Uma compreensão evolutiva da depressão enquanto uma adaptação, chamada de hipótese de ruminação analítica (ARH), postula que a depressão pode ter evoluído para permitir um pensamento sustentado sobre problemas sociais complexos. Esta visão sugere que os tratamentos clínicos que favoreçam as funções que a depressão desenvolveu para o enfrentamento de problemas serão mais eficazes do que aqueles – como os medicamentos antidepressivos – que meramente aliviam o sofrimento.
Além disso, a teoria evolucionista sugere que os medicamentos antidepressivos podem ter um efeito iatrogênico que prolonga a duração do episódio subjacente. Em outras palavras, ao mascarar os sintomas, os antidepressivos podem realmente prolongar os episódios depressivos, deixando-os sem solução. Para testar esta teoria, Steven Hollon, Paul Andrews e seus colegas delinearam um estudo simples de pesquisa que pode testar se os medicamentos antidepressivos são, de fato, iatrogênicos por esse motivo.
Os pesquisadores têm sugerido que os antidepressivos podem fazer mais mal do que bem. Os antidepressivos têm sido criticados por uma variedade de razões, incluindo a correlação com a incapacidade a longo prazo, problemas de abstinência, riscos na gravidez e o aumento do risco de suicídio, especialmente para os jovens. Estudos apoiados pela indústria sobre a eficácia do antidepressivo também têm sido criticados pela comunicação incorreta dos resultados de ensaios clínicos. Outros estudos têm levantado preocupações sobre o raciocínio por trás da classificação da depressão como uma doença que requer modificações neuroquímicas, em oposição, por exemplo, a mudanças sociais ou políticas.
Como Hollon escreveu em um estudo anterior, “qualquer intervenção que facilite as funções que a depressão desenvolveu para ajudar é provável que funcione melhor a longo prazo do que um antidepressivo que simplesmente anestesia a dor”.
De acordo com a hipótese de ruminação analítica, a depressão se desenvolveu para manter as pessoas concentradas na fonte de sua angústia até que possam chegar a uma solução para resolver o problema relevante. … [Nesta visão] há razões para se acreditar que os antidepressivos têm um efeito iatrogênico que prolonga a duração do episódio subjacente e que deixa os pacientes em elevado risco de recaída sempre que eles são retirados.
A depressão é o transtorno psiquiátrico diagnosticado mais comumente no mundo inteiro, e os antidepressivo são as intervenções mais comumente prescritas para o tratamento da depressão. Infelizmente, os antidepressivos parecem funcionar apenas pelo tempo em que são tomados. Apesar das preocupações de segurança em relação ao uso a longo prazo, as diretrizes da Associação Americana de Psicologia recomendam o uso indefinido para pacientes com depressão crônica.
Os autores propõem a terapia cognitivo-comportamental (TCC) como um método alternativo de tratamento que é igualmente eficaz como o antidepressivo quando implementado adequadamente, com efeitos terapêuticos de longo prazo não encontrados a partir do uso de medicamentos. Entretanto, a maior parte das evidências dos efeitos duradouros da TCC vem de comparações com o uso anterior do antidepressivo, e a amplitude em que os antidepressivos são iatrogênicos permanece, portanto, pouco clara.
Como os autores argumentam, com base na ARH, há uma possibilidade razoável de que os antidepressivos não só interfiram no efeito duradouro da TCC, mas também tenham efeitos iatrogênicos. Eles escrevem:
“Se o objetivo da ruminação analítica é chegar a uma solução para qualquer problema interpessoal complexo que primeiro desencadeou o sofrimento, então qualquer intervenção que facilite a implementação dessa solução deverá facilitar a função que a ruminação analítica desenvolveu para servir… Há motivos para pensar que acrescentar um antidepressivo pode diminuir o efeito duradouro da TCC”.
Para testar esta hipótese, os autores elaboraram um estudo randomizado que poderá determinar se os antidepressivos evitam o efeito duradouro da TCC.
Estudos anteriores simplesmente compararam resultados para pacientes deprimidos que utilizavam TCC com aqueles que utilizavam apenas antidepressivos O estudo dos autores introduz um terceiro grupo de controle experimental, um grupo pill-placebo. Se a TCC realmente tem um efeito duradouro, então os pacientes que se recuperam da depressão na TCC devem ter menos probabilidade de recorrência do que os pacientes que se recuperam em um placebo (o controle não específico necessário para determinar se a TCC está suportando) ou se o antidepressivo é iatrogênico, ou ambos. Se o antidepressivo for iatrogênico, então os pacientes que se curam com antidepressivo devem se recuperar pior do que os grupos de TCC ou de pill-placebo.
Como Hollon e seus colegas concluem:
“Sabemos que o tratamento com TCC supera o uso anterior do antidepressivo, mas ainda não sabemos por que… O estudo proposto responderá a estas perguntas e merece ser feito”.
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Hollon, S., Andrews, P., Singla, D., Maslej, M., Mulsant, B. (2021). Evolutionary Theory and the treatment of depression: It is all about the squids and the sea bass. Behavior Research and Therapy 143. (Link)