Impactos Psicológicos e Intervenções Possíveis na Pandemia de COVID-19

A saúde mental e psicológica da população e profissionais de saúde tendem a ser ignoradas em situações de emergência, como a que estamos vivendo. Por isso, o artigo se propõem a trabalhar possibilidades de intervenção psicológica durante a pandemia de coronavírus

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A pandemia do coronavírus (COVID-19) é a maior emergência de saúde pública, e a mais severa síndrome respiratória, desde a chamada gripe espanhola, em 1918. A saúde física da população preocupa a comunidade internacional, mas também é necessária a atenção com a saúde psicológica, que tendem a ser negligenciadas ou subestimadas nessas ocasiões.

Levando em consideração esse panorama, o artigo de Schmidt at. al., Impactos na Saúde Mental e Intervenções Psicológicas Diante da Pandemia do Novo Coronavírus (COVID-19), realizou uma revisão da literatura técnico-científica, produzida em diferentes países, para sintetizar o que foi relatado até agora sobre o assunto. A importância da discussão se baseia na necessidade de cobrir lacunas no combate ao Coronavírus, principalmente, porque os impactos psicológicos podem ser mais duradouros e prevalentes que o próprio acometimento pela COVID-19.

“Estudos têm sugerido que o medo de ser infectado por um vírus potencialmente fatal, de rápida disseminação, cujas origens, natureza e curso ainda são pouco conhecidos, acaba por afetar o bem-estar psicológico de muitas pessoas (Asmundson & Taylor, 2020; Carvalho et al., 2020).”

Sintomas de depressão, ansiedade e estresse já são identificados diante da pandemia na população em geral, de maneira especial, nos profissionais da saúde. Além disso, em alguns países, como Coreia do Sul e índia, já foram identificados casos de suicídios ligados aos impactos psicológicos da COVID- 19.

No entanto, os impactos psicológicos não estão apenas diretamente relacionados à COVID-19, mas também, se relacionam com as medidas de contenção da pandemia. A literatura vem identificando efeitos negativos, como sintomas de estresse pós-traumático, confusão e raiva. Preocupações com escassez de suprimentos e as perdas financeiras, também são identificados como prejuízos ao bem- estar psicológico. Nesse contexto, ainda há a tendência no aumento de estigmas sociais e descriminação a alguns grupos específicos, como os chineses, grupo primeiramente infectado pelo COVID-19.

Desse modo, fica nítida a necessidade de intervenções psicológicas no contexto de pandemia. Algumas práticas exitosas têm sido descritas em estudos recentes, principalmente no continente asiático. Recomenda-se que as intervenções psicológicas cara a cara sejam restritas ao mínimo possível, para diminuir as chances de propagação do vírus. Portanto, sugere-se intervenções via internet, telefone e até cartas.

Para a população em geral, a literatura apontou algumas iniciativas de psicoeducação, como cartilhas e outros materiais informativos; canais de escuta psicológica, para que as pessoas possam aliviar suas emoções negativas via telefone ou através de plataformas online, 24 horas por dia e sete dias na semana; atendimento psicológico por meio de cartas estruturadas, em que o usuário do serviço se apresenta, descreve suas principais emoções e queixas, e as razões delas; atendimento psicológico online ou, quando comprovadamente necessários, presenciais. Para aqueles que experimentam sofrimentos mais severos, intervenções mais intensivas passam a ser necessárias. Sempre que necessário, as pessoas devem ser encaminhados para outros profissionais de saúde.

“Levantamentos online também têm sido realizados para melhor compreender o estado de saúde mental da população diante da COVID-19, com o objetivo de identificar rapidamente casos com maior risco e ofertar intervenções psicológicas alinhadas às demandas.”

Os profissionais de saúde também merecem atenção especial durante a quarentena, são eles que muitas vezes irão oferecer apoio psicológico, escutando as queixas daqueles que buscam o serviço de saúde e daqueles que estão hospitalizados, além de vivenciarem o medo de se infectarem e o isolamento da família e do seu círculo social, além do estresse pela falta de material nos hospitais. Os psicólogos podem ajudar oferecendo suporte e orientação no manejo de determinadas situações; orientação sobre sintomas psicológicos que eles podem vir a ter nesse contexto (ex.:estresse, ansiedade, insônia); estratégias de enfrentamento e autocuidado (ex.: importância dos momentos de descanso); fortalecimento das redes de apoio desses profissionais (contato frequente com familiares, amigos).

Em alguns lugares foi proposto a classificação das pessoas e grupos afetados pelo coronavírus, para estabelecer prioridade na oferta de intervenção. A Comissão Nacional de Saúde da China propôs uma classificação em quatro níveis: (1) Casos mais vulneráveis a problemas de saúde mental, como pessoas hospitalizadas com infecção confirmada e profissionais da saúde que trabalhem ou não na linha de frente; (2) Pessoas isoladas com sintomas leves, suspeitas de infecção ou em contato próximo com casos confirmados; pessoas com sintomas como febre; (3) Pessoas em contato próximo com casos descritos nos níveis 1 e 2, ou seja, familiares, amigos e colegas; equipes de resgate que participem de ações de resposta à COVID-19; (4) Pessoas afetadas pelas medidas de prevenção e controle, grupos suscetíveis e população geral.

Os autores concluem que a Psicologia pode contribuir de maneira relevante com o enfrentamento das repercussões do COVID-19, tanto durante a pandemia, como posteriormente, quando as pessoas precisarão se readaptar e lidar com perdas e transformações. Além disso, sugerem o levantamento sobre os impactos na saúde mental dos brasileiros diante da pandemia, considerando as diferenças socioeconômicas e culturais do Brasil em relação aos outros países pesquisados, a fim de elaborar intervenções mais efetivas para a população desse país continental e tão desigual.

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SCHMIDT, et al. Impactos na Saúde Mental e Intervenções Psicológicas Diante da Pandemia do Novo Coronavírus (COVID – 19). SciELO Preprints, 2020. (Link)