Um importante estudo que procurou investigar o que pesquisadores e profissionais da área pensam sobre os psicofármacos no cuidado em Saúde Mental. O artigo que saiu na revista internacional Journal of Critical Psychology, Counselling and Psychotherapy investigou profissionais dos cinco continentes do planeta e foi resultado de uma parceria entre o Laboratório de Estudos e Pesquisas em Saúde Mental e Atenção Psicossocial (LAPS) e o Centro de Estudos Estratégicos (CEE), ambos da FIOCRUZ.
O que motivou a pesquisa foi o crescente número de pessoa no Brasil e no mundo que consomem alguma categoria de droga psiquiátrica, bem como a dificuldade que estas mesmas pessoas, e os próprios médicos, sentem em realizar a descontinuação farmacológica. Como bem-sabido, a retirada da dose psicofármacos em uso pode ser um processo muito difícil de ser suportado pelos usuários, especialmente devido aos sintomas de abstinência e a falta de tecnologias para que essa descontinuação seja realizada de maneira segura. A indústria farmacêutica não disponibiliza doses personalizadas ou com variações que permitam um processo de redução lento e gradual para evitar que o sofrimento com sintomas de abstinência seja o mínimo possível.
O método empregado foi um questionário ‘online’, com 10 perguntas objetivas, enviado para o endereço de correio eletrônico de autores de publicações científicas sobre o tema. Foram enviados convites da pesquisa para 14. 981 ‘e-mails’, dos quais foram obtidas 384 respostas válidas. A amostra consistiu em 318 questionários totalmente respondidos, o que significa um nível de confiança de 95%, com margem de erro de 5%.
O questionário foi estruturado em duas partes. O primeiro qualificou os respondentes de acordo com seu nível de conhecimento sobre o assunto (‘Bom’, ‘Algum’ ou ‘Nenhum’ conhecimento). Foram excluídos da investigação aqueles que responderam não ter ‘Nenhum’ conhecimento. Na segunda parte da pesquisa, respondentes com ‘Algum’ ou com um ‘Bom’ conhecimento passaram para as demais 9 perguntas do questionário. As respostas eram restritas a “Concordo”, “Discordo” ou “Não sei”.
A ocorrência de sintomas relacionados à retirada dos psicofármacos foi reconhecida pela maioria dos respondentes, bem como a controvérsia sobre a eficácia do tratamento psicofarmacológico. A maioria dos respondentes também concordou sobre a necessidade de proporcionar a descontinuação personalizada das drogas psiquiátricas, respeitando cada características e necessidades individuais e permitindo, assim, uma maior oportunidade de sucesso no procedimento.
“A literatura científica e a experiência de vida dos usuários indicam que quanto mais tempo os indivíduos usam uma droga psiquiátrica, é maior a probabilidade de graves sintomas de abstinência (M. Harrow et al., 2012; M. Harrow & Jobe, 2013; Martin Harrow & Jobe, 2007; Moncrieff, 2006). A maioria dos entrevistados concordou com esta posição.”
Apesar da crescente pesquisa e da abundante quantidade de relatos de experiências de vida de ex-usuários de medicamentos psiquiátricos sobre a dependência química e os sintomas de abstinência, a maioria dos entrevistados (a Academia) disse não ter conhecimento sobre a problemática de abstinência dos medicamentos. No entanto, a maioria concordou sobre a importância da retirada das drogas psiquiátricas para o bem-estar do paciente, isso significa que há o reconhecimento dos efeitos dessa retirada, demandando uma assistência adequada durante o processo.
Os resultados do estudo sugerem a importância de se desenvolver tecnologias para garantir a disponibilidade de medicamentos psiquiátricos em doses adequadas, para assim permitir haver a descontinuação sob medida às singularidades de cada usuário.
***
FREITAS, F., MOTA, F., BRAGA L.A.M. and GOMES, Camila M. Attitudes of researchers
concerning discontinuation of psychopharmacological treatment. Journal of Critical Psychology, Counselling and Psychotherapy, Vol. 20, No. 4, 55-65. (link).