Eu não Acredito em Transtornos Mentais, e Você?

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mcornwallEm novembro de 2000, fiquei ansioso diante de quatrocentos e cinquenta profissionais de saúde mental reunidos. Entre administradores, colegas e acadêmicos, disse: “Oi, eu sou Michael Cornwall e não acredito em transtornos mentais!”

Fui o primeiro palestrante de uma grande conferência realizada em San Francisco. Eu não acreditava em transtornos mentais nem quando eu estava passando pela minha prórpia crise de loucura há 46 anos nem nos ultimos 30 anos servindo a pessoas loucas. Jay Mahler foi a única pessoa que veio até mim, e agradeceu por ter dito que não acreditava em transtornos mentais. Enquanto várias outras pessoas me trataram como se eu estivesse com alguma doença contagiosa.

Eu me senti estimulado a escrever este blog, porque acabei de ler um artigo de Marianne Farkas, publicado pelo Centro de Reabilitação Psiquiátrica, da Universidade de Boston, intitulado: “A visão sobre a recuperação (‘recovery’) hoje: o que é, e o que isso significa para os serviços”. Ela se refere às pessoas que precisam desses serviços, como tendo “transtorno mental grave”. O artigo foi escrito em 2007, mas ainda é recomendado por líderes do Centro de Reabilitação Psiquiátrica, para uma análise aprofundada do Movimento de Recuperação, com base, portanto, na visão de que as pessoas têm transtornos mentais graves.

O que acreditamos motiva muito que fazemos com as nossas vidas. Pelo fato de que eu não acreditava em doenças mentais, passei minha vida, desde que eu era uma pessoa jovem passando por uma crise de loucura, sem medicação ou tratamento, perguntando: “Se a loucura não é o que a bio-psiquiatria diz, então, o que é?” Eu criei minha própria definição de loucura com base na minha experiência pessoal, na minha experiência de trabalho como terapeuta, e na minha pesquisa como doutorando. Eu já compartilhei isso em blogs anteriores.

Agora, se eu acreditasse que a loucura era uma doença cerebral genética, eu poderia ter me tornado um bio-psiquiatra ou ter tomado medicações para minha crise de loucura.

Porque o transtorno mental é como a bio-psiquiatria se refere à loucura e a cada formulação diagnóstica em seu DSM. Eu nunca digo às pessoas que estou a serviço de um transtorno mental. Pois não as vejo através dessa lente do DSM.

Eu as vejo como eu me vejo: uma pessoa que pode ter várias experiências de sofrimento emocional, sofrimento este que às vezes assume a forma de loucura.

Fui recentemente chamado à atenção por um colega, líder nacional de recuperação (‘recovery’), por descrever a mim, e a outros, como capazes de experimentar sofrimento emocional. Ele disse que o sofrimento é a palavra errada – a aflição (ou angústia) é a mais precisa. Mas eu não acredito nisso, porque não reflete minha própria experiência ou, como descreveria, a dor dos outros quando estão aterrorizados, em desespero ou em loucura. A aflição (ou angústia) é uma forma leve de sofrimento na minha compreensão, como se fosse uma indigestão, que com um sal de frutas talvez alivie. Mas isso é só o que eu acredito.

Nossa cultura e nosso mundo estão repletos de crenças polarizadoras – políticas, religiosas, etc. Em uma reunião, eu ouvi alguém chamar um líder nacional do Movimento de Recuperação de nazista, porque esse líder havia dito que a recuperação completa era possível. A pessoa que o chamou de nazista temia que, se as pessoas loucas acreditassem nele e não tomassem medicação, haveria um holocausto, e este líder seria o responsável por tais mortes. Também já ouvi colegas chamarem bio-psiquiatras de nazistas.

Até onde podemos seguir no respeito e na oposição aos sistemas de crenças extremamente diferentes dos nossos, antes de cair em xingamentos chamando as pessoas com opiniões diferentes da minha de nazistas, e de vê-las como malvadas?

Imagino que algumas pessoas acreditavam que Bob Whitaker tinha cruzado a linha quando escreveu seu blog, “The Taint of Eugenics in MIMH-Funded Research”. Por causa das minhas crenças, não acredito que ele tenha cruzado a linha.

Eu acredito que algumas práticas – como medicação forçada, isolamento com restrições, etc. para crianças, adolescentes e adultos, prescrição de drogas psicológicas para crianças – são todos abusos dos direitos humanos. Você acha que eu cruzei a linha dizendo isso?

Existe um terreno comum em que podemos permanecer, mesmo com nossas crenças polarizadas? Esse pedaço de terreno comum a todos varia em tamanho. Às vezes, não existe.

Eu não acredito em doenças mentais. Eu acredito que somos almas soberanas que não devem ser presas ou receber tratamentos forçados. Mas sim, que nos sejam oferecidos tratamentos que não façam NENHUM tipo de mal para aqueles que passamos por um sofrimento emocional e uma crise de loucura. Eu acredito que devemos receber respeito, amor e compaixão.

No que você acredita?