Comprimidos que roubam a vida de gerações

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Há quatro anos atrás aconteceu algo que mudou a minha vida e fundamentalmente as minhas crenças sobre a doença mental.

Eu  cresci com medo de que a doença depressiva, que havia causado o suicídio do meu pai quando eu tinha 12 anos, um dia pudesse vir a me visitar. Eu nunca irei esquecer aquele dia de julho de 1976, quando minha mãe e minha irmã inesperadamente apareceram na casa do meu amigo: “Papai fez isso” – lembro-me da minha mãe dizendo. E ela não tinha mais nada a acrescentar.

Evidentemente que todos nós choramos no funeral. Mas havia um alívio também. Por alguns anos, meu pai havia ficado sentado lá na sala a fazer nada. Meus irmãos mais velhos tentaram me proteger da realidade: que aos 56 anos o meu pai não queria mais viver. Ouvia conversas em que ele iria falar algo sobre isso, porém o meu cérebro infantil simplesmente não conseguia entender o que era isso. Por que ele não pegava umas férias? assumia um novo hobby?, eu me perguntava. Como poderia alguém simplesmente não mais querer viver? Esses pensamentos mascaravam os meus medos mais profundos, que permaneceram sem ser expressos durante a minha infância, e que só vieram à tona quando adulta, em sessões de terapia. Certamente que meu pai, que desejava acabar com sua vida, devia ser um reflexo de que eu não significava muito para ele. Será que isso não queria dizer que eu não fosse um ser atraente?

A decisão do meu pai de querer acabar com a sua própria vida permaneceu incompreensível, até que a mesma coisa veio acontecer comigo, muitos anos depois. Mas não foi a depressão que causou isso. Eu sou uma entre 1% das pessoas que têm uma grave reação adversa aos antidepressivos, porque nos causam sofrimentos e nos tornam instantaneamente suicidas.

Aos 48 anos, eu me via sofrendo noites sem dormir, no momento em que atravessava por um processo de divórcio, e, como muitos na mesma situação que a minha, estava convencida de que precisava de um antidepressivo. Poucas horas depois de tomar o escitalopram (Lexapro), juntamente com a mirtazapina, eu estava em um estado de transe. Comecei a ter acatisia intensa, uma condição dolorosa em que você não pode ficar parada. Esse é um sinal de que você está em um estado perigoso de toxicidade, devido às drogas. Dois dias mais tarde, eu estava descontroladamente delirante e alucinante. Convenci-me de que eu tinha que matar meus filhos, e que eu estava sendo filmada pela televisão nacional. Embora eu não tenha lembrança disso, sei que apanhei uma faca de cozinha e dilacerei o meu braço.

E acabei sendo internada em um dos principais hospitais psiquiátricos privados de Londres. Quando fui entrevistada pela primeira vez, insisti que havia feito um pacto de suicídio com Deus, e que haviam câmeras no teto. Felizmente, mesmo em meu estado delirante, reconheci que era o Lexapro que estava me deixando doente. Pedi para não tomar essa droga e dois dias depois eu me encontrava melhor. O problema era que os médicos não acreditavam que havia sido a pílula que me havia tornado doente. Eles diagnosticaram depressão psicótica, insistiram para que eu permanecesse internada, devido à ameaça de me cortar outra vez, e também insistiram para que eu tomasse mais antidepressivos e antipsicóticos.

Os resultados foram devastadores. Eu nunca me tornei psicótica novamente, porém comecei a ser tomada por um desejo inexplicável de me matar. Eu não conseguia dormir ou me concentrar. Fui forçada a participar de sessões de terapia, mas eu não podia ficar parada, porque mais uma vez eu estava com acatisia (embora na época eu não tivesse idéia do que isso se tratava). Lembro-me de haver experimentado o que possivelmente seja a queda mais assustadora que um ser humano pode experimentar: o entorpecimento emocional aos seus extremos. De repente, eu fiquei incapaz de conversar com as pessoas, porque eu não tinha empatia. Música e filmes não significavam nada para mim. E o pior era que eu me sentia incapaz de sentir amor por meus filhos, Lily e Oscar.

Após três semanas, eu fui autorizada a deixar o hospital particular, na condição de que eu retornasse para consultas semanais com o psiquiatra de referência. Como o meu estado de saúde havia piorado, ele se convenceu de que eu estava sofrendo de depressão resistente ao tratamento.

Dois meses depois que eu havia saído do hospital, comecei a alimentar-me compulsivamente, a ganhar uma quantidade enorme de peso, e passei a estar tão mal que era incapaz para mim de sair de casa. Comecei a auto-medicar-me com bebida alcoólica e cigarros, para tentar acabar com o monstro da acatisia. Em um período de alguns meses eu deixei de ser uma super-mãe e sempre atenta para com a minha boa forma física, para passar a viver em uma piração total, vagando ao redor da casa em um roupão velho, fumando desbragadamente, bebendo e babando.

Meus filhos começaram a me odiar e só queriam estar com o meu ex-marido, que teve que se mudar para a minha casa para cuidar de mim. Assim que pude, mudei-me para fora da casa da minha família, porque eu não podia suportar o olhar de ódio em seus rostos. Sua mãe tinha se tornado um monstro incapaz de amá-los!

Depois de um ano de me haverem sido prescritas mais e mais drogas, incluindo lítio, juntamente com um diagnóstico de transtorno bipolar, eu estava prestes a acabar com a minha vida. Eu tinha perdido tudo. O dia chegou, em setembro de 2013, em que eu estava planejando de me jogar debaixo de um trem. Então, olhei-me no espelho: o meu cabelo sujo, a cara inchada por causa das drogas, os olhos vidrados e feridas ao redor da minha boca. Embora meu cérebro estivesse muito confuso, até mesmo para ser capaz de me vestir, ele ainda podia se lembrar das duas pessoas mais importantes na minha vida. A imagem dos rostos dos meus filhos no meu funeral apareceu. Eles estavam quase que com a mesma idade que eu tinha quando meu pai se suicidou.

Foi essa memória o que me levou a me dirigir para a mulher da equipe de tratamento domiciliar, que estava me visitando para se certificar de que eu estava tomando as minhas pílulas, e pedi-lhe para que me levasse para o hospital local. O meu seguro havia acabado, então eu não poderia voltar mais para o hospital privado.

Quando fui entrevistada pelo psiquiatra na unidade de saúde mental, eu disse as palavras que sabia que iriam obrigar que me hospitalizassem, “Eu vou me matar”.

E eles tomaram uma decisão que salvou a minha vida. Eles me tiraram todos os cinco antidepressivos e antipsicóticos. Entrei em agonia com a interrupção brusca de toda a medicação. Eu suava, gritava e gritava, às vezes incapaz até mesmo de ficar de pé. Então, depois de quatro semanas, algo milagroso aconteceu. Eu estava completamente melhor.

O processo de recuperação nas semanas seguintes foi mágico. Lembro-me de haver sido movida pela primeira vez por um trecho de música. Ser capaz de me concentrar em um filme. De passar a conversar e a rir com outros pacientes no hospital. E eu nunca vou esquecer olhando nos olhos dos meus filhos e de ser capaz de sentir amor por eles novamente.

Havendo saído do hospital depois de seis semanas de hospitalização, comecei o processo de retomar a viver juntamente com os meus filhos. Dentro de semanas, voltei ao trabalho, comecei a treinar para uma meia maratona, e tendo uma casa para mim e para os meus filhos que imediatamente reconheceram que eu estava melhor.

Nem todos concordaram, no entanto. Persuadir o resto do mundo que eram as drogas que causaram a que me tornasse uma suicida, ao invés de haver sido a depressão, tem sido uma luta difícil.

Amigos e familiares me aconselharam a manter o sigilo, a fingir que todo o incidente não tivesse acontecido, e guardando tudo para mim mesma. Mas quanto mais eu leio sobre o assunto mais irritada eu fico, não apenas devido ao que aconteceu comigo mesma, mas com o que ocorreu com os outros que perderam a vida devido a essas drogas.

Eu decidi fazer um filme e escrever um livro. Quando eu comecei, há exatamente um ano, eu não tinha ideia das descobertas extraordinárias que eu estava prestes a fazer. Há o que é encoberto pela Big Pharma, as pesquisas ocultas, as histórias de tragédias terríveis, e evidências convincentes de que a psicose induzida por antidepressivo está por trás de alguns dos piores assassinatos do mundo.

Mas há também uma revelação que me ajudou a entender o suicídio do meu pai, e que mudou completamente minhas crenças sobre a doença mental.

Eu descobri que muitos especialistas acreditam que a incapacidade de tolerar antidepressivos pode ser genética. De repente, tive uma visão sobre por que meu pai decidiu acabar com sua vida em 1976. Eu soube que, assim como eu, ele estava em uso de medicação antidepressiva. Parece altamente provável que a doença possa ter sido inteiramente causada por efeitos colaterais da medicação, assim como aconteceu comigo.

Conversando com outros membros da família revelou-se que eles também haviam se tornado misteriosamente doentes, depois de tomarem medicamentos similares. Por exemplo, a minha sobrinha começou a alucinar e não podia sair de casa depois de tomar uma pílula ansiolítica. Outro membro da família tomou um antidepressivo e teve que parar de tomá-lo imediatamente porque ele se sentia muito estranho.

Eu já falei com muitas pessoas que experimentaram casos semelhantes de suicídios na família. Eu também descobri que existem mais de 100 medicamentos que têm efeitos colaterais suicidas, incluindo algumas drogas anti-tabaco, alguns medicamentos anti-malária e alguns medicamentos para a acne. Cheguei à conclusão de que pode não se tratar de uma doença mental transmitida através das gerações. Talvez seja um gene na família que faz com que as pessoas sejam incapazes de tolerar a medicação e que elas se tornem suicidas.

Isso certamente tem algumas ramificações muito grandes para a nossa compreensão da saúde mental. Desde que comecei a divulgar a minha história e a fazer uma campanha, eu sou frequentemente contatada por pessoas que começaram a se perguntar se seus entes queridos se mataram por causa da medicação. Espero que eu seja capaz de explicar-lhes, por experiência própria que, se você está sofrendo acatisia ou toxicidade por drogas, a motivação para acabar com a sua vida é inexorável. Você está literalmente sendo torturado – que é por isso que, eu acho, muitos doentes tomam uma decisão impulsiva para acabar com suas vidas em ações aparentemente inexplicáveis, como saltar de um trem sem deixar qualquer nota ou explicação para as pessoas mais próximas a elas.

Uma das coisas mais difíceis foi tentar explicar aos meus filhos, que agora têm 14 anos e 15 anos de idade, é que as drogas haviam me levado ao ponto em que eu estava prestes a acabar com a minha vida. Porque isso estava em meu livro, e eles disseram que iriam lê-lo, eu tive que dizer a eles tudo.

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A conversa terminou com todos nós chorando e se abraçando. Porque nós os três temos viajado juntos nessa viagem de descoberta sobre os efeitos colaterais da medicação, eu acho que eles realmente compreenderam que o meu desejo de acabar com a minha vida não tinha nada contra eles. Meus adversários haviam sido uma combinação de cinco antidepressivos, antipsicóticos e estabilizadores de humor – com o meu DNA e a minha incapacidade para tolerar esses medicamentos, eu não tinha escolha.

Claro, agora eu penso muito diferente sobre a morte do meu pai. Eu já não o culpo por me haver deixado, e eu já não mais tenho medo de que o “cão negro” que arruinou a sua vida venha visitar a mim ou aos meus filhos. Em vez disso, eu sei com certeza que medicamentos antidepressivos (e provavelmente algumas outras drogas) me levariam para o mesmo ponto de querer acabar com a minha vida em um espaço muito curto de tempo. E eu disse aos meus filhos que há uma forte possibilidade de que o mesmo acontecesse com eles.

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Você quer saber mais sobre a sua experiência?  Eis algo mais.

E o vídeo que ela preparou está aqui.

Senão, esse outro vídeo que teve uma forte repercussão no Reino Unido.