O Modelo alternativo ao DSM proposto pela Sociedade Britânica de Psicologia

A proposta discutida em Nova Zelândia e Austrália (parte I)

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Este é o primeiro de dois blogs sobre a minha turnê pela Nova Zelândia e Austrália, tendo sido convidada para apresentar o Modelo Poder Ameaça Sentido (em inglês Power Threat Meaning Framework – PTMF). A PTMF é uma tentativa ambiciosa de delinear uma alternativa conceitual ao diagnóstico psiquiátrico e à medicalização do sofrimento, patrocinada pela Divisão de Psicologia Clínica da British Psychological Society, que foi lançada em Londres, em janeiro de 2018 (Johnstone e Boyle, 2018a; Johnstone e Boyle, 2018; clique aqui para documentos relevantes, vídeos e outros recursos, bem como para o acesso para o vídeo com legendas em português). Nossos anfitriões foram a ISPS (Sociedade Internacional de Abordagens Psicológicas à Psicose) presente em ambos os países, com a colaboração da Fundação Blue Knot (Austrália), havendo também sido convidada  pela Sociedade Psicológica da Nova Zelândia e pelo Colégio de Psicólogos Clínicos da Nova Zelândia.

O primeiro evento, e para mim o mais assustador em princípio, foi um workshop em Auckland que durou dois dias. Eu queria fazer disso uma oportunidade para comparar e contrastar diferentes experiências culturais e expressões de sofrimento psíquico. Eu estava ansiosa por explorar uma das nossas esperanças para o PTMF – qual seja, que em contraste com a imposição do modelo de diagnóstico ocidental em todo o mundo, o PTMF respeite e valide outras visões de mundo, em parte porque está baseado em princípios fundamentais que são compartilhados. Como dissemos no documento:

O modelo PTM prevê e permite a existência de experiências culturais e expressões de sofrimento amplamente variáveis, sem posicioná-las enquanto variações bizarras, primitivas, menos válidas ou exóticas, dos diagnósticos dominantes ou de outros paradigmas ocidentais … Apresentado como uma metalinguagem baseada em capacidades humanas universalmente evoluídas e respostas a ameaças, os princípios básicos do modelo PTM aplicam-se ao longo do tempo e entre diferentes culturas. Dentro disso, listas abertas de respostas e funções de ameaças…. permitem um número indefinido de expressões de sofrimento local e historicamente específicas, todas moldadas pelos significados culturais predominantes (Johnstone e Boyle, 2018a, p. 22).

O consultor de psicologia clínica Ingo Lambrecht organizou o evento, com o apoio do resto do comitê da ISPS da Nova Zelândia; ele conseguiu garantir o uso, durante os dois dias, de um marae – que é um local de encontro comunal maori, quer dizer, um espaço sagrado.

O contexto da Nova Zelândia

O marae foi criado como sendo um serviço de saúde mental a oferecer intervenções maori ao lado daquelas mais convencionais. Esta é uma estrutura de serviço comum na Nova Zelândia, e os Pakeha (europeus) também podem acessar essas abordagens, se assim o desejarem. Não existe um modelo único, mas há um que é bem conhecido e é amplamente integrado na prática: Te Whare Tapa Wha(Durie, 1994). Ele se baseia nos 4 pilares interconectados do bem-estar maori: mente, espírito, saúde física e família (whanau). Isso foi expandido para o modelo Meihana por um grupo de clínicos que queriam desenvolver uma estrutura que se envolvesse ativamente com crenças, valores e experiências Maori (Pitama et al, 2014). Meihana acrescenta as dimensões de Taiao (ambiente físico) e Iwi Katoa (contexto social). Se algum desses elementos estiver fora de equilíbrio, haverá uma ameaça ao bem-estar. Diversas variações desses modelos são descritas por McNeill (2009). Por exemplo, Te Pae Mahutonga (Durie, 1999) explicitamente inclui os impactos da colonização nas vidas, experiências e conceitos Maori, assim como a versão mais recente do modelo Meihana, que também enfatiza o papel do racismo e a migração da terra tradicional iwi.

Todas essas são perspectivas holísticas, diferentes das ocidentais em vários aspectos, incluindo a ênfase na espiritualidade. O conceito de whanau faz com que a noção ‘holista’ seja muito mais expansiva do que a palavra equivalente em inglês, ao incluir a extensa família composta por tias, tios, avós e assim por diante, vivos e mortos. Vários whanau formam um hapu, que por sua vez são parte de um iwi ou tribo. Essas identidades estão fortemente conectadas ao mundo natural. Assim, uma introdução tradicional de Maori incluirá ‘meu rio é …’ e ‘minha montanha é …’, bem como ‘meu whanau é …’ ‘… meu hapu é … ‘e ‘meu iwi é …’

O contexto mais amplo é, de certa forma, muito diferente daquele do Reino Unido. Resumidamente, a Nova Zelândia / Aotearoa (Aotearoa é o nome Maori do país, traduzido aproximadamente como ‘nuvem branca longa’) foi colonizada por europeus a partir de 1800. Aotearoa / Nova Zelândia tornou-se uma colônia britânica em 1840 ,através do Tratado Marco de Waitangi, assinado por representantes da Coroa Britânica e chefes Maori. Isto salvaguardou a posse legal dos Maori das suas terras e bens e deu-lhes direitos iguais aos cidadãos britânicos. Os princípios do Tratado foram realizados de forma muito imperfeita e não impediram a anexação posterior da terra Maori. Até hoje, os povos maori e das ilhas do Pacífico estão muito representados nas estatísticas da pobreza, desemprego, saúde mental e dependência. No entanto, o Tratado permanece como uma declaração de princípios e, sem dúvida, contribuiu para um compromisso de reconhecer e respeitar as visões de mundo dos Maori e das Ilhas do Pacífico e para reconhecer e reduzir as desigualdades e as disparidades de saúde existentes nessas populações.

A Nova Zelândia está no meio de uma grande Inquérito realizada pelo governo sobre os serviços de saúde mental e dependência química, que são vistos como falhas na população como um todo; as taxas de suicídio são altas, assim como os vícios. Um longo período de consulta resultou em 40 recomendações, que atualmente estão sendo consideradas. O documento de resumo é eloquente- alguns trechos são os seguintes (He Ara Oranga, 2018):

“Reconhecemos desde o início que essa investigação representava uma oportunidade de mudança” que apenas ocorre uma vez para uma geração. Em todo o país, as pessoas nos disseram que queriam que esse relatório levasse a uma mudança real e duradoura – uma ‘mudança de paradigma’ …”

“As pessoas disseram que, a menos que a Nova Zelândia lide com os determinantes sociais e econômicos da saúde, nós nunca deteremos a maré dos problemas de saúde mental e dependência. Há um chamado para o bem-estar e as soluções comunitárias – para ajudar nas tempestades da vida, para ser visto como uma pessoa como um todo, não como um diagnóstico, e para que as pessoas sejam encorajadas e apoiadas a cura e a restauração do senso de si mesmo …”

“Para a saúde e o bem-estar maori, é fundamental o reconhecimento do impacto da alienação cultural e da privação geracional, a afirmação da indigeneidade e a importância das abordagens culturais e clínicas, enfatizando os laços com whānau, hapū e Iwi.”

“Para os povos do Pacífico, a adoção de ‘formas típicas do Pacífico’ para permitir a saúde e o bem-estar nosso – uma abordagem holística incorporando as línguas, identidade, conexão, espiritualidade, nutrição, atividade física e relacionamentos saudáveis que são características dos povos do Pacífico.”

“Não podemos medicar ou tratar o nosso modo de como sair da epidemia de sofrimento mental e do vício que afetam todas as camadas da nossa sociedade.”

“Acreditamos que muitas dimensões das aspirações dos povos Maori e do Pacífico, especialmente a chamada por uma abordagem holística, apontam o caminho para todos os neozelandeses.”

O workshop

Em um lindo dia quente, nós nos reunimos sob uma árvore  – uma plateia mista de médicos (incluindo vários psiquiatras), voluntários e familiares, estudantes, usuários de serviço e ex-usuários. O processo de acolher um visitante em um marae é chamado de powhiri e pode assumir várias formas. Neste caso, o tangata whenua (anfitriões) realizou um haka powhiri (uma dança de boas-vindas e canto), quando eu e os participantes nos aproximávamos do marae. Uma vez lá dentro, e depois de um momento de respeito pelos antepassados cujas gravuras estavam na parede oposta, um ancião (kaumatua) entoou canções e karakia (orações). Os anfitriões receberam os visitantes com um beijo na bochecha ou hongi (tocando o nariz) e então nos mudamos para outra sala para lá  compartilhar chá e frutas (comida e bebida não são permitidas nos marae.)

Desejando ressaltar as apresentações de Māori, colocando-me com um pouco mais de precisão do que simplesmente dizer “sou um psicólogo clínico”, eu descrevi minha cidade natal, Bristol, minha família e minha herança escocesa de Johnstones, Grahams, McKays e Frasers. Eu também disse aos assistentes que dois dos meus bisavós tinham sido missionários em Gana e Sri Lanka (conhecidos pelos britânicos como Gold Coast e Ceilão). Eu disse que parecia importante reconhecer que todos nós temos uma relação com o colonialismo. Também coloquei as questões deliberadamente provocativas: “O paradigma diagnóstico ocidental é simplesmente outra forma de colonialismo, talvez mais sutil do que as versões anteriores, mas igualmente prejudicial em seus impactos?” “O Inquérito que está sendo feito irá longe o suficiente para alcançar a tão esperada ‘mudança de paradigma’?” “Ou vamos simplesmente acabar criando versões mais atualizadas ao que já temos hoje?” “É legítimo oferecer o modelo de diagnóstico ocidental fracassado junto com os modelos indígenas, ou ele precisa ser abandonado por completo?”

Eu não vou descrever o primeiro dia, além de dizer que ele consistiu em introduzir o PTMF  e ilustrá-lo através da história de Debra Lampshire, atual presidente da ISPS NZ – muito obrigado a Debra por sua generosidade. Nós terminamos com um karakia.

Depois de uma cerimônia de boas-vindas que foi mais breve, o segundo dia começou com uma reflexão sobre as perspectivas Maori por Pikihuia Pomare, um psicólogo clínico Maori e Jason Haitana, um colaborador que presta assessoria. Pikihuia começou com uma waita (canção) e depois voltou à discussão do dia anterior sobre o poder em seus muitos disfarces, incluindo o colonialismo e o privilégio branco, e a consequente necessidade de se recuperar o conhecimento maori que foi silenciado. Jason pegou este tema, recontando algumas histórias de criação maori ou purakau. Como ele disse, elas são mais do que simples histórias, porque, embora não sejam literalmente verdadeiras, expressam verdades importantes herdadas dos ancestrais. Sua primeira história foi sobre Ranginui e Papatuanuku, o pai celeste e a mãe terra do mundo, vivendo na escuridão. Seus filhos decidem que precisavam ser afastados para trazer luz ao mundo, e fizeram isso, porém não sem esforço e dor. Ele convidou o público a compartilhar ressonâncias com suas próprias vidas, como a necessidade de as crianças criarem o espaço para se tornarem elas mesmas. Os participantes, tanto Māori quanto Pakeha, responderam com uma série de reflexões pessoais.

Fiquei com vários pensamentos. Em primeiro lugar, a noção de histórias, mitos e lendas enquanto veículo de verdades é algo que muito apoiado pelo PTMF. É por isso que o modelo defende a narrativa em geral, não apenas o tipo particular de narrativa chamada de ‘formulação’ (por nós no Reino Unido). Se formos além da prática convencional baseada em evidências e da verdade histórica, e também considerarmos a ‘verdade narrativa’ (Spence, 1982, citado em Johnstone e Boyle, 2018a, p. 83), podemos valorar as histórias de acordo com o fato de elas parecerem se encaixar de uma maneira que “torne a mudança concebível e alcançável” (Schafer, 1980, citado em Johnstone e Boyle, 2018a, p.82). Em segundo lugar, como um dos participantes comentou para mim, as histórias Maori mostraram temas claros que poderiam ser descritos como poder, ameaça e significado. Não estou sugerindo que eles precisem ser traduzidos nesses termos, mas simplesmente estou observando pontos comuns entre as duas perspectivas de Māori purakau e os temas centrais do PTMF. Em terceiro lugar, as reações do público me deram uma ideia de como esse purakau poderia ser usado para refletir, explorar e curar dilemas e lutas humanas. Isso também ecoa o PTMF, que se refere à ‘Competência narrativa … a capacidade de os seres humanos absorverem profundamente, interpretarem e responderem apropriadamente às histórias dos outros’ (Grant, 2015, citado em Johnstone e Boyle, 2018a, p.78), e recuperação enquanto “recuperar nossa experiência para retomar a autoria de nossas próprias histórias” (Dillon e May, 2003, citado em Johnstone e Boyle, 2018a, p. 75).

A segunda metade da manhã consistiu em um painel informal com 7 de nós. Um intervalo de tempo relativamente longo foi alocado para isso, e fiquei impressionada com a maneira como se desenrolou. De acordo com a sessão anterior, alguns dos oradores de Maori responderam aos pontos indiretamente ao contar uma história tradicional, e da mesma forma, alguns da audiência, embora Pakeha, começaram suas contribuições contando histórias sobre si mesmos. O sentido era o desdobramento de uma conversa fluente que ia mais fundo do que o debate acadêmico usual. Em vários momentos do dia anterior, quando expliquei o conceito de ‘formulação’, lembrei-me, acertadamente, que esse processo de co-construção de uma história é essencialmente sobre duas pessoas que estão profundamente em contato uma com a outra e que tocam o coração uma da outra. Isso não é do meu conhecimento, em qualquer definição oficial de ‘formulação’ que eu conheça, e, no entanto, me pareceu absolutamente verdadeiro.

Sugeri que a discussão poderia querer voltar às perguntas que fiz no começo do primeiro dia. Não houve respostas diretas – não foi esse tipo de conversa, e ainda não sabemos como será o resultado do Inquérito que está sendo feito no país. No entanto, houve forte endosso da inclusão dos fatores causais do PTMF que são omitidos da maioria dos modelos psiquiátricos e psicológicos, como o ‘impacto do colonialismo’, ‘trauma intergeracional’, ‘negação e perda do conhecimento tradicional’ e o papel do poder ideológico em todas essas áreas. Alguns dos participantes foram fortemente a favor de se abandonar o modelo baseado no DSM, junto com a defesa do PTMF como uma alternativa, embora imperfeita e ainda em desenvolvimento para nos levar adiante.

Um dos membros do painel foi uma jovem mulher maori, uma sobrevivente de serviços de saúde mental que agora está treinando para ser psiquiatra a fim de provocar mudanças no sistema. Ela havia encontrado o PTMF por acaso e lido o documento principal em sua totalidade. Ela reconheceu que o Modelo precisaria se adaptar às necessidades locais, mas sentiu que havia espaço para isso ser oferecido. Como tal, ela estava muito entusiasmada com seu potencial para apoiar entendimentos indígenas e nos disse que já está sendo usado para informar o pensamento em um serviço de saúde mental Maori.

O Inquérito inclui um resumo das respostas especificamente maori (“Whakamanawa: Honrar as vozes e as histórias de Maori”). Um extrato ilustra as semelhanças com as mensagens do PTMF:

“A voz maori do Inquérito reconhece o sofrimento mental como uma resposta razoável a ambientes mais adversos. Dentro de um paradigma de bem-estar, a angústia mental não é medicalizada, patologizada ou criminalizada; os caminhos para a cura são baseados em whānau, incluindo elementos espirituais e apoiados por um ambiente saudável mais amplo. O ponto focal de uma mudança de paradigma de bem-estar pressupõe que a saúde mental é uma dimensão de experiência relevante para todos os membros da sociedade.”

Reflexões

Eu acho que todo o workshop foi uma experiência profundamente provocante e enriquecedora. Ao contrário de algumas experiências de treinamento, senti que recebi muito mais do que dei, tanto em termos de ideias e desafios, como também em termos de cordialidade, conexão e a oportunidade de experimentar o sabor de uma cultura muito diferente.

Eu quero evitar fazer generalizações simplistas sobre uma cultura que não é familiar para mim, e estou ciente de que tem havido muita mistura de sangue e ideias entre os europeus e os maori ao longo dos anos. Como resultado, as pessoas agora vivem em ambos os mundos e possuem diferentes graus de identificação com práticas e perspectivas tradicionais. Por exemplo, muitos Maori se converteram ao cristianismo no século XIX.

Dito isto, concordo com o Inquérito de que as cosmovisões dos Maori e das Ilhas do Pacífico têm muito a oferecer a todos os neozelandeses e, gostaria de acrescentar, às perspectivas ocidentais em geral. É muito evidente que, pelo menos no Reino Unido, perdemos o senso de comunidade, espiritualidade, identidade e conexão com o mundo natural que é tão altamente valorizado pelos neozelandeses indígenas, com impactos no bem-estar amplamente documentados. Tentamos reconhecer isso no PTMF, incorporando  referências como o impacto do colonialismo e do trauma intergeracional, a inseparabilidade do indivíduo em relação ao grupo social e a necessidade de integrar a mente, o corpo, o espírito e o mundo natural. Incluímos também, como possíveis formas de reivindicar poder, identidade e agência:

  • Significados, crenças e formas de expressão específicas da cultura
  • Práticas, rituais e cerimônias apoiadas culturalmente
  • Narrativas comunitárias, valores, credos e crenças espirituais, para apoiar a cura e integração do grupo social
  • Conexões com o mundo natural
  • Lidar com traumas coletivos / transgeracionais e perda de identidade, cultura, patrimônio e terra
  • Produção narrativa através da arte, poesia, literatura, música
  • Ação política

(Johnstone e Boyle, 2018b, p.216-217; Johnstone e Boyle, 2018 a, p. 77-79).

Após minha breve e direta exposição a uma cultura muito diferente, percebo que esse reconhecimento não vai longe o suficiente. Embora obviamente não seja apropriado que os próprios autores da PTMF adaptem o documento para as perspectivas não-ocidentais, acredito que as futuras edições precisam dar mais ênfase a essas necessidades humanas universais.

E algumas reservas …

Não tenho nenhum desejo de idealizar as perspectivas que aprendi. Especificamente, tenho preocupações sobre a infiltração do pensamento medicalizado nessas abordagens originalmente não-ocidentais. Depois de descrever sua abordagem “Te Whare Tapa Wha”, um serviço de saúde mental comunitário maori acrescenta esses parágrafos que poderiam vir de qualquer livro psiquiátrico padrão:

O que é doença mental?

A doença mental é um comportamento clinicamente significativo ou um distúrbio psicológico que está associado à angústia ou incapacidade … Uma doença mental pode … limitar nossa capacidade de funcionar como a sociedade normalmente esperaria de nós e pode colocar nós e outras pessoas em risco. A doença mental é, portanto, um termo amplo que abrange problemas que vão desde distúrbios menores a graves.

Esquizofrenia

A esquizofrenia é um transtorno mental grave que afeta cerca de 1% da população geral. É uma doença complexa caracterizada por ‘psicose’, palavra usada para descrever desordem de pensamentos (por exemplo, delírios – falsas crenças mantidas apesar da evidência de que não são reais), percepções (por exemplo, alucinações – ver, ouvir ou sentir coisas que não estão lá), discurso desorganizado e comportamento grosseiramente desorganizado, que não são experimentados por outros e que não são vistos como anormais pelo sofredor. Esses quatro sintomas são frequentemente chamados de ‘Sintomas Positivos’ da esquizofrenia, porque são o resultado do processo da doença.

Da mesma forma, o Inquérito, juntamente com a sua progressiva “chamada ao bem-estar e soluções comunitárias – para ajudar nas tempestades da vida, para ser visto como uma pessoa completa, não como um diagnóstico”, inclui muitas frases que implicam o próprio modelo diagnóstico, como “doença psiquiátrica duradoura” e “doença mental grave” (que parecem ser conceitualizadas como algo fundamentalmente diferente de outras formas de sofrimento). Entre as recomendações bem-vindas para lidar com os determinantes sociais da angústia estão várias que simplesmente implicam “mais do mesmo” (por exemplo, “Expandir o acesso a serviços a mais pessoas com necessidades mentais e de dependência leve a moderada e moderada a grave”). Um serviço culturalmente consciente não é uma garantia contra a infiltração de ideias biomédicas.

Em conclusão, o resultado do Inquérito da Nova Zelândia continua a ser produzido. Não tenho dúvidas de que essa iniciativa ousada resultará em algumas melhorias reais, mas parece provável que fique aquém de um desafio fundamental à abordagem diagnóstica. No entanto, se o PTMF puder ajudar nesse sentido, eu e os outros autores ficaremos encantados. Enquanto isso, vou sempre valorizar a conexão vitalícia que agora foi forjada com o marae em Manawanui.

Com agradecimentos a Ingo Lambrecht, Debra Lampshire e o resto do comitê doISPS NZ.

Durie, M. (1994). Whaiora: Māori health development. Auckland: Oxford University Press.

Durie, M. (1999). Te Pae Mahutonga: A model for Māori health promotion. In Health Promotion Forum of New Zealand Newsletter, 49, 2-5.

He Ara Oranga: Report of the Government Inquiry into Mental Health and Addiction (2018) Available at  www.mentalhealth.inquiry.govt.nz/inquiry-report

Johnstone, L. & Boyle, M. with Cromby, J., Dillon, J., Harper, D., Kinderman, P., Longden, E., Pilgrim, D. & Read, J. (2018a). The Power Threat Meaning Framework: Overview. Leicester: British Psychological Society. Available from www.bps.org.uk/PTM-Overview

Johnstone, L. & Boyle, M. with Cromby, J., Dillon, J., Harper, D., Kinderman, P., Longden, E., Pilgrim, D. & Read, J. (2018b). The Power Threat Meaning Framework: Towards the identification of patterns in emotional distress, unusual experiences and troubled or troubling behaviour, as an alternative to functional psychiatric diagnosis. Leicester: British Psychological Society.

McNeill, H. (2009) Māori models of mental wellness. Te Kaharoa, 2, 96-115.

Pitama, S., Huria, T., and Lacey, C. (2014)Improving Māori health through clinical assessment: Waikare o te Waka o Meihana. Journal of theNew Zealand Medical Association, 127, pp 107 – 119.

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A Dra. Lucy Johnstone é psicóloga clínica, formadora, palestrante e escritora, e uma crítica de longa data do modelo biomédico de psiquiatria. Ela trabalhou em ambientes de saúde mental para adultos por muitos anos, alternando com cargos acadêmicos. Ela é a ex-Diretora do Programa do Doutorado em Psicologia Clínica de Bristol, que foi baseada em uma filosofia crítica, politicamente consciente e informada pelo usuário, juntamente com uma ênfase no desenvolvimento pessoal. Ela escreveu e treinou extensivamente sobre o assunto da formulação psicológica como alternativa ao diagnóstico psiquiátrico. Lucy é a autora principal, juntamente com a professora Mary Boyle, do Power Threat Meaning Framework, publicado pela British Psychological Society em janeiro de 2018. Este documento ambicioso oferece uma alternativa conceitual ao modelo de diagnóstico de sofrimento psicológico e emocional. Lucy atualmente trabalha como treinadora independente.