Dra. Birgitta Alakare, diretora médica do Programa Diálogo-Aberto (Open Dialogue), em Western Lapland, na Finlândia, apresenta como é possível tratar da esquizofrenia e das psicoses em geral, sem antipsicóticos, particularmente nos primeiros episódios agudos. A experiência finlandesa é a que de longe obtém os melhores resultados em todo o mundo ocidental.
O Mad in Brasil, dando sequência às postagens com o resumo das palestras apresentadas no Simpósio Científico: Drogas Psiquiátricas – riscos e alternativas -, que ocorreu na cidade de Gotemburgo, na Suécia, em 15 de outubro de 2016, apresenta agora a intervenção de Birgitta Alakare.
Há 30 anos Birgitta é a coordenadora médica do Programa do Diálogo-Aberto (Open-Dialogue).
No começo, no Hospital de Laplande, ela lembra, a sua população era de esquizofrênicos crônicos, a maioria de pacientes fortemente medicados. Os antipsicóticos eram muito usados, que era o protocolo para os psiquiatras fazerem; no mínimo, dois diferentes a cada vez. Evidentemente que eram muitos os efeitos colaterais, e para que fossem atenuados os sintomas, cada vez mais medicamentos se faziam necessários.
A questão do diagnóstico? Ela reconhece que após 30 anos de experiência enquanto médica ainda não sabe o que é um diagnóstico ‘correto’ – quando ela se encontra com um paciente. E mesmo quando sabe qual é o diagnóstico, como estar segura de que tratamento e qual é a medicação mais adequada?
E quando se encontra com os pacientes, ela diz não poder deixar de admitir que os diagnósticos mudam todo o tempo. Isto porque os diagnósticos mudam quando se está em relações com os pacientes. O que significa que são as relações que constroem o chamado ‘diagnóstico psiquiátrico’.
Como ocorre na psiquiatria tradicional?
Nela, o psiquiatra é um tipo de autoridade, ele é uma autoridade médica. Por conseguinte, ninguém questiona as suas recomendações ou as suas prescrições.
A medicação e a sua necessidade não são objeto de discussão com os outros. Tal quadro ilustra bem isso:
Medicação Psiquiátrica:
O paciente, a família e os outros profissionais:
- Espera-se por um milagre
- Há os medos
- O tratamento pode se tornar apenas ajustar a medicação.
A família, o paciente e outras pessoas próximas ao paciente, incluindo os outros membros da equipe e profissionais, todos confiam no médico. Mas eles também têm muitos tipos de medos, e também uma certa esperança por um milagre que a medicação possa ajudar: a medicação a fazer milagres.
Os psiquiatras prescrevem a medicação de acordo com o seu próprio treinamento, essa é a regra geral.
Consequentemente, os medicamentos não são integrados ao processo de tratamento como um todo.
Mas na prática, os medicamentos são apenas uma parte – diferente e separada do tratamento.
E quando se prescreve medicamento no início, o que ocorre é que a medicação passa a se tornar o aspecto mais importante durante todo o processo de tratamento.
O foco passa a ser:
Como a medicação afeta? A dosagem é suficiente? Deve-se aumentar ou diminuir a dosagem?
Todas as pessoas ficam a olhar para ver se os sintomas desapareceram.
Assim sendo, a medicação pode ser a única discussão.
Isso é inevitável: quando a medicação é prescrita no começo do tratamento
E o que está ocorrendo na vida real? Muito pouco se sabe, não é mesmo? – ela nos indaga.
Na experiência na Finlândia, eles começaram a reforma do seu sistema de assistência com as assim chamadas ‘reuniões de tratamento’; isso foi em 1984. E um detalhe que irá fazer a diferença: a medicação fazia parte do discutido nessas reuniões.
Com o que aprenderam com o processo: há um avanço, ao se evitar o uso de medicação com antipsicóticos durante as duas primeiras semanas do processo agudo psicótico. Resumindo o que passa a ser experimentado entre 1992-1993:
No Projeto de 1992-1993:
- Evitar a hospitalização
- Evitar o uso de medicação neuroléptica no início (durante as 2 semanas)
O surpreendente para todos os membros da equipe é que a demanda por neurolépticos não foi tão grande quanto era o esperado, graças à maneira como começaram a trabalhar.
O projeto foi um estudo de nível nacional (Finlândia), mas eles continuaram a fazê-lo em Western Lapland até 1997.
Birgitte apresenta vários estudos de follow-up. Esses estudos serão apresentados por Mad in Brasil em uma postagem onde iremos apresentar com mais detalhes em que consiste a abordagem do Diálogo Aberto.
Birgitte reconhece que durante muito tempo prescreveu antipsicóticos e a hospitalização. Mas essa experiência era muito frustrante para ela enquanto médica assim como para a equipe.
Ela fala das recaídas.
O que é dito pela indústria farmacêutica? Que o indivíduo não pode interromper o tratamento medicamentoso, senão terá recaídas.
E o que é uma recaída? É uma nova crise, ela sublinha. Evidentemente que todo mundo pode ter uma nova crise em suas vidas. Se alguém foi deprimido num momento do passado e depois tem uma nova depressão, então ele/ela está em crise.
Birgitte apresenta os principais elementos da abordagem do Diálogo Aberto. A saber:
Princípios do Diálogo Aberto:
- Ajuda imediata (há algo decisivo nas vidas das pessoas a espera de ajuda)
- Rede Social (explorando os recursos disponíveis, os seus saberes dos atores)
- Flexibilidade e mobilidade (ver os pacientes em suas residências e em seu meio social)
- Responsabilidade (o mesmo médico acompanha todo o processo de tratamento, quando há vários há muitas medicações prescritas inevitavelmente)
- Continuidade psicológica (a equipe acompanha todo o processo)
- Tolerância à incerteza (as dúvidas, o reconhecimento que há uma construção coletiva, que não se tem de antemão as soluções)
- Diálogo (tudo é discutido juntos, inclusive a própria medicação).
Com esses princípios, na prática clínica a necessidade por medicamentos diminui muito significativamente. Quando a medicação é prescrita, é importante discuti-la, e ainda avaliá-la e garantir meios para interrompe-la. E todos discutem a medicação.
Quando necessária, em geral a medicação é um ansiolítico, e no começo do tratamento. E sempre que qualquer medicação psiquiátrica é usada, sempre em baixas doses – e por um período curto. Nenhum psiquiatra está autorizado a se encontrar sozinho com o paciente. O psiquiatra faz parte, é membro da equipe específica para o caso, o que torna mais fácil enfrentar o problema da medicação.
Como abandonar a medicação?
Abandonar a medicação:
- As medicações psiquiátricas afetam muitos receptores no cérebro.
- O cérebro é sábio e flexível: adaptação.
- Um grande aumento nos receptores com relação ao que havia antes da medicação.
- Interrupção de antipsicóticos = ‘tempestade no cérebro’. Alucinações, entre outras, como uma das consequências da interrupção. Mas isso não é recaída.
- Diminuir lentamente a medicação para que assim o cérebro possa se adaptar.
- Esse processo pode chegar mesmo de dois a quatro anos.
Birgitta Alakare tem publicados vários artigos em periódicos científicos. Mas recomendamos o que ela escreve nesse livro:
PARABÉNS A TODOS ENVOLVIDOS NESTE PROJETO….. ME FEZ RELEMBRAR VARIAS EXPERIENCIAS COM PACIENTES EM ATENDIMENTO NO CAPS..ALGUNS QUE LÁ ESTAVAM E OUTROS QUE CHEGAVAM PARA O ACOLHIMENTO………..ME FEZ LEMBRAR DA LUTA ANTI-MANICOMIAL DA ITÁLIA..E FINALMENTE DA NOSSA LUTA DIÁRIA AQUI NO BRASIL….POR UMA SOCIEDADE MAIS HUMANA E SEM MANICÔMIOS…