Ensaios clínicos mostram que os antidepressivos “não são benéficos a longo prazo”

Os ensaios clínicos também falham consistentemente em medir e relatar os efeitos nocivos a longo prazo.

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É cada vez mais comum que as pessoas tomem remédios antidepressivos por um longo prazo. Recentemente, um novo estudo teve como objetivo descobrir se o uso a longo prazo tem ganhado suporte nos dados de ensaios clínicos feitos para esses medicamentos. Os pesquisadores, liderados por Peter C. Gøtzsche, descobriram que esses medicamentos não eram eficazes para o uso a longo prazo. Segundo os pesquisadores, todos os estudos avaliados “concluíram que os medicamentos não são benéficos a longo prazo”.

Além disso, os pesquisadores queriam determinar a prevalência de efeitos nocivos após o uso de antidepressivos a longo prazo. Infelizmente, o que descobriram foi que todos os ensaios clínicos não relataram danos ou que escolheram medidas de resultado muito seletivas que provavelmente ocultavam a verdadeira extensão dos efeitos nocivos.

Por esse motivo, os pesquisadores concluem que “os ensaios randomizados atualmente disponíveis não podem ser usados para investigar danos persistentes ocasionados pelos antidepressivos”.

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É possível se extrapolar os danos em longo prazo a partir dos danos em curto prazo dos antidepressivos cujos resultados são hoje conhecidos. Os pesquisadores escrevem que “sabemos que o uso em curto prazo de antidepressivos pode causar irritabilidade, ansiedade e pânico, embotamento emocional, discinesias, comprometimento sexual, assim como suicídio e agressão”. Além disso, efeitos sérios de abstinência estão cada vez mais sendo bem documentados: podem durar meses ou anos, assim como podem ser confundido com sendo o retorno dos sintomas depressivos para os quais foram prescritos.

Os pesquisadores conduziram uma revisão sistemática de todos os ensaios clínicos existentes tendo como objeto os antidepressivos, pesquisas randomizadas e controladas por placebo (duplo-cego), que examinaram o seu uso a longo prazo (com resultados até pelo menos seis meses). Sem surpresa alguma, havia muito poucos ensaios que empregaram esse critério. Com outras palavras, os pesquisadores encontraram apenas 12 estudos desse tipo. Com um detalhe, nem todos os estudos se concentraram na depressão. Alguns estudos incluíram pacientes com transtorno de estresse pós-traumático, transtorno obsessivo-compulsivo, transtorno do pânico, transtorno da compulsão alimentar periódica e até adolescentes que se recusaram a ir à escola.

Embora já tenha havido milhares de ensaios clínicos de antidepressivos já feitos, apenas esses 12 estudos foram os que relataram resultados de uso a longo prazo. Apareceram também outros problemas com os estudos que eles examinaram, que são assim explicados:

Os resultados relatados foram menos detalhados durante o acompanhamento (‘follow-up’) do que no período de intervenção, e apenas dois estudos mantiveram o duplo-cego durante o acompanhamento.”

Isso significa que os estudos falharam em medir com precisão seus resultados no acompanhamento (‘follow-up’). Isso também significa que em 10 dos 12 estudos, os participantes sabiam se estavam recebendo antidepressivos ou placebo durante as avaliações de follow-up, o que provavelmente influenciou os resultados coletados.

Os pesquisadores escrevem que, como os ensaios clínicos randomizados e controlados existentes não são úteis para analisar benefícios e riscos de longo prazo do uso de antidepressivos, outros tipos de estudos são os que fornecem as únicas informações sobre este tópico.

Por exemplo, um estudo observacional de resultados em longo prazo acompanhou aqueles que usam antidepressivos ao longo do tempo e correlacionou o seu uso com os resultados. Os pesquisadores desse estudo descobriram que aqueles que tomaram antidepressivos tiveram resultados piores após nove anos do que aqueles que não receberam o medicamento – mesmo quando a gravidade dos sintomas depressivos esteve sob controle.

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Danborg, P. B., Valdersdorf, M., & Gøtzsche, P. C. (2019). Long-term harms from previous use of selective serotonin reuptake inhibitors: A systematic review. International Journal of Risk & Safety in Medicine, 30, 59-71. DOI: 10.3233/JRS-180046 (Link)

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Peter Simons MIA-UMB News Team: Peter Simons tem formação em ciências humanas onde estudou inglês, filosofia e arte. Agora está em seu doutorado em Psicologia de Aconselhamento, sua pesquisa recente tem se concentrado em conflitos de interesse na literatura de pesquisa psicofarmacêutica, o uso de medicamentos antipsicóticos no tratamento da depressão, e as implicações filosóficas e sociopolíticas gerais da taxonomia psiquiátrica no diagnóstico e tratamento.