Uso inseguro da droga do sono Zolpidem é comum

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Photo Credit: Ambien 10mg- Wikimedia Commons

spetersUm novo estudo, publicado no JAMA Internal Medicine, investiga os padrões de uso do zolpidem (o nome comercial é Ambien) em adultos. O artigo é escrito por Thomas Moore, que é cientista sênior do Institute for Safe Medication Practices, e por Donald Mattison, diretor médico chefe e vice-presidente sênior da Risk Sciences International. Os resultados do estudo indicam que mais de três quartos dos usuários de zolpidem não estão seguindo as recomendações da agência reguladora FDA para reduzir os riscos de efeitos colaterais e dependência a drogas.

“Esses dados mostram que o uso seguro ideal do zolpidem é pouco comum. Embora a eficácia diminua substancialmente após 14 dias de administração contínua, a maioria dos pacientes com zolpidem relatou uso prolongado, com um risco aumentado de dependência, visto que o zolpidem é uma substância controlada de classe IV ”, escrevem os autores.

Photo Credit: Ambien 10mg- Wikimedia Commons
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Em 2013, o zolpidem, um sedativo frequentemente usado para dormir, foi o medicamento hipnótico prescrito mais comumente usado nos EUA. Dado o uso disseminado da droga, seus efeitos adversos e riscos são importantes para serem enfrentados. A agência reguladora FDA fez três recomendações ao se tomar zolpidem, para que seja reduzido o risco de comprometimento no próximo dia relacionado com mudanças de comportamento e igualmente à dependência a drogas: (1) usar a droga apenas em curto prazo, porque o seu uso a longo prazo resulta em perda da eficácia; usar em doses baixas (5mg) para mulheres e pessoas com 65 anos ou mais, devido a mais elevadas concentrações sanguíneas, e (3) limitar a sua combinação com outras drogas que deprimem o sistema nervoso central (SNC).

Os pesquisadores do presente estudo procuraram comparar os padrões de uso do zolpidem na população adulta dos EUA com as recomendações da FDA. Para estimar os padrões nacionais de prescrição, eles usaram dados da Pesquisa do Painel de Gastos Médicos dos EUA em 2015, com uma amostra de 35.427 pessoas.

Os resultados sugerem que 3,8 milhões de adultos nos EUA tiveram pelo menos uma prescrição de zolpidem em 2015. As mulheres são quase duas vezes mais propensas que os homens a tomar zolpidem. Sessenta e quatro por cento dos adultos com 65 anos ou mais e 68% das mulheres estavam tomando doses mais altas de zolpidem, apesar das recomendações da FDA contra isso. Além disso, 68% dos pacientes que tomaram zolpidem utilizaram a droga por mais de 60 dias (mediana = 192 dias). Entre os que tomaram zolpidem por um período sustentado, 41% estavam também a tomar outro fármaco depressor do SNC (26% do zolpidem combinado com um opiáceo).

Os pesquisadores resumem: “No geral, 77,4% (95% CI, 70,5% -84,3%) não estavam observando duas ou mais recomendações para reduzir o risco”.

Esses achados são especialmente preocupantes, pois o uso de zolpidem resulta em mais visitas às emergências, devido a efeitos adversos, do que qualquer outro medicamento psicotrópico. Os resultados também sugerem que as mulheres estão em maior risco de efeitos adversos, devido às suas maiores taxas de uso de zolpidem e também porque os corpos das mulheres levam mais tempo para limpar o medicamento do sistema, resultando em concentrações sanguíneas 45% maiores. Os pesquisadores pedem mais esforços para reduzir os riscos de uso do zolpidem. Eles concluem:

“Este estudo do zolpidem mostra que há muitas oportunidades para reduzir os riscos de comprometimento no dia seguinte, mudanças anormais de comportamento e dependência”.

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Moore, T. J., & Mattison, D. R. (2018). Assessment of patterns of potentially unsafe use of zolpidem. JAMA Internal Medicine. Advance online publication. doi:10.1001/jamainternmed.2018.3031 (Link)

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NOTA DO MAD IN BRASIL

Na literatura científica brasileira:

  • Sukys-Claudino, L., Santos Moraes, W. A., Tufik, S.,Poyares, D. (2010). Novos Sedativos Hipnóticos. ‘Novos Sedativos Hipnóticos’. Rev. Bras. Psiquiatr. vol.32, 3, set2010, p. 288-293. Disponível clicando → aqui.
  • POYARES, Dalva; PINTO JR, Luciano Ribeiro; TAVARES, Stella  and  BARROS-VIEIRA, Sergio. Hipnoindutores e insônia. Rev. Bras. Psiquiatr. 2005, vol.27, suppl.1, pp.2-7. Disponível clicando → aqui.

A Retraumatização pela Psiquiatria: Uma Conversa acerca do livro Trauma e Loucura nos Serviços em Saúde Mental

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blevineForças políticas, culturais e financeiras têm feito com que muitos profissionais de saúde mental ignorem a realidade do trauma e da adversidade, o que costuma prejudicar muito em vez de ajudar. Em seu livro recentemente publicado Trauma e loucura em serviços de saúde mental (Trauma and Madness in Mental Health Services, publicado por Palgrave Macmillan, 2018) a psicóloga clínico Noël Hunter oferece uma crítica perspicaz das irracionalidades do diagnóstico e tratamento em saúde mental, e também fornece ferramentas concretas para os sobreviventes de trauma e para quem quer ajuda-los.

Hunter tem um ponto de vista particular para ver a profissão de trabalhadores em saúde mental. Não só ela é uma psicóloga com amplo conhecimento da pesquisa empírica, mas ela mesma foi ‘diagnosticada’ e ‘tratada’ como tendo uma ‘doença mental séria’. Antes de se tornar psicóloga clínica, Hunter era uma atriz envolvida em comédia de improvisação – que ela ainda faz – e ganhou a vida por uma década como personal trainer. No entanto, suas próprias experiências como paciente resultaram em seu retorno à escola para se tornar psicóloga. Sua dissertação de doutorado, na qual o livro é baseado, inclui entrevistas com indivíduos com experiência em primeira mão do sistema de saúde mental – especialistas por experiência – que Hunter cita ao longo de seu novo livro.

Recentemente, eu revi Trauma e Loucura em Serviços de Saúde Mental para CounterPunch, e eu estava curioso para ouvir mais de Hunter sobre seu novo livro.

Bruce Levine: Você escreve: “Não apenas minhas experiências no sistema de saúde mental foram retraumatizadas, mas elas também alteraram criticamente a minha visão de mim mesma e do mundo. Além disso, a dinâmica entre eu e vários dos profissionais de saúde mental que encontrei espelhou estranhamente aqueles que foram meus agressores.” Noël, me fale mais sobre isso, e quão comum você acha que é para o tratamento psiquiátrico estar sendo ‘retraumatizado’?

Noël Hunter: Eu acho que quanto mais alguém se machucou na vida, particularmente se foi durante o desenvolvimento, o mais provável é que se machuque de novo e de novo e de novo ao longo da vida. O sistema de saúde mental é um reflexo disso. Acredito que, no geral, o sistema é parte de uma grande reencenação das primeiras dinâmicas – sejam experiências de marginalização, discriminação, rejeição, abandono, julgamento e condenação, etc. – e há uma enorme falta de consciência por parte da maioria dos profissionais de como eles são cúmplices em reproduzi-los.

Um homem negro passa sua vida sendo marginalizado e agredido, demitido ou descartado do sistema por causa de seu medo e dor – se ele/ela entrar no sistema, ele não é mais “menos que” por causa de sua negritude, agora ele/ela é marginalizado e descartado como sendo ‘esquizofrênico’. Uma mulher jovem que sofreu abuso sexual e foi informada de que ‘queria’, foi culpada e nunca teve a oportunidade de ficar zangada com o sistema – ela agora está ‘limítrofe’ e mais uma vez culpada por ser muito sexualizada, por fazer a equipe se comportar de modos vergonhosos, e condenada por sua ira, mesmo quando está sendo retirada de si mesma.

Talvez mais do que qualquer outro, a encenação mais comum é aquela associada com o indivíduo que cresceu com um pai narcisista em constante necessidade de adulação, intolerante ao desconforto ou a autorreflexão, e que era um mestre na arte da manipulação sobre si mesmo.

Bruce Levine: Há tantas coisas que a psiquiatria do establishment tem errado que aqueles de nós que escrevem artigos e livros criticando esta instituição podem sobrecarregar um leitor. Para você, o que é o mais importante para os leitores em Trauma e loucura em serviços de saúde mental?

Noël Hunter: Que os problemas não provêm de poucos indivíduos ou mesmo de uma profissão. Em vez disso, a totalidade do campo da saúde mental e o paradigma sob o qual ela opera é uma religião moderna repleta de todos os problemas e benefícios familiares que existem em qualquer religião. Mais importante, porém, é a esperança de que as pessoas estejam dispostas a ir além do que a sociedade nos diz que ‘devemos’ fazer. As pessoas têm se recuperado de grandes dores há 200 mil anos – enquanto que as profissões de saúde mental existem há menos de 200. Embora hajam algumas coisas que aprendemos, precisamos parar de tentar reinventar a roda. As pessoas precisam de amor, apoio, comunidade, para serem ouvidas, valorizadas, validadas, terem propósito, ter saúde e moradia, ter nutrição física e emocional – não é ciência de foguetes e não se torna em ciência apenas porque continuamos dizendo que é.

Bruce Levine: Da minha experiência, nada deixa os psiquiatras do establishment mais irritados do que ser confrontados com essa verdade: seu desequilíbrio bioquímico e suas teorias de falhas genéticas o que fazem é rotular as pessoas como ‘defeituosas’, e isso resulta em que as pessoas que já estão sofrendo sejam estigmatizadas e marginalizada devido a este status de defeito. Isso é extremamente importante e você discute isso em seu livro.

Noël Hunter: Essa pode ser uma das coisas mais comuns com as quais me deparo em meu trabalho clínico, ao lado de pessoas que estão constantemente tentando provar que são fantasmas de seu passado sem sucesso. Se os pacientes aceitam de bom grado o papel de defeituosos, então como o médico está fazendo algo prejudicial ou errado? Pessoas que cresceram como bode expiatório, que acreditam que estão sujas, defeituosas ou más, que têm vergonha de sua existência ou acreditam que deveriam ser alguém que não são, que levaram suas vidas inteiras sendo marginalizadas e discriminadas na sociedade – estas são as pessoas que mais frequentemente entram em serviços de saúde mental. Elas também são as mais facilmente vulneráveis a aceitar essas mensagens sob o disfarce de tratamento e cuidado. Não é até que as pessoas estejam dispostas a começar a considerar que, de fato, elas não são defeituosas, ao contrário, que elas são seres humanos imperfeitos e únicos, adaptando-se a uma dor incrível, e que elas podem começar a acreditar em si mesmas o suficiente para se curar.

Naturalmente, há simplesmente a questão existencial dos profissionais de saúde mental que pode ser insuportável para eles enfrentar: se não estou corrigindo um problema definido e identificável, para o que, então, sirvo eu? Se o real poder de cura que tenho é algo que qualquer ser humano pode em princípio fornecer, desde que esteja disposto, por que gastei todos esses anos na escola e, possivelmente, dezenas de milhares de dólares? Se essas não são doenças específicas relacionadas a falhas bioquímicas ou genéticas específicas, por que me especializei – e quem não gosta de se sentir especial? E, pior, se eu não estou me dirigindo a pessoas com doenças genéticas e problemas bioquímicos, o que, de fato, estou fazendo quando tudo o que tenho para oferecer são drogas e intervenções tecnológicas?

Este problema não é exclusivo dos profissionais de saúde mental. Os médicos são pegos em um dilema semelhante quando se trata de obesidade, doenças cardíacas, diabetes, inflamação crônica e muitas doenças autoimunes, até mesmo câncer. O que esses médicos fazem quando percebem que esses problemas são quase inteiramente devidos a uma dieta industrializada amplamente baseada em interesses corporativos – a indústria açucareira, os fabricantes de soja, a Monsanto – e que se as pessoas simplesmente comessem como os humanos são projetados para comer, problemas na maior parte não existiriam? E, claro, essas questões estão totalmente interligadas com problemas de saúde mental!

É muito perigoso para a própria ansiedade existencial e a identidade qualquer questionamento sobre teorias genéticas e bioquímicas; a ideia de que essas teorias e seus tratamentos relacionados são realmente prejudiciais e discriminatórios está além do limite da aceitabilidade. Na defesa dos profissionais, os pacientes também passaram a acreditar que não estão recebendo tratamento ‘de verdade’ ou tratamento de qualidade se lhes for pedido que se exercitem, que comam saudavelmente, que caminhem mais, etc. – elas sentem que estão sendo pouco cuidadas se elas não saem com um plano ou prescrição concretas. O ônus ainda está com os profissionais que devem dizer a verdade.

Bruce Levine: O seu livro Trauma e Loucura em Serviços de Saúde Mental é sobre um assunto muito sério, mas você me fez rir em voz alta algumas vezes. Por exemplo, quando você discute a necessidade financeira dos profissionais de saúde mental de se destacar de seus numerosos colegas através de especializações pretensiosas, você escreve: “Eu moro em Nova York, onde a população de terapeutas é rivalizada apenas por atores, profissionais do sistema financeiro e pelos ratos”. A maioria dos profissionais de saúde mental têm medo de ser irreverentes sobre aspectos de sua profissão que ninguém deveria reverenciar. Você acha que a socialização deles prejudica sua espontaneidade e autenticidade?

Noël Hunter: Qual é o sentido da vida se não podemos rir! O riso é tão incrivelmente curativo e nos permite enfrentar os aspectos mais dolorosos da nossa existência sem sermos sufocados sob o peso de tudo isso. Isso nos permite digerir o que de outra forma é intolerável. Em essência, o riso é como um laxante altamente prazeroso. Uma boa risada é realmente uma boa… bem, você sabe bem.

Infelizmente, rir é desaprovado, e eu concordo que muitos profissionais de saúde mental parecem estar de alguma forma com medo de humor, pelo menos quando se trata de seu trabalho. Eu não acho que esse problema seja exclusivo dos profissionais de saúde mental. Eu acho que é um subproduto do próprio desenvolvimento doloroso em que eles podem ter sido ridicularizados ou não levados a sério quando crianças, e também, sim, da sua formação. Vivemos em uma sociedade que valoriza o estoicismo, o controle total sobre os próprios comportamentos, a falta de expressão emocional, a ‘polidez’ às custas da autenticidade – eu amo Nova York! – e um misterioso ideal de conformidade. Profissionais de saúde mental muitas vezes são selecionados por sua capacidade de representar esses valores. Aqueles encrenqueiros que dizem a verdade, são espontâneos (que também chamados de ‘impulsivos’), que riem ou encontram humor na escuridão (ou ‘afeto impróprio’), que se recusam a se conformar (ou o meu favorito, que têm um comportamento ‘desafiador’) são marginalizados e patologizados pela ameaça que eles representam para a propriedade. Eles geralmente não passam pelo processo de treinamento. Eu sei que quase nunca. É o caminho anglo-saxão. É também o que faz a maioria de nós completamente infelizes.

Bruce Levine: O que você acha que é mais importante transmitir aos profissionais de saúde mental que estão tratando de pessoas que podem estar se comportando de maneiras que parecem bizarras para eles ou que os assustam?

Noël Hunter: Tente entender o que você não entende. Saiba que quase sempre há uma razão pela qual uma pessoa está se comportando da maneira como está. É nosso trabalho dedicar um tempo para tentar entender o que é isso, não para escrever e julgar. Todos nós podemos imaginar um animal assustado e preso – ele esperneia, contorce-se, corre em círculos, pula, e se pudesse falar, provavelmente não estaria se esforçando muito para ajudar você a se sentir melhor, ele estaria tentando se proteger. Entendemos isso com animais e sabemos instintivamente que devemos ajudar a acalmar o animal e ajudá-lo a se sentir seguro. No entanto, com as pessoas, de repente, todo o senso comum e instinto sai pela janela e, em vez de compaixão e compreensão, julgamos, condenamos, evitamos, agredimos e desumanizamos. A reação padrão aos indivíduos que estão com medo e com muita dor é exatamente o oposto do que eles precisam.

Em suma: só porque alguém é diferente de você, isso não os torna errados, doentes, com personalidade desordenada, defeituosa, menos do que ou abaixo de você. Se você não pode ser curioso ou controlar seu próprio medo, busque aconselhamento.

Bruce Levine: Para concluir esse nosso bate-papo, você teve alguma reação à minha revisão do CounterPunchCounterPunché uma publicação política antiautoritária de esquerda com a maioria de seus leitores tendo antipatia por Donald Trump e Hillary Clinton, e parte do que eu queria fazer na minha análise de Trauma e Loucura em Serviços de Saúde Mental foi conquistar esses tipos de leitores para que se tornem tão críticos do complexo psiquiátrico-industrial quanto do complexo militar-industrial. Alguma coisa que eu disse na revisão que você discorda?

Noël Hunter: Eu amei a sua revisão e os paralelos que você desenha. É importante reconhecer o quadro maior – a psiquiatria existe dentro de um contexto maior. Vivemos em uma sociedade gerida por interesses corporativos e o nosso ‘conselho de experts” em quase todas as áreas é mais sobre proteger esses interesses do que a humanidade.

Também agradeço que você chame a atenção para a situação que muitos clínicos individuais têm o desejo sincero de ajudar seus pacientes, mas que o sistema industrial-corporativo estraga quase qualquer possibilidade de que eles possam realmente fazer isso. Eu não vejo o valor em atacar profissionais individuais assim como não gostaríamos que eles nos ataquem – encurralar uma pessoa com uma crítica ácida e agressões raramente, ou nunca, faz com que essa pessoa ouça ou se conecte.

As pessoas que entram nos serviços de saúde mental são frequentemente as mais vulneráveis da sociedade – pessoas que sofreram extensos traumas, adversidades, abuso e opressão durante toda a vida. Ao mesmo tempo, luto contra a palavra ‘trauma’ porque significa algum evento muito forte e evidente que precisa passar por uma linha arbitrária de ‘ruim o suficiente’ para ser levado em conta. Eu prefiro os termos ‘stress’ e ‘adversidade’. No livro, falo sobre o problema da linguagem e como isso insinua diferenças que não existem, julgamentos e suposições que são falsas. Nossos cérebros e corpos não sabem a diferença entre ‘trauma’ e ‘adversidade’ – um estado estressado luta pelo stress / estado de luta por trauma é o mesmo, independentemente das palavras que você usa para descrever o ambiente externo. Estou cansado de pessoas dizerem que “nada de ruim me aconteceu”, porque elas não sofreram “trauma”. As pessoas sofrem e, quando o fazem, é por um motivo.

Além disso, é importante reconhecer que ‘ex-pacientes recuperados’ são um grupo seleto de indivíduos muito privilegiados, como eu sou, e não são as únicas vozes de valor. Os participantes que citei ao longo do meu livro existem ao longo de um grande continuum de funcionalidade, angústia e status de recuperação autoidentificada – embora a maioria tenha, de fato, se identificado como ‘recuperado’. Quase todos ainda estavam em algum tipo de terapia ou tratamento de saúde mental, e, portanto, não seriam considerados ex-pacientes. Muitas pessoas não têm o luxo de escapar do sistema, seja devido à dependência de drogas, falta de outro apoio, medo, solidão ou a lei. Suas vozes são igualmente importantes.

E esse é realmente todo o propósito do meu livro. Para dar a essas vozes a chance de serem ouvidas. Espero que as pessoas escutem.

 

“A mente polarizada” como estrutura alternativa para o sofrimento humano

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shanonspetersUm novo artigo, escrito por Kirk Schneider, aborda a questão de que os indivíduos marginalizados têm maior probabilidade de receber diagnósticos psiquiátricos, enquanto muitos comportamentos abusivos ou destrutivos exibidos por indivíduos poderosos são mais glorificados do que patologizados. Como presidente do Instituto Existencial-Humanista e professor adjunto da Saybrook University, Schneider é um dos principais porta-vozes da psicologia existencial-humanista contemporânea. Seu artigo, adaptado de um post anterior da sua coluna no Psychology Todaye publicado no Journal of Humanistic Psychology, sugere que “a mente polarizada” pode ser uma estrutura mais útil para responder ao sofrimento do que o diagnóstico.

“Se quisermos abordar o problema do distúrbio mental em nossas comunidades e, de fato, no mundo, devemos abordar as culturas e as motivações que causam tal perturbação, e precisamos buscar recursos muito além do modelo médico ou da psicologia clínica”, escreve Schneider.

 

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Schneider observa que a ‘doença mental’ é popularmente entendida como referindo-se ao sofrimento psicológico, mas tem sido cada vez mais definida em termos biológicos. Ele argumenta que esse foco biológico “quase que nos cega para sua causa mais profunda”, que ele argumenta ser ambiental e o resultado do medo não reconhecido. Schneider levanta a questão de que muitas pessoas que se envolvem em atos destrutivos (por exemplo, abuso, guerra) não são vistas pela sociedade como tendo uma “doença psiquiátrica”. Ele usa o exemplo de muitos líderes políticos, empresariais e religiosos que exibem traços antissociais, transtorno de personalidade ou transtorno de personalidade narcisista. Ele escreve:

“Agora, é muito claro – ou deveria ser, ainda que com um conhecimento superficial da história do passado ou a dos tempos atuais – que essas ‘desordens’ mencionadas são grandes perturbações da humanidade e não meramente as patologias de grupos marginalizados.”

Schneider reivindica uma terminologia que “possa capturar a amplitude do problema que convencionalmente atribuímos aos grupos marginalizados e privados de direitos que sãao rotulados como pessoas com transtornos mentais”. Ele sugere que “a mente polarizada” possa ser uma estrutura útil. Schneider define:

“A mente polarizada é a fixação em um ponto de vista e a exclusão total de pontos de vista concorrentes e, na minha opinião, essa é a ‘praga’ psicossocial da humanidade.”

De acordo com Schneider, a mente polarizada aplica-se a todas as pessoas em algum grau, atravessando os diversos níveis de poder (por exemplo, ricos / pobres, privilegiados / marginalizados). Ele espera que este quadro possa ajudar a explicar como o ‘transtorno mental’ surge.

“A mente polarizada é uma estrutura conceitual mais aberta para diagnósticos do DSM; nos dá um contexto sociopolítico para esses diagnósticos, e os situa na narrativa muito maior e mais precisa do sofrimento histórico do que nas narrativas compartimentadas da fisiologia, paternidade ou trauma individual ”, escreve Schneider.

Schneider conecta a mente polarizada à teoria do gerenciamento do terror: que a fixação em um ponto de vista é o resultado do medo, especificamente do medo da morte. Quando não abordado, as pessoas trabalharão para evitar o medo, o que pode resultar em atos destrutivos. Ele dá exemplos de tiroteios em massa, atentados suicidas e homicídios racialmente carregados, bem como a influência corporativa no Congresso dos EUA, destruição do meio ambiente e retórica odiosa.

Schneider oferece possíveis maneiras de integrar a estrutura da mente polarizada em intervenções. Ele recomenda mais pesquisas de psicologia profunda, referindo-se a “análises quantitativas e qualitativas, existencialmente informadas, da condição humana”. Por exemplo, ele sugere pesquisas sobre psicoterapia profunda para jovens, famílias e comunidades.

Ele também sugere pesquisas sobre artes, humanidades e inteligência emocional sejam incorporadas aos currículos nas escolas. Por fim, ele pede estudos sobre encontros facilitadores entre membros da comunidade e funcionários do governo. Schneider espera que esses tipos de intervenções permitam que as pessoas ampliem suas perspectivas e encontrem pontos de convergência com outras, o que poderia reduzir a polarização.

Schneider conclui com o alerta: “Se não reconhecermos que as abordagens psiquiátricas convencionais – e a terminologia – são insuficientes para a tarefa de abordar aqueles que governam e muitas vezes ameaçam nosso mundo, continuaremos a tropeçar em desespero”.

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Schneider, K. J. (2018). The chief peril is not a DSM diagnosis but the polarized mind. Journal of Humanistic Psychology. Advance online publication. doi:10.1177/0022167818789274 (Link)

A abordagem da psicoterapia contemplativa para casos extremos psicóticos

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RebeccaNa nova edição especial do Journal of Humanistic Psychology, “Perspectivas Humanísticas para o Entendimento e Resposta aos Estados Extremos”, editada pelo Dr. Michael Cornwall, Charles Knapp explora teorias e tratamentos para “estados extremos psicóticos”. Quase 30 anos de prática na Windhorse Community Servicesem Boulder, CO, Knapp propõe que estados extremos carregam o potencial de transformação em “um caminho altamente individual de descoberta e manifestação… [a própria] sanidade intrínseca e única”.

“Em mais de 30 anos conhecendo pessoas em estados extremos, eu não encontrei um pensamento, emoção ou processo em outros que eu não reconheça como parte da minha própria mente”, escreve Knapp.

A escrita de Knapp baseia-se na tradição da psicoterapia contemplativa, uma abordagem nascida de uma colaboração entre o professor budista tibetano Chögyam Trungpa Rinpoche e psiquiatras e psicólogos ocidentais na década de 1970. Um dos princípios fundamentais da psicoterapia contemplativa é o da “sanidade brilhante“, que se refere a uma qualidade de mente expansiva, clara e compassiva à qual todos os humanos têm acesso.

 

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O Naropa Institute (hoje, Naropa University) foi fundado por Chögyam Trungpa Rinpoche em 1974 em Boulder, Colorado, como uma casa para o ensino de psicologia contemplativa e psicoterapia. Em 1981, Trungpa Rinpoche passou a desenvolver o Projeto Windhorse com o Dr. Ed Podvoll; o projeto posteriormente evoluiu para os Serviços Comunitários de Windhorse, onde Knapp é um clínico sênior. Windhorse usa uma abordagem psicoterapêutica contemplativa para apoiar aqueles que experimentam estados mentais extremos de uma maneira holística, baseada em casa e baseada na comunidade, e voltada para a recuperação.

Knapp aborda duas questões em seu artigo: “Quais são as causas e experiências os estremos estados psicóticos?” E “Como a compreensão disso informa como podemos ser úteis?

Reconhecendo que são complexas as causas dos estados extremos psicóticos, Knapp se concentra em duas razões particulares – ambientais e psicológicas. As causas ambientais incluem a família, a comunidade e o zeitgeist(o espírito da época) mais amplo (por exemplo, a degradação e desconexão humana do nosso ambiente natural).

O ambiente também influencia os caminhos dos indivíduos para a recuperação após a experiência de estados extremos. Embora as comunidades vizinhas de algumas pessoas “respondam com habilidade e gentileza”, escreve Knapp, outras reagirão com “intervenção agressiva”, o que pode resultar em “uma sentença de morte espiritual”: a conclusão de que a pessoa está fundamentalmente danificada e sempre será. ”

O ambiente também influencia os caminhos dos indivíduos para a recuperação da experiência de estados extremos. Embora alguma pessoas próximas das pessoas irão “responder com habilidade e delicadeza,” Knapp escreve, outros reagirão com ‘intervenção agressiva’, o que pode resultar em “uma sentença de morte espiritual: a conclusão de que a pessoa está fundamentalmente danificada e assim ficará para sempre.”

Em se tratando das causas psicológicas dos estados extremos, Knapp descreve a ruptura que pode ocorrer quando a “realidade consensual” se choca com um nível mais profundo e mais “fundamental da realidade” que normalmente não faz parte de nossa consciência diária. Ele relata a sua própria experiência evitando esse nível de realidade quando jovem e através do trabalho e da “automedicação”.

Ao discutir como o despertar para este nível de realidade pode ser chocante e fazer com que alguém se desvincule da realidade consensual, Knapp extrai da Medicina e Psiquiatria Tibetanas, que afirma que “Realização dos fatos inevitáveis da decadência e morte, da impermanência em todos aspectos da vida, podem ser devastadores … A base psicológica da insanidade é a mesma base para a iluminação.

Em resposta à sua segunda pergunta sobre como alguém pode ser útil para alguém em um estado extremo, Knapp apresenta quatro princípios empregados pelos praticantes da Windhorse:

1.) “As pessoas são fundamentalmente sadias e saudáveis, assim a confusão mental existe e funciona em uma posição secundária.”

A “sanidade fundamental” dos clientes deve ser reconhecida e afirmada; tal postura serve para diminuir o medo e transmitir respeito. Ajudar os clientes a se conectarem com suas experiências de saúde anteriores também pode ajudar a promover um senso de confiança e possibilidade.

2.) “Somos inseparáveis do nosso meio ambiente.”

Os clínicos devem se esforçar para criar “ambientes de sanidade” para seus clientes. Uma das maneiras pelas quais os praticantes de Windhorserealizam isso é através da prática do Atendimento Básico, que envolve a sintonização e o envolvimento total com os clientes. Outros conceitos incluem recuperação mútua e troca, que reconhecem que os clínicos estão em uma jornada ao lado de seus clientes e que, estando radicalmente abertos às experiências dos clientes, os clínicos podem ter experiências desconfortáveis em que “experimentam diretamente” as mentes e estados físicos de seus clientes. Como a troca é um processo mútuo, os clientes também são capazes de absorver os “aspectos saudáveis das mentes estáveis no ambiente”.

3.) “A recuperação é o caminho da descoberta e sincronização com a própria saúde e sanidade.”

Knapp enfatiza que isso envolve começar onde os clientes estão e ajudá-los a se conectar com um senso de saúde através de seus próprios sentidos e relacionamentos de apoio. “É bem sabido que muitas pessoas em estados extremos se sentem indescritivelmente solitárias – seus mundos internos são desconhecidos para os outros e cortadas do contato com pessoas que estão dispostas a simplesmente estar com elas”, escreve ele. “Como terapeuta, simplesmente sentir a dor e a situação de outra pessoa sem desviar o olhar e sem tentar mudá-la é muitas vezes um ponto de encontro onde uma comunicação genuína pode ocorrer.” A perspectiva de Knapp ecoa a defesa de Michael Cornwallpara abordar os estados extremos a partir de um lugar de “receptividade amorosa”.

4.)“Não importa o quão perturbada a mente tenha se tornado, a recuperação é possível.”

Knapp prefacia sua descrição desse princípio final com uma resposta à pergunta “Recuperação de quê?” O “o quê”, escreve ele, é “afogamento” – circunstâncias em que os clientes chegaram a um ponto de não conseguir “manter a vida na realidade consensual”, e tornaram-se tão desconectados do “corpo e sentidos ” que não podem mais estar em “relações recíprocas e na comunidade ”.  Knapp enfatiza, no entanto, que uma vida saudável vem em muitas formas: “Nadar” não significa tornar-se a versão do normal que o outro quer.”

Knapp fecha com letras de uma canção do monge budista zen e famoso cantor e compositor, o Leonard Cohen:

Tocar os sinos que ainda podem tocar

Esqueça sua oferta perfeita

Há uma rachadura em tudo

É assim que a luz entra

Finalmente, ele escreve:  “Esta  “quebra “refere-se a lacunas em nossas mentes, bem como em nossa vida familiar… Para o bem ou para o mal, estados extremos são uma lacuna… para aqueles de nós que estão em posição de ser prestativos, a confiança nessas lacunas potenciais para catalisar caminhos altamente individuais de sanidade nunca deve ser esquecida. ”

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Knapp, C. (2018). That’s How the Light Gets In. Journal of Humanistic Psychology, 0022167818761998. (Link)

PETER LEHMANN: seu livro Alternativas para Além da Psiquiatria

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eter Lehmann awarded Honorary Doctoral Degree by the School of Psychology of the Aristotle Univ. of Thessaloniki, Greece, Faculty of Philosophy. He is in the ceremonial hall "Alexandros Papanastasiou") [Photo by Takis Leontidis, FOTO GRECO]

Livro que aborda alternativas à psiquiatria em todo o mundo, editado por Peter Stastny e Peter Lehmann. (Ex-) usuários e sobreviventes de psiquiatria, terapeutas, psiquiatras, advogados, cientistas sociais e parentes relatam sobre seu trabalho alternativo, seus sucessos, suas experiências individuais e coletivas. O livro destaca alternativas além da psiquiatria, possibilidades atuais de autoajuda para indivíduos que vivenciam a loucura e estratégias para implementar o tratamento humano. Com um link para “Autoajuda e Alternativas além da Psiquiatria” – Portal Internacional de Internet sobre Antipsiquiatria Humanista de Peter Lehmann.

Peter Lehmann, nascido em 1950 em Calw na Floresta Negra da Alemanha, experimentou pessoalmente a internação involuntária e tratamento psiquiátrico na década de 1970, e nos últimos 40 anos trabalha pelos direitos dos pacientes psiquiátricos e suas redes mundiais de mútua ajuda. Cientista social, foi premiado com o doutorado honnoris causa pela Escola de Psicologia da Universidade Aristóteles de Thessaloniki, Grécia, Faculdade de Filosofia.

eter Lehmann awarded Honorary Doctoral Degree by the School of Psychology of the Aristotle Univ. of Thessaloniki, Greece, Faculty of Philosophy. He is in the ceremonial hall "Alexandros Papanastasiou") [Photo by Takis Leontidis, FOTO GRECO]
Peter Lehmann awarded Honorary Doctoral Degree by the School of Psychology of the Aristotle Univ. of Thessaloniki, Greece, Faculty of Philosophy. He is in the ceremonial hall “Alexandros Papanastasiou”) [Photo by Takis Leontidis, FOTO GRECO] 
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Adversidade social e ser Vítima de Violência aumentam o risco de experiências psicóticas em cinco vezes

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Photo Credit: Katie McKeown, “Urban vs. Rural,” Flickr

bruizA pesquisa tem citado com frequência a urbanidade, quer dizer morar em um ambiente urbano, como sendo um fator de risco para o desenvolvimento de sintomas associados à psicose. Um novo estudo, publicado no Schizophrenia Bulletin, examina o impacto da urbanidade, das condições adversas da vizinhança e de ser vítima de crimes violentos, para o desenvolvimento de experiências psicóticas durante a adolescência. Os autores, liderados por Joanne Newbury do King’s College de Londres, determinaram que adolescentes criados em áreas urbanas versus os criado em áreas rurais eram significativamente mais propensos a relatar experiências psicóticas e que, quando combinadas, as condições sociais da vizinhança e a vitimização por violência estavam significativamente associadas a experiências psicóticas adolescentes.

“A maioria das pesquisas anteriores sobre o surgimento de experiências psicóticas adolescentes concentrou-se nos fatores de risco no nível individual e atualmente pouco se sabe sobre o impacto potencial de estruturas macro, como urbanismo e processos sociais de vizinhança, assim como a fragmentação social e a criminalidade”. Newbury e os coautores escrevem.

Photo Credit: Katie McKeown, “Urban vs. Rural,” Flickr
Photo Credit: Katie McKeown, “Urban vs. Rural,” Flickr

A urbanidade é um fator de risco bem aceito para a psicose. Além disso, numerosos estudos confirmaram taxas mais altas de transtornos do espectro psicótico em populações urbanas. Um estudo de 2015 descobriu que de 1990 a 2010, as taxas de esquizofrenia nas áreas rurais permaneceram estáveis em 0,36%, enquanto que as taxas nas áreas urbanas aumentaram para 0,68%. Os autores do presente estudo apontam que as pesquisas muitas vezes focalizaram os fatores de nível individual, e deram muito pouca importância para o impacto potencial das estruturas de nível macro e dos processos sociais da vizinhança para que essa relação seja melhor explicada.

Em sua pesquisa, Newbury e sua equipe procuraram analisar o que significa viver em centros urbanos que contribuem para esse risco maior. Analisando dados do Reino Unido, Newbury e seus colegas buscaram testar sua hipótese de que “uma das razões pelas quais os jovens em ambientes urbanos correm maior risco de fenômenos psicóticos é que eles experimentaram um maior acúmulo de adversidades sociais no nível de vizinhança e experiências pessoais de violência durante a seu crescimento.”

Os autores deste estudo testaram suas hipóteses usando dados longitudinais de 2.063 gêmeos britânicos do Environmental Risk (E-Risk) Longitudinal Twin Study. Os fenômenos psicóticos adolescentes foram capturados por meio de uma medida de auto-relato que incluiu itens como “Preocupa-me que minha alimentação esteja envenenada”. A urbanidade foi determinada pelo CEP da família e com base na definição fornecida pelo Escritório de Estatísticas Nacionais (ONS) Rural – Definição Urbana para pequenas áreas geográficas. Consistiu em 3 categorias (características da vizinhança em área rurais, em áreas intermediárias e em áreas urbanas foram determinadas por pesquisas enviadas a residentes próximos dos participantes. De particular interesse foram os fatores: coesão social e desordem na vizinhança.

“Estávamos interessados em [esses fatores] porque coletivamente capturam as características da vizinhança que poderiam influenciar de forma plausível o risco de fenômenos psicóticos, como confiança e apoio entre vizinhos e sinais físicos e sociais de ameaça na vizinhança. ”

A coesão social foi capturada por itens que acessassem se os vizinhos compartilhavam valores, confiavam e se davam bem uns com os outros. A desordem nos bairros foi capturada por questões que tinham como objetivo determinar se problemas específicos, como ataques e roubos, assaltos e vandalismo, afetavam sua vizinhança. Informações sobre Vitimização de Crimes Pessoais foram coletadas através de entrevista e usando a 2ª Revisão do Questionário de Vitimização Juvenil (JVQ-R2). Itens incluídos: desde que você tinha 12 anos, “alguém bateu ou atacou você de propósito com um objeto ou arma como um pau, pedra, arma, faca ou qualquer coisa que doesse? ” A privação no nível de bairro foi determinada pela Classification of Residential Neighborhoods (BOLOTA). As categorias incluem: “empreendedores ricos (25%), prosperidade urbana (5,3%), confortavelmente alternativo (13%), meios moderados (26%) e  “duramente pressionados “(26%). Por último, dados da família e nível individual foram coletados e contabilizados, como a situação socioeconômica familiar, o histórico psiquiátrico familiar, a dependência de álcool e cannabis, entre outros.

Os autores deste estudo descobriram que à medida que o ambiente urbano aumentava as experiências psicóticas também aumentavam. Além disso, ao controlar as potenciais variáveis intervenientes no nível da família e do indivíduo (por exemplo, nível de coesão da família, histórico psiquiátrico familiar) e privação no nível da vizinhança, a associação permaneceu significativa.

Além disso, os resultados mostraram que as experiências psicóticas foram mais comuns entre os adolescentes que viviam em bairros com níveis mais baixos de coesão social e níveis mais altos de violência na vizinhança. Por último, enquanto a adversidade social do bairro e a vitimização do crime foram independentemente associadas de forma significativa com experiências psicóticas adolescentes, o efeito combinado foi cinco vezes maior do que um sozinho.

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Newbury, J., Arseneault, L., Caspi, A., Moffitt, T. E., Odgers, C. L., & Fisher, H. L. (2017). Cumulative effects of neighborhood social adversity and personal crime victimization on adolescent psychotic experiences. Schizophrenia Bulletin44(2), 348-358. (Link)

A síndrome da disfunção sexual pós antidepressivos (PSSD): no The Guardian, U.S. News & Lyon Capitale

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RxISKO The Guardian, jornal britânico, lançou um programa semanal chamado “Minha vida no sexo”, uma coluna na qual os leitores podem escrever e falar sobre sua vida sexual.

Em 8 de junho de 2018, foi publicado um artigo chamado “Depois de tomar antidepressivos, meus genitais pareciam entorpecidos”. Uma mulher de 30 anos descreveu como ficou com disfunção sexual pós-ISRS (PSSD), desde que parou com antidepressivos (ISRS) há oito anos. Você pode encontrar o artigo no link acima.

Muitas vezes há mais relatos de PSSD de pacientes do sexo masculino do que de mulheres, de modo que o artigo é útil para aumentar a conscientização de que a condição afeta ambos os sexos. Curiosamente, vários dos que deixaram comentários no site do The Guardian assumiram erroneamente que o autor era do sexo masculino.

O artigo destacou a questão específica da dormência genital. Esta é uma das marcas registradas do PSSD e pode ajudar a esclarecer que um doente está experimentando um efeito farmacológico e não um problema psicológico.

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Artigos sobre o PSSD na mídia são bastante raros. Para quem ainda não viu, temos uma página em nosso site que lista artigos da mídia sobre PSSD e disfunções sexuais relacionadas. Apesar do fluxo constante de artigos de notícias sobre antidepressivos e até mesmo sobre os efeitos colaterais sexuais, há sempre relutância dos jornalistas quando se trata de PSSD. Isso torna ainda mais surpreendente que o The Guardian realmente tenha publicado algo nesse sentido.

Respostas

Comentários sobre artigos da Internet variam significativamente em qualidade, que podem rapidamente se tornar em algo sem interesse ou cair em abuso. Não obstante, ainda pode ser interessante analisá-los para se ter uma ideia de como o público responde. Nesse caso em tela, houve um total de 307 comentários, que podem ser visualizados no artigo principal no site do The Guardian.

Várias pessoas parecem que entenderam mal que o autor estava descrevendo efeitos colaterais que persistiram após a interrupção da droga, ao invés de efeitos colaterais enquanto ainda em um antidepressivo. Vários comentários também pareceram errar ao não se darem conta de que o artigo era primariamente sobre dormência genital e não simplesmente sobre perda de libido.

No geral, no entanto, as respostas foram bastante favoráveis e certamente mais razoáveis do que é frequentemente o caso quando se discutem os danos dos antidepressivos. Talvez isso seja porque fazia parte de uma série sobre a vida sexual das pessoas, em vez de ser enquadrada como uma peça especificamente sobre antidepressivos. Também pode ter ajudado que os comentários tenham sido moderados.

Algumas pessoas ficaram chocadas e desapontadas com a atitude do médico em demonstrar pouco interesse ou preocupação com a disfunção contínua do autor. Houveram sugestões de que a pessoa deveria mudar de médico.

Talvez os comentários mais interessantes tenham sido de pessoas que declararam ou sugeriram que podem elas mesmas estar sofrendo do mesmo problema:

  • “Há três anos atrás tomei ISRSs por algumas semanas e minha função ainda não se recuperou completamente.”
  • “Tomei ISRSs há uns bons dez anos e, embora menos grave que seus sintomas quando em uso, nunca mais fui o mesmo desde então.”
  • “Os médicos não conseguem enfatizar esse problema. Meu ex tinha exatamente o mesmo problema com antidepressivos, e não foi avisado que tal condição persistiria mesmo depois de parar os antidepressivos.
  • Eu fui recomendado a tomar antidepressivos por uma médica – eu questionei o risco de PSSD (porque pode também afetar mulheres) – ela me disse que aquelas pessoas contando essas histórias online estavam inventando! ”
  • “Absolutamente entendo e compartilho dos mesmos sentimentos com você. Eu costumava gozar facilmente em minhas relações sexuais. Em 1997, eu estava em ISRSs por alguns meses, e não consegui gozar uma vez sequer. Quando eu saí alguma sensibilidade retornou, mas ainda é dez vezes mais difícil de atingir o orgasmo do que costumava ser. Tenho certeza de que esse é um efeito colateral muito pouco relatado porque é vergonhoso conversar com seu médico sobre o assunto. ”
  • “Sou do sexo masculino e tomei ISRSs há 20 anos. Demorei muito tempo para me recuperar deles sexualmente; por muito tempo, na verdade, e vem a lembrança de como as coisas haviam sido murchadas, e eu fiquei com a sensação incômoda de que fiquei com uma perda residual ”.
  • “… Passei meses lutando contra os sintomas de abstinência (que os médicos dizem não existir) por desistir dos medicamentos ISRSs. Mas tendo finalmente conseguido, a função sexual tornou-se ainda pior – na medida em que passei a querer sexo de novo-, mas simplesmente eu não conseguia administrá-lo em nenhuma circunstância. Isso foi há um ano e o problema persiste até hoje sem nenhum sinal de melhora – agora parece ser permanente! ”
  • “Oi. Experiência semelhante. Perdi todo o interesse por cerca de dez anos e nunca pensei que eu seria capaz de aproveitar isso novamente. Por sorte, tenho um parceiro que é paciente e gentil e que está comigo há vinte anos. Nós apenas experimentávamos, até descobrirmos o que funcionava melhor para nós. Muito, muito, muito devagar, comecei a sentir a sensação de volta. Não é bem o que me lembro dos meus 20 anos, mas deixa os dois satisfeitos … agora com 39 anos e com uma vida sexual completamente ativa (finalmente!)
  • “ … Eu também me recusei a tomar antidepressivos desde os 25 anos. Difícil, mas consegui desenvolver mecanismos de enfrentamento para superar o pior de tudo. ”
  • “É bom para um escritor poder falar sobre essa condição horrível. Eu também tenho sofrido isso depois de me ter sido prescrito aos 17 anos o Prozac. Meus genitais estão entorpecidos desde então, mesmo que eu tenha interrompido a medicação cinco anos atrás. ”
  • “Para mim, eles notaram o sintoma, mas não acreditavam que pudesse ser um sintoma permanente depois de interromper os medicamentos. Eu também sofri por anos e, infelizmente, estou absolutamente certo de que isso não é psicológico ou relacionado à ansiedade. É uma absoluta falta física de sexualidade ou prazer sexual. Começou imediatamente depois que comecei a usar o AD – ingenuamente, eu nem sabia que era um efeito ”.
  • “Eu também tive esse efeito colateral horrível depois de tomar o AD há alguns anos atrás. Isso afetou todos os aspectos da minha sexualidade – não tenho desejo físico, não sinto prazer sexual – em termos sexuais, sinto como se estivesse completamente morta.”
  • “A falta de libido, sensação, desejo, prazer (não apenas no sexo, mas na música, qualquer coisa) pós-ISRS é absolutamente um resultado possível. Um estado permanente. É tão real (para aqueles entre vocês que não experimentaram e tentam explicar isso), é como um membro amputado. Eu tomei um ISRSI em 1994, por apenas quatro meses. Eu passei a sofrer com essa falta de alegria, emoção e sensação sexual desde então. ”

Notícias dos EUA

Em 28 de junho de 2018, o site do US News and World Report publicou um artigo sobre saúde chamado “Você tem efeitos colaterais sexuais com os antidepressivos que parou de tomar?” Foi escrito por Michael O. Schroeder e focado nas publicações recentes do RxISK no International Journal of Risk & Safety in Medicine.

Há citações da Dra. Audrey Bahrick, uma das autoras originais revisadas por pares sobre a condição, bem como do professor Dee Mangin, diretor médico da RxISK.

Houve também uma interessante contribuição da Dra. Eliza Menninger. O artigo afirma:

“Dr. Eliza Menninger, que dirige um programa de saúde comportamental no McLean Hospital, em Boston, diz que nunca ouviu pacientes expressando sérias preocupações sobre os efeitos colaterais sexuais depois de interromper a medicação. Na maior parte, os efeitos colaterais sexuais parecem desaparecer depois que os pacientes param de tomar o medicamento, diz Menninger.”

Observem os termos “na maioria das vezes” e “parecem desaparecer”. O artigo passa a citar diretamente a Dra. Menninger, quem diz:

“Alguns podem ainda se queixar de haver ainda um problema, mas eles não parecem tão incomodados com isso – e eu não sei se é um problema tão ruim quanto quando eles estavam no ISRS”.

Isso parece estar de acordo com o que alguns de nós do RxISK, e outros, vêm dizendo há muito tempo. Embora alguns portadores de PSSD tenham uma forma grave da doença, é provável que hajam outros – talvez até uma porcentagem maior de pacientes – com sintomas menos graves que ou não percebam que são afetados, ou que não os atribuam a um medicamento que não estão mais tomando, ou que não se importam com o problema devido à perda de libido. Nós exploramos essas questões em nosso post de 2016 – Quão comum é o PSSD.

Lyon Capitale

Lyon Capitale é uma revista francesa que abrange uma gama de tópicos, incluindo saúde. Em 28 de junho de 2018, eles publicaram um artigo chamado “Un antideppresseur peut-il détruire votre vie sexuelle?” Que se traduz como “Um antidepressivo pode destruir sua vida sexual? ”

O artigo discute o tópico dos efeitos colaterais sexuais persistentes após o uso de antidepressivos, incluindo transtorno da excitação genital persistente (PGAD). As publicações de periódicos recentes do RxISK são mencionadas e há também uma contribuição do Professor Healy.

No momento, o artigo apenas pode ser acessado via pagamento e não temos certeza se, ou quando, ele será disponibilizado gratuitamente.

Esperamos que esses artigos tragam conhecimento do PSSD e do PGAD para um público mais amplo. Somos gratos ao autor anônimo do artigo do The Guardian e a Michael Schroeder e Ariane Denoyel por ajudarem a aumentar a conscientização sobre essas condições que potencialmente mudam por completo a vida.

Nova pesquisa sugere que anormalidades cerebrais na ‘esquizofrenia’ podem resultar dos antipsicóticos

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Peter SimonsUm novo estudo publicado em Biological Psychiatry descobriu que a espessura cortical reduzida e a área da superfície do cérebro estão correlacionadas a um diagnóstico de esquizofrenia, mas que essas diferenças podem ser explicadas pelo uso disseminado de medicamentos antipsicóticos.

Os pesquisadores relataram que “os tamanhos do efeito foram duas a três vezes maiores nos indivíduos que receberam medicação antipsicótica em relação aos indivíduos não medicados”.

Na verdade, os pesquisadores descobriram que, nos que diz respeito à espessura cortical, os participantes com diagnóstico de esquizofrenia, que não estavam medicados, não eram significativamente diferentes daqueles sujeitos saudáveis do grupo controle.

Os pesquisadores fazem parte do grande consórcio mundial chamado ENIGMA Schizophrenia Working Group. O estudo incluiu dados de 9 572 participantes em 39 testes mundiais (4.474 foram diagnosticados com esquizofrenia; 5.098 foram sujeitos de controle “saudáveis”). Os pesquisadores examinaram dados sobre a espessura cortical e a área da superfície do cérebro em geral.

Os pesquisadores descobriram que os indivíduos com diagnóstico de esquizofrenia tinham córtices mais finos do que os do grupo de controle em áreas específicas e córtices mais espessos do que os de controle em outras áreas. No entanto, quando os participantes foram agrupados com base no uso de medicamentos, os pesquisadores descobriram que os participantes com esquizofrenia não medicados não apresentaram diferenças estatisticamente significativas em relação aos saudáveis do grupo de controle.

O tamanho do efeito de redução da espessura cortical foi duas vezes maior para os participantes que usaram antipsicóticos de segunda geração. Por sua vez, para aqueles que tomam antipsicóticos de primeira geração, o tamanho do efeito foi três vezes maior quando comparado aos participantes não medicados.

Os pesquisadores também notaram que as mais elevadas doses de medicação “estavam significativamente correlacionadas com o córtex mais fino em quase toas as regiões do cérebro”.

Nessas análises, os pesquisadores controlaram possíveis variáveis intervenientes, como a idade quando o diagnóstico da esquizofrenia foi dado, duração dos sintomas, gravidade dos sintomas, idade atual e sexo. No entanto, mesmo após o controle da gravidade dos sintomas, as pessoas diagnosticadas com esquizofrenia em uso de antipsicóticos reduziram significativamente a espessura cortical, enquanto as que não foram medicadas não foram significativamente diferentes daquelas saudáveis que do grupo de controle.

Os pesquisadores descobriram que a área da superfície do cérebro foi menor em média para os participantes com diagnóstico de esquizofrenia do que para os participantes do grupo controle e que esse achado não foi explicado pelo uso de medicamentos. No entanto, eles também observam que este achado envolveu um tamanho de efeito muito menor do que seus outros resultados – indicando que houve sobreposição significativa na área de superfície entre os grupos.

Os pesquisadores escrevem que futuros estudos sobre as diferenças cerebrais devem ter o cuidado de incluir o uso de medicamentos como um potencial fator interveniente. Eles sugerem que isso poderia ser um fator que contribui para o fato de que, mesmo após várias centenas de estudos sobre a espessura e a área de superfície cortical na esquizofrenia, um consenso ainda não tenha sido formado.

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van Erp, T. G. M., Walton, E., Hibar, D. P., Schmaal, L., Jiang, W., Glahn, D. C. . . . Turner, J. A. (2018) Cortical brain abnormalities in 4474 individuals with schizophrenia and 5098 control subjects via the Enhancing Neuro Imaging Genetics Through Meta-Analysis (ENIGMA) Consortium. Biological Psychiatry. Published online ahead of print. https://doi.org/10.1016/j.biopsych.2018.04.023 (Link)

Probióticos e Transtornos do Humor

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Publicado em Harvard Health Publishing: “Este estudo contribui para os dados que sugerem que a flora intestinal tem um efeito sobre as doenças psiquiátricas. Ainda não sabemos se uma desordem do microbioma intestinal é a causa da mania e do transtorno bipolar. No entanto, esta pesquisa suporta uma afirmação de que a inflamação em geral está associada à inflamação do intestino, que por sua vez pode modular os transtornos do humor, ou pelo menos casos graves de mania para pacientes bipolares. A evidência de um “princípio do eixo intestino-cérebro” é mais robusta, especialmente depois de alguns estudos mostrarem que o tipo de bactéria que vive em nosso intestino pode causar inflamação cerebral. Essa pesquisa mais recente indica que poderíamos administrar os sintomas de casos graves de transtorno bipolar apenas mudando a composição do nosso microbioma.”

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Borboleta

FDA defende decisão para aprovar aripiprazol digital

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Photo Credit: Raw Pixel

RebeccaEm uma reportagem publicada recentemente no Journal of Clinical Psychiatry, os membros da divisão de Produtos de Psiquiatria do Centro de Pesquisa e Avaliação de Drogas dos EUA da FDA responderam às críticas à sua aprovação do aripiprazol digital, no ano passado. Os autores – um dos quais é o diretor da divisão, Mitchell V. Mathis – afirmam que a discussão em torno da aprovação da droga foi “obscurecida pelo sensacionalismo”.

“Esperamos que esta peça facilite um diálogo mais racional e medido em torno das capacidades reais do produto, da decisão da FDA de aprovar o produto e quaisquer preocupações éticas levantadas pelo produto”, escrevem os autores.

Photo Credit: Raw Pixel
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Em novembro de 2017, o aripiprazol digital foi aprovado pela FDA dos EUA (nome comercial Abilify MyCite). O fabricante da droga, Otsuka Pharmaceutical, e seu colaborador de tecnologia digital, Proteus Digital Health, primeiro registraram um novo medicamento (NDA) para aripiprazol digital com a FDA, em setembro de 2015. Este NDA foi rejeitado em abril de 2016, quando a FDA solicitou mais informações, incluindo dados sobre o funcionamento do medicamento em condições reais, e estudos adicionais sobre fatores humanos. A Proteus / Otsuka reapresentou seu NDA ao FDA, juntamente com as informações solicitadas, em 7 de maio.

A liberação de aripiprazol digital é notável por representar a primeira aprovação de um medicamento com um ‘sistema de rastreamento de ingestão digital’ nos EUA. Igualmente notável é o fato de que tal tecnologia foi aprovada pela primeira vez para uso em um medicamento antipsicótico. Como o Dr. Paul Applebaum – diretor de Direito, Ética e Psiquiatria da Universidade de Columbia – disse ao New York Times: “Você deve pensar que, seja em psiquiatria ou medicina em geral, drogas criadas para quase qualquer condição de saúde, elas não teriam um lugar melhor para começar (com tecnologia digital) do que para a esquizofrenia.” Também vale a pena notar que a patente norte-americana da Otsuka para o aripiprazol expirou em abril de 2015, não muito antes de a empresa apresentar seu primeiro NDA para a versão digital do medicamento.

As reações públicas após a aprovação da droga variaram de um teor fortemente crítico à admiração. Os autores do artigo se concentram nas respostas críticas, no entanto – incluindo uma perspectiva no New England Journal of Medicine(NEJM) intitulada “Engolindo um espião” – que eles caracterizam como sensacionalista.

“Publicações recentes expressaram uma ampla gama de preocupações em relação ao produto, como seu potencial para violar a privacidade e a autonomia do paciente, criar uma dinâmica adversária entre médico e paciente, ser usado em situações médico-legais ou afetar a cobertura de seguro”, escrevem os autores.

Os autores defendem a aprovação do aripiprazol digital pela FDA, enfatizando o fato de que sua revisão do medicamento e de seus componentes relacionados (seu sensor interno, o adesivo de pele com o qual o sensor se comunica, um aplicativo móvel, e o portal da web) foi baseada sobre os resultados de estudos com fatores humanos que examinaram se os pacientes “poderiam usar o produto como o pretendido”, bem como uma avaliação de segurança da adição de um sensor digital à droga. Eles afirmam que a FDA se concentrou na extensão em que a versão digital poderia “interferir com o uso prescrito”, bem como na identificação e redução de erros, a fim de aumentar a “simplicidade” de uso.

Curiosamente, um dos argumentos dos autores em apoio à aprovação do medicamento é que “nenhum dado foi coletado durante o desenvolvimento do produto, sugerindo que o produto impacta na adesão ou influencia o comportamento do paciente”. É curioso que um medicamento apresentado como um benefício para a adesão do paciente tenha sido aprovado sem revisão de seus efeitos na adesão (ou resultados para o paciente).

Os autores também afirmam que a FDA e Otsuka compartilham as preocupações do público sobre “as possíveis questões éticas de monitorar a ingestão de drogas”, e que, de fato, a FDA trabalhou de perto com Otsuka para lidar com algumas dessas questões. Eles afirmam, por exemplo, que a exigência de que os pacientes “optem ativamente por compartilhar suas informações com médicos e cuidadores” foi adicionada com base nas recomendações de uma equipe de bioeticistas com quem Otsuka consultou sobre questões de privacidade do paciente.

Por fim, os autores afirmam que alguns dos medos do público são baseados em “suposições imprecisas” sobre o medicamento – por exemplo, eles afirmam que o sinal Bluetooth do sensor de drogas é criptografado e não pode ser interceptado, e que o patch não contém um transmissor GPS. e, portanto, não pode agir como um “espião”, como o título da peça do NEJM implica.

Ao finalizar o artigo, os autores escrevem:

“A FDA compartilha as preocupações levantadas pelo público em relação ao uso potencial do produto em situações médico-legais e o uso potencial pelas companhias de seguros nas decisões de pagar pelos cuidados. Embora esteja fora do mandato regulamentar e de fiscalização da FDA, uma discussão nacional poderia ajudar a determinar se são necessários mais esforços para proteger os dados dos pacientes de medicamentos e aplicações digitais.”

Em sua sentença final após essa chamada para discussão, os autores escrevem: “Nossa esperança é que a discussão necessária se apoie em fatos racionais, em vez de reações emocionais a essa nova tecnologia”.

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Lee, D. J., Farchione, T. R., Mathis, M. V., Muniz, J., & Muoio, B. M. (2018). US Food and Drug Administration’s Approval of Aripiprazole Tablets With Sensor: Our Perspective. The Journal of clinical psychiatry, (3). (Link)

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