XVII Congresso Mundial de Psiquiatria, Berlim

Mesa-Redonda: "Retirada dos Psicotrópicos", com a presença de Laura Delano, nossa convidada no Seminário Internacional A Epidemia das Drogas Psiquiátricas

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fernando_foto_definitivaNos dias 8 a 12 de outubro, em Berlim, está ocorrendo o XVII Congresso Mundial de Psiquiatria. O tema geral é bastante sugestivo,  A Psiquiatria no Século XXI: Contexto, Controvérsias e Compromisso.

É com grande satisfação que tenho recebido mensagens de vários colegas da nossa comunidade do Mad – militantes do movimento de ex-usuários, profissionais de saúde mental e intelectuais, da Europa, Estados Unidos e Canadá – felizes por estarem indo à Berlin para participar desse Congresso; sobretudo para a mesa-redonda intitulada ‘Retirada dos Psicotrópicos”. Entre os palestrantes dessa mesa-redonda estão Peter Lehmann, quem irá coordenar, Laura Delano e Peter Gotzsche.  Laura estará entre nós daqui a duas semanas, para o nosso Seminário Internacional A Epidemia das Drogas Psiquiátricas, Causas, Danos e Alternativas.

Para que melhor se tenha uma ideia da problemática que será abordada em nosso Seminário, certamente é do interesse de todos – inscritos no Seminário e o público em geral – ter mais uma vez uma ideia do que hoje vem sendo discutido internacionalmente a respeito da problemática das drogas psiquiátricas. Em um blog anterior apresentei a experiência de Soteria, uma abordagem de tratamento de pessoas vivendo a experiência de surto ou de grave crise psicológica, que foi desenvolvida no início dos 70 nos Estados Unidos, cujas principais características é o tratamento dado primariamente por não-profissionais de saúde e sem uso (ou o mínimo indispensável) de drogas psiquiátricas. Seus resultados surpreendentes têm sido objeto do escrutínio científico há décadas. Infelizmente, aqui no Brasil muito pouco ainda se sabe a respeito de experiências como a de Soteria, o que tem contribuído para que a nossa assistência em saúde mental seja quase que absolutamente dependente do modelo biomédico da Medicina mental, assim como criado obstáculos incontornáveis para que a eficácia das abordagens de natureza psicossocial seja implementada.

O Mad in Brasil vem sistematicamente disponibilizado em suas páginas postagens à respeito dos danos das drogas psiquiátricas e diferentes iniciativas para interromper o seu uso de forma segura, viável e com o mínimo possível de sofrimento.  O debate ganha força internacional, e não é por acaso que o Congresso Mundial de Psiquiatria está dando espaço para a discussão dessas problemática.

É interessante se observar como foi desenhada essa mesa-redonda da qual a Laura Delano está participando. Por isso estou apresentando o seu programa, com tradução do resumo do que será colocado por cada palestrante. Mais importante do que a importância internacional dos palestrantes é ao meu ver o conteúdo do que cada um irá apresentar.

 

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Withdrawal from psychotropics (A Retirada dos Psicotrópicos)


11.10.2017 | 15:15 – 16:45 | Hall Berlin 1

Peter Lehmann, Berlin

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Leia o resumo:

Os medicamentos em psiquiatria, como na medicina geral, devem atingir uma síndrome específica para um período de tratamento definido, e devem ser reduzidos ou encerrados após algum tempo. Os pacientes podem preferir suporte não farmacológico para aliviar problemas mentais. No entanto, há uma falta de diretrizes sobre como reduzir a medicação e uma preocupação crescente de que medicamentos farmacêuticos podem causar sintomas de abstinência com diferentes graus de nocividade. Vemos um fosso crescente entre o conhecimento sobre os problemas de abstinência associados aos antidepressivos e neurolépticos e o suporte existente para a retirada.
Que conclusões podem ser extraídas? Quais formas de suporte, o da Internet incluído, já existentes? Quem está educando sobre estratégias de redução de risco para a retirada? As diretrizes de melhores práticas não deveriam exigir que os profissionais tentem rotineiramente retirar os pacientes das drogas psiquiátricas? Seria apropriado falar sobre a dependência física de antidepressivos e neurolépticos mesmo quando não há vício (craving)? Os pacientes a quem não são oferecidas oportunidades para reduzir ou retirar medicamentos psiquiátricos podem reclamar na justiça pelos danos sofridos?


Co-Chair

Andreas Heinz, Berlin


Speaker (palestrante)

Peter C. Gøtzsche, Copenhagen, Denmark

001 –International institute for psychiatric drug withdrawal

(Instituto Internacional para a Retirada das Drogas Psiquiátricas)

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Leia o Resumo

Em outubro de 2016, onze pessoas de sete países incluindo ex-pacientes, psiquiatras, psicólogos, terapeutas e cientistas, decidiram abrir um Instituto Internacional para a Retirada de Drogas Psiquiátricas, reconhecendo que muitos milhões de pacientes tornaram-se dependentes de drogas psiquiátricas e têm dificuldade em sair delas, o que leva a resultados pobres a longo prazo, com taxas crescentes de pensões por invalidez. É um dos maiores problemas de saúde que temos, mas muito pouco é feito para ajudar esses pacientes a reduzir suas drogas com segurança. Infelizmente, alguns profissionais de saúde acreditam que a dependência é apenas um problema com os benzodiazepínicos, embora tenha sido amplamente documentado que este também é um grande problema para outras classes de drogas psiquiátricas, por exemplo, também para antidepressivos e antipsicóticos. Pesquisa, educação e a criação de clínicas de retirada e linhas de ajuda são algumas das iniciativas que vamos realizar e apoiar em todo o mundo.


Speaker (palestrante)

Tom Bschor, Berlin

002 –Do antidepressants cause dependence? A comparison to benzodiazepines with special regard to withdrawal reactions

(Os antidepressivos causam dependência? Uma comparação com os benzodiazipínicos com especial atenção para as reações à retirada)

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Leia o resumo

Apenas cerca de 20 anos após a introdução no mercado, foi amplamente aceito que os benzodiazepínicos podem causar dependência. Além de outros sintomas, reações acentuadas de abstinência, muitas vezes obrigando o indivíduo a voltar a fazer uso da droga, ilustram o poder viciante dos benzodiazepínicos. Nos últimos 20 anos, ocorreu um aumento acentuado das prescrições de antidepressivos. Igualmente reações de abstinência severas ocorrem após a cessação dos antidepressivos, com muita frequência, mas não apenas, após o término dos ISRSs. Essas reações também impedem as tentativas de parar a medicação. Sendo uma característica distinta, os sintomas de abstinência não são simplesmente o retorno da depressão pré-tratamento. Uma característica é o seu desaparecimento imediato após a re-administração do antidepressivo.
Alguns especialistas argumentam que essas reações de retirada são indicativas da dependência aos antidepressivos. No entanto, a dependência é uma doença caracterizada por um conjunto de mudanças físicas e psicológicas. O que se segue pode ser observado em pacientes dependentes de benzodiazepina, mas não em pacientes com antidepressivos: ingestão para experimentar um efeito imediato; aumento da dose, tolerância e ingestão várias vezes ao dia; negligência progressiva de prazeres ou interesses alternativos, devido ao uso de substâncias psicoativas; maior quantidade de tempo necessário para obter ou armazenar o medicamento; formas ilegais de obter a droga (dificilmente existe qualquer mercado negro de antidepressivos).
Diagnosticar a dependência pela ocorrência de uma reação de retirada apenas ignoraria as dimensões psicológicas da dependência. Por isso, os antidepressivos geralmente causam sintomas de abstinência, mas geralmente não a dependência como a da benzodiazepina. Os antidepressivos têm uma latência de início do efeito desejado, que normalmente é uma desvantagem dessa classe de fármacos. No entanto, a falta de um efeito imediato dos antidepressivos é provavelmente o fator mais importante que evita a dependência.


Speaker (palestrante)

Volkmar Aderhold, Greifswald

003 –The withdrawal of neuroleptics: When to do so? How? When not to do so? What then?  

(A retirada dos neurolépticos: Quando fazer isso? Como? E quando não proceder dessa forma?)

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Leia o resumo

Objetivo

Estudos de longo prazo de pessoas que experimentam seus primeiros ou múltiplos episódios de psicose sugerem que entre 20% e 35% podem se retirar com sucesso dos neurolépticos no curto e longo prazos. Sob condições ideais de apoio social e orientação profissional, pode-se esperar uma maior proporção. Estudos de longo prazo da era pré-neuroléptica também apóiam essa conclusão.
Surpreendentemente, não há estudos de descontinuação nos 15-20% dos pacientes que não respondem aos neurolépticos.

Métodos

Avaliação de publicações conforme a pesquisa bibliográfica.
Experiência clínica.

Resultados / Discussão

As tentativas guiadas de antecipação da retirada são benéficas devido às alterações cerebrais adversas causadas por neurolépticos e também servem para atingir a menor dose possível. <BR> A não conformidade aos neurolépticos é consistentemente alta (entre 50% e 75%). Isso geralmente é uma reação a fortes efeitos colaterais e baixa eficácia, e tende a resultar em tentativas de retirada profissionalmente não guiadas e, muitas vezes, perigosas. O que é necessário, portanto, é o desenvolvimento de uma prática cooperativa de redução e retirada, de modo a não deixar pessoas e familiares afetados por conta própria, expostos a altos riscos assim como a tensões físicas e psicológicas. Precisamos de equipes de pacientes ambulatoriais multiprofissionais, incluindo especialistas com experiência e ex-pacientes, que tenham a habilidade para ajudar as pessoas a reduzir / retirar, além de outras práticas psicoterapêuticas efetivas. <BR> Previsores positivos de retirada bem-sucedida nos poucos estudos existentes podem nos ajude a julgar a viabilidade de retirada / redução. O apoio social é um dos preditores centrais. Além disso, os preditores negativos, bem como as contra-indicações para a retirada, podem ser identificados. <BR> Dúvidas que precisam de esclarecimentos, bem como as etapas recomendadas na preparação de uma tentativa de retirada, serão apresentadas Em seguida, será descrito um procedimento de redução, bem como fenômenos que podem ocorrer ao se reduzir / retirar os neurolépticos. Através dessa prática, podemos aprender mais sobre as diferentes estratégias farmacológicas necessárias para o tratamento da síndrome muito heterogênea (em causa e curso) chamada “esquizofrenia” e desenvolver a melhor cooperação possível com todos os afetados.


Speaker (palestrante)

Laura Delano, Medford, MA, USA

004 –Start low, go slow – bridging the divide between the lack of clinical research on safe psychiatric drug withdrawal protocols and the growing evidence base of successful tapering methodologies by users of psychiatric drugs  

(Comece lentamente, avance devagar – colmatando o fosso entre a pesquisa clínica sobre protocolos seguros de retirada de drogas psiquiátricas e a crescente base de evidências de metodologias de redução bem sucedida criadas por usuários de drogas psiquiátricas.)

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Leia o resumo

Os usuários de drogas psiquiátricas estão desenvolvendo sofisticados protocolos de redução gradativa de drogas psiquiátricas que estão produzindo resultados positivos – inclusive entre aqueles que estiveram em várias drogas por muitos anos. Esta apresentação elucidará essa base de evidências anedóticas crescentes, ricas, mas não reconhecidas “oficialmente”, de metodologias de redução gradativa, para provocar uma conversa sobre como poderemos criar pontes entre aqueles que vieram de drogas psiquiátricas e ajudaram outras pessoas a fazê-lo de forma segura e exitosa e os profissionais psiquiatras.