Um artigo recente publicado na revista BMC Psychiatry explora os resultados para usuários de serviços de um programa de diálogo aberto em pequena escala implementado dentro do Serviço Nacional de Saúde (NHS) do Reino Unido. As medidas tomadas, incluindo questionários de auto-relato e questionários preenchidos pelos membros do sistema de apoio social e pelos clínicos, encontraram melhorias em todas as áreas de bem-estar, funcionamento social, satisfação do serviço e muito mais.
“DAP [Diálogo Aberto Apoiado por Pares] é a capacitação do usuário do serviço e adota uma abordagem de rede social que reúne a rede social e profissional. Isto cria um espaço onde os usuários dos serviços e sua rede encontram palavras para as suas experiências. O objetivo da prática dialógica no Open Dialogue é ouvir e responder ativamente, gerando diálogo entre todos os participantes. Isto é diferente dos tratamentos tradicionais, onde métodos ou intervenções são planejados para um diagnóstico específico para reduzir sintomas ou mudar o pensamento.
Nas reuniões da rede, os clínicos refletem entre si na presença do usuário do serviço e sua rede, geralmente familiares, com o objetivo de dar sentido à crise. As decisões de tratamento são tomadas por todos os participantes com o objetivo expresso de evitar um planejamento apressado do tratamento. O DAP é integrativo e inerentemente democrático com uma tomada de decisão transparente”, explicam os autores.
Diálogo Aberto (DA) como uma abordagem alternativa ao tratamento de problemas de saúde mental, particularmente psicose do primeiro episódio, tem sido sugerida como uma alternativa promissora ao tratamento pesado de medicamentos. Para os não iniciados, DA é um modelo de prática originado na Finlândia que enfatiza a dignidade da pessoa, uma orientação comunitária holística, e um diálogo e tomada de decisão compartilhada entre usuários de serviços, membros da comunidade, tais como família/amigos, e profissionais da saúde mental.
O Diálogo Aberto expandiu-se além das fronteiras da Finlândia na última década, inspirando iniciativas alinhadas de forma similar em Nova York, Vermont e muitos outros lugares.
O artigo atual fornece uma visão geral de uma replicação do programa de Diálogo Aberto dentro do Serviço Nacional de Saúde da Inglaterra, chamado “Diálogo Aberto Apoiado por Pares” (DAP). Embora aderindo aos princípios centrais do Diálogo Aberto, o DAP também inclui pessoal treinado de apoio composto por pares.
Os autores observam que a pesquisa existente sobre os resultados do Diálogo Aberto é amplamente qualitativa, com apenas seis estudos quantitativos sendo realizados ao longo dos anos. Quatro deles foram feitos pelos criadores do DA. Além disso, muitos dos estudos sobre DA não seguem estritamente o protocolo original e têm critérios de inclusão variáveis, tornando difícil uma avaliação geral. Eles afirmam que é necessária uma pesquisa mais rigorosa sobre a eficácia de DA.
O objetivo do estudo atual era examinar a eficácia dos resultados do DAP ao longo de seis meses para usuários de serviços, assim como para a família e redes sociais. Foram coletadas informações por meio de questionários relacionados a resultados clínicos, bem-estar, impacto na rotina diária e rede de apoio familiar/social.
Cinqüenta indivíduos participaram do estudo – uma mistura de usuários de serviços, membros de redes sociais e clínicos. Eles foram solicitados a completar questionários baseados em resultados antes de iniciar o tratamento DAP, no prazo de três meses de tratamento, e finalmente no prazo de seis meses de tratamento.
54% dos participantes eram homens, e 94% eram brancos britânicos. O programa de tratamento foi realizado na área rural de Kent, no sudeste da Inglaterra.
Todo o pessoal envolvido no DAP foi submetido a um curso de treinamento de um ano na modalidade.
Todos os participantes completaram as medidas de base iniciais, 80% completaram as medidas de três meses e 74% completaram as medidas de seis meses.
Uma medida de bem-estar mental encontrou uma melhoria em relação à linha de base na marca de três meses, com uma ligeira redução na marca de seis meses, mas ainda assim maior do que a linha de base.
A funcionalidade auto-relatada relacionada ao trabalho e às atividades sociais continuou a melhorar durante todo o programa de tratamento. Além disso, uma medida que examina “saúde e funcionamento social” encontrou uma melhoria significativa entre a linha de base e o ponto de seis meses.
Em termos de emprego e educação, na linha de base, 22% dos participantes estavam empregados em tempo integral, e 12% eram estudantes em tempo integral. Após seis meses, 30% estavam empregados, e 18% estavam na escola.
Outra medida constatou que houve redução da “gravidade dos sintomas relatados pelo médico” da linha de base para o ponto de referência de seis meses, indicando uma melhora na angústia mental ao longo do tratamento.
Uma medida que avaliou a satisfação com os cuidados recebidos pelo programa do NHS descobriu que aqueles associados ao DAP indicavam uma pontuação média de 9,19, enquanto a pontuação média nacional de 2017 para o NHS era 7,03. Houve um aumento relatado nesta satisfação entre a linha de base e os pontos de seis meses.
Como outro ponto de interesse, mais da metade das reuniões da rede, onde os usuários do serviço se reuniram com a equipe do DAP para dialogar sobre sua experiência e decidir mutuamente sobre ações futuras, foram atendidos por cuidadores – seus cônjuges, pais, amigos, filhos adultos, outros parentes, irmãos, e muito mais.
Em resumo, todas as medidas tomadas mostraram uma melhoria significativa em todo o programa DAP, e os usuários dos serviços que participaram expressaram uma satisfação maior do que a média com os cuidados que receberam:
“As experiências dos usuários do Serviço Nacional de Saúde são medidas a cada ano usando a Pesquisa de Saúde Mental da Comunidade CQC. Nossas observações das pontuações mostram que os usuários do serviço classificaram o serviço DAP mais positivamente do que outros dados locais e nacionais e sugerem que esta abordagem pode abordar algumas questões pendentes com os serviços de saúde mental em torno da satisfação do usuário do serviço”.
Os autores observaram desafios em torno da implementação do programa DAP dentro do sistema NHS mais amplo, que não opera de acordo com os princípios ou práticas do Diálogo Aberto.
Eles concluem:
“Uma resposta flexível e em rede social ao atendimento de crises que inclui trabalhadores de apoio entre pares como um componente chave do atendimento, o DAP, com a continuidade dos mesmos clínicos do DAP construindo uma memória compartilhada do sofrimento de uma família ao longo do atendimento, representa uma abordagem significativamente diferente do atendimento à saúde mental no Reino Unido.
Os resultados clínicos foram consistentes entre o bem-estar mental e o ajuste trabalho/social (auto-relatados) e os escores HoNOS (relatados pelos clínicos) e mostraram que esta abordagem é clinicamente eficaz com melhorias significativas em todas as medidas. Como tal, este estudo evidenciando resultados clínicos e satisfação dos usuários dos serviços e de suas famílias apóia a necessidade de uma pesquisa de ensaios de controle randomizado em escala real a nível nacional e é um bom augúrio para suas descobertas”.
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Kinane, C., Osborne, J., Ishaq, Y., Colman, M., & MacInnes, D. (2022). Peer supported Open Dialogue in the National Health Service: Implementing and evaluating a new approach to mental health care. BMC Psychiatry, 22(1), 138. (Link)
[trad. Fernando Freitas]