Las Vegas: mais um Caso em que Drogas Psiquiátricas estão associadas

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Publicado hoje, em Los Vegas Review-Journal. A respeito de Stephen Paddock, quem matou pelo menos 58 pessoas e feriu centenas mais em Las Vegas no domingo, com rifles de alta potência. A ele havia sido  prescrito uma droga ansiolítica em junho, o que pode haver levado a um comportamento agressivo.

Stephen-C-Paddock

Segundo os registros do Programa de Monitoramento de Prescrição de Nevada obtidos na terça-feira, à Paddock havia sido prescrito 50 comprimidos de 10 miligramas de diazepam, pelo médico de Henderson, Steven Winkler, em 21 de junho.

O diazepam é um medicamento sedativo-hipnótico da classe de medicamentos conhecidos como benzodiazepínicos, cujos estudos já demonstraram que podem desencadear um comportamento agressivo. O uso crônico ou abusivo de sedativos, como o diazepam, também pode desencadear experiências psicóticas, de acordo com drugabuse.com.

“Se alguém tem um problema de agressão subjacente e você o trata com essa droga, seus usuários podem se tornar agressivos”, disse o Dr. Mel Pohl, diretor médico do Centro de Recuperação de Las Vegas. “Pode desinibir um estado emocional subjacente. … É muito parecido com o que acontece quando você dá álcool a algumas pessoas … elas se tornam agressivas em vez de ir a dormir “.

Na segunda-feira, a atriz Kirstie Alley, mais conhecida por seu papel na comédia de TV “Cheers”, agitou a controvérsia ao colocar no ar que as armas e as drogas psiquiátricas são os denominadores comuns em recentes tiroteios em massa nos Estados Unidos.

Veja na íntegra a reportagem clicando aqui.

Experiências Alternativas ao Modelo Biomédico da Medicina Mental

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Soteria House in Santa Clara, California

Dias 30, 31 de outubro e 01 de novembro de 2017, na Escola Nacional de Saúde Pública (ENSP/FIOCRUZ), ocorrerá o Seminário Internacional A Epidemia das Drogas Psiquiátricas: Causas, Danos e Alternativas. Como o próprio título aponta, entre as metas do Seminário está a busca por alternativas viáveis e seguras ao que hoje é reconhecido como ‘epidemia das drogas psiquiátricas’.

Para contribuir na preparação nossa para o Seminário, estou apresentando uma sequência de dois blogs. Dizem respeito a duas alternativas que podemos considerar como sendo não apenas viáveis – pois já realizadas -, mas também como seguras e reproduzíveis.

A primeira experiência é a de Soteria, objeto deste primeiro blog. O segundo blog será dedicado à apresentação e análise da experiência finlandesa do Open Dialogue (Diálogo Aberto).

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A EXPERIÊNCIA DE SOTERIA

No final da década de 60 e começo da de 70, muitas experiências foram criadas para oferecer alternativas de comunidades terapêuticas à hospitalização das pessoas diagnosticadas com esquizofrenia. Eram experiências que tentavam entender a esquizofrenia com quadros de referência distintos do modelo médico intervencionista, entendendo-a como um importante aspecto da história de vida individual [i].

Recusando o uso da medicação antipsicótica como primeira opção de tratamento, tais iniciativas tomavam como foco a necessidade de permitir os indivíduos atravessarem a sua experiência de psicose com um mínimo possível de interferência e o máximo possível de suporte psicossocial.

A lembrar: nos Estados Unidos e em vários países da Europa, nos anos 60 e 70, o ‘hospitalocentrismo’ estava deixando de ser a referência principal para a organização da assistência psiquiátrica. O ‘hospitalocentrismo’ demonstrava ser irracional, seja sob o ponto de vista econômico e político, mas também sob a perspectiva científica e ética propriamente dita.

E muito particularmente haviam os interesses da aliança entre a psiquiatria e a indústria farmacêutica. Fora do hospital psiquiátrico, na ‘comunidade’/ou ‘território’, uma nova racionalidade de mercado se abria, com a conquista e a incorporação de novos ‘atores’ sociais. Novas categorias de pacientes, obviamente; mas, sobretudo, um novo mercado de ‘saúde mental’. Para que tais objetivos pudessem ser alcançados, centralizar no hospital os cuidados psiquiátricos se constituía em um incômodo obstáculo institucional. Já que ‘de perto ninguém é normal’, seria impossível incluir a todos no hospital psiquiátrico. O que somente seria possível na ‘comunidade’, no ‘território’.

É nesse contexto que a experiência de Soteria ganha relevância internacional. Ainda que entre nós brasileiros tenha sido uma experiência praticamente desconhecida.

Como foi iniciada? 

Soteria correu originalmente na baía de San Francisco, Califórnia, Estados Unidos, durante os anos 1970 e o começo dos anos 1980.  E desde então vem sendo implantada em diversos outros locais dos Estados Unidos, como em Vermon, e em países europeus, como Inglaterra, Suíça, Suécia, Finlândia, Alemanha, Hungria, entre outros .

Em abril de 1971, o psiquiatra Loren R. Mosher, Voyce Hendrix e um grupo de colegas se juntaram e fundaram a Casa Soteria.

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É para chamar a nossa atenção a escolha do nome ‘Soteria’. A palavra é de origem grega, que significa ‘libertação’, ‘salvação’. Soteria foi o nome dado a uma proposta de tratamento na comunidade, que não apenas era uma alternativa aos modelos dominantes, mas uma abordagem radical. Quer dizer, um tratamento fora do hospital, em uma residência, onde era oferecido refúgio às pessoas, a maioria jovens, a maioria diagnosticada como “esquizofrênicos”, e todos sofrendo de severo sofrimento psíquico. E tratados radicalmente fora dos parâmetros da ‘medicina mental’ vigentes na época e hoje em dia.

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Seus princípios básicos incluíam:

  • a provisão de um meio terapêutico pequeno, acolhedor, terapêutico, na comunidade;
  • com uma equipe formada por pessoas leigas;
  • preservando o poder pessoal, as redes sociais e as responsabilidades compartilhadas;
  • um estilo relacional ‘fenomenológico’, com o objetivo de dar sentido à experiência subjetiva da psicose da pessoa;
  • desenvolvendo um entendimento da experiência psicótica ‘estando com’ e ‘fazendo com’ os clientes;
  • e nenhuma, senão doses baixíssimas de medicação antipsicótica – com todas as drogas psiquiátricas sendo tomadas à partir de uma posição de escolha e sem coerção).

Nesse ambiente humanitário e igualitário, em Soteria as taxas de recuperação mostram ser muito mais elevadas do que em qualquer outro local de assistência psiquiátrica. Isso é o que foi alcançado na experiência original, na Califórnia; mas é o que ocorre em todos os locais onde a experiência Soteria é replicada.

Loteria Berne Switzerland
Soteria, Berne (Suíça)
Soteria, Vermont (USA)
Soteria, Vermont (USA)

 

 

 

 

O interesse no paradigma Soteria tem crescido tanto que recentemente foi criado no Reino Unido uma rede nacional Soteria, tendo havido uma conferência inaugural com vistas a implantar Soteria no país.

Soteria e o background

Soteria juntou uma diversidade de distintas noções clínicas:

  • Práticas da era do ‘tratamento moral’ em saúde mental surgidas no século XVIII nos Estados Unidos.
  • Pioneiros da psicanálise nos Estados Unidos (Henry Stack Sullivan e Frieda Fromm-Reichmann, explorando a importância do potencial de cura das relações humanas).
  • Terapeutas que descreveram o crescimento a partir da psicose (Karl A. Menninger).
  • Um grupo de psiquiatras considerados hereges (Ronald D. Laing; Thomas Szasz).
  • Cronistas do desenvolvimento do transtorno psiquiátrico como resposta à crise de vida.
  • Alternativas ao modelo de assistência asilar (“Manicômios, Prisões e Conventos” de Erving Goffman).
  • Um espaço para testar a validade das críticas dos ‘antipsiquiatras’, como na época eram vistos os que contestavam a psiquiatria vigente, tais como Laing, Cooper e Basagalia.

Características Gerais

A Casa Soteria original não era um hospital. Nem tampouco era um Centro de Saúde Mental (CSM). Seu programa não era dirigido por médicos (ou enfermeiros). Não obstante, Soteria admitia apenas clientes que seriam hospitalizados.

As drogas neurolépticas (antipsicóticos), o tratamento padrão para a “esquizofrenia”, eram usadas o menos frequentemente quanto era o possível, de preferência nunca.

A equipe era formada por não-professionais de saúde, com a responsabilidade, o poder e a autoridade para o tratamento primário e cotidiano.

E o mais importante, diferente das centenas de casas terapêuticas criadas em todo o território dos EUA durante os meados dos anos 1970 – os CSM -para servir de etapa intermediária entre a hospitalização e os lares, Soteria oferecia uma alternativa à hospitalização ao invés de acompanhá-la.

Soteria e as experiências alternativas da época

O que diferenciará radicalmente Soteria de outras experiências na época é que o paradigma Soteria tem o compromisso de ser uma alternativa de fato ao modelo biomédico da medicina mental. Assim sendo, o paradigma Soteria não propõe uma reforma psiquiátrica, mas um tratamento alternativo à psiquiatria propriamente dita, ao criar condições para se abordar os problemas tradicionalmente remetidos à psiquiatria – sem haver a necessidade do uso do diagnóstico psiquiátrico e do tratamento psicofarmacológico.

Daí que a principal fonte de inspiração de Soteria ter sido o projeto de Ronald Laing com a experiência de Kingsley Hall.

Kingsley Hall residents, 1965

Soteria: seu compromisso com as evidências científicas

O compromisso de Soteria com as evidências científicas para julgar a validade da experiência merece uma atenção bastante especial nossa. Seu idealizador e principal referência foi o psiquiatra e cientista Lauren Mosher. Mosher foi o chefe do Centro de Estudos de Esquizofrenia do poderoso NIMH, de 1968-1980. Mosher deixará o cargo de direção no NIMH em 1980, justamente quando o DSM-III surgiu.

Durante 10 anos, Soteria teve financiamento para desenvolver uma pesquisa, coordenada justamente por Mosher. Uma pesquisa quantitativa, empírica, randomizada. [2]  O suporte financeiro do NIMH foi para que Soteria respondesse a duas simples questões:

  • “Podem as pessoas recentemente nomeadas ‘esquizofrênicas’, e em situação tão disfuncional a requerer hospitalização, serem tratadas com sucesso em um ambiente pequeno, como um lar, em um espaço não hospitalar e sem drogas antipsicóticas? ”
  • “Como são os seus resultados clínicos comparados – em seis semanas, seis meses, e um ano e dois anos – com aqueles pacientes de um grupo de pessoas semelhantemente selecionadas e estudadas, que receberam a assistência habitual como paciente internado em um hospital e depois acompanhados fora do hospital? “

Resultados investigados:  saber se fatores tais como ‘hospitalização’, ‘medicamentos’ e ‘sintomas psicóticos’ continuariam presentes, e se os níveis de funcionamento psicossocial melhorariam ou deteriorariam.

Hipótese: Se o progresso dos grupos tratados experimentalmente (Soteria) e tradicionalmente (Hospitais Psiquiátricos e Centros de Saúde Mental) fossem comparáveis, então esse novo tratamento seria tão ou melhor do que a prática corrente, e um fenômeno poderia sido definido.  Suas partes constitutivas poderiam então ser estudadas para tentar desenredar as razões para a sua eficácia. Se o grupo experimental fosse pior, a pesquisa terminaria e o status quo estaria preservado.

Nos anos 1970, o senso-comum era que o tratamento psiquiátrico eficaz dependia do tratamento psicofarmacológico. A necessidade de diagnóstico psiquiátrico mais preciso estava em pauta, o que levará ao abandono dos critérios vigentes no DSM-I e DSM-II e à criação do DSM-III. Além disso, desde o começo dos anos 60, o tratamento psicofarmacológico era visto como essencial. Os hospitais psiquiátricos estavam sendo esvaziados, o tratamento sendo transferido para a ‘comunidade’.  E os Centros de Saúde Mental (CSM) eram na época, nos Estados Unidos, os espaços alternativos à assistência hospitalar.

As questões do projeto parecem simples, mas não eram. Há muitos interesses dominantes em jogo. Portanto, as respostas ao Projeto Soteria seriam difíceis de aceitação.

Se poderia esperar que, após mais que 10 anos de pesquisa (e mais a criação de um segundo serviço experimental que durou 6 anos), uma resposta clara teria aparecido. De fato, Mosher acreditava que sim, com a publicação do seu estudo sobre os resultados de dois anos [3].

Mas o establishment científico vigente não concorda com os resultados. A aliança entre os interesses corporativos da psiquiatria e da indústria farmacêutica não aceita os resultados que poderiam destruir a própria aliança. Uma falha científica é considerada: a ausência de uma estrita atribuição aleatória (‘amostra randomizada’).  Apesar da comparabilidade dos dois grupos em uma miríade de variáveis acessadas na admissão, o establishment científico finalmente negou fundos de pesquisa para estudar quais elementos no ambiente (“setting”) foram essenciais para o seu sucesso.  O financiamento é suspenso, acabando a experiência original de Soteria. Apesar disso, a análise dos dados foi completada em março de 1992.

O cotidiano de Soteria

A casa Soteria.  12 quartos, hospedando seis residentes (jovens, solteiros, recentemente diagnosticados e rotulados como “esquizofrênicos”), dois membros da equipe em trabalho integral, geralmente um homem e uma mulher, e vários voluntários e ajudantes em tempo parcial. Além disso, cada casa Soteria tinha um diretor da casa e acesso a psiquiatras disponíveis por um par de horas por dia. O fato da casa poder hospedar apenas 6 pessoas se devia às leis para licenciamento residencial. Um ou dois novos residentes eram admitidos a cada mês, geralmente permanecendo por um período de três a seis meses.

O núcleo da equipe de Soteria, geralmente cerca de sete funcionários remunerados em tempo integral e mais os voluntários, quando nos estabelecimentos convencionais eram entre 7 a nove funcionários. Na verdade, em momentos de alta atividade – geralmente entre as 16:00 até à meia-noite – Soteria tentou ter um equilíbrio entre 50-50% de pessoas em plena crise com aquelas funcionando mais ou menos normalmente, incluindo residentes que haviam se recuperado o suficiente para serem auxiliares.

Essa equipe não profissional visava fornecer um ambiente social simples, semelhante a um lar, seguro, acolhedor, de suporte, calmo, tolerante e não-intrusivo.

Embora estivessem imbuídos pelos valores da contracultura dos anos 1960, os membros da equipe tinham um pacto de não serem militantes. A equipe de Soteria acreditava que o sincero envolvimento humano e o entendimento eram vitais para as interações de cura.

Os psiquiatras supervisionavam a equipe, serviam para dar segurança, e cumpriam com as suas responsabilidades formais médicas e legais.

A equipe e os residentes compartilhavam responsabilidade pela manutenção das tarefas da manutenção da casa, preparação da alimentação e limpeza.

O nome era ‘residentes’ (algumas vezes ‘clientes’), jamais ‘pacientes’, ‘consumidores’ ou ‘usuários’.

Não haviam cadeados nas portas; não haviam seringas e apenas haviam poucos medicamentos; nenhuma sala para contenção ou algo semelhante.

Seguindo a tradição que teve como pioneiro Sullivan, a equipe de Soteria, em tempo integral ou tempo parcial, não era de profissionais de saúde mental. Os administradores e os pesquisadores, esses sim tinham formação em vários campos da saúde mental – Alma, assistente social; Stan Redd, Ken Woodrow e Richard Poe, psiquiatras que sempre eram chamados e visitavam frequentemente, assim como Loren, o nome com maior projeção nacional e internacional, que havia estudado com psicanalistas sullivanianos em Harvard e com Laing em Londres, nos anos 1960. E Voyce Hendrix que não tinha formação formal alguma.

A Filosofia de Soteria

Loren estabeleceu a filosofia fundamental de Soteria. Ele planejou que a equipe de Soteria aprenderia a ver a reação  ‘esquizofrênica’ como estado alterado de consciência de alguém em resposta à crise. Se uma ‘psicose’ se desenvolveu, ela cresceu em e afetou a matriz psicossocial da inteira família ou outro grupo íntimo, formando a ecologia perturbada da pessoa. Por conseguinte, com frequência, o inteiro meio ambiente perturbado e perturbador da pessoa – que não pode facilmente tolerar ou coexistir com os estranhos comportamentos que vem de um estado alterado de consciência – também experimenta a crise, portanto não apenas o indivíduo etiquetado de ‘louco’ é que está em crise.

Tal visão da ‘esquizofrenia’ implica em um conjunto de atitudes terapêuticas.

  • A experiência psicótica perturbadora nem era abortada e nem forçada a assumir algo, mas vista como tendo potencial para reintegração e reconstituição.
  • A equipe era incentivada a ver os muito aspectos da experiência da ‘esquizofrenia’ quanto o mais possível real ao invés de um processo de fragmentação, para tratar os seus sentimentos como potencial crescimento psicológico, reconstituição e reintegração em um todo de desenvolvimento psicossocial em um nível mais amplo.

Soteria colocava limites, quando os indivíduos estavam em perigo para consigo próprios ou para com os outros, mas não por causa de uma inabilidade para tolerar a loucura.

A equipe também aprendia a ver as qualidades místicas como metaforicamente válidas e compreensíveis, também em relação ao background cultural como em relação à dinâmica da família.

As linhas de autoridade e de papeis não eram claramente delineadas.

O Novo Terreno: evitando a terapia com drogas

A ênfase de Soteria na possibilidade de crescimento da psicose, embora estivesse firmemente baseada nas teorias que haviam sido articuladas por Laing e Menninger, levou à criação de um ambiente organizado muito original. Soteria tinha poucos precedentes estabelecidos para ser seguidos quando passavam da teoria para a prática. Embora o modelo médico houvesse demonstrado valor heurístico, a sua aplicação aos transtornos psiquiátricos havia tido desafortunadas (e não intencionais) consequências para os pacientes individualmente. Soteria não propôs algumum modelo alternativo da época; porque nenhum deles parecia explicar a (s) condição (s) etiquetada de ‘esquizofrenia’.  Ao invés disso, Soteria trabalhou a partir de uma atitude, posição ou visão. A abordagem endossou uma abordagem interpessoal fenomenológica para a ‘esquizofrenia’, na medida em que a equipe tentava tanto entender como dividir a experiência psicótica da pessoa – sem julgar, rotular, derrogar ou invalidar.

Por causa do seu desenho experimental, os clientes de Soteria não recebiam as drogas antipsicóticas disponíveis (neurolépticos, tranquilizantes maiores) tais como Torazina, Haldol, Prolixin ou Stelazine (haviam 18 no mercado no começo dos anos 1970) durante as suas primeiras seis semanas na residência.

A razão principal para esse intervalo era para permitir um teste honesto da abordagem psicossocial de Soteria. A equipe acreditava que poderia demorar seis semanas antes que importantes relações pudessem ser formadas e antes que qualidades especiais da cultura pudessem ser transmitidas significativamente. Durante as seis semanas o progresso do cliente era avaliado, e se nenhuma melhora ocorresse, e se o residente, a equipe e o psiquiatra consultor todos concordassem, um ensaio clínico com tratamento psicofarmacológico geralmente era iniciado. Na medida em que algumas drogas antipsicóticas estavam bem-estabelecidas como eficazes para o tratamento dos sintomas psicóticos, deixar o paciente indefinidamente de fora do tratamento com as drogas poderia ser não-ético.

Durante as seis semanas da investigação do tratamento ‘sem drogas’ o uso de antipsicóticos era permitido:

  • Se acreditassem que as drogas poderiam dominar a violência sem controle ou impulsos suicidas que de outra forma não fosse possível manejar;
  • Se o residente estivesse com uma dor psíquica insuportável que não pudesse ser aliviada por meios interpessoais;
  • O residente solicitasse remédios para ajuda-lo/ajuda-la a se reorganizar.

O limitado uso de drogas antipsicóticas na Casa Soteria contrasta com o fato que quase que todos os sujeitos tratados nas enfermarias dos hospitais psiquiátricos ou gerais, bem como nos Centros de Saúde Mental, que serviram como unidades assistenciais para o estudo comparativo, todos recebiam neurolépticos durante toda a sua permanência.

Começamos o novo século, estamos em 2017, e apesar do acúmulo das evidências científicas a questionar o uso indiscriminado e massivo de antipsicóticos, ainda nos comportamos como se a ciência confirmasse a eficácia e a segurança do tratamento com antipsicóticos. Já em 1979, a Organização Mundial da Saúde (OMS), em um estudo sobre os resultados com o tratamento da ‘esquizofrenia’, mostrava a correlação entre a baixa confiança na medicação com antipsicóticos e recuperação, concordando com o que vinha sendo demonstrado em Soteria. Enquanto que mais do que ¾ dos indivíduos de sociedades do terceiro-mundo diagnosticados como “esquizofrênicos” estiveram ou recuperados ou levando suas vidas de um modo relativamente saudável após cinco anos do seu diagnóstico, apenas 25 %, quer dizer, ¼ de tais pacientes em países ricos desfrutavam um nível similar de sucesso. Uma segunda investigação da OMS, feita porque pesquisadores desacreditavam os resultados, dizendo que eles contrariavam o esperado, concluiu os mesmos achados [4] [5].

A propósito, destaco essa longa citação do que Mosher disse em 1979:

Nós vivemos em uma cultura sobre-medicada, muito frequentemente dependente de drogas, apesar da ambivalência resolvida ao se criar duas categorias de drogas: as boas, como álcool, e as más, como o LSD. A atitude da Psiquiatria não é diferente do que aquela do contexto social mais amplo: nós ainda estamos procurando por uma resposta mágica de uma pílula. As drogas antipsicóticas têm posto nas mãos dos psiquiatras uma substância real para a fantasia deles de cura mágica aplicada à esquizofrenia. Mas, como costuma ocorrer com a maioria das expectativas exageradas, a fantasia é melhor do que a realidade. Após duas décadas, está agora claro que as drogas antipsicóticas não curam a esquizofrenia. Está também claro que elas têm sérias, algumas vezes toxicidades irreversíveis (…) que a recuperação possa ficar prejudicada por elas, pelo menos para alguns esquizofrênicos (…) e que elas têm pouco efeito em longo-prazo no ajustamento psicossocial  (…) Essas críticas não negam a sua extraordinária ajuda na redução e controle de sintomas, diminuindo o tempo de internação, e revitalizando o interesse na esquizofrenia. Uma das metas do projeto Soteria é procurar uma alternativa viável bem informada com relação ao uso exagerado dessas drogas e a excessiva confiança nessas drogas, com frequência excluindo as medidas psicossociais. Nós usamos raramente drogas e, quando prescritas, elas estão primariamente sob o controle individual do residente (do paciente). Quer dizer, a ela/ele é solicitado que monitore cuidadosamente as suas respostas à droga para nos dar um feedback, para que assim nós possamos ajustar a dosagem, e , após um período de ensaio de duas semanas, a ele/ela é dado o papel principal de determinar se ele/ela irá continuar a usar as drogas.

– Mosher & Menn, 1979, p. 73 –

Muitos artigos escritos por Mosher e colegas com os resultados da experiência foram publicados, recomendo que pelo menos este aqui seja lido.

E para se conhecer melhor toda a fascinante história de Soteria, recomendo este livro aqui.

E Loren Mosher, explicando o paradigma Soteria. Clique aqui.

Referências bibliográficas citadas:

[i] Jenner, FA, Monteiro ACD, Zagalo-Cardoso JA, Cunha-Oliveira JA. Schizophernia: a disease or some ways of being human? Sheffield, UK: Sheffield University Press, 1993.

[2] Mosher, I. R. (1972). Research design to evaluate psychosocial treatments of schizophrenia. In D. Rubinstein & Y. O. Alanen (Eds.), Psychotherapy of Schizophrenia, (251-260). Amsterdam: Excerpta Medica Foundation.

[3] Mosher, I. R., Menn, A. Z. & Matthews, S. M. (1975). Soteria: Evaluation of a home-based treatment for schizophrenia. Americans Journal of Orthopsychiatry, 45 (3): 455-467.

[4] Jablenski, A. (1992). Schizophrenia: manifestations, incidence, and course in different cultures: a World Health Organization ten-country study. Psychological Medicine, Suppl. 20, 1-95.

[5] Leff, J. (1992). The international pilot study of schizophrenia”: five-year follow-up findings. Psychological Medicine, 22, 131-145.

[6] Mosher, L. R., & Menn, A. Z. (1979). Soteria: An Alternative to hospitalization for schizophrenia. New Directions for Mental Health Services, I, 73-83.

 

Irving Kirsch: O efeito Placebo e o que ele nos informa sobre a eficácia do antidepressivo

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James MooreEsta semana tive a honra de entrevistar o Dr. Irving Kirsch. O Dr. Kirsch é Diretor Associado do Programa em Estudos de Placebo e professor de medicina na Harvard Medical School e na Beth Israel Deaconess Medical Center. Ele também é Professor Emérito de Psicologia da Universidade de Plymouth e da Universidade de Hull no Reino Unido e da Universidade de Connecticut nos EUA. Ele publicou 10 livros e mais de 250 artigos de revistas científicas e capítulos de livros sobre efeitos placebo, medicação antidepressiva, hipnose e sugestão. Ele originou o conceito de expectativa de resposta. Suas meta-análises sobre a eficácia dos antidepressivos tiveram ampla cobertura na mídia internacional e influenciaram as diretrizes oficiais para o tratamento da depressão no Reino Unido. Seu livro de 2009, The Emperor’s New Drugs: Exploding the Antidepressant Myth, foi selecionado para o prestigiado prêmio Mind Book of the Year e foi o tema do famoso programa 60 Minutes na CBS e foi capa na Newsweek com uma matéria de 5 páginas.

Nesta entrevista com o Dr. Kirsch, é discutido o efeito placebo e a eficácia das drogas utilizadas para a depressão.

A seguir, um pequeno resumo do conteúdo da entrevista:

  • Como, como estudante de graduação, o Dr. Kirsch se interessou pela terapia comportamental, mas que duvidou da lógica por trás dessas abordagem;
  • Que isso despertou nele um interesse pelas crenças que as pessoas tinham e passou a pesquisar o efeito placebo;
  • Como, ao trabalhar na Universidade de Connecticut, sua pesquisa sobre o placebo o levou a se interessar na eficácia das drogas antidepressivas quando comparadas ao placebo;
  • Como seu trabalho o levou à conclusão surpreendente de que, se há medicamentos antidepressivos, o efeito placebo seria tão grande que haveria muito pouco espaço para um efeito significativo da droga propriamente dita;
  • Como isso alterou os pontos de vista do Dr. Kirsch sobre drogas antidepressivas, fazendo com que ele perguntasse se os riscos valiam o pequeno benefício para pacientes deprimidos;
  • Que a crença de uma pessoa pode afetar a sua resposta a um medicamento de forma positiva (placebo) ou de forma negativa (nocebo);
  • O Dr. Kirsch descobriu que existem muitas condições em que o placebo pode mostrar o seu efeito profundo, incluindo depressão, ansiedade, síndrome do intestino irritável, dor, doença de Parkinson e asma;
  • Que o placebo tende a ter um efeito maior em condições que possuem um grande componente psicológico, como em distúrbios funcionais;
  • Esse placebo pode ter um efeito, mesmo que o paciente saiba que eles estão tomando um comprimido inativo, e que parte dessa resposta está abaixo do condicionamento clássico;
  • Que o Dr. Kirsch está trabalhando em “placebo aberto” sendo capaz de prescrever placebo para pacientes sem que haja decepção;
  • Que o Dr. Kirsch estava acostumado a encaminhar pacientes deprimidos para tratamentos antidepressivos, mas que sua pesquisa o deixou descrente quando passou a observar a evidência de eficácia quando comparada ao placebo;
  • Como é que quando você dá a alguém um novo tratamento, isso muitas vezes irá contrariar os sentimentos de desesperança que caracterizam as experiências depressivas;
  • Que, ao analisar o tamanho desse efeito, deixou claro que a diferença entre a resposta ao placebo e a resposta antidepressiva era tão pequena que não era clinicamente significativa;
  • Que mesmo drogas com modos de ação muito diferentes resultaram em respostas praticamente idênticas em pacientes, por exemplo, Tianeptine, que é um SSRE (potenciador selectivo da recaptação de serotonina) e diminui os níveis de serotonina entre os neurônios, esse medicamento deveria piorar as pessoas deprimidas, mas mostrou a mesma eficácia que os antidepressivos ISRS;
  • Como, ao analisar os ensaios clínicos utilizados para demonstrar a eficácia do antidepressivo, ficou claro que a natureza óbvia dos efeitos adversos provocados por antidepressivos significava que os participantes do ensaio freqüentemente “quebrariam” o duplo cego, e que saberiam se estavam no grupo de drogas ativas ou no grupo placebo, isso naturalmente influenciando radicalmente os resultados do julgamento;
  • Que, em um pequeno número de estudos, utilizou-se um placebo ativo, que era uma substância que imitava os efeitos colaterais da droga ativa, sem ter nenhum efeito clínico;
  • Que nesses estudos ativos de placebo, se estava muito menos propenso a obter uma diferença significativa entre o fármaco e o placebo, quando comparado aos ensaios que usavam um placebo interno;
  • Que os ensaios realizados por fabricantes farmacêuticos são projetados para mostrar sua droga na melhor perspectiva possível e, portanto, não usam placebo ativo em seus estudos;
  • Que o Dr. Kirsch está convencido que, ao se realizar ensaios para medicamentos utilizados para a depressão, os pacientes devem ser solicitados no início do estudo se pensam estar no grupo ativo ou no grupo de placebo, e que esta questão ajudaria a garantir que os ensaios fossem confiáveis;
  • Como, ao usar os dados de ensaios não publicados, a diferença entre o efeito placebo e o efeito do medicamento foi ainda menor;
  • Como o Dr. Kirsch ficou satisfeito que outros pesquisadores tenham encontrado suas conclusões controversas, o que significava que eles estavam prestando atenção ao estudo, e que outros que replicaram a abordagem encontraram resultados semelhantes;
  • Que influenciar os médicos para que equilibrem melhor risco versus benefício levará tempo, e que precisamos compartilhar os dados e discutir as conclusões tanto quanto possível para permitir que as mudanças aconteçam;
  • Que as pessoas precisam de ajuda com a depressão e que existem muitas intervenções diferentes que são pelo menos tão eficazes quanto os antidepressivos, mas sem os riscos a estes associados;
  • Como não podemos inferir que a prescrição “fora do rótulo” seja eficaz, até que  estudos tenham sido realizados para um transtorno específico.

Links Relevantes:

Dr Irving Kirsch

The Emperor’s New Drugs: Exploding the Antidepressant Myth

The Emperor’s New Drugs: Exploding the Antidepressant Myth (video)

60 Minutes: Treating Depression: Is there a placebo effect? (video)

Antidepressants and the Placebo Effect

Initial Severity and Antidepressant Benefits: A Meta-Analysis of Data Submitted to the Food and Drug Administration

A LEI 13.438 É UM RISCO À SAÚDE DAS CRIANÇAS

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maria-aparecida

Em 26 de abril de 2017, foi sancionada a Lei 13.438, com o seguinte texto:

Art. 1° O art. 14 da Lei no 8.069, de 13 de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente), passa a vigorar acrescido do seguinte § 5°:

“Art. 14. ……………………………………………………………………………………..

§ 5° É obrigatória a aplicação a todas as crianças, nos seus primeiros dezoito meses de vida, de protocolo ou outro instrumento construído com a finalidade de facilitar a detecção, em consulta pediátrica de acompanhamento da criança, de risco para o seu desenvolvimento psíquico.” (NR)

Sob a aparente boa intenção de proteger e cuidar da primeira infância, desfere- se grave ataque às crianças e suas famílias, aos profissionais da área de saúde da criança, à pediatria, às políticas de atenção à saúde das crianças e, por fim, ao Sistema Único de Saúde.

Desvelam-se, ainda, as crescentes judicialização e patologização da vida.

Uma lei determinando que se realize uma ação técnica no interior das consultas pediátricas? Sob quais justificativas? Sustentada em quais embasamentos teóricos? O Ministério da Saúde (MS) e suas respectivas áreas estão falhando em definir normas, procedimentos, estratégias para melhorar a saúde infantil? Ainda, uma lei que é aprovada e sancionada apesar dos pareceres contrários das áreas específicas do MS? Será por isso que não é assinada pelo Ministro da Saúde mas sim pelo Ministro da Justiça?

Uma lei impondo a aplicação de screening universal no campo da saúde mental, já tão atingido pelos processos medicalizantes? Por que a preocupação exclusiva com o desenvolvimento psíquico, e não com o desenvolvimento integral da criança? Por que a marca temporal dos 18 meses? Após essa idade, não existem mais riscos psíquicos?

Essas são algumas das inquietações desencadeadas pela lei, perguntas que devem ser respondidas, aliás que deveriam ter sido respondidas se sua tramitação tivesse, minimamente, respeitado parâmetros democráticos e diálogo com pesquisadores da área, instituições de ensino superior, fóruns intersetoriais, entidades de pediatria e da psicologia e outras. Porém, como os interessados em sua aprovação optaram pelo trâmite veloz e na surdina (aproximadamente 30 dias entre desarquivar um PL parado há anos e sua aprovação), não houve espaço para questionamentos a tempo.

Porém, não se cala o questionamento nem se impede a luta desse modo. Ao contrário, retrocessos apenas nos lembram que só existem porque já havíamos avançado e, como ensinam várias culturas, inclusive a indígena, se já avançamos antes, podemos avançar de novo. [1]

A Pediatria, como campo científico, tem evoluído muito nas últimas décadas, avançando em conhecimentos gerais e específicos, em diferentes áreas (especialidades e sub-especialidades) e na sistematização desses conhecimentos em normatizações e guidelines.

Esta evolução tem-se refletido na participação na construção de políticas de atenção à saúde da criança e do adolescente cientificamente embasadas e devidamente contextualizadas, articuladas com outras áreas de conhecimento e, em especial, com as políticas públicas e o “já construído”.

Também a formação dos pediatras se modificou bastante nesse período, em um movimento que busca a especialização mas, em contraste com as demais áreas da medicina, ainda busca manter a formação generalista como eixo fundamental, para que a criança e o adolescente sejam vistos em sua integralidade. Daí, decorre que todo pediatra deve ser capaz de avaliar e acompanhar qualquer criança em relação às ações em cuidados primários de saúde preconizadas na Declaração de Alma Ata [2]: acesso a alimentação e saneamento básico; estado nutricional; imunização; crescimento e desenvolvimento; doenças de maior prevalência na idade.

Esta evolução do campo científico e o compromisso com a qualidade de vida e de atenção à saúde pode ser rapidamente identificada pela evolução da política de atenção à saúde da criança e do adolescente nos marcos legais do SUS e do ECA.

Tomemos, como referenciais recentes de análise, três documentos oficiais da União: a Caderneta de Saúde da Criança, a Política Nacional de Atenção Integral à Saúde da Criança (PNAISC) e o Marco Legal da Primeira Infância.

1. CADERNETA DE SAÚDE DA CRIANÇA (CSC)

A Caderneta de Saúde da Criança (CSC) foi implantada pelo Ministério da Saúde em 2005 para substituir o Cartão da Criança – em que somente constavam as vacinas recebidas-, e reúne o registro dos mais importantes eventos relacionados à saúde infantil. Além do cartão de vacina, a Caderneta apresenta o registro da história obstétrica e neonatal; indicadores de crescimento e desenvolvimento; aspectos importantes da alimentação como aleitamento materno e uso de sulfato ferroso e vitamina A; dados sobre saúde bucal, auditiva e visual; intercorrências clínicas; além de orientações para a promoção da saúde e prevenção da ocorrência de acidentes e violência doméstica.

A CSC é destinada a todos os nascidos em território brasileiro, e, por basear-se em ações de acompanhamento e promoção da saúde, inclui-se como estratégia privilegiada nas políticas de redução da morbimortalidade infantil.[3]

A CSC é composta por duas partes, uma a ser preenchida pelos profissionais com dados relevantes para o monitoramento da saúde de cada criança em particular e outra com informações e orientações relevantes para os cuidadores e vem sendo atualizada e aperfeiçoada em sucessivas edições.

Na edição de 2005 [4], o reconhecimento da importância da participação dos familiares no acompanhamento da criança se revela em orientações como:

  • Conversar e brincar com o bebê desde o nascimento é muito importante para que ele se desenvolva bem.
  • Acompanhe o desenvolvimento de sua criança.
  • Anote a idade da criança à medida que ela se desenvolve. Escreva também outras coisasque você observou que o seu filho ou filha já está fazendo.
  • Se achar que sua criança não está desenvolvendo como você espera, fale sobre isso com um profissional de saúde.

Em intervalos regulares (até os 2 meses, 2 a 4 meses, 4 a 6 meses, 6 a 9 meses, 9 a 12 meses, 1 ano a 1 ano e 6 meses, …) que refletem conhecimentos sobre marcos importantes para o desenvolvimento da criança, existem espaços para anotar o aparecimento de indicadores de desenvolvimento, acompanhados de orientações simples para os cuidadores sobre como lidar com a criança com afeto, auxiliando seu desenvolvimento:

  • 9 a 12 meses: Aproveite os momentos de cuidados com seu bebê (banho, troca de fraldas) para conversar e brincar com ele.
  • 1 ano e 6 meses a 2 anos: Sua criança já sabe o que é dela e o que é de vocês, mas quer ter o controle sobre tudo. É importante que vocês se sintam seguros em não satisfazer todas as vontades de seu filho ou filha.

Com orientações também sobre medidas reconhecidamente úteis para a segurança da criança:

  • Mantenha a criança longe de fogo, fogão, aquecedor e ferro elétrico.
  • Redobre a atenção. Produtos de limpeza, inseticidas e remédios devem ser guardadossempre em armários fechados e em lugar alto.
  • Verifique se o tanque está bem fixo, para evitar que ele caia sobre a criança e causelesões graves.

Na 10a. edição, de 2015 [5], o Sumário já indica a ampliação da CSC; as anotações de dados da criança pelos profissionais são mais detalhadas e revelam o embasamento no avanço científico; as orientações para os familiares são ainda mais abrangentes e respeitosas com a criança, a família e a comunidade.

Logo nas primeiras páginas, destacam-se orientações de grande relevância

A primeira parte é dedicada a quem cuida da criança. Contém informações e orientações para ajudar a cuidar melhor da saúde da criança. Apresenta os direitos da criança e dos pais, orientações sobre o registro de nascimento, amamentação e alimentação saudável, vacinação, crescimento e desenvolvimento, sinais de perigo de doenças graves, prevenção de acidentes e violências, entre outros.

A segunda parte é destinada aos profissionais de saúde, com espaço para registro de informações importantes relacionadas à saúde da criança. Contém, também, os gráficos de crescimento, instrumento de vigilância do desenvolvimento e tabelas para registros das vacinas aplicadas.

Converse com o profissional de saúde, tire suas dúvidas e peça orientações para que a criança cresça e se desenvolva bem.

Para que a criança cresça e se desenvolva bem, é fundamental comparecer à unidade de saúde para fazer o acompanhamento do seu crescimento e desenvolvimento.

Nas consultas de rotina, peça orientações sobre os cuidados necessários para que a criança tenha boa saúde e esclareça as suas dúvidas

Logo após o cronograma de consultas de rotina recomendado pelo Ministério da Saúde, o alerta:

Algumas crianças necessitam de maior atenção e devem ser vistas com maior frequência.

Destacamos, aqui, uma orientação fundamental para que a CSC atinja seu objetivo de possibilitar a avaliação contínua da criança: ela precisa ser preenchida e os cuidadores são convidados a participarem ativamente.

Solicite ao profissional de saúde que preencha a Caderneta de Saúde. Esse é um direito da família e da criança. (grifo nosso)

Esta orientação é enfatizada mais de uma vez:

É importante que o profissional de saúde anote as informações de cada consulta nos espaços próprios desta caderneta.

Retomaremos este ponto mais adiante.

A CSC em sua 10a. Edição revela a importância dada à avaliação e monitoramento do desenvolvimento de cada criança de modo bastante evidente: na parte inicial, destinada aos cuidadores, existem 5 páginas sobre desenvolvimento neuropsicomotor infantil, com orientações simples; na parte destinada aos profissionais, existem 8 páginas com orientações sobre desenvolvimento infantil e sua avaliação, 2 páginas sobre desenvolvimento em crianças com síndrome de Down e 1 página sobre autismo (reproduzida a seguir).


Autismo

Especial atenção deve ser dada aos sinais de autismo, pela sua elevada incidência e também pelo frequente diagnóstico tardio, comprometendo o tratamento e o prognóstico.

A detecção precoce do autismo é fundamental para a imediata intervenção. Até o momento, inexistem exames laboratoriais ou marcadores biológicos para a identificação do autismo, a qual se dá pela avaliação do quadro clínico e pela observação do comportamento.

O autismo aparece, tipicamente, antes dos 3 anos de idade e caracteriza-se por desvios qualitativos na comunicação, na interação social e no uso da imaginação. As crianças com autismo, quando crescem, desenvolvem habilidades sociais em extensão variada.

No caso de suspeita, é importante orientar os pais/cuidadores e encaminhá-los para locais que possam fazer o diagnóstico e o tratamento.

Sinais de Autismo

Alterações do sono variáveis e inespecíficas.

Indiferença em relação aos cuidadores, ausência de sorriso social, desconforto quando acolhido no colo e desinteresse pelos estímulos oferecidos (brinquedos por exemplo).

Ausência de atenção compartilhada (não compartilham o foco de atenção com outra pessoa) e de contato visual (não estabelecem contato “olhos nos olhos”).

Comportamentos estereotipados (mexer os dedos em frente aos olhos, movimentos repetitivos da cabeça e/ou de antebraços e mãos, andar nas pontas dos pés descalços, balanço do tronco).

Ausência de resposta ao chamado dos pais/cuidadores, aparentando surdez.

Aversão ao contato físico (a criança evita relacionar-se com pessoas desde o início da vida).

Ausência de reação de surpresa ou dificuldade para brincar de “faz de conta”. Hipersensibilidade a determinados tipos de sons.
Ecolalia – repetição imediata ou tardia de palavras ou frases.
Tendência ao isolamento, autoagressão, inquietação, comportamentos estranhos. Interesses circunscritos (às vezes, gosta de girar objetos).

Em alguns casos, presença de habilidades especiais (matemáticas, musicais e plásticas).


 

A CSC cumpre, assim, em sua estrutura, a proposta de ser uma estratégia privilegiada nas políticas de redução do adoecimento e da mortalidade infantil, exatamente por se basear em ações de acompanhamento e promoção da saúde.

Devemos destacar que os diagnósticos na infância, em especial nos campos de crescimento e desenvolvimento, são, na grande maioria dos casos, dinamicamente provisórios, alterando-se muito rapidamente, o que impõe a necessidade de acompanhamento cuidadoso de como evolui cada criança em particular, exigindo cautela em evitar diagnósticos rígidos e prematuros. Apenas a título de exemplo, Gisela Untoiglich, reconhecida psicanalista argentina, docente da Universidad de Buenos Aires, assim intitulou um de seus livros mais recentes [6], coletânea de textos de autores de diferentes países: En la infancia, los diagnósticos se escriben con lápiz.

A avaliação de crescimento e desenvolvimento não se faz em uma única consulta, mas é construída longitudinalmente, com o acompanhamento continuado; em caso de dúvida, a próxima avaliação deve ser antecipada. A atenção à saúde se baseia em normas e guidelines cientificamente embasados e, por isto mesmo, flexíveis de acordo com os resultados encontrados.

A elaboração da CSC se baseia exatamente neste conhecimento já bem estabelecido na Pediatria em todo o mundo. Com indicadores bem fundamentados de desenvolvimento e orientações para o profissional sobre como pesquisar, vai-se construindo um gráfico de seguimento longitudinal das conquistas da criança em seu desenvolvimento.

A CSC prevê, ainda, diferentes possibilidades desse gráfico longitudinal de desenvolvimento e orienta o profissional sobre a conduta a ser seguida, como se vê na figura abaixo.

avaliação de desenvolvimento

Devemos, então perguntar: se a CSC constitui instrumento tão valioso para a atenção à saúde da criança, por que a identificação de problemas no desenvolvimento – físico, mental, cognitivo – tem sido tão atrasada? Por que crianças com visão ou audição subnormal demoram tanto a serem identificadas? Por que crianças com deficiência mental importante não são diagnosticadas em tempo adequado?

A resposta, infelizmente, é simples: os profissionais não anotam regularmente os dados na CSC.

Ainda são relativamente poucas as pesquisas sobre este tema, mas todas revelam que o preenchimento de dados é bastante precário; em consequência da desvalorização da CSC por parte dos profissionais (notadamente médicos e enfermeiros), as famílias tendem a não terem ainda incorporado a CSC como um direito da criança e instrumento de qualificação da atenção à saúde. Destacamos duas pesquisas mais recentes. Em 2014, Palombo et cols. [7] encontraram que apenas 9 e 8% das CSC tinham, respectivamente, os gráficos de crescimento e desenvolvimento preenchidos. Em 2016, Lima et cols. [8] revisaram a bibliografia sobre o uso da CSC na atenção à saúde de crianças e também relatam a precariedade das anotações e, consequentemente, do uso da CSC, sendo um dos motivos o perfil dos profissionais diante da relevância do instrumento, concluindo ser imprescindível sua capacitação e sensibilização.

Em revisão sistemática do uso da CSC por pesquisadores ligados ao IFF (Instituto Nacional de Saúde da Mulher, da Criança e do Adolescente Fernandes Figueira), publicada em 2015, os autores destacam a importância da CSC como estratégia de qualificar a atenção à saúde da criança – e, logicamente, qualificar a própria saúde das crianças – e seu baixo uso pelos profissionais.

Outro problema evidenciado nesta revisão é o baixo resultado no preenchimento do quadro de acompanhamento dos marcos de desenvolvimento da criança. A ação de vigilância consiste em fazer sistematicamente exame físico, avaliação neuropsicomotora de maneira minuciosa, identificação da presença de fatores de risco e registro na CSC de todos os procedimentos feitos na criança, bem como dos achados das consultas. Essa ação constitui uma modalidade de intervenção preventiva que compreende atividades relacionadas à promoção do desenvolvimento normal e à detecção de problemas nesse processo. (Almeida et als, 2015). [9]

Recentemente, no dia 12 de setembro de 2017, foi realizado o Seminário de Apresentação de Resultados dos Projetos da Caderneta de Saúde da Criança, organizado pelo IFF (Instituto Nacional de Saúde da Mulher, da Criança e do Adolescente Fernandes Figueira), Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz) e Ministério da Saúde, com apresentação de dados detalhados de pesquisa empírica realizada por essas pesquisadoras do IFF, desenhada a partir da revisão sistemática descrita acima.

Um dos dados apresentados, sobre o preenchimento de dados sobre crescimento e desenvolvimento na CSC corrobora as pesquisas citadas.

Na população estudada, abrangendo todas as regiões do país, encontrou-se que apenas 9,9% das cadernetas tinham anotações relativas à vigilância do desenvolvimento infantil.

Entende-se, então, a ênfase dada na CSC a seu adequado preenchimento, como destacamos anteriormente, neste texto.

É internacionalmente reconhecido que a qualidade da anotação em prontuários (e em instrumentos como a CSC) reflete diretamente a qualidade da consulta.

O profissional ética e cientificamente comprometido com a atenção à saúde da pessoa à sua frente sabe que suas anotações qualificam os atendimentos, especialmente em consultas ambulatoriais, de seguimento, como acontece na Atenção Básica. Se o profissional não se preocupa em anotar corretamente seus achados, hipóteses diagnósticas, condutas, plano terapêutico, esse seu descompromisso com o seguimento da pessoa se reflete também na qualidade da atenção prestada.

Elaborar estratégias de formação e sensibilização dos profissionais, aqui os pediatras em especial, para a importância de anotar corretamente seus achados e propostas constitui estratégia de qualificar a atenção à saúde de crianças.

É exatamente isto que os dois outros documentos oficiais que tratamos neste texto buscam atingir.

A Política Nacional de Atenção Integral à Saúde da Criança (PNAISC)

A Política Nacional de Atenção Integral à Saúde da Criança (PNAISC)foi instituída no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS) em 5 de agosto de 2015, pela Portaria No 1.130, do Ministério da Saúde. [10]

Como portaria ministerial, a PNAISC situa-se hierarquicamente superior à CSC, um manual técnico, estabelecendo normas legais para qualificar a atenção à saúde da criança.

Alguns de seus artigos merecem ser destacados, na medida em que preveem estratégias e ações que devem ser implantadas em todo o território nacional, incluídas aqui as relativas a desenvolvimento infantil. Ressalte-se o embasamento na concepção de que saúde, em todos os seus aspectos, é socialmente determinada e a atenção aos agravos deve ser feita de modo integrado e articulado, respeitando o dado inegável de que a criança que sofre o agravo é um ser integral, não passível de ser abordada, avaliada ou cuidada em “partes” artificialmente construídas.

Art. 6° A PNAISC se estrutura em 7 (sete) eixos estratégicos, com a finalidade de orientar e qualificar as ações e serviços de saúde da criança no território nacional, considerando os determinantes sociais e condicionantes para garantir o direito à vida e à saúde, visando à efetivação de medidas que permitam o nascimento e o pleno desenvolvimento na infância, de forma saudável e harmoniosa, bem como a redução das vulnerabilidades e riscos para o adoecimento e outros agravos, a prevenção das doenças crônicas na vida adulta e da morte prematura de crianças, a seguir relacionados:


III – promoção e acompanhamento do crescimento e do desenvolvimento integral: consiste na vigilância e estímulo do pleno crescimento e desenvolvimento da criança, em especial do “Desenvolvimento na Primeira Infância (DPI)”, pela atenção básica à saúde, conforme as orientações da “Caderneta de Saúde da Criança”, incluindo ações de apoio às famílias para o fortalecimento de vínculos familiares;

VI – atenção à saúde de crianças com deficiência ou em situações específicas e de vulnerabilidade: consiste na articulação de um conjunto de estratégias intrassetoriais e intersetoriais, para inclusão dessas crianças nas redes temáticas de atenção à saúde, mediante a identificação de situação de vulnerabilidade e risco de agravos e adoecimento, reconhecendo as especificidades deste público para uma atenção resolutiva;

A PNAISC, como se vê, revela a atenção que deve ser dada à avaliação contínua do crescimento e desenvolvimento de cada criança, que devem ser continuamente monitorados, com orientações adequadas aos cuidadores para que riscos e alertas identificados nessa vigilância possam ser superados ou minimizados.

O inciso IV trata especificamente da atenção à saúde de crianças com deficiências, estabelecendo firmemente que deve ser articulada de modo intra e intersetorial, regionalizada e hierarquizada. Isto reflete seu embasamento na própria concepção do SUS, internacionalmente reconhecida como fundamental para o sucesso de uma política de saúde voltada à qualidade de vida de toda a população.

O artigo 9°. enfatiza, novamente, a importância estratégica do acompanhamento continuado do crescimento e desenvolvimento integral (grifo nosso) e o papel fundamental da CSC para sua qualificação.

Art. 9° São ações estratégicas do eixo de promoção e acompanhamento do crescimento e do desenvolvimento integral:
I – a disponibilização da “Caderneta de Saúde da Criança”, com atualização periódica de seu conteúdo;

II – a qualificação do acompanhamento do crescimento e desenvolvimento da primeira infância pela Atenção Básica à Saúde;

É impossível pensar em políticas de atenção à saúde universalizadas e com qualidade se não forem enraizadas na concepção de articulação, regionalização e hierarquização. O Art. 14o fortalece a concepção de que a atenção à saúde se organiza de modo articulado entre os diferentes níveis de atenção e redes temáticas, sempre a partir da atenção básica.

Art. 14. A PNAISC se organiza a partir da Rede de Atenção à Saúde e de seus eixos estratégicos, mediante a articulação das ações e serviços de saúde disponíveis nas redes temáticas, em especial aquelas desenvolvidas na rede de saúde materna neonatal e infantil e na atenção básica, esta como coordenadora do cuidado no território.

A PNAISC, assim, em 2015 estabeleceu firmemente a importância de que todas as crianças sejam acompanhadas na rede de atenção básica, com monitoramento continuado de seu crescimento e desenvolvimento, com o uso adequado da CSC, ou seja, anotação completa de todos os dados solicitados.

3. MARCO LEGAL DA PRIMEIRA INFÂNCIA

Em 8 de março de 2016, foi promulgada a Lei No. 13.257 [11], conhecida como Marco Legal da Primeira Infância, que “Dispõe sobre as políticas públicas para a primeira infância (…)”

Já no Art. 3° se afirma a preocupação e compromisso do Estado com o desenvolvimento integral de todas as crianças em território nacional.

Art. 3° A prioridade absoluta em assegurar os direitos da criança, do adolescente e do jovem, nos termos do art. 227 da Constituição Federal e do art. 4o da Lei no 8.069, de 13 de julho de 1990, implica o dever do Estado de estabelecer políticas, planos, programas e serviços para a primeira infância que atendam às especificidades dessa faixa etária, visando a garantir seu desenvolvimento integral.

O Art. 4° estabelece marcos legais para as políticas públicas voltadas à primeira infância: respeito a diferenças entre as crianças, notadamente em relação a ritmos e tempos de desenvolvimento; respeito aos contextos sociais e culturais da criança e de seu grupo social, assumindo esses contextos como condicionantes e facilitadores do desenvolvimento infantil; importância de os conhecimentos científicos e tecnológicos não se pretenderem neutros e absolutos, mas enraizados nas construções humanas, devendo se articular com outros campos de conhecimento e com a ética e a política. Mais uma vez, se enfatiza a necessidade imperiosa de ações articuladas entre diferentes áreas e setores.

Art. 4° As políticas públicas voltadas ao atendimento dos direitos da criança na primeira infância serão elaboradas e executadas de forma a:

III – respeitar a individualidade e os ritmos de desenvolvimento das crianças e valorizar a diversidade da infância brasileira, assim como as diferenças entre as crianças em seus contextos sociais e culturais;

12 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2016/lei/l13257.htm

V – articular as dimensões ética, humanista e política da criança cidadã com as evidências científicas e a prática profissional no atendimento da primeira infância;

VII – articular as ações setoriais com vistas ao atendimento integral e integrado;

Mais adiante, o Marco Legal firma a obrigatoriedade legal de que as políticas para a primeira infância sejam articuladas com as instituições de formação profissional, reconhecendo que uma lei somente se torna real se se concretiza nos espaços onde acontece o objeto sobre o qual legisla. No caso das políticas de atenção à saúde de crianças, a legislação deve alterar os modos de funcionamento e práticas profissionais que se realizam na rede de atenção primária, nas unidades básicas de saúde, no interior dos consultórios, no espaço de cada consulta. Para tanto, os profissionais envolvidos devem ser comprometidos com os objetivos da lei em questão; se pediatras não forem formados em consonância com o Marco Legal da 1a. Infância, a PNAISC, não avaliarem adequadamente todas as crianças em todos os aspectos envolvidos em uma consulta pediátrica, incluídos aqui crescimento e desenvolvimento, anotando corretamente em prontuários e documentos como a CSC, a lei será mais uma letra morta.

Art. 9° As políticas para a primeira infância serão articuladas com as instituições de formação profissional, visando à adequação dos cursos às características e necessidades das crianças e à formação de profissionais qualificados, para possibilitar a expansão com qualidade dos diversos serviços.

No caso das políticas de atenção à saúde de crianças, a legislação deve alterar os modos de funcionamento e práticas profissionais que se realizam na rede de atenção primária, nas unidades básicas de saúde, no interior dos consultórios, no espaço de cada consulta. Para tanto, os profissionais envolvidos devem ser comprometidos com os objetivos da lei em questão; se pediatras não forem formados em consonância com o Marco Legal da 1a. Infância, a PNAISC, não avaliarem adequadamente todas as crianças em todos os aspectos envolvidos em uma consulta pediátrica, incluídos aqui crescimento e desenvolvimento, anotando corretamente em prontuários e documentos como a CSC, a lei será mais uma letra morta.

Também, as políticas públicas de saúde devem conter a necessidade de monitoramento das pessoas atendidas, além de serem, elas mesmas, objeto de monitoramento contínuo e fiscalização, permitindo inclusive a construção de banco de dados de todas as crianças em território nacional.

Art. 11. As políticas públicas terão, necessariamente, componentes de monitoramento e coleta sistemática de dados, avaliação periódica dos elementos que constituem a oferta dos serviços à criança e divulgação dos seus resultados.
§ 1° A União manterá instrumento individual de registro unificado de dados do crescimento e desenvolvimento da criança, assim como sistema informatizado, que inclua as redes pública e privada de saúde, para atendimento ao disposto neste artigo.

A LEI 13.438 DESRESPEITA E AGRIDE CRIANÇAS, FAMÍLIAS, PEDIATRAS E O SUS

Os marcos legais estão prontos. As normas técnicas estão disponíveis. Os instrumentos existem. Mas ainda não estão de fato implementados na rede de saúde. As crianças com problemas continuam sendo identificadas – quando o são – muito tarde.

Como se resolve este problema?

Com uma nova lei, que atropela o já construído, o coletivamente construído, o científica e politicamente embasado?

A Lei 13.438 ignora tudo que já se construiu nas últimas décadas no campo de promoção e monitoramento da saúde de crianças; prepotentemente, impõe ao atendimento pediátrico na Atenção Básica uma ação que agride e desconstrói o que o campo cientifico da Pediatria vem desenvolvendo e implementando nas políticas públicas, de modo articulado com outros campos.

Em toda consulta pediátrica, deve ser avaliado o desenvolvimento da criança, no contexto de uma avaliação mais ampla, da criança como um ser integral. O desenvolvimento infantil se realiza em uma criança que precisa comer, dormir, interagir, tomar vacinas, ter acesso a saneamento básico, crescer, aprender, ser cuidada com afeto e segurança. O desenvolvimento só é um objeto estanque e abstrato em alguns textos.

Ainda, o desenvolvimento acontece de modo multifacetado: motor, sensitivo, sensorial, cognitivo, psíquico, neurológico, afetivo…

Em uma consulta pediátrica na Atenção Básica, toda criança deve ser avaliada integralmente, aí incluído seu desenvolvimento.

A criança avaliada como um ser integral, com seu desenvolvimento avaliado em suas diferentes facetas, permite que o pediatra perceba que “algo não vai bem”, que a criança não está se desenvolvendo (de acordo com o que se esperaria em suas condições concretas de vida, inserção social, cultural, geográfica, afetiva etc e não segundo tabelas e protocolos alheios à sua vida).

O que quero dizer é que uma criança com problemas em seu desenvolvimento psíquico exibe isto em todas as facetas do prisma que é seu desenvolvimento, do prisma que ela é! Exatamente do mesmo modo como alterações de sono ou de alimentação, infecções recorrentes e tantas outras patologias interferem com o desenvolvimento da criança; aliás, muitas vezes são percebidos pelas alterações no desenvolvimento.

Somos nós, profissionais e pesquisadores, que “fatiamos” as pessoas em partes, por nossa incapacidade em abarcar o todo, como se conhecer as partes nos permitisse conhecer o todo.

Retomando, a criança (ou adolescente, ou adulto) com problemas no na constituição psíquica assim como no desenvolvimento neuromotor, reflete isto em todas as áreas de sua vida. Problemas no desenvolvimento psíquico se manifestam como problemas no desenvolvimento, ou melhor, como “um desenvolvimento que não se desenvolve bem”. Ou seja, um pediatra bem formado, saberá avaliar uma criança em sua integralidade e será competente para identificar quando ela não vai bem, quando ela exibe sinais de alerta, quase como pedindo ajuda.

O pediatra detecta não risco psíquico, mas sinais de sofrimento psíquico, algo diferente de patologia mental, mas que precisa de intervenções adequadas capazes de alterar seu curso, sua evolução.

Detectado qualquer sinal de alerta, deve-se proceder à investigação mais específica, diminuindo os intervalos entre as consultas e referenciando a criança a especialistas, se necessário.

É importante ainda, destacar, que avaliar risco psíquico exige, obrigatoriamente, uma formação mais aprofundada no campo, pois implica em dominar conhecimentos sobre a própria instituição subjetiva do ser. Um campo de conhecimentos muito importante, mas que extrapola a formação do pediatra sem nenhum demérito para ele. Mas também um campo de conhecimentos e práticas que extrapola o que se preconiza na Rede de Atenção Primária à Saúde.

Impor, por um mecanismo de lei, não discutido com nenhuma instância vinculada ao tema, que se aplique determinado instrumento para avaliar uma área especifica do desenvolvimento infantil constitui desrespeito com o pediatra, com a criança, com a família, com os gestores políticos, com as agências formadoras, com pesquisadores. Mas, acima de tudo, denota a arrogância e o desconhecimento do que seja uma consulta pediátrica e uma rede pública de saúde e quais os reais entraves para que todo o já construído (CSC, PNAISC, Marco Legal e muitos outros) transformem a realidade da detecção tardia.

Se for realizado o imposto pela Lei 13.438, privilegiando a avaliação de risco psíquico em detrimento de todas as demais ações de uma consulta pediátrica, isto implicará em deixar de avaliar a criança como sujeito integral, o que ela come, como dorme, como está o cocô, se está crescendo bem, se brinca com outras crianças, se é bem cuidada, se seus olhos brilham ou trazem embutido um pedido de socorro, se tomou as vacinas e tantas outras coisas que vão sendo construídas e pactuadas em cada consulta, na relação do pediatra com o cuidador, com a criança, com a comunidade sob seus cuidados.

Enfatizo que ele deixará de fazer isto não por maldade ou vingança, mas pela dinâmica da rede de saúde, pelo tempo que ele pode dispor para cada consulta, pelo tempo que a mãe pode dispor, pelo tempo que a criança pode aguentar no consultório.

Então, se obrigado por lei, ele priorizará a avaliação do risco psíquico – para a qual, como já dito anteriormente não tem formação específica, o que se afirmará resolver com treinamentos aligeirados, caros e ineficientes – em detrimento da avaliação da criança.

Assim, entrará no consultório, uma-criança-potencialmente-portadora-de-risco- psíquico, não a criança. A Mariazinha, o Pedrinho, o Joãozinho, a Rosinha serão tornados invisíveis, somente o risco psíquico será visível.

Tal risco será, assim, obrigatoriamente avaliado em crianças abstratas, pois a criança real, de carne e osso, com necessidades, desejos, problemas, possibilidades, sofrimentos, não será nem vista nem ouvida. Tal lei conseguirá, assim, a proeza de abstrair a criança real, tirando a vida de cena.

Ainda, tal lei provocará uma epidemia de diagnósticos de risco psíquico, com resultados duplamente cruéis: crianças com risco psíquico real não serão identificadas na avalanche de encaminhamentos e continuarão não sendo diagnosticadas e cuidadas em tempo adequado; crianças normais ou com outros problemas serão rotuladas com esse diagnóstico, em conhecido processo de patologização da vida.

O argumento de que os protocolos não farão diagnósticos, mas identificarão riscos é reconhecida e repetidamente falacioso. Usado sempre que se propõe triagens como essa, busca escamotear que será, sim, feito um diagnóstico, o diagnóstico de risco psíquico, a ser carregado por toda a vida. Como carimbo indelével, será a justificativa para todos os problemas que venham a acontecer na vida da criança, mesmo que decorrentes dos modos de organização da sociedade.

O diagnóstico de risco rapidamente se transforma em diagnóstico de uma patologia, o risco é transformado em doença. E aí, se cria a demanda, artificialmente construída, por serviços especializados no tratamento do risco.

Nessa previsível epidemia de diagnósticos, será impossível elaborar / financiar políticas públicas voltadas à atenção de crianças com risco psíquico. A patologização mais uma vez movimentará os moinhos da judicialização e da privatização do público.

Por fim, a pergunta necessária: quem ganha com a Lei 13.438? Quais os interesses que a subsidiam e a sustentam?

Com certeza, não são as crianças com riscos de qualquer ordem em seu desenvolvimento.

O entrave real para as políticas públicas de saúde é o sub-financiamento do SUS, atrelado à estratégia privatizante da saúde que vem sendo imposta.

Este entrave, político e ideológico, se reflete na formação dos profissionais – voltada para e pautada pelo mercado -, o que explica a existência de profissionais descompromissados com a saúde da população brasileira.

O SUS é uma conquista do povo brasileiro e não pode ser atacado, seja por agentes financeiros, seja por mecanismos legais comprometidos com outros interesses.

NOTAS DE PÉ DE PÁGINA:

[1] Davi Kopenawa, grande xamã e porta-voz dos Yanomami, ensina que o céu já caiu no passado e, se já caiu, poderá cair novamente. “A queda do céu: palavras de um xama yanomami” Davi Kopenawa e Bruce Albert São Paulo: Companhia das Letras.

[2] Documento final da Conferência Internacional sobre Cuidados Primários de Saúde, realizada em Alma Ata, URSS, em setembro de 1978. É considerada a primeira declaração internacional que enfatiza a importância da Atenção Primária à Saúde, exortando governos, OMS, UNICEF a buscarem com urgência estabelecer a promoção de saúde como prioridade. Disponível em http://www.who.int/publications/almaata_declaration_en.pdf,  acesso em 10/09/2017)

[3] Observatório da Saúde da Criança e do Adolescente . http://site.medicina.ufmg.br/observaped/eixos/caderneta-de-saude-da-crianca/ acesso em 10 de setembro de 2017 acesso em 10/09/201

[4] Disponível em http://189.28.128.100/nutricao/docs/geral/caderneta_saude_da_crianca.pdf acesso em 10/09/2017

[5]http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/caderneta_saude_crianca_menino_10ed.pdf

[6] Untoiglich, Gisela, et al. (2013) En la infancia los diagnósticos se escriben con lápiz. La patologización de las diferencias en la clínica y la educación. /266 p. Buenos Aires: Noveduc.

[7] Palombo CNT, Duarte LS, Fujimori E, Tamami A, Toriyama M Uso e preenchimento da caderneta de saúde da criança com foco no crescimento e desenvolvimento Rev Esc Enferm USP, 2014; 48 (Esp):60-7 (http://www.scielo.br/pdf/reeusp/v48nspe/pt_0080-6234-reeusp-48-esp-060.pdf)

[8] Lima LG, Nobre CS, Lopes ACMU, Rolim KMC, Albuquerque CM, Araujo MAL A utilização da Caderneta de Saúde da Criança no acompanhamento infantil R bras ci Saúde 20(2):167-174, 2016 (http://periodicos.ufpb.br/index.php/rbcs/article/viewFile/21266/15747)

[9] ALMEIDA, Ana Claudia de et al . Use of a monitoring tool for growth and development in Brazilian children – systematic review. Rev. paul. pediatr., São Paulo , v. 34, n. 1, p. 122-131, Mar. 2016 Disponível em http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103- 05822016000100122&lng=en&nrm=iso . Acesso em 10 de setembro de 2017

[10] http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2015/prt1130_05_08_2015.html

[11] http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2016/lei/l13257.htm

 

Saúde Mental?  “Isso é um Mito!”

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Publicado pela BBC 3:

“Eu não uso essa expressão ‘saúde mental’. Quando ouço alguém dizer isso, estremeço”, diz a Dra. Bonnie Barstow.

‘Saúde Mental’. Eis aí uma expressão que faz parte do ‘senso-comum’.

Mas o que é ‘saúde mental’?

Não se sabe!

Salvo dizer que ‘saúde mental’ não é ‘doença mental’.

Mas há ‘doença mental”?

As evidências científicas parecem dizer não haver ‘doença mental’.  Esquizofrenia? Transtornos de ansiedade? Transtornos depressivos? TDAH? São ‘doença’ mental? Ou ‘transtorno mental’, como estamos hoje acostumados a dizer?  O que fazemos quando usamos tais palavras? Eis uma questão que não é meramente filosófica, como sublinha a psiquiatra Joanna Moncrieff.

Doenças?  Ou não seria melhor: ‘transtornos existenciais’?

Se forem ‘doenças’, o que a ciência mostra é que não foram até hoje cientificamente demonstradas – em termos biomédicos. Se forem ‘transtornos existenciais’, talvez o modo de abordagem de tais problemas seja de natureza própria ao que fazemos com as vicissitudes em geral da existência (o dasein, em termos heideggerianos). Consequentemente, não sendo do âmbito de ‘doença’, tampouco não seria do âmbito da ‘saúde mental’ – como um estado ideal ou algo que deve ser perseguido. A respeito desse ‘estado ideal’, há o famoso livro de Freud ‘O Mal-Estar na Civilização’.

Há critérios para o que é ‘saúde mental’?

Pois afinal de contas, o que é ‘saúde mental’, que possa ser ‘algo’ universalizável, uma condição para todos?  O que é ‘saúde mental’ para uma criança? Para um adolescente? Para alguém na chamada média idade? Para um idoso? Há critérios em termos de saúde mental? E não seria justamente a perseguição desse suposto estado ideal o que justifica as diversas formas de medicalização da existência humana? Ao dizermos ‘saúde mental’ não estamos convertendo situações ‘existenciais’ em objetos de ‘saúde’?

Eis o que foi dito a respeito, pela Dra. Bonnie Barstow, em uma entrevista dada recentemente à BBC.

Veja aqui, em inglês, e em espanhol.

Bonnie Burstow

Por que a Filosofia é Importante?

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jmoncrieff-150x150Este é o primeiro de uma série de blogs em que apresentarei uma análise filosófica do sistema moderno de saúde mental e com o que ele está envolvido.

O filósofo do século 20, Ludwig Wittgenstein, cujos últimos trabalhos dizem respeito ao nosso pensamento sobre a “mente”, sugeriu que o papel da filosofia é identificar e esclarecer confusões conceituais. Muitas dessas confusões foram introduzidas pelos filósofos, fazendo perguntas erradas no modo errado. Wittgenstein esperava mostrar que, ao se compreender melhor a natureza da linguagem, muitos dos dilemas mais complexos da filosofia simplesmente se dissolveriam.

Essa ideia de arrumar nossa linguagem pode soar como uma atividade bastante modesta, de pouca importância prática, própria a apenas filósofos que foram seduzidos por usos confusos da linguagem e desviados em debates infrutíferos. O que não procede na prática. Essas confusões conceituais têm permeado o pensamento do cotidiano. Influenciam nosso comportamento como indivíduos e estruturam as instituições sociais que construímos. Em nenhum lugar isso é mais impactante do que no sistema, do que hoje em dia chamamos de  sistema de ‘saúde mental’.

Thomas Szasz é, naturalmente, a pessoa mais conhecida por chamar a atenção para a confusão conceitual incorporada no termo “doença mental” [1]. Para Szasz, doenças e enfermidades são conceitos que estão inextricavelmente ligados ao corpo, daí que mente – que não é corporal –  não possa ser ‘doente’ [2]. Situações que são referidas como ‘doença mental’ são definidas por certos comportamentos problemáticos e não pela disfunção biológica característica de uma doença enquanto tal. Szasz também entendeu que a confusão inerente ao conceito de ‘doença mental’ não surgiu simplesmente porque as pessoas estavam equivocadas, é o que ele chamou de “estratégico”. Designar certos problemas como ‘doença mental’ justifica particulares arranjos sociais e isso se passa porque os termos ‘enfermidade’ e ‘doença’ derivam seu significado por ser uma condição do corpo.

Em blogs posteriores voltarei à questão crucial de se uma doença é ou não necessariamente uma característica corporal, mas agora eu apenas quero ilustrar o quão importante é essa questão. Sistemas sociais inteiros dependem do pressuposto de que o que chamamos de ‘doença mental’ ou ‘transtorno mental’ (um termo que pega carona no primeiro) se origina no corpo. Em particular, essa noção é fundamental para a atual resposta social a certas formas de comportamento e para os processos de alocação de recursos para assistência ou bem-estar.

Nas sociedades modernas, o uso da força por alguns indivíduos contra outros é considerado inaceitável e é ilegal. O Estado reserva-se o direito de usar a força em algumas situações, mas apenas contra aqueles que quebraram o código de conduta nacionalmente acordado – a lei. No entanto, se pensa que o pensamento e o comportamento de alguém são o resultado de um processo biológico aberrante que ocorre no corpo ou no cérebro, um processo que não tem nada a ver com a personalidade ou o self do indivíduo (que é o que eu argumentarei enquanto a compreensão usual do termo ‘doença’), então o indivíduo perde logicamente o direito de ser considerado como um ser de atuação autônoma. O que a pessoa faz e diz nessas circunstâncias pode legitimamente ser desconsiderado. Os esforços para mudar seu comportamento, que podem envolver o uso da força, podem ser concebidos como um ‘tratamento’ médico que não se destina ao indivíduo per si, mas à doença subjacente.

Pense no contraste entre as ordens para tratamento comunitário compulsório ou o compromisso para tratamento ambulatorial para pessoas com diagnóstico de transtornos mentais e o uso de agentes supressores de libido para infratores sexuais (às vezes designados por castração química). Embora essas drogas possam ser impostas aos condenados como parte da sentença em algumas partes do mundo, na maior parte da Europa os delinquentes sexuais devem dar o seu consentimento, e no Reino Unido uma segunda opinião também é necessária para que os medicamentos sejam administrados por injeção. Sob leis de comprometimento ambulatorial, alguém que tenha um diagnóstico de transtorno mental, mas que nunca tenha feito mal a alguém, pode ter seu corpo alterado quimicamente contra a vontade dela durante o resto da vida, apesar de ter a capacidade de tomar uma decisão por ela mesma e de forma perfeitamente racional. Isso não é imposto como uma punição por mau comportamento (pelo menos não explicitamente) e não seria aceitável na sociedade ocidental moderna sem a suposição implícita de que ter um ‘transtorno mental’ equivale a ter uma doença corporal. Isso permite que os desejos expressos do indivíduo sejam desconsiderados, uma vez que ela não é mais vista como um agente autônomo, mas como um objeto que é conduzido pelo processo biológico que ocorre em seu cérebro.

A ideia de que o transtorno mental é uma doença também é a base dos sistemas de bem-estar modernos e crucialmente importante para a aplicação da ética de trabalho moderna. As características do ‘papel doente’, descrito por Talcott Parsons, derivam da natureza das doenças como processos biológicos. As pessoas que têm uma doença têm isenções de expectativas sociais normais e direitos para cuidar e apoiar, devido ao reconhecimento de que os eventos biológicos não são (geralmente) sob o controle humano. [3]

A sociedade moderna não tem outra maneira de dispensar as pessoas de suas obrigações sociais. Embora reconheçamos que numerosos eventos da vida comum (quebra de relacionamento, perda de emprego) podem tornar difícil para as pessoas lidar com seus deveres diários, apenas um certificado médico que verifique que alguém está “doente” (o “bilhete de doença”) as autoriza para ficar livre de ter que trabalhar ou a ter assistência financeira sem a obrigação de buscar trabalho.

Não estou pretendendo dizer nada novo aqui. Szasz fez essas considerações há décadas. Não obstante, há uma tendência dentro dos círculos de saúde mental para camuflar ou evitar o problema. Os defensores do modelo “biopsicossocial” parecem sugerir que os transtornos mentais podem ser simultaneamente um processo biologicamente orientado e uma condição comportamental. Outros afirmam que os mecanismos mentais e os processos biológicos são a mesma coisa e, portanto, que se pode ter um transtorno mental ou estar doente da mesma maneira.[5] Embora o termo “transtorno mental” pareça evitar críticas ao conceito de doença mental, na realidade serve ao mesmo propósito e, portanto, “pega carona” no conceito de doença mental.

Eu simplesmente quero enfatizar que os aspectos fundamentais da sociedade ocidental dependem da equação de certos problemas sociais com enfermidades ou doenças corporais. Sem isso, os conceitos de doença mental ou transtorno mental não podem funcionar como ocorre atualmente. Eles não poderiam formar a base dos sistemas sociais que atualmente sustentam.

O que doença ou enfermidade são precisamente pensadas para ser, e se esses conceitos deveriam, ou não, incluir os problemas que chamamos de ‘doença mental’, tem consequências extremamente significativas. Acontece que esclarecer as confusões conceituais pode ter um impacto profundo na sociedade moderna.

No próximo blog desta série, vou analisar a filosofia de Wittgenstein com mais detalhes e como isso se relaciona com nossa compreensão da ‘mente’ ou do ‘mental’.

Notas de pé de página:

  1. Szasz, T. (1961) The Myth of Mental Illness: Foundations of a Theory of Personal Conduct.New York: Harper.
  2. Szasz, T. (2000). Mental disorders are not diseases. USA Today, January issue.
  3. Parsons, T. (1951). The Social System. London: Routledge and Keegan Paul.
  4.  Szasz, T. (1989). Law, Liberty and Psychiatry: an inquiry into the social uses of mental health. Syracuse, New York: Syracuse University Press.
  5. Eu estou me referindo aqui, entre outros, a Jerome Wakfield’s ‘harmful dysfunction’ hypothesis of mental disorder: Wakefield, J.C. (1992) Disorder as harmful dysfunction: a conceptual critique of DSM-III-R’s definition of mental disorder. Psychological Review, 99, 242-247.

Que Você não Critique as Nossas Drogas

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robert-whitakerUma das características principais da corrupção institucional é que uma instituição atuará regularmente de forma a promover seus próprios interesses, mesmo que isso signifique trair os princípios que deveriam governar essa instituição. No mundo dos periódicos médicos, o público assume que a revista procurará publicar artigos de pesquisa que informem sobre a segurança e a eficácia dos tratamentos, independentemente se os resultados não apoiarem crenças e práticas comuns. Além disso, o público pressupõe que uma revista publicará cartas para o editor que, quando escrito por pessoas experientes no campo, levantem questões sobre algum artigo publicado pela revista.

Tais são os ditames da ciência. Espera-se que uma revista médica promova uma discussão aberta de tratamentos, mesmo que descobertas – ou críticas – ameacem as crenças convencionais.

Em um blog publicado em 22 de setembro, Peter Gøtzsche detalhou uma carta que ele e eu apresentamos ao periódico World Psychiatry, relacionado a um artigo sobre os resultados de 10 anos de 281 pacientes noruegueses após um primeiro episódio de psicose. A taxa de mortalidade nesse estudo foi bastante alta (11%), e achamos que os autores deveriam ter relatado com detalhes sobre essas mortes em seu artigo publicado.

Não me surpreendeu essa rejeição da nossa carta. Como não acadêmico, na verdade não tenho permissão para escrever uma “carta ao editor” de um periódico médico, e embora Peter Gøtzsche tenha certamente essa posição, pensei que havia pouca chance de nossa carta ser publicada. Há uma longa história de editores de revistas de psiquiatria que rejeitam artigos que desafiam os méritos das drogas psiquiátricas de forma fundamental, ou apenas aceitam tais artigos se os resultados prejudiciais forem minimizados ou apresentados de maneira obscura. Em revistas de psiquiatria, os resumos são quase sempre escritos de forma a garantir que o senso-comum sobre drogas psiquiátricas não seja ameaçada indevidamente.

Agora, temos um novo e poderoso exemplo dessa corrupção institucional no trabalho.

Como os leitores regulares do Mad in Brasil (MIB)sabem, Donald Goff, Jeffrey Lieberman e outros publicaram recentemente uma revisão dos efeitos a longo prazo dos antipsicóticos no American Journal of Psychiatry. A conclusão deles foi que, embora não hajam boas evidências de que os antipsicóticos pioram os resultados a longo prazo, existem boas evidências que apoiam seu uso a longo prazo. Joanna Moncrieff escreveu um blog para o MIB criticando o estudo deles, assim como o blog de Miriam Larsen-Barr no Mad in America, e o meu longo ‘relatório Mad in Brasil’ sobre como a revisão deles – dada a sua apresentação tendenciosa de achados do estudo, sua seleção dos dados favoráveis e sua rejeição de evidências que apontaram os danos a longo prazo – exemplifica um estudo de caso de corrupção institucional. A revisão feita por eles foi claramente projetada para defender seus antipsicóticos, ao contrário de investigar verdadeiramente seus efeitos a longo prazo.

O estudo deles também desencadeou a submissão de pelo menos duas ‘cartas ao editor’ do American Journal of Psychiatry criticando o estudo, uma escrita por Moncrieff e Stefan Priebe, e outra por Robin Murray e cinco colegas. Embora Moncrieff possa ser conhecido no mundo da psiquiatria como uma ‘psiquiatra crítica”, o que pode haver feito com que os editores do American Journal of Psychiatry ficassem ansiosos para rejeitar a sua submissão, Murray é conhecida como uma das principais autoridades em esquizofrenia no mundo. Como tal, é difícil imaginar como a carta que ele e seus colegas enviaram poderia ser rejeitada pelos editores do American Journal of Psychiatry.

Mas foi rejeitada, assim como a carta enviada por Moncrieff e Priebe.

Eu tenho que confessar, isso não deixou de me surpreender. A rejeição da carta de Murray revelou a corrupção institucional de uma forma demasiadamente rígida: que o senhor não critique nossas drogas. Pelo menos não nas páginas do American Journal of Psychiatry.

O American Journal of Psychiatry é publicado pela American Psychiatric Association. Como o site do jornal afirma, é a ‘publicação oficial’ da associação. O site se orgulha de que seja o jornal psiquiátrico mais lido no mundo.

Como tal, este é o jornal que talvez tenha o maior impacto em pensar sobre drogas psiquiátricas. No entanto, se você procurar a declaração da missão, você vê que o objetivo do jornal não é, de fato, fornecer uma revisão científica sobre os méritos das drogas psiquiátricas. Aqui está o que os editores escrevem: “O American Journal of Psychiatry está empenhado em manter o campo da psiquiatria vibrante e relevante, ao publicar os últimos avanços no diagnóstico e tratamento de doenças mentais”.

A revista está empenhada em “manter o campo da psiquiatria vibrante”, e fazê-lo contando “avanços no diagnóstico e tratamento de doenças mentais”. Sua missão declarada é promover os interesses da aliança da psiquiatria e, dessa perspectiva, faz todo o sentido que os editores tenham rejeitado a carta de Murray e também a de Moncrieff. A rejeição de tais críticas atende à missão declarada do jornal.

Eu li a declaração de missão do jornal ao escrever este blog, e isso foi um momento de um ‘aha’. Eu não tinha percebido antes que o American Journal of Psychiatry tinha confusamente confessado esse propósito da aliança, mas pelo menos agora sabemos, com essa rejeição da carta de Murray, que a proteção dos editores dessa missão é absoluta. Eles não darão espaço para a crítica, mesmo que venha de um dos psiquiatras mais conhecidos do mundo.

Ambos, Murray e Moncrieff deram ao Mad in Brasil permissão para imprimir as cartas enviadas ao American Journal of Psychiatry. Aqui estão elas:

A carta apresentada por Robin Murray e colegas

Não descarte os efeitos adversos dos antipsicóticos de longo prazo em estudos com animais.

Robin M Murray, Anthony C Vernon, Sridhar Natesan, Jim Van Os, David Taylor, Marta Di Forti

Existe um acordo quase universal de que os antipsicóticos são úteis nos cuidados agudos das pessoas com esquizofrenia e que muitos pacientes terão de continuar a toma-los por períodos prolongados. No entanto, evidências recentes indicam que uma proporção significativa de pacientes poderá eventualmente diminuir a medicação ao mínimo ou sair das drogas sem prejudicar a sua saúde mental (1).

Em sua revisão publicada on-line nesta revista (2), Goff e colegas minimizam os danos potenciais do uso ‘profilático’ de longo prazo de antipsicóticos. Por exemplo, eles minimizam a evidência formidável de que a maioria dos antipsicóticos de segunda geração aumentam o risco de obesidade e a síndrome metabólica com todas as suas consequências (3). Além disso, eles descartam os estudos que mostram que a administração de antipsicóticos induz a perda de volume cerebral em modelos de roedores (4) e primatas (5). Goff e colegas alegam que a relevância de tais descobertas “para o tratamento da psicose é incerta, tanto por diferenças relacionadas a espécies quanto por falta de fisiopatologia da esquizofrenia. É possível que os antipsicóticos tenham efeitos prejudiciais sobre o cérebro normal, mas há os efeitos de proteção, na presença de neuropatologia relacionada com a esquizofrenia. “ Esta explicação ignora a semelhança das alterações do cérebro induzida em animais aos observados nos pacientes, com antipsicóticos longo prazo (6) . Além disso, invoca a suposição extraordinária de que existe uma “neuropatologia relacionada à esquizofrenia” que responde ao bloqueio da dopamina D2 do modo oposto ao dos cérebros do restante da humanidade.

Goff e colegas apenas abordam brevemente a extensa evidência de que, em animais, a administração antipsicótica de longo prazo induz a supersensibilidade do receptor de dopamina D2. Eles ignoram os estudos detalhados de Seeman, Kapur e seus colegas (7,8), que observaram que a exposição antipsicótica em ratos e gatos induzem um aumento no número de receptores D2, e que a supersensibilidade da dopamina resultante faz com que os antipsicóticos percam a sua eficácia ao suprimirem a locomoção induzida por anfetaminas e resposta preventiva condicionada. Mais uma vez, Goff et al. evitam a conclusão óbvia de que o bloqueio da dopamina D2 provavelmente terá um efeito semelhante no cérebro humano. Além disso, eles falham em citar os relatórios recentes de que alguns agonistas dopaminérgicos parciais, como o aripiprazole, têm menor propensão a causar supersensibilidade da dopamina e, portanto, podem ter vantagens clínicas nesse sentido (9).

Na farmacologia, estudos em animais são considerados um indicador valioso do que esperar em termos dos efeitos de uma droga em humanos. Ao argumentar que aqueles entre nós que tratam pacientes com antipsicóticos não têm nada a aprender com estudos em animais, Goff et al parecem ter adotado o credo criacionista de que seres humanos e animais foram criados de maneira totalmente separada sem sobreposição de sistemas neurais. O psiquiatra competente terá uma visão mais equilibrada e trabalhará com seus pacientes para reduzir lentamente a dose de antipsicótico, ao nível mínimo compatível com a saúde mental contínua do paciente: em uma minoria, embora uma minoria importante, esse nível será zero.

Referências:

  1. Murray RM, Quattrone D, Natesan S, et al. Should psychiatrists be more cautious about the long-term prophylactic use of antipsychotics?Br J Psychiatry2016;
209, 361–365.
  2. Goff DC, Falkai P, Fleischhacker W, et al. The Long-Term effects of antipsychotic medication on clinical course in schizophrenia.Amer J Psychiatry, AJP in Advance (doi: 10.1176/appi.ajp.2017.16091016)
  3. De Hert M, Detraux J, van Winkel R et al. Metabolic and cardiovascular adverse effects associated with antipsychotic drugs.Nature Rev. Endocrinology, 2012, 8, 114-126
  4. Vernon AC, Crum WR, Lerch JP, et al. Reduced cortical volume and elevated astrocyte density in rats chronically treated with antipsychotic drugs – linking magnetic resonance imaging findings to cellular pathology.Biol Psychiatry2014; 75, 982–90.
  5. Dorph-Petersen KA, Pierri JN, Perel JM, et al. The influence of chronic exposure to antipsychotic medications on brain size before and after tissue fixation: a comparison of haloperidol and olanzapine in macaque monkeys.Neuropsychopharmacology2005; 30, 1649–61.
  6. Vita A, De Peri L, Deste G, et al. The effect of antipsychotic treatment on cortical gray matter changes in schizophrenia: does the class matter? A meta-analysis and meta-regression of longitudinal magnetic resonance imaging studies.Biol Psychiatry2015; 78, 403–12.
  7. Samaha AN, Seeman P, Stewart J et al ‘‘Breakthrough’’ dopamine supersensitivity during ongoing antipsychotic treatment leads to treatment failure over time.J Neurosci2007; 27: 2979–2986.
  8. Ginovart N, Wilson AA, Hussey D, et al. D2-receptor upregulation is dependent upon temporal course of D2-occupancy: a longitudinal 11C- raclopride PET study in cats.Neuropsychopharmacology2009; 34: 662–71.
  9. Tadokoro S, Okamura N, Sekine Y, et al. Chronic treatment with aripiprazole prevents development of dopamine supersensitivity and potentially supersensitivity psychosis.Schizophr Bull2012; 38: 1012–20.

Conflitos:

R.M.M., J.v.O., e DT receberam honorários como palestrantes das empresas farmacêuticas Janssen, Lilly, Otsuka, Servier e Lundbeck, e M.D.F. recebeu honorários da Janssen e Lundbeck. D.T. está nos seguintes conselhos consultivos: Servier, Lundbeck e Sunovion, e recebeu financiamento de pesquisa da Janssen, Lundbeck e BMS. A ACV recebeu financiamento de pesquisa da Roche.

A carta apresentada por Joanna Moncrieff e Stefan Priebe

Os pacientes merecem mais evidências

Uma resposta a “Os efeitos a longo prazo da medicação antipsicótica em processo clínico na esquizofrenia” por D.C. Goff, P. Falkai, W.W. Fleischhacker, R. R. Girgis, R.M. Kahn, H. Uchida, J. Zhao, J.A. Lieberman

O artigo recente de Goff et al. destaca que a relação risco-benefício total do tratamento antipsicótico de longo prazo permanece incerta (1). Todos os ensaios de tratamento a longo prazo envolvem a retirada do tratamento prévio, mas a retirada antipsicótica pode induzir sintomas psicóticos e aumentar o risco de recaída, assim, confundindo os resultados. Follow-ups em longo prazo e dados sobre outros resultados também são limitados. Apenas seis dos 65 ensaios na meta-análise de Leucht et al. de 2012 duraram mais de um ano (2). O único follow-up em longo prazo de uma coorte aleatória sugere que a redução antipsicótica gradual e apoiada pode levar a um melhor funcionamento social, sem aumento em longo prazo do risco de recaída, embora os números sejam pequenos (3).

Goff et al. referem evidências usando porcentagens e meios grupais, mas os médicos são confrontados com indivíduos. Mesmo ignorando os problemas com estudos existentes, os números necessários para tratar com antipsicóticos sugerem que os pacientes individuais são mais propensos a não se beneficiar do que beneficiar. Na revisão de Leucht et al, três pacientes precisam receber antipsicóticos de manutenção para que um paciente tenha menor chance de recaída atribuível ao tratamento. Como os médicos fornecem a evidência aos pacientes dessa situação? Como a possibilidade de efeitos positivos pode ser equilibrada com a probabilidade de efeitos adversos sérios e as indicações – mesmo que não confirmadas – de encolhimento cerebral, cognição prejudicada e menor funcionamento social?

As decisões dos pacientes serão influenciadas pelas probabilidades de diferentes resultados e por suas avaliações pessoais desses resultados. Um paciente pode aceitar o risco de rehospitalização em troca da maior chance de uma vida sexual satisfatória, por exemplo, e as avaliações podem, obviamente, mudar ao longo do tempo. O desafio para a pesquisa não é chegar a uma recomendação generalizada a favor ou contra o tratamento com antipsicóticos, mas fornecer evidências mais detalhadas para facilitar a escolha informada de pacientes individuais. Se os médicos apoiam os pacientes para tomar tais decisões, um relacionamento terapêutico mais aberto e confiável pode ser estabelecido, tornando menos provável que os pacientes interrompam a medicação por conta própria.

O Instituto Nacional de Pesquisa em Saúde (National Institute for Research in Health) do Reino Unido financiou o primeiro grande teste de redução e descontinuação antipsicótica gradual em pessoas com condições psicóticas recorrentes, que medirão o funcionamento social e a qualidade de vida, bem como a recaída (4). Isso poderá esclarecer algumas questões sobre o tratamento antipsicótico de longo prazo. Ainda são necessários mais estudos para diferentes grupos de pacientes para fornecer os dados que os pacientes e os médicos precisam para tomar decisões informadas e colaborativas.

Goff DC, et al. The Long-Term Effects of Antipsychotic Medication on Clinical Course in Schizophrenia. Am J Psychiatry 2017 May 5;appiajp201716091016.

  1. Leucht S, Tardy M, Komossa K, Heres S, Kissling W, Davis JM. Maintenance treatment with antipsychotic drugs for schizophrenia. Cochrane Database Syst Rev 2012;5:CD008016.
  2. Wunderink L, Nieboer RM, Wiersma D, Sytema S, Nienhuis FJ. Recovery in Remitted First-Episode Psychosis at 7 Years of Follow-up of an Early Dose Reduction/Discontinuation or Maintenance Treatment Strategy: Long-term Follow-up of a 2-Year Randomized Clinical Trial. JAMA Psychiatry 2013 70:913-20.
  3. RADAR trial ISRCTN (International Standard Randomised Controlled Trial Number) 2017 Feb 7. http://www.isrctn.com/ISRCTN90298520

Declaração de conflito de interesse:

Ambos os autores são investigadores num programa de investigação financiado pelo Instituto Nacional de Pesquisa em Saúde (National Institute for Health Research) do Reino Unido, intitulado Investigação sobre Descontinuação e Redução Antipsicótica (RADAR). Os detalhes são descritos no texto e uma referência ao registro de teste é fornecida.

Nenhum o autor tem conflitos de interesse financeiros.

 

O Pensador do Poder

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Neste ensaio, Aeon, Kolin Coopman exploram o impacto e o legado de Michel Foucault.

“Era um bio-poder exercido por psiquiatras e médicos que, no século 19, transformaram a homossexualidade em uma ‘perversão’ por causa da sua incapacidade para focar a atividade sexual em torno da família reprodutiva saudável. Teria sido improvável, se não impossível, conseguir isso por atos soberanos de coerção física direta. Muito mais eficazes foram os exércitos de médicos que ajudaram a endireitar seus pacientes para o seu próprio suposto auto-interesse. “

Foucault

O Conselho Federal de Psicologia (CFP) Reitera a sua Posição Histórica contra a Chamada Cura Gay. 

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O Conselho Federal de Psicologia (CFP) interpôs, na tarde desta quinta-feira (21/9), no Tribunal Regional Federal da 1ª Região, agravo de instrumento contra a liminar concedida parcialmente, em 15 de setembro, pelo juiz Waldemar Cláudio de Carvalho, da Seção Judiciária do Distrito Federal, relacionada à Resolução CFP 01/99.

Veja a matéria do ggn→

CFP

 

Pesquisa sobre Maconha: Superando as Barreiras

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Da APA Science Advocacy: Com um número crescente de estados nos EUA começando a legalizar o uso medicinal e / ou recreativo da maconha, é claro que é necessária mais pesquisa sobre os riscos e potenciais benefícios do medicamento. A American Psychological Association está trabalhando para uma legislação que remova algumas das principais barreiras que impedem os cientistas de buscar toda a pesquisa necessária para entender o impacto da maconha.

É hora que aqui no Brasil igualmente sejam derrubadas barreiras que impedem que tenhamos uma agenda positiva para que a ciência investigue os possíveis benefícios da maconha para a saúde.

Artigo →

Maconha

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