Fitoterapia e Desmedicalização na Atenção Primária à Saúde: Um Caminho Possível?

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Resumo do artigo realizado por Jéssica Marques e revisado por Camila Motta.

O artigo intitulado Fitoterapia e desmedicalização na Atenção Primária à Saúde: um caminho possível? dos autores Artur Alves da Silva e Wandsons Alves Ribeiro Padilha, destaca e debate que mesmo com o crescimento da fitoterapia no Sistema Único de Saúde (SUS), a prática da medicalização é tão enraizada e generalizada que afeta praticamente todo o corpo social do Brasil, mesmo o uso da fitoterapia sendo um cuidado em saúde que é acessível, confiável e culturalmente aceito.

A Organização Mundial da Saúde (OMS) já expressava a importância de valorizar as plantas medicinais, esse reconhecimento influenciou as ideias do movimento da Reforma Sanitária, que pautou a implementação da Fitoterapia no SUS. No entanto, as mudanças no sistema social, induzidas pelos processos de industrialização e urbanização, suscitaram transformações sociais, inclusive a medicalização da saúde, acarretando vários efeitos sobre sujeitos e instituições sociais.

A ampliação da Atenção Primária à Saúde (APS) no Brasil elevou consideravelmente o acesso à biomedicina e o contato das pessoas com ela, mas apesar da importância do acesso da população à APS, é preciso estar atento porque esse processo pode torná-la mais suscetível aos efeitos da medicalização, já que dependendo da organização dos serviços e dos profissionais, pode-se medicar em maior ou menor grau. Quem atua na APS precisa praticar a autocritica, percebendo no cotidiano os desdobramentos da medicalização que se podem traduzir em danos clínicos e também em efeitos nocivos nos valores, imaginários, medos e crenças de quem utiliza o SUS.

O Ministério da Saúde reconhece que atualmente a medicalização induz a população a querer resolver problemas sociais com o uso de medicações. Isso demanda que os profissionais estejam atentos para considerar outras formas de tratamento que fortaleçam o cuidado integral e multidisciplinar. Por isso, o SUS precisa debater quando é necessária a prescrição de medicamentos, com o objetivo de avançar em direção à desmedicalização.

Estima-se que 82% da população brasileira utiliza as plantas medicinais em seu cuidado com a saúde, seja por meio do uso popular, que envolve os conhecimentos da medicina tradicional indígena, quilombola e de outros povos e comunidades tradicionais; seja por meio de orientações e prescrições no SUS, baseadas em práticas de cunho científico. Podendo ser ofertada na forma de plantas medicinais frescas (in natura), plantas medicinais secas (droga vegetal).

O artigo aponta os benefícios da fitoterapia na APS como: a validação dos saberes tradicionais/populares das comunidades, o fortalecimento de laços entre a comunidade e a equipe de saúde, o fortalecimento da integralidade em saúde e principalmente a possibilidade de redução da excessiva medicalização entre outros benefícios. No entanto, existem entraves associados à formação profissional, que geralmente é voltada às práticas medicalizadoras do modelo biomédico, dificultando a aplicação dos conhecimentos da área das plantas medicinais. Vários estudos realizados no âmbito do SUS revelam que os profissionais de saúde têm dificuldade para orientar e prescrever o uso de fitoterápicos.

É importante destacar que, apesar de a potencialidade da fitoterapia contribuir para a desmedicalização no SUS, essa prática não está livre de atuar reforçando a lógica da medicalização.  O método clinico centrado na pessoa (MCCP) consiste em um importante recurso para a prática da prevenção quaternária, possibilitando a redução dos efeitos da medicalização sobre as pessoas com base na valorização da escuta e da construção compartilhada de planos de cuidado. Hoje se baseando em quatro componentes interativos:

  1. O primeiro componente do método clinico centrado na pessoa: explorando a saúde, a doença e a experiência da doença.
  2.  O segundo componente do método clínico centrado na pessoa: entendendo a pessoa como um todo.
  3.  O terceiro componente do método clínico centrado na pessoa: elaborando um plano conjunto.
  4.  O quarto componente do método clínico centrado na pessoa: intensificando a relação da pessoa com o médico.

Por fim, o artigo aponta que a medicalização tem impactos no SUS e na APS, e intervenções biomédicas desnecessárias tornam-se naturalizadas e reduzem a autonomia dos indivíduos no cuidado da própria saúde, expondo-os aos riscos de intervenções desnecessárias. A fitoterapia pode ser uma aliada da prática da prevenção quaternária na APS ao tornar possível o encontro do saber tradicional com o técnico-científico, o que viabiliza um modo de cuidado alternativo à lógica medicalizadora, além de promover o fortalecimento do vínculo da equipe de saúde da família com o usuário por meio do respeito ao conhecimento popular e da valorização da autonomia do indivíduo.

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Silva A.A. da, Padilha W.A.R. Fitoterapia e desmedicalização na Atenção Primária à Saúde: um caminho possível?. Rev Bras Med Fam Comunidade. 17(44):2521. 2022 

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Nota do Editor: Todos os artigos, matérias, notícias e traduções publicadas no Mad in Brasil são previamente autorizadas pelo nosso editor-chefe, Paulo Amarante.