A FORMAÇÃO DO CAMPO ARTÍSTICO –CULTURAL

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A Formação do campo artístico-cultura a partir do campo da assistência psiquiátrica

Graças ao processo da reforma psiquiátrica, no Brasil vem sendo formado um campo de atividades artístico-culturais com condições estruturais que apontam para a sua autonomia com relação ao próprio campo psiquiátrico aonde tais atividades têm a sua origem.  É isso o que é revelado pelos pesquisadores do Laboratório de Estudos e Pesquisa em Saúde Mental e Atenção Psicossocial. O conteúdo dessa pesquisa é animador para a perspectiva que aponta para a superação da condição existencial de ‘doente mental’ daqueles que fazem uso do sistema de assistência. A problemática do reconhecimento e suas vicissitudes é o foco.

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Desde os tempos de Pinel, é comum o emprego de meios artísticos e culturais para as finalidades da instituição psiquiátrica. Seja para acalmar ou simplesmente para enfrentar o ócio.  Quando não, para confirmar hipóteses de diagnóstico, o psiquiátrico propriamente dito; ou também, para que sejam confirmadas as hipóteses de uma determinada escola doutrinária da psicologia.  Ainda hoje não são pouco frequentes as exibições públicas oferecidas pelas instituições psiquiátricas em geral, nas quais seus pacientes expõem os produtos preparados durante semanas ou meses em seus espaços terapêuticos, como oficinas de musicoterapia, pintura, artesanato e etc. A novidade, captada pelo olhar atento dos pesquisadores, é que na medida em que tais atividades artísticas e culturais não são reduzidas à racionalidade instrumental de serem meios para fins supostamente terapêuticos, as pessoas ganham condições para se tornar ‘sujeito’ de fato , passam a se expressar pela via dos meios a elas disponibilizados, produzindo uma nova subjetivação de si próprias. E conseguem encontrar um lugar social alternativo ao papel social de doente mental. E passam a ser pessoas com condições políticas mais favoráveis para a lutar por direitos sociais até então negados.

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A metodologia empregada na pesquisa foi qualitativa. As atividades artístico-culturais abordadas ocorreram no período de 2007 e 2010. Por meio de entrevistas semiestruturadas com usuários-artistas e profissionais de saúde – enquanto autores dessas atividades -, assim como com a observação participante em diversos eventos culturais e artísticos ocorridos nesse período em diversas regiões do país, os pesquisadores demonstram, através dessas ‘experiências-exemplares’, ser estruturalmente possível a criação de um campo artístico-cultural onde os critérios do que é arte e o que é cultura sejam os parâmetros de base para o reconhecimento dos seus autores.

Os autores tomam com referência teórica um conjunto de contribuições da filosofia e das ciências sociais, em particular o pensamento de Axel Honneth e Pierre Bourdieu, articulando os conceitos de ‘reconhecimento’, ‘autonomia’ e ‘campo social’.

Nas conclusões do artigo, os autores chamam a nossa atenção para a necessidade de que os critérios normativos da ‘desinstitucionalização’ sejam objetivados em termos de ‘autonomia’ e ‘auto realização’. O que sabemos ser algo que vai contra a corrente do processo de ‘medicalização’ da vida cotidiana dominante em nossa sociedade dos tempos atuais.

Amarante, Paulo; Freitas, Fernando; Pande, Mariana Rangel; Nabuco, Edvaldo. “El campo artístico-cultural en la reforma psiquiátrica brasileña: el paradigma identitario del reconocimiento.” Salud colectiva,  Lanús ,  v. 9, n. 3, p. 287-299, dic.  2013 . 

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