Uso de Psicofármacos por Populações Acometidas por Desastre

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O artigo O uso de psicofármacos por populações acometidas por desastres: uma revisão integrativa aborda como os desastres naturais e não naturais, além de ceifarem vidas, podem expor sobreviventes ao risco de desenvolvimento de múltiplos desfechos negativos, destacando a ocorrência de problemas de saúde mental. Nesse contexto, o objetivo foi reunir estudos que abordem o uso de psicofármacos, antidepressivos e/ou benzodiazepínicos entre populações afetadas de forma direta ou indireta por desastres naturais e não naturais.

Dados sobre o artigo:

  • A coleta e análise dos dados foram realizadas por duas revisoras independentes e as divergências resolvidas por uma terceira revisora.
  • Foram incluídos 13 artigos nesta revisão, incluindo artigos que abordavam a utilização de medicamentos psicofármacos (antidepressivos e/ou benzodiazepínicos) por indivíduos pertencentes a populações afetadas, de forma direta ou indireta, por desastres naturais ou não.
  • Foram excluídos estudos conforme os seguintes critérios: 1) estudos de revisão, cartas, editoriais ou estudos em animais; 2) que avaliaram indivíduos hospitalizados; 3) que avaliaram indivíduos com menos de 18 anos; 4) que avaliavam o uso de medicamentos não psicofármacos, ou psicofármacos diferentes de antidepressivos ou benzodiazepínicos.
  • Foram recuperadas as seguintes informações nos artigos incluídos: data e local do estudo; tipo de desastre; população ou amostra estudada; fonte de dados; período analisado; medicamentos avaliados no estudo (conforme classe terapêutica – antidepressivos e/ou benzodiazepínicos). Os resultados foram sintetizados de forma narrativa e foi conduzida uma análise descritiva.

Os desastres podem ser definidos como eventos adversos, sendo classificados como: desastres humanos, que são gerados pelas ações ou omissões humanas (acidentes de trânsitos, incêndio industriais), e os desastres naturais, causados pelo impacto de um fenômeno natural de grande intensidade sobre uma área, podendo ou não ser agravado pelas atividades humanas. Impactos ambientais só são tidos como desastres ambientais quando os seus danos e prejuízos são incalculáveis e de difícil restituição. Caso contrário, é apenas um evento natural.

Seguindo essa perspectiva, tem-se que os danos humanos oriundos dos desastres podem exceder a capacidade de respostas dos serviços de saúde, comprometer seu funcionamento adequado e desencadear consequências a curto, médio e longo prazo. Neste sentido, cabe destacar que, por sua complexidade, o enfrentamento dos desastres representa um grande desafio para a saúde pública, uma vez que afeta a saúde pública de diversas formas. É comum observar-se o aumento no diagnóstico de transtornos mentais em grande parte da população acometida pelos desastres.

Há um aumento no diagnóstico de transtornos de saúde mental  em pessoas que foram expostas a desastres, eles incluem: o transtorno de estresse agudo, o transtorno de estresse pós-traumático, depressão, ansiedade, pânico, luto complicado, raiva e sofrimento psicológico em geral. Nestes casos, se adotam abordagens não farmacológicas e farmacológicas. Destacam-se como tratamento farmacológico nesses casos, os antidepressivos e benzodiazepínicos.   

Considerando que o uso desses dois fármacos deve ser devidamente avaliado de forma individualizada e completa, emerge a necessidade de identificar o que há na literatura sobre o manejo farmacológico dos transtornos de saúde mental oriundos à exposição a desastres. Dessa forma, o artigo se insere neste contexto com o objetivo de reunir estudos que abordem o uso de psicofármacos, antidepressivos e/ou benzodiazepínicos, entre populações afetadas de forma direta ou indireta por desastres naturais e não naturais. Com um total de 596 artigos retornaram da estratégia de busca, após análise e exclusão de acordo com critérios previamente definidos, foram incluídas 13 publicações, sendo avaliado diferentes tipos de desastres.

Exemplos dessas avaliações diferentes:

Mediante um naufrágio que ocorreu no Reino Unido, sobreviventes alegaram um aumento no consumo de antidepressivos. Também foi mais pronunciada a utilização dessa classe terapêutica por mulheres e por pessoas de ambos os sexos que moravam próximas a uma indústria na França em que houve uma explosão de nitrato de amônio. Após o ataque terrorista de 11 de setembro de 2001 nos Estados Unidos, 3% dos sobreviventes atendidos por psiquiatras voluntários obtiveram uma prescrição de antidepressivos.

O uso dessa classe de medicamentos também foi avaliado para desastres não naturais.

Após uma explosão de uma fábrica de fogos de artifícios na Holanda, foi observado que a incidência do uso de qualquer benzodiazepínico por sobreviventes do desastre foi aproximadamente duas vezes maior, quando comparada à incidência de uso por pacientes pertencentes ao grupo de referência. Mediante a ocorrência do ataque terrorista, nos Estados Unidos, 23% dos pacientes que foram atendidos por psiquiatras voluntários tiveram benzodiazepínicos prescritos.

É perceptível pelo artigo o aumento na utilização dos psicofármacos em diferentes períodos e independentemente da causa do desastre, assim como os indivíduos expostos a essas situações podem ser mais diagnosticados com transtorno de estresse pós-traumático e outras comorbidades como ansiedade, depressão, mania e distimia.

Os antidepressivos configuram o tratamento farmacológico de primeira escolha nos casos de transtorno de estresse pós-traumático, com destaque para os inibidores seletivos da recaptação da serotonina. Entretanto, na prática clínica, os benzodiazepínicos são comumente utilizados como adjuvantes, apesar de seu uso não ser recomendado, sobretudo entre pessoas que apresentarem pouco controle de impulsos.  Além da necessidade de se fazer um tratamento efetivo, de curto prazo, é necessário que seja realizado acompanhamento ao longo prazo dessas populações acometidas por desastre. Esse acompanhamento deve ser feito não só no contexto da saúde, mas também no contexto social, já que o bem-estar da população dependem de múltiplos fatores.

Como conclusão, o artigo aponta as consequências interdisciplinares e intersetoriais que os desastres causam, bem como o aumento no consumo de ambas as classes de medicamentos após o desastre, e reafirma a necessidade de gestores e profissionais que atuam na saúde pública terem uma visão ampla a respeito dos desastres e suas consequências e, a partir disso, formularem políticas e ações que atuem diretamente sobre as populações acometidas.

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LUZ, M.M. et al. Uso de psicofármacos por populações acometidas por desastres: uma revisão integrativa. Revista Amazônia: Science & Healthv. 11 n. 1 (2023) (link)