Uma reanálise dos resultados dos dados dos antidepressivos no estudo STAR*D

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FreitasUm novo estudo, liderado por Irving Kirsch, diretor-associado do Programa de Estudos com Placebo, na Harvard Medical School, reanalisa pela primeira vez os resultados primários do estudo chamado STAR*D (Alternativas Sequenciais de Tratamento para Aliviar a Depressão). Os resultados do estudo feito por Kirsch e colegas, publicado em Psychology of Consciousness: Theory, Research, and Practice, sugerem inflação da eficácia antidepressiva, tanto nos relatórios experimentais STAR * D como nos ensaios clínicos convencionais.

O STAR*D é o estudo mais amplo e custoso sobre a eficácia dos antidepressivos que foi até hoje feito. Participaram do STAR*D 4.041 pacientes buscando atenção médica de rotina e que foram diagnosticados com depressão, que foram tratados na fase aguda da depressão, e que foram acompanhados clinicamente de tal forma a maximizar a probabilidade de alcançar e manter a remissão. Para ser o mais próximo possível da prática clínica que ocorre no ´mundo real´, o desenho da pesquisa STAR*D não propôs o grupo de controle com placebo ou qualquer outro tipo de grupo de controle.

” Em resumo, as comparações das melhorias identificadas na Escala de Avaliação de Hamilton para Depressão [HRSD] HRSD no ensaio clínico STAR * D com melhorias relatadas em pesquisas clínicas convencionais indicam que a melhora após o tratamento com antidepressivos é substancialmente menor nesta amostra altamente generalizável do que nas pesquisas clínicas convencionais, ” Kirsch e seus colegas escrevem. “A efetividade real dos antidepressivos no mundo real é aproximadamente a metade daquela relatada nos testes de eficácia das pesquisas clínicas”.

estrela cadente

Diferentemente das pesquisas clínicas convencionais, STAR*D não excluiu pacientes por terem alguma comorbidades médica ou psiquiátrica, nem por estarem cronicamente deprimidos, por abuso de substâncias ou suicidas. A pesquisa STAR*D consistiu em 4 etapas. O estudo feito por Kirsch e colegas tomou como foco a primeira etapa.  Que consistiu em uma pesquisa de 12 semanas com o antidepressivo citalopram e duas semanas acrescentadas aos pacientes considerados próximos à remissão.

Os resultados primários objetivados pelo estudo STAR*D foram os “sintomas severos de depressão, medidos pela Escala de Avaliação de Hamilton para Depressão (HRSD). No entanto, nem as mudanças na gravidade sintomatológica identificada no HRSD e nem as taxas de reposta no HRSD são fornecidas. Em vez disso, o STAR * D apresenta resultados no Inventário Rápido de Sintomatologia Depressiva (QIDS). Os autores abordam questões com a troca de medidas de resultados, bem como limitações do QIDS (ou seja, um inventário que foi desenvolvido por pesquisadores STAR * D e, portanto, não foram utilizados em estudos anteriores).

No presente estudo, os autores adquiriram os dados brutos do STAR * D através do NIMH, graças ao Freedom for Information Act, e reanalisaram os resultados do HRSD. Devido a deficiências em relatar apenas as taxas de resposta ou remissão, os autores também relatam uma melhora média nos escores do HRSD. Um total de 3.110 pacientes está incluído na análise. Os pesquisadores então compararam suas descobertas com uma grande meta-análise de testes comparativos antidepressivos que também usaram a medida HRSD. Uma grande diferença entre os estudos clínicos STAR * D e comparador é que os ensaios clínicos convencionais geralmente têm critérios de exclusão mais rigorosos (por exemplo, excluir indivíduos com diagnósticos de comorbidade.

Os resultados mostram que 25,6% dos pacientes obtiveram remissão (isto é, com uma pontuação HRSD de 7 ou menos), e 32,5% foram os que responderam bem ao tratamento (quer dizer, 50% ou mais conseguiram resultados favoráveis no HRSD).  Por sua vez, a taxa de remissão nas pesquisas clínicas tradicionais (a meta-análise feita) foi de 48,4%, uma taxa de resposta de 65% e uma melhora média de HRSD de 14,8.  O que significa que comparando os resultados, o que se observa é que a melhora média se traduz em apenas ‘minimamente melhor´ em termos clínicos.

“ Esses resultados sugerem que os critérios de exclusão usados nas pesquisas clínicas convencionais inflacionam as taxas de remissão em 89%, as taxas de resposta em 101% e os escores de melhora contínua em 126%, dizem os pesquisadores ”

Os pesquisadores também compararam as taxas de remissão QIDS com as HRSD, e verificaram que as primeiras estavam 19% mais elevadas. Por sua vez, a taxa de resposta QIDS foi 34% mais elevada que as taxas de resposta HRSD.

“Esses resultados indicam que as taxas de remissão e de resposta estão substancialmente infladas no QIDS comparadas com as HRSD e que os escores dos estudos relatando uma dessas medidas não podem ser comparados validamente com escores reportados em estudos usando outras medidas, afirmam os autores. “

Os pesquisadores observam algumas limitações de seu estudo.  A primeira é que houve falta de controles placebo ou qualquer outro tipo de grupo controle no projeto STAR*D. E isso é muito importante, porque sem esses controles nós não podemos saber se o grau da melhora que é observada se deve ao tratamento ou se é devido ao efeito placebo, à história natural, a regressão para média, ou a outros fatores.

Uma segunda limitação é que a meta-análise incluiu estudos de vários antidepressivos, enquanto o STAR * D utilizou apenas o citalopram. Por fim, os autores observam que o estudo não levou em conta fatores contextuais que podem influenciar a depressão e a recuperação dos participantes.

O presente estudo é o primeiro a relatar o desfecho original do STAR * D: o HRSD. Como os autores observam, “tal análise está atrasada”. Os pesquisadores demonstram que (a) o relato STAR * D sobre a QIDS em vez da HRSD inflacionou significativamente os escores de melhora da depressão, e (b) ensaios clínicos convencionais levam a estimativas infladas de eficácia antidepressiva em comparação com a prática clínica do “mundo real”.

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Kirsch, I., Huedo-Medina, T. B., Pigott, H. E., & Johnson, B. T. (2018). Do outcomes of clinical trials resemble those “real world” patients? A reanalysis of the STAR*D antidepressant data set. Psychology of Consciousness: Theory, Research, and Practice. (Link)