Pacientes com Esquizofrenia Mostram Melhor Funcionamento Laboral Quando Fora de Antipsicóticos

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bernalyn ruizUtilizando dados do Chicago Follow-up Study, durante 20 anos pesquisadores acompanharam 139 pacientes que no começo do estudo haviam sido diagnosticados como psicóticos. Publicado em Psychiatry Research, o estudo relata que, embora os antipsicóticos tenham sido benéficos durante as internações agudas, durante o follow-up os pacientes sem antipsicóticos tiveram um funcionamento bem melhor do que aqueles que estavam fazendo uso de antipsicóticos.

“Evidências negativas sobre a eficácia em longo prazo dos antipsicóticos têm aparecido em nossos próprios estudos longitudinais e nos estudos longitudinais de Wunderink, de Moilanen, Jääskeläinena e colegas usando dados do estudo do Northern Finland Birth Cohort Study, dados das pesquisas dinamarquesas da OPUS, o estudo De Lincoln e Jung na Alemanha, e os estudos de Bland no Canadá (…) Esses estudos longitudinais não têm apresentado efeitos positivos para pacientes em uso de antipsicóticos em longo prazo para a esquizofrenia. Além dos resultados que indicam a raridade de períodos de recuperação completa por intervalos de tempo prolongados para pacientes com antipsicóticos, nossa pesquisa indicou uma taxa significativamente maior de períodos de recuperação para pacientes com esquizofrenia que estiveram fora dos antipsicóticos por intervalos prolongados “.

 Trabalho

Os autores deste estudo chamam a atenção para pesquisas anteriores que apontaram a falta de evidência sobre a eficácia dos antipsicóticos após 3 anos de uso. O artigo de Martin Harrow e colegas faz referência a uma pesquisa anterior que foi apresentada no estudo dinamarquês OPUS que demonstrou melhor funcionamento e maiores taxas de emprego em pacientes fora dos antipsicóticos, ao longo de dez anos.

Os autores deste estudo longitudinal que aqui estamos apresentando objetivaram medir o funcionamento do trabalho em pacientes com esquizofrenia submetidos a tratamento em longo prazo com antipsicótico em comparação com pacientes com esquizofrenia e sem antipsicóticos;  tomando como controle os parâmetros: a gravidade dos ‘sintomas’ e ‘situações pré-mórbidas’.

Utilizando dados do Chicago Follow-up Study, um estudo que examinou o funcionamento, o processo e a recuperação em distúrbios psicóticos, 139 pacientes – (esquizofrenia psicótica, n = 70); amostra de controle (transtorno de humor psicótico) n= 69) – foram acompanhados ao longo de um período de 20 anos de duração. Os pacientes foram recrutados e avaliados inicialmente durante a fase aguda da hospitalização, e seguidos aos 2 anos, 4 ½ anos, 7 ½  anos, 10 anos, 15 anos e 20 anos.

Dos 70 pacientes classificados com esquizofrenia, 58 foram acompanhados no período de 20 anos, 30 foram avaliados em todos os 6 seguimentos (2, 4 ½ , 7 ½ , 10, 15 e 20 anos) e 32 foram avaliados em 5 períodos. Dois pacientes foram avaliados em 4 seguimentos e 6 em menos de 4 seguimentos. 25 pacientes sempre receberam antipsicóticos prescritos e 15 não tiveram antipsicóticos prescritos a partir do 2o.ano de follow-up. Esses dois grupos de comparação foram utilizados na avaliação das diferenças em longo prazo entre os pacientes com antipsicóticos versus os que ficaram sem antipsicóticos.

Martin Harrow

O gráfico acima apresenta o funcionamento do trabalho dos pacientes a quem os antipsicóticos foram continuamente prescritos (n = 25) versus aqueles que viveram sem antipsicóticos nos últimos 18 anos (n = 15). Como a figura mostra, o único ponto do tempo do follow-up em que não houve diferença significativa entre o funcionamento do trabalho entre os dois grupos foi durante o período inicial de 2 anos.

Em cada um dos pontos de tempo restante, o grupo não medicado apresentou desempenho significativamente melhor no funcionamento do trabalho (.000 -.016). A partir da avaliação de 4 1/2  anos, mais de 65% dos pacientes que não estavam em antipsicóticos estavam trabalhando em meio tempo ou mais.

Além disso, os pacientes com antipsicóticos continuamente prescritos foram significativamente mais propensos a ter sintomas negativos do que aqueles sem antipsicóticos prescritos entre os 4 ½ anos e os 20 anos de seguimento, e aqueles com sintomas negativos apresentaram menor probabilidade de trabalhar em 4 dos 6 períodos de seguimento.

Controlando o prognóstico, os pacientes com mau prognóstico e fora dos antipsicóticos tiveram melhor funcionamento do que aqueles com antipsicóticos prescritos e igualmente com mau prognóstico. Não foram encontradas diferenças significativas entre os grupos medicados e não medicados com bom potencial prognóstico, o que os autores apontam que pode ser devido ao pequeno número de pacientes com um bom prognóstico no começo da investigação.

Ao combinar todos os resultados dos 70 pacientes com esquizofrenia em todos os seis seguimentos, tomando como referência sintoma e funcionamento, os resultados não apoiaram o uso de antipsicóticos para melhorar o funcionamento, e a razão de probabilidade conduzida pelos autores demonstrou que aqueles sem antipsicóticos tiveram 1,76 vezes mais chances de funcionar adequadamente em comparação com aqueles em antipsicóticos.

Os resultados deste estudo aumentam a crescente literatura que demonstra a falta de efeitos positivos em longo prazo de antipsicóticos para pacientes identificados como tendo esquizofrenia. Os pesquisadores acrescentam que em outros artigos publicados eles relataram igualmente uma maior taxa de recuperação naqueles que estiveram fora dos antipsicóticos.

Em suma, os resultados deste estudo deixam claro que após a marca de 2 anos (em que as diferenças não são significativas), os fora de antipsicóticos têm melhores resultados. Os autores escrevem:

“Os dados indicam que qualquer hipótese baseada na visão de que os antipsicóticos facilitam o funcionamento do trabalho é extremamente duvidosa, uma vez que os resultados para o funcionamento do trabalho funcionaram fortemente (em níveis significativos) na direção oposta”.

 

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Harrow, M., Jobe, T. H., Faull, R. N., & Yang, J. (2017). A 20-Year multi-followup longitudinal study assessing whether antipsychotic medications contribute to work functioning in schizophrenia. Psychiatry Research256, 267-274. (Abstract)

12 Modos de como Ajudar as Crianças a Lidarem com a Ansiedade Escolar

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Nesta matéria para USA Today, Candy Grande oferece 12 abordagens não farmacológicas para ajudar as crianças a lidarem com a ansiedade relacionada à escola, como é ter uma discussão sobre suas preocupações, as envolver em atividades extracurriculares, incentivar para que durmam o suficiente, ou recomendar que coloquem as suas lembranças em cadernos, por exemplo.

Crianças

As listas de gratidão são uma porcaria – As Listas de ingratidão é que me salvaram

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Neste artigo para Good Housekeeping, uma mulher compartilha de como “pensar positivo” e fazer listas de gratidão apenas agravou a sua depressão; e como ao reconhecer sua dor e trauma, através de listas de ingratidão, ajudou-a a se sentir com mais valor e capacitada para lidar melhor com a vida.

As listas de gratidão não me ajudaram em nada. Escrevê-las foi uma prática que me levou mais fundo à vergonha e à auto-aversão, quando eu já me encontrava em um lugar muito escuro. As listas de gratidão dizem que aqueles entre nós que sofrem estão sofrendo porque escolhem a miséria, e simplesmente não estão trabalhando o suficiente, e que, se pensarmos com pensamentos felizes, estaremos acima dos nossos problemas, como as crianças em Peter Pan.”

As minhas listas de ingratidão me ajudaram a entrar em contato com as coisas que eu perdi, ter sido enganada, e todas as vezes em que a vida deu um chute diretamente no meu coração. Aprendi que engolir raiva e tristeza, por meio de uma pilha de listas de gratidão, não as faz desaparecer. Escrever as coisas que me tornaram miserável e furiosa também não as faz desaparecer, é verdade, mas isso tem me ajudado a me concentrar nas coisas da vida que eu quero mudar, porque me levam a sofrer uma e outra vez. Minhas listas de ingratidão têm me dado direção, foco e me ajudado a me afastar dos imperativos da vergonha e da aceitação a qualquer preço. Meu coração ainda dói, mas não grito que sou egoísta – por estar mais triste “.

Listas

 

 

Dr. Peter Breggin: A Consciência da Psiquiatria

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James MooreEsta semana, temos um convidado muito especial para você, e me sinto honrado por poder entrevistar o Dr. Peter Breggin.

Dr. Breggin é um psiquiatra treinado em Harvard e ex-consultor do Instituto Nacional de Saúde Mental (NIMH). Ele foi chamado “A Consciência da Psiquiatria”, por suas muitas décadas de esforços bem sucedidos para reformar o campo da saúde mental

 

 

Seu trabalho fornece as bases para a crítica moderna de diagnósticos e drogas psiquiátricas, e abre caminho para promover tratamentos mais cuidadosos e eficazes. Seus projetos de pesquisa e educacionais têm trazido mudanças importantes nas informações completas de prescrição que são aprovadas pela FDA, assim como aquelas que estão nas bulas para dezenas de drogas antipsicóticas e antidepressivas. Ele continua a educar o público e as profissões sobre a tragédia de se estar drogando os filhos dos estadunidenses e das sociedades em geral.

Ele é autor de dezenas de artigos científicos e mais de vinte livros, incluindo livros médicos e best-sellers como Toxic Psychiatry e Talking Back to Prozac. Seus três livros mais recentes são Guilt, Shame and Anxiety: Understanding and Overcoming Negative EmotionsMedication Madness: the Role of Psychiatric Drugs in Cases of Violence, Suicide and Murder; e Psychiatric Drug Withdrawal: A Guide for Prescribers, Therapists, Patients and their Families..

Como um expert em medicina legal, o Dr. Breggin possui conhecimentos únicos e sem precedentes sobre como a indústria farmacêutica também com frequência comete fraudes na pesquisa e na comercialização de drogas psiquiátricas. Ele já testemunhou muitas vezes sobre negligência, responsabilidade por produtos, e casos criminais que frequentemente têm relação com os efeitos adversos das drogas, e mais ocasionalmente sobre eletrochoque e cirurgia psiquiátrica. Uma lista do seu testemunho de julgamento desde 1985 está contida na última seção de seu currículo no site do Dr. Breggin.

O Dr. Breggin ensinou em muitas universidades e tem uma prática de clínica psiquiátrica em Ítaca, Nova York.

Para uma carreira tão longa e distinta como o Dr. Breggin, decidimos dedicar dois episódios para o ouvir falar. Esta primeira parte abrange a carreira do Dr. Breggin, suas opiniões sobre psiquiatria e drogas psiquiátricas e também os recentes desenvolvimentos do julgamento envolvendo Michelle Carter.

A segunda parte da entrevista se concentrará mais no julgamento de Michelle Carter e no envolvimento do Dr. Breggin nesse julgamento.

Neste episódio, discutimos:

  • Como o Dr. Breggin trabalhou como voluntário em um hospital estadual metropolitano em 1954, com apenas 18 anos de idade?
  • Qual foi a sua impressão imediata em comparação com os campos de concentração alemães, pois ele testemunhou a brutalidade, incluindo lobotomia e terapia com coma insulínica?
  • Como foi que com a introdução das drogas, principalmente a Torazina, o número de pacientes internados passou a diminuir, seria porque haviam se tornado dóceis e obedientes?
  • Se estaria produzindo danos cerebrais com a finalidade de controle?
  • Por que o Dr. Breggin quis então ir à faculdade de medicina e se tornar parte do movimento de reforma?
  • Que, na década de 1950, ainda havia psiquiatras que tinham interesse e treinamento em terapia psicológica ou abordagens psicanalíticas e psicologia social e comunitária.
  • Que isso também resultou em que a psiquiatria tenha se tornado muito hostil com relação às abordagens psicossociais, que eram menos dispendiosas e melhores.
  • Então, na década de 1960, a psiquiatria entrou em parceria com as empresas farmacêuticas e passou a ficar muito mais rica.
  • Que o Dr. Breggin entrou na prática privada e soube que a lobotomia estava retornando. Isso o levou a promover uma campanha internacional de vários anos para deter o uso de lobotomia e psicocirurgia no mundo ocidental.
  • Desde então, o Dr. Breggin também tem incansavelmente feito campanhas para levar a mudanças na rotulagem da FDA com relação às drogas psicotrópicas.
  • Que o Dr. Breggin se sente abençoado por ter sido capaz de defender os outros, mas também ocasionalmente se sente preocupado com os ataques da psiquiatria enquanto instituição movidos contra ele e pessoas como ele.
  • Como o Dr. Breggin sente que devemos dizer a verdade sobre as drogas psiquiátricas e que as afirmações de “medo” são um mecanismo para reduzir a crítica às drogas.
  • Informar as pessoas é muito diferente do que assustá-las.
  • Que cada pessoa individualmente ainda é o melhor juiz de quando e como se retirar de medicamentos psiquiátricos.
  • Que o Dr. Breggin sente que a psiquiatria não tem incentivo econômico para mudar, então o consumidor precisa parar de ir a psiquiatras para buscar medicamentos.
  • Como o procurador no caso Michelle Carter agora está tentando parar os blogs do Dr. Breggin Mad in America sobre seu caso.

Links relevantes:

Peter Breggin’s personal website

Os blogs de Peter no Mad in Brasil:

Part 1

Part 2

Michelle Carter Blogs and Archives

The handwritten note from the DA to the Judge about stopping Dr. Breggin’s blog

Toxic Psychiatry

Talking Back to Prozac

Guilt, Shame and Anxiety: Understanding and Overcoming Negative Emotions

Medication Madness: the Role of Psychiatric Drugs in Cases of Violence, Suicide and Murder

Psychiatric Drug Withdrawal: A Guide for Prescribers, Therapists, Patients and their Families.

(Nota dos Editores do Mad in Brasil: Infelizmente não temos condições de legendar para o português o precioso conteúdo dessa entrevista. Lamentamos!)

Allen Frances e David Healy em Desacordo com Respeito ao Programa da BBC

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Allen Frances e David Healy expressaram opiniões diferentes sobre Uma Prescrição para Matar, documentário recente da BBC Panorama sobre a associação entre antidepressivos e violência. Enquanto o Dr. Frances criticou o que ele acha ser uma posição extremista, o Dr. Healy defendeu a importância de apontar o papel causal que os antidepressivos podem desempenhar em atos violentos.

Clique aqui para ler a troca de e-mails.

Allen Frances

Antidepressivos: Uma Prescrição para Matar?

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Há chances que você ou alguém que você conhece tome antidepressivos. Há chances que você ou alguém que você conhece tenha sido ajudado por essas drogas. E quais são as chances que tais drogas prescritas tenham um papel em assassinatos?  Alguns deles são assassinatos em massa, como foi a chacina de Columbine College.

O programa da BBC 1, Panorama, apresentou e discutiu os antidepressivos, com histórias que chocaram o mundo, com depoimentos e pontos de vista de especialistas em psiquiatria.

Veja na íntegra o documentário da BBC →  Com legendas em inglês.

Prescription for murder

Melhoria Cognitiva com Yoga

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Publicado no Psychiatric Times: um estudo recente sugere que a yoga Kundalini pode ser pelo menos tão eficaz quanto o treinamento de memória, para melhorar a resiliência cognitiva em adultos mais velhos com queixas subjetivas de memória e comprometimento cognitivo leve.

Artigo →

Yoga

Parte II: Michelle Inicia o Prozac e vê o Diabo

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Peter Breggin

Parte II de uma série de relatórios sobre a história de Michelle Carter. A Parte I pode ser encontrada aqui.

Enquanto Michelle Carter e sua família abriam caminho – pela barreira erguida por câmeras de TV montadas fora do tribunal de Massachusetts – rumo ao tribunal que iria julgar a Michelle, a atmosfera dentro e fora do tribunal estava tensa. Era o mesmo juiz que já a havia condenado por homicídio involuntário no suicídio de seu namorado, Conrad Roy.

Enquanto perito em psiquiatria, por mais de duas horas eu permaneci sentado em frente a uma câmera em um estúdio em Ithaca, Nova York. Estava eu lá a espera de ouvir pelo meu fone de ouvido que a câmera postada em minha frente estaria ligada e que o meu microfone me colocaria ao vivo.

Eu passei a maior parte deste terceiro dia de agosto, das 12h às 20h, ouvindo e respondendo à cobertura televisiva da sentença de Michelle Carter. A melhor notícia foi que minha esposa Ginger estava na sala de engenharia do estúdio, ajudando-me a acompanhar o que era importante.

Rodeado pela indignação

Pelo meu fone de ouvido fui informado de que eu entraria ao vivo em alguns segundos; e endireitei a minha postura e passei a focalizar os meus olhos na câmera. Eu estava mais uma vez preparado para falar sobre a verdadeira Michelle Carter, uma jovem cálida e atenciosa, em grande parte graças às forças que estavam além da sua compreensão ou do seu controle. E então a sala de comando em Atlanta desligou novamente a minha câmera .

A cobertura mudou para um incidente fora do tribunal. Quando Michelle passava pela multidão com o olhar assustado e frágil, alguém gritou para ela: “Mate-se!” O canal repetiu a cena, para ter certeza de que todos ouvimos as palavras. Para os produtores de TV e os comentaristas, isso não passava de um grande teatro.

Eu me senti imerso em uma realidade de espetáculo, dominada pela raiva, vingança e ódio contra Michelle, um espetáculo assistido por milhões de telespectadores via a Headline News (HLN), de propriedade da CNN. Esta condenação midiática, às vezes sutil e às vezes não, foi dirigida à Michelle pela maioria dos comentaristas das redes de TV; pelos espectadores selecionados para filmagem; com as entrevistas feitas com os indignados familiares do jovem falecido; por advogados encolerizados e pelos promotores selecionados para o show; e até mesmo por alguns ‘especialistas’ de saúde mental.

A imagem ampliada

Depois de passar um dia ouvindo a cobertura da mídia da HLN – com algumas pausas para olhar para a CNN, a Fox News Channel e outros canais -, comecei a perceber que a cobertura de TV da história de Michelle e dos aspectos legais do caso não passavam de uma diversão midiática, para evitar que os americanos voltem a sua atenção para o que realmente incomoda o nosso país e o mundo de hoje em dia. Neste caso, a história a ser evitada a todo custo é a da epidemia das drogas, que atinge os nossos filhos e jovens, e de como estamos entregando os nossos filhos às companhias farmacêuticas e aos médicos. Em vez de uma tomada de consciência, que se odeie e que se culpe a vítima, e que não nos deixem ver o estrangulamento que o Império Farmacêutico está fazendo na psiquiatria, a medicina, as companhias de seguros, a mídia, o Congresso, o sistema educacional e praticamente em toda a nossa cultura.

O programa da ABC TV 20/20 dedicou uma hora à história de Michelle Carter, em 4 de agosto de 2017, no dia seguinte à sua sentença, e forneceu vislumbres de realidades escondidas. Com base na filmagem de mais de 90 minutos no estúdio de Nova York, provavelmente a entrevista que dei teve influência na apresentação da história de uma forma mais equilibrada. Em vários clipes curtos na produção final, me foi dada a oportunidade de fazer minhas observações sumárias, sendo as mais importantes: que Michelle tentou por dois anos salvar a Conrad, até que ela sucumbiu à influência de suas ameaças abusivas de se matar e também à intoxicação involuntária causada por uma mudança recente em sua medicação.

As experiências de Perdas Traumáticas vividas por Michelle

Em variações infinitas, a história de Michelle é parecida com a que é vivida diariamente por milhões de crianças na América e em outros lugares do mundo, especialmente no mundo industrializado.

Tanto quanto alguém pode dizer, ela estava indo bem até aos seus 14 anos de idade, sendo uma boa aluna, uma atleta-estrela e uma garota que gostava da vida e que era amada pelas pessoas que a conheciam. Nada havia nela como igual a qualidades antissociais.

Então, em setembro de 2010, um mês depois de completar 14 anos e de entrar na 8ª série, Michelle sofreu um duplo trauma. Os seus avós maternos muito queridos, que moravam nas proximidades e que eram muito presentes na vida familiar, morreram inesperadamente em uma rápida sucessão. Primeiramente, seu avô materno morreu de um ataque cardíaco e, algumas semanas após, sem aviso prévio, a sua avó morreu de um acidente vascular cerebral. Essas perdas traumáticas seriam suficientes para agredir temporariamente qualquer criança; e Michelle passou pelo processo normal de luto – exceto que foi oficialmente diagnosticada com ansiedade e depressão, em vez de estar a sofrer de um processo saudável de luto e necessário.

Um mês após à morte de seus avós, o corpo forte e atlético de Michelle havia diminuído cerca de 20 a 30 libras (em torno de 9 a 12 kg).  Ela já pesava 85 libras (38 kg), 2% para a sua faixa etária e altura.

O gastroenterologista a descreveu como “anormalmente magra” por não querer comer; e ela foi diagnosticada com anorexia, ansiedade e depressão. Suas funções hepáticas estavam anormais e permaneceriam assim por anos. Seu eletrocardiograma mostrou anormalidades que seriam esclarecidas posteriormente. Seu sistema cardiovascular estava tão instável que ela desenvolveu hipotensão ortostática – ou seja, sua pressão sanguínea caia precipitadamente quando ela se levantava. Ela passou a ser uma criança muito emocionalmente angustiada e fisicamente enferma.

O que Michelle e sua família realmente precisavam

Michelle precisava de um terapeuta familiar experiente, alguém que teria juntado rapidamente toda a família Carter para ajudar a lidar com a sua dor. A irmã mais nova de Michelle também perdeu seus avós; e a mãe de Michelle, obviamente, por haver perdido os dois pais. As duas crianças, especialmente, precisavam de ajuda para expressar seus inevitáveis medo e ansiedade sobre a própria morte. No aconselhamento familiar, os quatro membros da família poderiam ter trabalhado juntos para aumentar sua comunicação amorosa e processar suas emoções compartilhadas de tristeza.

Em vez de se concentrar em Michelle como paciente, um terapeuta familiar teria enfatizado ajudar os pais de Michelle, sendo eles os líderes da família. Na minha experiência, ao ajudar os pais, a necessidade do terapeuta de ver as crianças muitas vezes diminui. Os pais, com seu novo entendimento e melhores habilidades de comunicação, conseguem ajudar a toda a família a se curar. No caso de Michelle, onde ela se comunicava quase que exclusivamente com seus pares através das mídias sociais, um grande avanço implicaria mudar mais as suas comunicações para com seus pais e irmã.

Ao invés disso, foram dados a Michelle antidepressivos, o que abafou a sua habilidade e a sua motivação para lidar com as aflições. Um dos efeitos mais comuns dos antidepressivos é justamente a supressão da emoção, ao mesmo tempo que impõem a apatia e a indiferença. As drogas, por conseguinte, impedem a ligação com a família e de fazer o luto. Depois de se retirarem dos antidepressivos, muitos pacientes percebem que passaram por eventos importantes, como as graduações de seus filhos ou a morte de seus pais, “sem sentir nada”. (Para estudos da apatia antidepressiva, veja a parte número quatro dos artigos científicos que estão no meu Centro de Informações sobre Antidepressivos.)

A iniciação de Michelle com o Prozac

Em vez de tratá-la como membro de uma família sob estado de choque e triste, Michelle foi tratada como se tivesse uma doença mental. Em 17 de fevereiro de 2011, seu médico da Atenção Primária a iniciou no Prozac, para aumentar seu peso e talvez para tratar sua ‘depressão’. Após uma semana, seu médico dobrou a sua dose para 20 mg.

Vinte miligramas é uma dose de Prozac comum para adultos. Para Michelle, em sua condição frágil, tornou-se uma dose gigantesca. Seu sistema cardiovascular ficou instável. Ela estava com 2% do seu peso normal. Para adicionar a este estado vulnerável, o mau funcionamento do fígado provavelmente reduziu a sua capacidade de metabolizar ou quebrar o Prozac, levando-o a um nível ainda maior na corrente sanguínea do que o previsto. Seu sistema cardiovascular danificado colocou-a em risco para uma arritmia induzida por drogas e para a morte.

Em 5 de abril de 2011, sem explicação, o médico de Michelle da Atenção Primária aumentou a dose de Prozac para 30 mg. Esta dose, acima da média para um adulto, foi uma receita para a tragédia de Michelle.

Após uma semana de aumento da dose, o médico exclamou no registro, “Ganho de peso!” Michelle tinha mais três quilos e seu IMC era agora de 3%.

Na época, Prozac já estava aprovado para a depressão em crianças, mas nunca seria aprovado para transtornos alimentares em crianças. O impacto imediato dos ISRSs geralmente causa perda de peso, um fato que os médicos equivocadamente usaram para pressionar as mulheres que queriam perder peso, enquanto tentavam superar a depressão.

Infelizmente, o efeito a longo prazo de antidepressivos como Prozac, Citalopram e Escitalopram é geralmente ganho de peso; e para uma criança que é desesperadamente fóbica sobre gordura, isso aparece como uma calamidade. O aumento de peso de Michelle com os antidepressivos SSRI contribuirá para o seu crescente desespero nos próximos três anos. Como ela perdeu o controle de seu peso, ela se tornou bulímica, perseguindo corridas exaustivas, como uma maneira de evitar que ganhasse mais peso.

O que sabíamos sobre os perigos dos antidepressivos em 2011?

Em 2011, qualquer pessoa que lesse a literatura científica, em grande parte vinda das principais referências médicas americanas, teria sabido que as crianças não podem tolerar ISRSs e que, portanto, não se deve prescrever essas drogas a elas. O relato científico que citarei a seguir, bem como muitos outros estudos confirmatórios, podem ser obtidos sem custo em meu site www.123antidepressants.com.

Uma equipe liderada por Riddle, do Yale Child Study Center, um centro afiliado à Yale Medical School, descobriu que 50% das 24 crianças, entre 8 e 16 anos de idade, desenvolveram anormalidades comportamentais graves quando tratadas com Prozac. Onze crianças (45%) desenvolveram ‘inquietação motora’, que geralmente é um sinal de acatisia, uma desordem que provoca piora da condição de uma criança ou adulto, levando às vezes à psicose, violência ou ao suicídio.

Nesse estudo, seis crianças e adolescentes desenvolveram ‘desinibição social’, o que também pode causar comportamentos perigosos, como os que Michelle mais tarde mostrará no final da vida de Conrad. Três crianças desenvolveram ‘uma sensação subjetiva de excitação’, que é o início da mania, com todos os seus riscos, incluindo seus sentimentos de grandiosidade e onipotência, muitas vezes desastrosos; o que Michelle também expressaria nos últimos dias de Conrad, de uma maneira muito desagradável.

Como se estivesse avisando qual seria o futuro de Michelle, os autores desse estudo ao qual estou me referindo concluíram:

Os clínicos que tratam crianças com fluoxetina [Prozac] devem estar conscientes dos efeitos colaterais comportamentais … Esses efeitos colaterais podem ser difíceis de se diferenciar de sintomas psicopatológicos comuns, como hiperatividade, agitação e impulsividade.

A ‘impulsividade’ induzida por drogas, juntamente com a ‘desinibição social’, e outros sintomas induzidos por fármacos maníacos, como é o esperado provavelmente passaram a dominar a vida de Michelle.

Reacções ao Prozac e a todos os outros antidepressivos mais recentes podem destruir vidas. Com base na minha experiência clínica e forense, descrevi muitos desses casos no meu livro Medication Madness: The Role of Psychiatric Drugs in Cases of Violence, Suicide and Crime.

Graças em parte a meus trabalhos científicos, em 2004 e 2005, a FDA modificou a informação de prescrição completa para todos os antidepressivos, incluindo o Prozac. A partir de então, todas as informações completas da prescrição de antidepressivos passaram a ter múltiplas referências a um contínuo de ativação ou estimulação de efeitos adversos, que são semelhantes à metanfetamina e à cocaína:

Todos os pacientes que estão sendo tratados com antidepressivos para qualquer indicação devem ser monitorados adequadamente e observados de perto para a piora clínica, o suicídio e para as mudanças incomuns no comportamento, especialmente durante os primeiros meses do processo de terapia medicamentosa, ou em momentos de mudanças de dose, quer aumentando-a ou diminuindo-a. Os seguintes sintomas, como ansiedade, agitação, ataques de pânico, insônia, irritabilidade, hostilidade, agressividade, impulsividade, acatisia (inquietação psicomotora), hipomania e mania, foram relatados em pacientes adultos e pediátricos, tratados com antidepressivos para transtorno depressivo maior assim como para outras indicações, tanto psiquiátricas como não psiquiátricas. Seção 5.1 (em negrito no original)

Uma porcentagem significativa das internações hospitalares é causada por psicose e mania induzidas por antidepressivos. Como a informação completa da prescrição aprovada pela FDA confirma, os efeitos colaterais mais comuns podem ser acompanhados de mudanças drásticas em relação a comportamentos agressivos antissociais, incluindo “irritabilidade, hostilidade, agressividade, impulsividade”. E ‘sintomas maníacos’, como a grandiosidade que Michelle exibiria por um breve e trágico período de dez dias antes do suicídio de Conrad.

Reação de Michelle para a primeira rodada de Prozac

O profissional de saúde de Michelle só reconheceu a ‘dor de cabeça’ como uma reação adversa depois de aumentar a dose de Michelle, para o que era para ela uma dose gigantesca de 30 mg. O texto de Michelle com seus amigos mostra o primeiro desenvolvimento conhecido de comportamento problemático. Embora atraída por meninos, Michelle desenvolveu uma paixão feminina e perseguiu compulsivamente sua amizade até que a mãe da menina interveio. A perda desse relacionamento aumentaria suas perdas anteriores e aumentaria seu sofrimento ao longo dos próximos anos.

Para Michelle, seus relacionamentos eram sempre pautados por apegos emocionais profundos. Ela queria ajudar as pessoas. Ela queria amar as pessoas e ela buscava o amor delas. Com meninos ou meninas, jovens ou adultos, os objetivos eram sempre os mesmos, amor e ajuda mútua; e as pessoas respondiam muito calorosamente e com apreciação a ela.

Esses sentimentos apaixonados, porém, platônicos, foram abertamente compartilhados em centenas de textos entre Michelle e seus amigos que se mantinham afeiçoados. O foco potencialmente perigoso de Michelle em ajudar e ser ajudada tornou-se mais desesperado e obsessivo sob a influência de antidepressivos e o implacável abuso de Conrad sobre ela.

Como Michelle sentiu que estava indo bem já há algum tempo, seu médico da Atenção Primária interrompeu o Prozac, no início de outubro de 2011. Michelle estava fora do Prozac quando conheceu Conrad pela primeira vez, em fevereiro de 2012. Ela tinha agora quinze anos.

Recomeçando o Prozac sete meses depois

No dia 3 de maio de 2012, seu médico da Atenção Primária escreveu no prontuário de Michelle: “Retorno da chamada da mãe – Mãe preocupada, Michelle comendo demais – não pode parar de comer e está se exercitando compulsivamente. Michelle agora pede ajuda, mas não quer voltar ao [outro] consultório, pois está preocupada que a equipe a veja como um “fracasso”.

Na época, a mãe de Michelle calculava o peso da filha em 45 quilos, com cerca de 11 quilos abaixo do peso. Seu médico anterior encaminhou-a para um novo médico no mesmo grupo de cobertura, porém em outro local.

O novo médico da Atenção Primária, que permaneceria com Michelle até da morte de Conrad, rapidamente aceitou o pedido de Michelle para reiniciar o Prozac. Em uma escalada muito rápida de catorze dias, o médico levantou a dose de Michelle de 10 a 30 mg, simplesmente porque Michelle estava tomando 30 mg no passado.

Michelle e Conrad têm contato limitado o levando à sua tentativa de suicídio

Michelle e Conrad se encontraram com suas famílias em férias na Flórida, em fevereiro de 2012, quando ela tinha quinze anos e ele tinha dezesseis anos. As primeiras comunicações entre Michelle e Conrad disponibilizadas para mim são trocas diretas de mensagens no Facebook, que começaram alguns meses após o primeiro encontro em 17 de julho de 2012.

Eles se encontraram novamente em agosto de 2012 na casa dos Carter. Seus dois últimos encontros ocorreram em suas cidades natais em Massachusetts, no verão de 2013, e eles não se viram nunca mais durante o ano antes da morte de Conrad.

Suas comunicações disponíveis de 17 de julho de 2012 a 5 de setembro de 2012 parecem infantis e brincalhonas, muitas vezes consistindo apenas de uma a três palavras. Em uma mensagem trocada, Conrad escreve: “amo você” e algumas linhas depois Michelle replica, “Que bom. Eu te amo muito.”

Em 10 de outubro de 2012, Conrad começou outra troca de mensagens diretas no Facebook; em uma das quais ele disse a Michelle que havia deixado recentemente um hospital, após uma séria tentativa de suicídio. Michelle, que não tinha suspeitas de que ele estava emocionalmente mal, ficou chocada.

Em 2011, Conrad havia tido uma forte overdose em Tylenol, na primeira das quatro ou mais tentativas de suicídio (meu testemunho & Registros Públicos 3, 29 e 31). Eu testemunhei que as mudanças nos medicamentos antidepressivos de Conrad agravaram seu estado de suicida e sua mãe concordou que o divórcio de seus pais “o machucou profundamente” (Registro Público 23). Haviam também alegações de que Conrad havia sido abusado fisicamente por seu pai e abusado verbalmente por seu avô e seu tio (meu testemunho, testemunho policial e registros públicos 34, 49 e 50).

A primeira tentativa séria de suicídio de Conrad guarda semelhanças com o seu suicídio de fato, por haver envolvido uma colega (Relatório Público 51). O pai de Conrad explicou à polícia: “A primeira vez que Conrad tentou se suicidar ele estava falando com uma garota que ele conheceu em um grupo, e ela ligou para a polícia imediatamente, e ela salvou sua vida. . . “(Relatório público 2).

Nos próximos dois anos, Conrad repetidamente ameaçou se matar enquanto mandava textos para Michelle. Durante dez dias, em julho de 2014, essas ameaças combinadas com o antidepressivo que tomava a derrubaram mentalmente, e ela concordou em apoiar seu objetivo de morrer rápido e facilmente, para ir ao céu.

Transformação trágica de Conrad

Durante essa troca de mensagens de 10 de outubro no Facebook, Conrad já não exibe a inocência e a relativa sensibilidade de suas comunicações anteriores – sem drogas – com Michelle. Em vez disso, ele continua todos os dias a atormenta-la com ameaças repetidas de que ele planejava se matar naquela noite. Aterrorizada, ela implora que não fizesse isso. Ele insiste, “não, eu vou”, e depois explica “apenas deixar você saber que a voz na minha cabeça me disse para fazer isso”. Ele se considera “louco” e diz que ele irá realizar seus planos.

Conrad continua torturando Michelle com descrições de seus vários métodos de suicídio, insistindo: “Eu vou tentar o meu melhor e não falhar na próxima vez”. Ele repete suas intenções de que ele faria isso “esta noite”. Ela diz a ele, “Você está me assustando” e reitera o quanto ela o ama e quer ajuda-lo. Isso ocorreu várias e várias vezes.

Michelle torna-se frenética e chama um amigo e um parente de Conrad em sua cidade natal, que fica a uma hora de carro. Enquanto isso, ainda não sendo bastante estar entre 16 e 30 mg de Prozac, Michelle permanece insegura sobre o que mais fazer até ouvir um retorno dele.

Michelle, cujo principal objetivo na vida era amar e ajudar as pessoas, agora está presa em uma situação desesperadora. Ela acredita que ama Conrad e ele está convencido de que só ela poderá salvá-lo. Este padrão desesperado continuará por quase dois anos.

Sua mensagem é interrompida por cinco horas até às 9 horas daquela noite em que Michelle envia uma única mensagem sem resposta, “Conrad, responda-me agora, por favor”.

A próxima comunicação que me foi fornecida data de seis semanas depois. Naquele momento, em 19 de novembro de 2012, Conrad continua com o que se tornará uma avalanche periódica de comunicações estranhas e sombrias. Ele fala sobre “Eu quero o seu sangue” e “Quero misturar o seu sangue com a sua saliva e com o meu sangue”. Michelle é atraída para o que ela descreve nas mensagens como essa conversa “nojenta”.

Pesadelos diabólicas e alucinações

Após a meia-noite de 24 de novembro de 2012, ainda em 30 mg de Prozac, Michelle envia uma mensagem direta a Conrad no Facebook dizendo que, pela primeira vez, está tendo terríveis pesadelos sobre o diabo que a impede de dormir.

Em suas comunicações com Michelle, Conrad mostra uma indiferença grosseira em relação a seus sentimentos, provavelmente causada ou agravada pelos efeitos emocionais das drogas. Quando Michelle traz os pesadelos perturbadores, Conrad brinca de si próprio e faz pouco dos sonhos dela.

Ela responde: “Tento me matar neles [os pesadelos]” e depois elabora, “na verdade, o Diabo tenta me matar haha”. Ela então descreve como um namorado dormiu e a ajudou com os pesadelos.

Na noite seguinte, ela novamente traz seus pesadelos. “No entanto, vou para o inferno. O Demo me disse isso. Eu juro … Não estou brincando. Estou falando sério.”

Conrad pergunta: “Ele te disse isso?” E ela responde: “Sim”.

Então ele volta a atenção para si mesmo: “Eu já vi o diabo”.

Michelle responde: “Eu também, e como você o viu?”

Conrad responde: “Ele estava no hospital, em uma noite, olhando para mim. E ele me disse para matá-los todos. ”

Não há discussão sobre a alucinação do comando “matar todos eles”. Em vez disso, Michelle pergunta: “Você está falando sério?”

Conrad diz: “Mortos, sério”.

Michelle mais uma vez se torna a ajudante simpática. “Sinto muito, amor!”

Conrad descreve sua visão do Diabo: “Ele estava vermelho e tinha uma capa preta”.

Michelle diz-lhe para não ouvir o Diabo. “Eu aprendi a lutar contra ele, e sim, eu sei que eu também o vi. Eu realmente o vi, de verdade. ”

Ela elabora que “tudo isso ocorre no sono “, “mas para mim parece uma vida real”.

Conrad diz: “Eu o vi na vida real”.

Michelle continua, “e eu pensei que o vi em minha cama uma noite, mas acho que era uma alucinação. Eu não sei.”

Conrad responde: “Eu pisquei e ele desapareceu” e ela responde: “Sim, isso aconteceu também comigo”.

Conrad então apresenta a ideia de que suas experiências mútuas com o Diabo indicam que “talvez estivéssemos destinados a estar juntos”.

Michelle diz: “Ninguém acredita que eu realmente o veja, mas sim eu o vejo”.

Conrad declara categoricamente: “o diabo nos trouxe a estar juntos”.

Michelle responde: “e sim, talvez seja uma maneira engraçada de estar juntos”, com a qual Conrad segue com “porque não conheço mais ninguém que tenha visto o diabo”.

Michelle conclui: “estamos destinados ao inferno então?” E Conrad confirma, “Sim”.

Michelle continua a descrever, “como uma vez falei, eu alucinava e meus olhos estavam sangrando. Foi assustador. Eu pensei que era real na época, mas não era. Isso me assustou tanto. ”

Eles compartilharam o assustador que tudo isso se lhes aparecia, e Michelle continua a se perguntar, “como se eu não soubesse o que ele quer de mim ou de você. Por que nós?

Conrad responde à sua pergunta, “porque nós somos suas vítimas”.

Sem ganhar clareza, eles continuam a discutir por que tudo isso está acontecendo com eles.

Os pesadelos e a ênfase de Conrad sobre o diabo trazendo os dois juntos, teve que deixar Michelle confundida sobre o que é real e o que não é real. Às vezes, posteriormente, à noite ela se apegava ao seu cachorrinho, com a esperança de assustar o diabo.

Os pesadelos com o Prozac

Desde a primeira informação a respeito da prescrição do Prozac até às mais recentes, “sonhos anormais” foram listados na literatura como sendo a reação adversa mais freqüente ao Prozac. Pois bem, parece que nem Conrad e nem Michelle foram avisados sobre esses efeitos comuns com essas drogas, apesar de ambos estarem nos antidepressivos de ISRS.

Fortes pesadelos também têm sido relatados na literatura científica. Trinta e oito dias após o início de um ensaio clínico duplo-cego controlado por placebo comparando o Prozac com uma pílula de açúcar, um menino de doze anos “experimentou um pesadelo violento sobre matar seus colegas de classe até ele mesmo ser baleado”.

Ele despertou com muitas dificuldades, e o sonho continuou a ser sentido como “muito real”. Ele relatou ter tido vários dias de “sonhos ruins” cada vez mais vivos antes deste episódio; estes incluíram imagens de se matar e de seus pais morrendo. Quando ele foi visto mais tarde naquele dia, ele estava agitado e ansioso, recusou-se a ir à escola e relatou ideias suicidas marcantes e que o tornaram inseguro em casa também. P. 180

Este pesadelo na escola, que persistia após o despertar, é notável por ter ocorrido muito antes do surto de tiroteios bem conhecidos iniciados na Columbine High Schoolem 1999. O estudo clínico duplo-cego do menino foi interrompido e foi confirmado que ele estava tomando o Prozac, 20 mg. A droga foi retirada e ele gradualmente melhorou. Quando Prozac foi reiniciado algum tempo depois, ele voltou a tentar se suicidar, e novamente a medicação teve que ser interrompida.

O papel dos que prescrevem

Os médicos que falham em alertar seus pacientes sobre pesadelos, suicídio compulsivo, sentimentos violentos e outras reações adversas potencialmente perigosas e angustiantes dos antidepressivos estão fazendo a seus pacientes e à sociedade um grave desserviço. A falta de informação dos seus pacientes deixa-os à mercê de experiências horríveis que permeiam à psicose. Os pacientes desavisados terão medo de estar ficando loucos. Eles vão pensar que estão ‘tão longe’, que nem mesmo os potentes antidepressivos podem ajudá-los. Isso muitas vezes leva ao desespero e às vezes ao suicídio.

Michelle e Conrad em Isolamento

Esses dois adolescentes feridos e perturbados, com quinze e dezesseis anos, desenvolveriam um relacionamento nas redes sociais – principalmente sem se verem, comandado por Conrad – que iria dominar os dois. Os distúrbios mentais induzidos por seus antidepressivos e as suas próprias vulnerabilidades emocionais os expulsariam do convívio com as outras pessoas, devastando as suas vidas e causando sofrimentos inimagináveis às suas famílias e amigos. Na medida em que tomavam as suas drogas antidepressivas, exibiam todos os efeitos adversos mais graves, incluindo a piora geral da saúde mental, como irritabilidade e hostilidade, grandiosidade e suicídio.

Devemos mostrar respeito por Michelle e Conrad, e a todas as vítimas do Império Farmacêutico, tomando suas vidas como exemplos do que devemos evitar que continue a acontecer. Devemos ouvir e contar suas histórias. Devemos ser advertidos e inspirados para recuperar nossos filhos do que eu chamo de ‘Complexo Psicofarmacêutico’ em meu livro Toxic Psychiatry.

Império Farmacêutico, com seu forte marketing de drogas psiquiátricas para os problemas da vida real das crianças, tem roubado desses jovens e suas famílias a vontade e a capacidade para buscar e usar abordagens mais carinhosas e humanas, para lidar e superar o inevitável, como são as lutas que os jovens enfrentam enquanto crescem e se tornam pessoas maduras.

O crescente abuso emocional de Conrad e o terrorismo feito à Michelle, e seu declínio mútuo ao tomar antidepressivos, serão o assunto adicional da terceira parte. Conrad e Michelle selarão seu relacionamento de uma forma profundamente perturbada e, eventualmente, condenável; mas Conrad é sempre responsável, até que Michelle finalmente entregue os pontos e se torne agressiva.

(Nota dos Editores do Mad in Brasil: O Dr. Breggin interrompeu temporariamente sua série sobre Michelle Carter enquanto a resolução é tomada pelo tribunal sobre que informação médica pode ou não ser tornada pública. O tribunal está programado para se pronunciar sobre este assunto em 21 de agosto. Dr. Breggin pretende retomar a série em breve.)

 

Michelle Carter: Ela Enviava Textos ao Seu Namorado para que Ele se Suicidasse?

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With her defense attorney Joseph Cataldo at left, Michelle Carter listens to her sentencing for involuntary manslaughter for encouraging 18-year-old Conrad Roy III to kill himself in July 2014. Thursday, Aug. 3, 2017. She was sentenced Thursday to 15 months in jail for involuntary manslaughter. (Matt West/The Boston Herald via AP, Pool)

Peter BregginRecentemente, em 3 de agosto de 2017, um juiz de Massachusetts julgou uma suposta ‘garota malvada’, pelo crime de homicídio culposo de seu namorado. Na época, a jovem tinha apenas dezessete anos de idade. E ele tinha dezoito anos. Ela poderia ter recebido 20 anos na prisão estadual, pelo ‘crime’ alegado de haver incentivado o seu namorado a se suicidar, ao dizer a ele que voltasse ao seu caminhão cheio de monóxido de carbono. Em vez disso, o juiz deu a ela apenas 15 meses em uma casa de correções. Agora, o juiz suspendeu a prisão, até que o processo seja plenamente concluído, permitindo que ela volte para casa com liberdade condicional.

Eu fui o único perito em psiquiatria e em medicação ao mesmo tempo, e testemunhei em defesa de Michelle. Além de talvez seus próprios advogados, provavelmente seja eu quem mais saiba sobre a história verdadeira.

Este blog será o primeiro de uma série de relatórios sobre o processo. Quase tudo nesta série de relatórios foi revelado e documentado no julgamento, muitas vezes através do meu testemunho. Documentos para o caso Michelle Carter e links para vídeos da audiência do pré-julgamento e o posterior julgamento podem ser encontrados no arquivo do caso que estou criando no meu site www.breggin.com.

Michelle Carter para a impressão pública

Nos últimos tempos, tenho viajado muito para depor em tribunais, enquanto especialista em psiquiatria e para dar workshops e me apresentar em conferências. Porque o caso dela não saía da minha mente, e por ele haver ocupado tanto a minha atenção e o meu tempo, eu perguntava às pessoas nos aeroportos, nos aviões, nos táxis e nos hotéis, se elas já tinham ouvido falar de uma jovem que supostamente havia dito ao seu namorado para que se matasse.

Para minha surpresa, quase todos recordavam algo sobre a história. A cobertura de notícias tem sido extensa aqui nos Estados Unidos. Para vocês brasileiros que não conhecem o caso, a cobertura dada aqui foi desde a mídia impressa como o New York Times e o Washington Post ao People, e na TV desde ABC e NBC à CNN e Fox News. Curiosamente, ninguém parecia saber nada além da ideia de que uma adolescente havia dito ao seu namorado para se matar, e que ele havia feito isso. Eles tinham certeza de que ela era uma garota muito má.

As pessoas ficavam interessadas quando eu mencionava que tanto a garota como seu namorado estavam tomando há anos drogas antidepressivas que eram quase que idênticas. Havia consternação quando eu começava a dar detalhes sobre a relação deles. Isso não se encaixava no imaginário que as pessoas tinham criado. Elas se sentiam enganadas pelos meios de comunicação.

Quase ninguém podia lembrar seu nome. É Michelle Carter. Ninguém conhecia o nome do jovem falecido. Foi Conrad Roy. Era o início de julho de 2014, e Michelle estava se preparando para começar seu último ano de ensino médio, enquanto lutava com um transtorno alimentar. Conrad estava trabalhando para seu pai, batalhando e tentando encontrar o seu caminho após haver se formado no ensino médio.

As informações mais reveladoras estavam contidas em mais de mil páginas de mensagens de texto com as dezenas de centenas de comunicações entre Michelle e Conrad, bem como entre Michelle e seus muitos amigos. Se tratava de um mundo digital vertiginoso de adolescentes, com uma impressionante falta de presença de adultos. Os textos foram muito importantes no julgamento, porque Michelle e Conrad não se viram durante um ano antes da morte dele. Antes desse longo hiato, eles só se encontraram em quatro ocasiões por um ou dois dias, com pouca chance de intimidade e de mesmo de algum contato sexual.

No meu trabalho forense, no trabalho de reconstrução do que os indivíduos estavam pensando e comunicando levando-os ao desfecho trágico – como assassinato, suicídio ou morte, enquanto efeitos psiquiátricos de drogas -, eu nunca tinha tido em minhas mãos tanta documentação como agora eu tinha com este caso. Eu estava entrando em contato não somente com as intactas trocas íntimas de mensagens entre Michelle e Conrad, mas também aquelas entre Michelle e seu extenso grupo de colegas.

A maioria das pessoas com quem conversava enquanto viajava sabia que o caso era sobre mensagens de texto. Eles quase que unanimamente ficaram com a impressão errada de que Michelle enviara mensagens de texto para Conrad que foram aparentemente fatais.

Depois que o advogado de defesa, Joe Cataldo, contatou-me e me forneceu a documentação inicial, eu assumi o caso como especialista em medicina, sabendo que talvez eu nunca teria de volta as minhas despesas pagas, muito menos receberia algum honorário. Eu fiz isso porque rapidamente me dei conta que, no que diz respeito a este caso, não se tratava de uma ‘garota malvada’. À medida que as pilhas de documentos cresciam em pacotes ou eram baixadas da ‘nuvem’, a história foi se transformando em uma tragédia americana – e Michelle Carter tornando-se o mais inocente de todos os muitos participantes na morte de Conrad Roy.

Quem é Michelle Carter?

Tenho sido um expert em centenas de casos legais, com 100 ou mais que foram a julgamento, a maioria dos casos por crime, negligência ou processos de responsabilidade por produtos. Esses casos muitas vezes me exigem entrevistar inúmeros amigos, famílias, e indivíduos que passaram pela mesma situação, pessoas com vínculos com adultos e crianças que sofreram severas reações adversas fazendo uso de drogas. Em casos civis de negligência ou responsabilidade do produto, o indivíduo pode estar morto ou vivo. De qualquer forma, eu tenho que reconstruir suas histórias de vida, a partir de todas as evidências disponíveis. Se os indivíduos foram acusados de um crime, e as drogas psicoativas podem ter contribuído para isso, eu faço o mesmo processo de construção de sua biografia. Em nenhum momento eu já experimentei tanta convicção sobre um indivíduo. Quando comecei a investigar, a história da vida de Michelle ela parecia literalmente boa demais para ser verdade, e de certa forma assim o era.

Michelle

Michelle antes dos 14 anos era uma excelente atleta que estrelava no softball. Em sua pequena cidade de Plainville, Massachusetts, o que não era um insignificante feito. A escola e a comunidade com cerca de 8 mil habitantes se orgulhavam de ganhar campeonatos de softball e de enviar garotas para a faculdade para continuar suas carreiras como atletas. Os treinadores de Michelle, que eram empresários, me disseram que ela era a companheira de equipe mais atenciosa e prestativa com quem já haviam tido o prazer de trabalhar.

Em suas equipes altamente competitivas, embora fosse uma jogadora muito melhor do que a maioria das suas colegas, Michelle nunca colocou a vitória acima dos sentimentos de seus companheiros de equipe. Quando uma jogadora tinha um desempenho fraco, ela não poupava esforços para tranquilizá-la e confortá-la. Quando perguntei a um treinador se ele podia nomear uma outro atleta-estrela que nunca se queixava sobre outras jogadoras, ou mesmo sobre as outras equipes, ele fez uma breve pausa para sondar a sua memória e disse: “Nenhuma”. Treinadores e professores também me disseram que Michelle saía do seu caminho em sala de aula para ajudar outros alunos e também para ajudar seus professores.

Vários treinadores e professores contaram a mesma história sobre encontros com ela nos corredores ou em um jogo de bola. Ela sempre era a única aluna a se separar de seu grupo de colegas para perguntar aos outros se estavam bem, para dar um ‘oi’. Ao entrevistar Michelle, notei que ela conhecia muitas vezes melhor os nomes e as pessoas da sua comunidade do que seus próprios pais, os quais também sempre estiveram muito envolvidos nas atividades da sua pequena cidade.

Um professor da escola secundária, cuja classe havia ganho um prêmio em um projeto em que Michelle participou, a conhecia muito bem. Ele me contou que Michelle o ajudou de forma altruísta e a outros alunos, sem preocupar-se com as suas próprias notas. Ele foi efusivo sobre o quanto ele a respeitava e a apreciava. Textos entre Michelle e seus colegas mostram que ela oferecia apoio a outros estudantes que estavam trabalhando no projeto.

A preceptora mais antiga da escola secundária, e que foi transferida como professora para uma escola em uma comunidade próxima, permaneceu amiga de Michelle. Quando ela se formou na faculdade e começou a ensinar, Michelle começou a orientá-la em troca e apoiá-la no tratamento de seus próprios medos e preocupações sobre como começar a ensinar. A ex-preceptora de Michelle a via como uma jovem, única, carinhosa, amorosa e solidária.

Uma mãe que morava ao lado da sua casa, e cuja filha frequentemente trazia Michelle para a sua casa, disse que não via grande diferença em Michelle quando criança e agora no presente. O que estivesse acontecendo dentro de Michelle estava fora da vista dos adultos. Os parentes e os pais de Michelle também não viam nenhuma grande mudança ocorrendo nela. Ela era tão brilhante e alegre quanto sempre havia sido, e sempre ansiosa para agradar e ajudar. Michelle continuou para os seus olhos a merecer nota dez em bondade, carinho e solidária.

Perguntei às pessoas que entrevistei se elas sabiam ou tinham ouvido falar de alguém em sua cidade de 8. 000 pessoas que teria uma palavra ruim a dizer sobre Michelle. Alguns pensavam por um segundo, outros ponderavam, e todos responderam com efeito, “Não nunca”. Eles fizeram esta observação apesar da torrente de informações negativas sobre ela veiculadas pela imprensa.

O que emerge das entrevistas, da escola e dos registros médicos e textos é que se trata de uma menina cuja principal intenção na vida é amar e ajudar as pessoas. Milhares de textos com seus amigos confirmam quanto amor eles compartilhavam entre si, e como seus amigos em particular viam Michelle como uma pessoa atenciosa. Conrad Roy, o menino que cometeu suicídio, acabaria por usar suas inclinações naturais contra ela com consequências desastrosas.

Em sua escola e comunidade, ninguém poderia acreditar nas histórias de notícias horríveis sobre Michelle. O Estado de Massachusetts processou-a na mídia através de vazamentos seletivos e parciais de seus textos enviados para Conrad Roy, que a fazia parecer como alguém muito má; mas não era tão assim como parecia. Pelos vazamentos cuidadosamente orquestrados no escritório do procurador judicial a impressão que ficava é que não havia dúvidas sobre o que aconteceu – que ela tenha lhe dito essas palavras e que elas foram postadas em seus textos enviados a ele.

A escola de Michelle confiava tanto nela, que mesmo quando ela estava sob a acusação de homicídio culposo no início do último ano, a convidou para voltar para o seu último ano do ensino médio. Em seu último ano, antes de ir a julgamento, a sua turma lhe deu uma série de prêmios estudantis de prestígio. Michelle Carter, conhecida na mídia como a menina má, recebeu o prêmio de seus colegas de classe por ser o aluno “Mais Provável de Iluminar seu Dia”. Ela também obteve um segundo prêmio por “Palhaço da Classe”, não por ser perturbadora ou fora dos padrões, mas por fazer as pessoas sorrirem. Os advogados do Estado de Massachusetts nunca deram essa informação à imprensa.

A acusação da promotoria

O que aconteceu com Michelle Carter, que aparentemente se tornou um ser humano destrutivo e inclinado a empurrar seu namorado para se matar? A promotoria alegou que ela era uma pessoa egoísta incentivando seu namorado a se suicidar, a fim de ganhar atenção e simpatia. Esse era o único motivo que poderia explicar um ato tão horrível.

Durante os últimos meses que antecederam a trágica morte de Conrad, Michelle começou a se cortar. Ela frequentemente enviava mensagens de texto a seus amigos sobre seus problemas de alimentação e os cortes feitos em seu próprio corpo, até que um deles veio até à sua casa para sumir com a faca, e outro disse que não aguentaria mais que isso viesse a ocorrer. Em seu contra-interrogatório no final do primeiro dia do meu testemunho, a acusação afirmou que Michelle compôs todos os textos sobre se cortar apenas para obter simpatia e atenção de seus amigos, exatamente como “causou” a morte de Conrad pelos mesmos motivos egoisticamente perversos.

Naquela noite, preparei-me para a continuação do meu interrogatório no dia seguinte. Dentro da enorme quantidade de documentos que continham milhares de mensagens de texto, consegui localizar dois episódios separados, onde as amigas viram seus cortes e cicatrizes na escola e expressaram sua preocupação com ela. Na manhã seguinte, no julgamento, pude desconstruir o falso argumento da acusação de que Michelle nunca havia se cortado e, em vez disso, havia fingido ter se cortado para ganhar simpatia e atenção.

Eu citei os números de página dos textos, de modo que os advogados da acusação pudessem localizá-los e lê-los, o que lhes tomou um tempo. Eles pararam de alegar que ela tinha fingido tudo; mas eles nunca reconheceram que estavam errados ou se desculparam por criticá-la de forma tão negativa.

Essas mensagens de texto e outras fontes relevantes podem ser encontradas no meu Arquivo do Caso Michelle Carter, que estarei atualizando à medida que eu continuar com esta série de blogs.

Perguntas que precisam ser respondidas

Então, o que aconteceu com Michelle Carter para que ela tenha se tornado participante – mesmo que apenas por telefone e textos – nos planos suicidas de Conrad nos últimos dez dias de sua vida? Ela não o viu por um ano, e teve apenas alguns breves encontros com ele nos primeiros anos. Por que ela tinha alguma coisa a ver com ele?

Adolescentes na época, Michelle e Conrad serão encontrados envolvidos e dominados por forças além de sua compreensão ou controle – uma situação que afeta inúmeras outras crianças, adolescentes e até muitos adultos em todo o mundo hoje em dia. Algumas dessas vítimas estão presas, algumas em hospitais psiquiátricos ou casas adotivas. Muitas pessoas sofrem danos físicos e mentais persistentes, e muitas estão mortas. Enquanto isso, a grande maioria está sobrevivendo o melhor que pode em suas comunidades e famílias, enquanto tentam continuar na escola ou empregos.

Muito poucos têm alguma ideia do que aconteceu com eles. Muito poucos têm alguma idéia de que a deterioração da qualidade de vida é muitas vezes devida aos medicamentos psiquiátricos que estão recebendo. Em vez disso, com as drogas prejudicando o seu julgamento, as pessoas erroneamente se culpam e dizem que é a sua ‘doença mental’.

São muito poucos aqueles que narram as suas histórias, como eu tentarei fazer o melhor possível nesta série. A história de Michelle Carter não foi contada na mídia convencional. Como muitas outras vítimas da psiquiatria, os resultados trágicos das drogas usadas em larga escala na vida de nossos filhos e adultos não são revelados. Espero corrigir essa omissão.

Guerra às Drogas e Pós-Democracia

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No dia 3 de agosto último ocorreu a Aula Inaugural do Curso de Especialização em Saúde Mental e Atenção Psicossocial (ENSP/FIOCRUZ), em sua 35o. edição. O evento ocorreu no Auditório Internacional da ENSP, com a presença do diretor da ENSP, Prof. Hermano Castro e o Coordenador do Curso de Especialização, Prof. Paulo Amarante. A aula inaugural foi dada por Rubens R. R. Casara, que é Juiz de Direito do TJRJ, Doutor em Direito, Mestre em Ciências Penais, professor universitário, membro da Associação Juízes para a Democracia (AJD) e do Corpo Freudiano. Autor de Mitologia Processual Penal (Saraiva, 2015), Processo Penal do Espetáculo: ensaios sobre o poder pena, a dogmática e o autoritarismo na sociedade brasileira (Empório do Direito, 2015), dentre outros livros.

Rubens Casara

 

Veja na íntegra a aula inaugural na seção de vídeos localizada ao pé da página de Mad in Brasil.

 

 

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