O tema deste artigo é a retirada do Seroquel: o processo de retirada e as consequências de eu haver tomado essa substância por mais de dez anos. No meu caso, desde que esse medicamento entrou no mercado, em 1997. Na trovoada de histórias sobre a retirada de drogas psicotrópicas, não estou ouvindo quase nada sobre Seroquel e sinto uma obrigação moral de oferecer a minha história para o bem comum. Fiquem avisados: não é uma história bonita.
Em 2009, descobri que eu havia sido totalmente enganada, como ocorreu com inumeráveis pessoas. Eu me dei conta que em mais de uma década de sofrimento (incluindo a perda de meus filhos devido à minha tendência suicida) não estava, de fato, sofrendo de uma doença real, mas sim, os ‘efeitos colaterais’ das drogas que pretendiam tratá-la. A história dessa traição pela comunidade médica pode ser para um outro momento; agora permitam-me que eu vá direto ao assunto do Seroquel.
Durante muitos anos, tomei 1.500 mg de Seroquel como parte do meu coquetel de drogas psiquiátricas. Em 2009, eu estava com 300 mg de Seroquel e 2 mg de Ativan. Foi nesse momento que fui ‘demitida’ pelo sistema de saúde mental de Asheville, na Carolina do Norte. Não foi nada fácil para mim. Minha psiquiatra me disse: “Pessoas como você não podem sair dos remédios”. Eu não acreditava mais nela. Eu vinha fazendo muita pesquisa por conta própria. Desde que eu passara a ser uma ativista (sofrer de mentira muitas vezes tende a politizar as pessoas), eu tinha apoio dentro da comunidade de sobreviventes psiquiátricos. Lá você sabe quem você é. Muito obrigado.
Tomei minha última dose de Seroquel no final de novembro de 2010. Duas semanas depois, fui levada para o hospital com fortes dores abdominais e inchaço. Se um neurologista competente estivesse lá na sala de emergência, ele poderia muito bem ter dito aos médicos que me orientaram a fazer uma histerectomia radical: “Seus idiotas. Ela acabou de sair de uma droga que age em neurotransmissores. Noventa e sete por cento dos neurotransmissores está no intestino. Isso é consequência das drogas. ” No entanto, nenhum neurologista estava em cena. Lá apenas eu com aquela dor severa, meu parceiro Jim com muito medo, e um bando de homens em casacos brancos com pose de terem a certeza de que eles sabem de tudo (assim são os médicos em geral). Eu tive uma histerectomia desnecessária.
Um mês e meio depois, visitando o ‘estado vizinho’ do Alasca, no Havaí, sem meu útero e ovários, aconteceu a mesma coisa, e minha saúde começou a cair. Meu turismo na bela ilha de Maui foi restrito em grande parte a centros de atendimento de urgência e a uma sala de emergência do hospital. Eu tinha infecções bacterianas altamente resistentes (um bom indício de que meu sistema imunológico não estava funcionando bem) e reações extremas a alimentos e produtos químicos (como cosméticos, infelizmente). Os melhores quatrocentos dólares que eu já gastei (não cobertos pelo seguro, e por que isso?) foi um teste de sangue para sensibilidade alimentar. BINGO! Eu tinha que mudar a minha alimentação radicalmente. Laticínios, grãos (não apenas glúten), fermento, milho, soja. Sim, todos os meus sonhos veganos tinham ido pelo ralo. Estranhamente, ou talvez não, recebi essa informação como a melhor notícia possível. Isso era algo que eu poderia fazer, e na medida em que eu amo desafios criativos, comecei a escrever um livro de receitas. Meu primeiro título (sugerido por Jim) foi o “Sou alérgica a tudo: livro de receitas”. Agora, um ano depois, o título pode ser: “Sem grãos, sem dores. ” A questão de como me manter, após Seroquel, foi de algum modo aí abordada.
A questão da insônia, para coloca-la em termos paradoxais, foinum pesadelo. Por mais de um ano, por sorte conseguia três ou quatro horas de sono; e passei dias (noites, na verdade) seguidos, com absolutamente nenhuma hora de sono. Eu não conseguia bocejar. E nunca estava cansada. Meu corpo estava fixado em um estado de luta ou fuga que criava inflamações severas, agitação exaustivas e irritabilidade severa. Houve períodos de crise, mas as intervenções desajeitadas só pioraram as coisas (Ambien, que não funcionou e Haldol, que me proporcionou 24 horas de movimentos faciais incontroláveis).
Quem hoje é o responsável pela atenção primária para mim é um enfermeiro em um “centro médico progressivo”. Meu tratamento tem se concentrado em aminoácidos, vitaminas, ervas medicinais – como flor de maracujá -, reposição hormonal bio-idêntica e melatonina.
Eu também consulto regularmente meu amigo Ken Thomas, autor do livro, “Efeitos Colaterais: A Agenda Oculta do Cartel Farmacêutico. “ Ken iniciou o Nurses for Human Rights e tem trabalhado incansavelmente para ajudar as pessoas a se recuperarem dos danos causados pelas drogas psicotrópicas.
A partir de junho de 2012, estou dormindo seis ou sete horas com bastante regularidade, embora qualquer estresse, seja qual for, possa facilmente alterar o meu sono. Bocejar me traz muito prazer e gratidão inesperada. Basta dizer que o sono é o maior tesouro do corpo e o maior desafio em preservar a saúde mental e sobreviver à retirada do Seroquel. A última questão que discutirei com vocês, pacientes leitores, é o que parece ser o menos conhecido, mas trata-se de uma questão que mudou minha vida para sempre.
Em 2010, ao desmamar o Seroquel, desenvolvi fotossensibilidade. Progressivamente, perdi a capacidade de ler, ver computadores, TVs e telas de cinema e, em julho de 2011, passei a não conseguir mais manter os olhos abertos por tempo suficiente para dirigir com segurança.
Vários oftalmologistas me disseram que não havia nada de errado. Foi sugerido por escrito que “à medida que me tornara mais emocional, meus olhos pioraram”.
Em maio de 2012, o Centro para a Visão de Boston capturou imagens microscópicas de “danos impressionantes nos nervos da córnea”. Essa condição é chamada de “Neuropatia da Córnea”. É considerada progressiva e permanente.
A bula do Seroquel, há dois anos, passou a afirmar que os pacientes em Seroquel devem consultar seu oftalmologista a cada seis meses. A bula lista entre os efeitos colaterais: “dor nos olhos”.
O que a bula não diz é que quarenta por cento dos receptores de dor do corpo estão na córnea. Em resumo, a retirada do Seroquel é um termo impróprio. Porque os danos que meu corpo tem sofrido como resultado da ingestão dessa toxina é um fenômeno que se desdobra em um destino desconhecido.
As empresas farmacêuticas não são susceptíveis de financiar estudos sobre um assunto que poderia resultar em sua droga ser retirada do mercado. Eu não vejo a FDA como uma entidade separada das empresas farmacêuticas.
Na minha experiência, depois de pesquisar este tópico por mais de dois anos, o único livro que vale a pena ter é ‘Como se livrar de drogas psiquiátricas com segurança’, de James Harper, disponível no site ‘The Road Back’. Quanto aos suplementos recomendados, que agora são vendidos separadamente para evitar conflitos de interesse, eu apenas alertaria que eu não acho que os Omega 3 são fortes o suficiente, acho que o Body Calm (que é Montmorency Cherry) possa estar agitando algumas pessoas que estão em estado avançado de estresse oxidativo. Minha preocupação com os probióticos é que eles podem não ser apropriados para todos. Para pessoas com supercrescimento do intestino delgado (entre 17 e 30% da população), a maioria das fórmulas probióticas alimenta bactérias indesejáveis. Existem problemas semelhantes usando alguns probióticos para pessoas com Síndrome do Cólon Irritável, Doença Celíaca, Doença de Crohn e Colite Ulcerativa. Para pessoas com essas condições, existem empresas que fazem probióticos específicos para a dieta.
No geral, James Harper é o mais abrangente narrador de verdades sobre a ciência de como essas drogas agem, como pode ser a sua retirada e como passar por esse processo. É essencial ter em mente que cada pessoa é diferente. Três coisas são sempre as mesmas: os médicos não sabem nada sobre a retirada de drogas psicotrópicas, não há pesquisa existente e não há lugar seguro de refúgio. Por mais sombrio que isso pareça, é a verdade.
O que eu espero é que minha história atraia para fora da obscuridade tantos outros que como eu morderam a isca quando o Seroquel apareceu pela primeira vez, que seguiram o regime de altas doses como o recomendado a mim por mais de dez anos, e conseguiram ficar livres do Seroquel por mais de um ano. Essas narrativas ajudarão milhões de pessoas que agora acreditam que “o Seroquel é o novo Sominex”.
Haverá dois grupos distintos de pessoas para entender a minha chamada. Um grupo será de pessoas que tiveram sintomas reais de mania ou psicose antes de serem “tratadas” com drogas psicotrópicas. O segundo grupo, ao qual eu pertenço, é o grupo de pessoas que sofreram uma depressão durante uma difícil transição de vida (divórcio, crise de meia-idade, morte de um ente querido, etc.) e foram levadas a acreditar que tinham um desequilíbrio químico que exigia medicação, “assim como um diabético requer insulina”.
De qualquer forma, esses dois grupos têm histórias importantes. Vamos preencher este abismo silencioso com as vozes da experiência.