Impactos Psicológicos e Intervenções Possíveis na Pandemia de COVID-19

0

A pandemia do coronavírus (COVID-19) é a maior emergência de saúde pública, e a mais severa síndrome respiratória, desde a chamada gripe espanhola, em 1918. A saúde física da população preocupa a comunidade internacional, mas também é necessária a atenção com a saúde psicológica, que tendem a ser negligenciadas ou subestimadas nessas ocasiões.

Levando em consideração esse panorama, o artigo de Schmidt at. al., Impactos na Saúde Mental e Intervenções Psicológicas Diante da Pandemia do Novo Coronavírus (COVID-19), realizou uma revisão da literatura técnico-científica, produzida em diferentes países, para sintetizar o que foi relatado até agora sobre o assunto. A importância da discussão se baseia na necessidade de cobrir lacunas no combate ao Coronavírus, principalmente, porque os impactos psicológicos podem ser mais duradouros e prevalentes que o próprio acometimento pela COVID-19.

“Estudos têm sugerido que o medo de ser infectado por um vírus potencialmente fatal, de rápida disseminação, cujas origens, natureza e curso ainda são pouco conhecidos, acaba por afetar o bem-estar psicológico de muitas pessoas (Asmundson & Taylor, 2020; Carvalho et al., 2020).”

Sintomas de depressão, ansiedade e estresse já são identificados diante da pandemia na população em geral, de maneira especial, nos profissionais da saúde. Além disso, em alguns países, como Coreia do Sul e índia, já foram identificados casos de suicídios ligados aos impactos psicológicos da COVID- 19.

No entanto, os impactos psicológicos não estão apenas diretamente relacionados à COVID-19, mas também, se relacionam com as medidas de contenção da pandemia. A literatura vem identificando efeitos negativos, como sintomas de estresse pós-traumático, confusão e raiva. Preocupações com escassez de suprimentos e as perdas financeiras, também são identificados como prejuízos ao bem- estar psicológico. Nesse contexto, ainda há a tendência no aumento de estigmas sociais e descriminação a alguns grupos específicos, como os chineses, grupo primeiramente infectado pelo COVID-19.

Desse modo, fica nítida a necessidade de intervenções psicológicas no contexto de pandemia. Algumas práticas exitosas têm sido descritas em estudos recentes, principalmente no continente asiático. Recomenda-se que as intervenções psicológicas cara a cara sejam restritas ao mínimo possível, para diminuir as chances de propagação do vírus. Portanto, sugere-se intervenções via internet, telefone e até cartas.

Para a população em geral, a literatura apontou algumas iniciativas de psicoeducação, como cartilhas e outros materiais informativos; canais de escuta psicológica, para que as pessoas possam aliviar suas emoções negativas via telefone ou através de plataformas online, 24 horas por dia e sete dias na semana; atendimento psicológico por meio de cartas estruturadas, em que o usuário do serviço se apresenta, descreve suas principais emoções e queixas, e as razões delas; atendimento psicológico online ou, quando comprovadamente necessários, presenciais. Para aqueles que experimentam sofrimentos mais severos, intervenções mais intensivas passam a ser necessárias. Sempre que necessário, as pessoas devem ser encaminhados para outros profissionais de saúde.

“Levantamentos online também têm sido realizados para melhor compreender o estado de saúde mental da população diante da COVID-19, com o objetivo de identificar rapidamente casos com maior risco e ofertar intervenções psicológicas alinhadas às demandas.”

Os profissionais de saúde também merecem atenção especial durante a quarentena, são eles que muitas vezes irão oferecer apoio psicológico, escutando as queixas daqueles que buscam o serviço de saúde e daqueles que estão hospitalizados, além de vivenciarem o medo de se infectarem e o isolamento da família e do seu círculo social, além do estresse pela falta de material nos hospitais. Os psicólogos podem ajudar oferecendo suporte e orientação no manejo de determinadas situações; orientação sobre sintomas psicológicos que eles podem vir a ter nesse contexto (ex.:estresse, ansiedade, insônia); estratégias de enfrentamento e autocuidado (ex.: importância dos momentos de descanso); fortalecimento das redes de apoio desses profissionais (contato frequente com familiares, amigos).

Em alguns lugares foi proposto a classificação das pessoas e grupos afetados pelo coronavírus, para estabelecer prioridade na oferta de intervenção. A Comissão Nacional de Saúde da China propôs uma classificação em quatro níveis: (1) Casos mais vulneráveis a problemas de saúde mental, como pessoas hospitalizadas com infecção confirmada e profissionais da saúde que trabalhem ou não na linha de frente; (2) Pessoas isoladas com sintomas leves, suspeitas de infecção ou em contato próximo com casos confirmados; pessoas com sintomas como febre; (3) Pessoas em contato próximo com casos descritos nos níveis 1 e 2, ou seja, familiares, amigos e colegas; equipes de resgate que participem de ações de resposta à COVID-19; (4) Pessoas afetadas pelas medidas de prevenção e controle, grupos suscetíveis e população geral.

Os autores concluem que a Psicologia pode contribuir de maneira relevante com o enfrentamento das repercussões do COVID-19, tanto durante a pandemia, como posteriormente, quando as pessoas precisarão se readaptar e lidar com perdas e transformações. Além disso, sugerem o levantamento sobre os impactos na saúde mental dos brasileiros diante da pandemia, considerando as diferenças socioeconômicas e culturais do Brasil em relação aos outros países pesquisados, a fim de elaborar intervenções mais efetivas para a população desse país continental e tão desigual.

***

SCHMIDT, et al. Impactos na Saúde Mental e Intervenções Psicológicas Diante da Pandemia do Novo Coronavírus (COVID – 19). SciELO Preprints, 2020. (Link)

PRÁTICAS DIALÓGICAS EM DIFERENTES CONTEXTOS SOCIAIS

0

TV MIB

PRÁTICAS DIALÓGICAS EM DIFERENTES CONTEXTOS SOCIAIS

Na próxima sexta-feira, 24 de abril de 2020. Às 11:00 (hora Brasília).

Entrar na reunião Zoom
https://zoom.us/j/93064531600?pwd=YzRhNjdQNDlzaUpHRUVyOGh1bThCUT09

O COVID-19 forçou todos nós a novas formas de ser, novas maneiras de nos relacionarmos e novas maneiras de respondermos uns aos outros em tempos de crise. Essas novas maneiras revelam mais claramente do que nunca como o diálogo é essencial para a experiência humana.

O coronavírus tem sido algumas vezes chamado de um equalizador, porque tem adoecido tanto ricos quanto pobres, mas onde ele chega encontra parcelas significativas da nossa sociedade que já vivem em seu cotidiano o isolamento, o distanciamento, a marginalização social.

Que ideias pessoas com experiência de enfrentamento de situações de crise têm para oferecer a um mundo em crise? Dialogar com quem? Para o que? Como?

Debatedores:

Jaakko Seikkula

Finlândia. Ph.D. Professor de Psicoterapia da University of Jyväskylä. Membro da equipe original criadora da abordagem do Open Dialogue (Diálogo Aberto), em Western Lapland,  Finlândia. Com cerca de 190 artigos científicos publicados e dois livros traduzidos em quinze idiomas, um deles em breve será lançado pela Editora Fiocruz.

 

Sofía Calcena

Paraguaia. Psicóloga Clínica. Terapeuta familiar, com experiência de trabalho em consultório particular e em projetos sociais na área da infância com enfoque nos direitos. Especializada em práticas colaborativas e dialógicas. Atualmente realizando a formação de profissionais na abordagem do Diálogo Aberto.

Itamar Silva

RJ/Brasil. Jornalista. Nascido e morador do morro Santa Marta. Foi militante do Instituto de Pesquisa das Culturas Negras (IPCN) e do Movimento Negro Unificado (MNU), e da Pastoral de Favelas do Rio de Janeiro.  Criou o histórico jornal ECO, com os objetivos de ecoar as notícias do morro pra fora e de fora pra dentro. Diretor da Federação das Associações de Favelas do Rio de Janeiro (Faferj), na década de 80. Atualmente, coordenador do Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (IBASE

Simone Silva

RJ/Brasil. Moradora da favela Santa Marta (Botafogo/Rio de Janeiro); Técnica de Enfermagem com Especialização Técnica em Saúde Mental – Escola Politécnica Joaquim Venâncio – EPJV/FIOCRUZ; Atuação em Enfermagem no CAPS III (Caps Maria do Socorro Santos – Rocinha) entre Maio 2015/Fev./2020. Agente Comunitário de Saúde/CF Santa Marta entre 2009/2012; Agente Comunitário de Políticas Públicas (Favela-Bairro/Projeto Santa Marta) pela SMH/SEMADUR entre 1999/2006.

Fernando Freitas  (mediador)

Rio de Janeiro. Psicólogo. PhD em Psicologia pela Université Catholique de Louvain. Pesquisador titular do LAPS/ENSP/FIOCRUZ.

Coeditor do site

 

***

Inscreva-se. Número limitado na sala de reunião.

https://zoom.us/j/93064531600?pwd=YzRhNjdQNDlzaUpHRUVyOGh1bThCUT09

Psiquiatras temem aumento de casos do Covid-19 em unidades de saúde mental

0

Publicado no The Guardian:

“As unidades de saúde mental podem sofrer um surto de casos do Covid-19 porque os funcionários não podem obter o equipamento de proteção ou os testes de que precisam, os psiquiatras vem alertando.

As mortes entre pacientes e profissionais de saúde mental podem potencialmente acabar tão altas quanto as das casas de repouso, afirma o Royal College of Psychiatrists.

‘Sem acesso a kits de teste e o equipamento de proteção certo, temo que possamos ver uma crise no estilo de um lar de idosos ocorrendo nas unidades de saúde mental, com muitos pacientes e funcionários contraindo o vírus’, disse a professora Wendy Burn, presidente da faculdade.”

Leia a matéria na íntegra →

Diálogo aberto e apoio intencional de colegas: experiências dos inscritos no ‘Programa Paraquedas’ de Nova York

0

Um novo estudo investiga como uma combinação de Diálogo Aberto e Suporte Intencional dos Pares foi experimentada por clientes e membros da rede que recebem serviços por meio do programa Parachute na cidade de Nova York. O programa Parachute (‘Paraquedas’) foi concebido como uma alternativa ao atendimento psiquiátrico padrão que pudesse responder a crises psiquiátricas por meio de visitas domiciliares e reuniões da rede. Os resultados do novo estudo, publicado no Community Mental Health Journal, mostraram que os participantes valorizam a falta de hierarquia nas equipes, a acessibilidade para receber cuidados em seu ambiente doméstico e haverem tido experiências positivas com especialistas.

“Para a maioria”, escrevem os autores, “as reuniões da rede parecem ter fornecido uma rota pela qual aqueles que sofrem de angústia e suas redes podem ter tempo para refletir, serem ouvidos e entender melhor pelo que os outros estão passando”.

“Sunset with a Tandem Parachute landing-3” by Sheba_Also 45,000 photos is licensed under CC BY-SA 2.0

A abordagem do Diálogo Aberto foi desenvolvida na Finlândia na década de 1980 como uma forma de psicoterapia e uma maneira de organizar os sistemas de saúde mental. A abordagem, originalmente projetada para pessoas que sofrem de psicose pela primeira vez, baseia-se em reuniões da rede em que membros da família e outros apoios naturais são convidados para um fórum conjunto onde a linguagem pode ser criada para lidar com situações difíceis e angustiantes.

As reuniões de rede geralmente acontecem no ambiente doméstico e as equipes são compostas por pelo menos dois terapeutas. Estudos observacionais da abordagem mostram que, em Wester Lapland, Finlândia, cerca de 80% das pessoas que sofrem de um primeiro episódio de psicose se recuperam após receber o Diálogo Aberto.

A pesquisa realizada pela equipe de desenvolvimento da Finlândia atraiu atenção internacional por seus resultados notáveis. Desde então, vários países adaptaram e implementaram a abordagem do Diálogo Aberto de diferentes maneiras.

Parachute NYC foi um programa lançado em 2012 para proporcionar um “pouso suave” para pessoas que enfrentam uma crise psiquiátrica. O programa foi financiado através de uma doação federal dos Centros de serviços Medicaid e Medicare e forneceu serviços através de equipes móveis e centros de repouso. Os profissionais de saúde mental trabalhavam ao lado de especialistas para oferecer reuniões de rede a indivíduos e seus apoios naturais (com 16 anos ou mais), que haviam recebido o diagnóstico de uma doença mental grave e que tinham pelo menos um membro da rede que havia concordado em participar das reuniões.

Todos os funcionários foram treinados tanto no Diálogo Aberto quanto no Suporte Intencional de Pares. O Suporte Intencional de Pares é uma abordagem desenvolvida por e para pares e se concentra em relacionamentos e mutualidade com a finalidade de promover esperança e parcerias em tempos de crise. A combinação do Diálogo Aberto e o apoio de colegas nunca havia sido tentada antes do Parachute. No entanto, agora está sendo testado em um grande ensaio clínico randomizado que está sendo feito no Reino Unido.

As reuniões da rede incluíram profissionais de saúde mental e um especialista da rede. As necessidades das pessoas atendidas determinavam a frequência, o formato e o conteúdo das reuniões. As sessões convidavam várias perspectivas de maneira não hierárquica para que fosse garantido que todas as vozes fossem ouvidas e a dissonância respeitada.

Profissionais envolvidos na técnica de reflexão, onde entre si eram discutidas as preocupações enquanto que a rede ouvia e era convidada a comentar, aumentando assim a transparência nos processos de tomada de decisão. O uso de medicamentos e o tratamento hospitalar eram discutidos abertamente, a hospitalização era vista como último recurso e os centros de repouso eram utilizados quando necessário.

Embora exista um número crescente de programas informados pelo Open Dialogue sendo desenvolvidos nos Estados Unidos e em outros países, ainda falta uma pesquisa sobre como esses programas podem beneficiar indivíduos. Considerada por muitos como uma abordagem alinhada ao paradigma dos direitos humanos na saúde mental, a abordagem do Diálogo Aberto teve grande sucesso na Finlândia na redução de hospitalizações, evitando a medicalização excessiva e promovendo a recuperação.

Este estudo oferece uma visão de como os participantes do Parachute experimentaram o programa e é uma contribuição essencial à literatura para apoiar o desenvolvimento de programas informados do Diálogo Aberto.

Por meio de entrevistas qualitativas, o estudo descreveu a experiência dos inscritos no programa Paraquedas e das suas redes. As entrevistas foram gravadas e transcritas em áudio, e os pesquisadores exploraram os temas que emergiram dos dados. Os pesquisadores procuraram explorar as seguintes perguntas com os participantes:

  • Como os recursos do Paraquedas foram recebidos pelos participantes, como visitas domiciliares e presença de um especialista em pares;
  • Como os cuidados recebidos pelo Paraquedas foram experimentados em comparação com as experiências de tratamento anteriores;
  • Como o Paraquedas facilitou ou não as mudanças nas percepções de si e nos relacionamentos. Dezoito indivíduos foram entrevistados.

Seus resultados mostram que os participantes tiveram experiências positivas com as reuniões da rede e a disponibilidade da equipe do Paraquedas. Comparando a experiência do Paraquedas com a hospitalização, os participantes afirmaram que o atendimento domiciliar era menos intimidador, conforme as palavras de um participante:

“Era importante fazer [realizar reuniões de rede] em um ambiente que era como um lugar seguro para nós, íntimo, você sabe, em casa.”

O estudo relata que os participantes que experimentam a presença de especialistas em reuniões da rede como sendo geralmente positiva. Os participantes observaram que a presença de uma pessoa com experiência vivida ofereceu uma perspectiva única para o tratamento. Além disso, ter mais de um terapeuta na sala foi bem-vindo pelos participantes, como essa citação ilustra:

“Apoio mais forte … dois cérebros pensando ao mesmo tempo.”

Por fim, os participantes reconheceram como as reuniões da rede mudavam a maneira como se viam, contribuindo para novas maneiras de entender as experiências e desenvolver mecanismos de enfrentamento. Incluir os apoios naturais das pessoas no centro das preocupações foi descrito como criando uma onda que beneficiava toda a rede. Alguns participantes sentiram que havia falta de estrutura nas reuniões e houve alguma preocupação relacionada à forma como o medicamento foi tratado pelas equipes.

Os autores concluíram que, em geral, o programa Paraquedas foi bem recebido e visto positivamente pelos participantes com casos de desconforto relacionados à novidade da abordagem em comparação com as modalidades de tratamento mais tradicionais – como reuniões em que ninguém desempenha o papel de especialista e discussões sobre medicamentos não necessariamente tomando o centro do palco.

Este estudo fornece evidências de que a combinação de Diálogo Aberto e Suporte Intencional de Pares foi bem recebida pelos participantes do Paraquedas. Mais importante, mostra que uma crise psiquiátrica pode ser tratada em um ambiente comunitário, mobilizando apoios naturais e criando um ambiente seguro para todos.

Em contraste com as abordagens atuais de crises que envolvem polícia, tratamento involuntário, hospitalizações e dependem principalmente de medicamentos, o programa Parachute ofereceu uma alternativa que pode estar mais alinhada com as necessidades e desejos de pessoas que sofrem estados extremos e suas famílias. A pesquisa atual no campo da saúde mental ainda esteve focada principalmente em ensaios clínicos randomizados (ECRs) como sendo o padrão-ouro para evidências de alta qualidade. No entanto, estudos qualitativos como este mostram que explorações aprofundadas de experiências individuais oferecem uma grande visão sobre o tratamento que vai muito além dos resultados usuais definidos por profissionais e pesquisadores.

Há um debate em andamento no campo sobre a qualidade das evidências para apoiar a implementação e expansão dos programas informados do Open Dialogue. Enquanto um ensaio clínico randomizado está em andamento no Reino Unido, estudos qualitativos como este são adequados para investigar em profundidade como os participantes experimentam diferentes tipos de tratamentos de maneiras que os ECRs não podem capturar. Isso aponta para a necessidade de reexaminar o domínio do modelo médico na pesquisa em saúde mental e contribui para um rico corpo de evidências que valoriza as experiências das pessoas e ajuda a fechar a lacuna entre a pesquisa e a vida real.

****

Wusinich, C., Lindy, D. C., Russell, D., Pessin, N., & Friesen, P. (2020). Experiences of Parachute NYC: An Integration of Open Dialogue and Intentional Peer Support. Community mental health journal, 1-11. (Link)

O suporte familiar às medidas sanitárias com o Coronavírus

0

A saúde mental não é um tema relevante para a maior parte da sociedade, mas as medidas sanitárias pela pandemia de COVID-19 nos afetam, em três dimensões centrais e interdependentes: infectológica, econômica e saúde mental. Sem perder de vista que as três estão interligadas, tentemos falar da última.

ATENÇÃO, A PRIMEIRA COISA QUE TEMOS QUE CONSIDERAR: As diferenças entre os grupos sociais, entre quem pode parar na quarentena e quem não pode parar. Parar é um privilégio em uma sociedade ultra desigual, tão injusta na distribuição de riqueza e tão precária na concretização dos direitos; hoje sabemos mais do que nunca as enormes limitações do nosso sistema de saúde¹. Na diferença entre estes dois grupos há uma ideia maiúscula, que não se pode perder: NÃO EXISTE SAÚDE MENTAL SE EXISTE FOME.

Dicas da Saúde Mental Comunitária para a convivência familiares em tempos de pandemia:

  1. Exercitar-nos no viver COM – conviver: talvez descubramos que apesar de dormir, ou até comer, com as pessoas com quem compartilhamos o mesmo teto, não temos intimidade com elas. Intimidade aqui entendida como partilhar o mundo interior (afetos, ideias, perguntas, imaginação…).
  2. Validar o direito à solidão: ter espaços separados, onde se possa conectar consigo mesmo e com seus interesses pessoais. A solidão não é uma derrota, porque viver não é uma competição e porque, finalmente, em um sentido último, há uma solidão que não tem escapatória.
  3. Conflitos no contexto de pandemia: Se existem novos conflitos, estejamos prevenidos que há uma sobrecarga emocional por causa da pandemia, e talvez, possamos fazer um acordo de convivência em uma pequena assembléia familiar. Mas se os conflitos são antigos, talvez seja o momento para tomar decisões e pedir ajuda. Não temos que aguentar o que nos vem fazendo mal.
  4. Tempo para nos (re)conhecermos: usar esse tempo como uma oportunidade para que cada um possa se conhecer melhor, quase como um pequeno laboratório de vida, onde observamos e tentamos reconhecer e crescer naquilo que cada um tem pendente.
  5. Valorizar a lentidão: O que podemos descobrir com nossas vidas indo mais devagar?
  6. Potencializar a solidariedade entre vizinhos: o Estado está defasado e o admite. O mercado se interessa, fundamentalmente, pelo lucro. Então, que o comunitário seja, como tantas vezes, o elemento central do cuidado.
  7. O humor, nosso velho aliado: Nada que já não saibamos sobre isso. Memes e o resto de sempre!
  8. Legitimar e trabalhar as perdas: permitamos a dor do que perdemos. É legitimo que sintamos angustia. Encontrar maneiras de expressar o sofrimento, e nos permitir (sem culpa ou vergonha) pedir ajuda, para sermos cuidados quando estamos frágeis. Como viver sem querer perder nada? (Alejandra Kohan)
  9. Sonhem juntos: fazer o exercício familiar de sonhar uma nação mais solidária e igualitária. é um exercício que se pode fazer em família. Uma tarde, uma noite, em uma conversa (com desenhos, com karaokê, contando histórias), que cada família possa imaginar o que necessitamos para alcançar uma sociedade assim e a concretize quando isso acabe. Porque essa quarentena é por um tempo limitado! Vai acabar! Isso nos dá sentido e um sonho em comum.
  10. Finalmente, a rebeldia é um direito que como pessoa nos damos, e em contexto de abuso, é um sinal de saúde mental. O artigo 138 da Constituição Nacional² habilita ” DA VALIDADE DA ORDEM JURÍDICA: fica autorizado aos cidadãos a resistência aos ditos usurpadores, através de todos os meios ao seu alcance. Na hipótese de que essa pessoa ou grupo de pessoas, invocando qualquer princípio ou representação contra esta constituição, detenham o poder público, seus atos se declaram nulos e sem nenhum valor, não vinculante e, pelo mesmo, o povo em exercício do seu direito de resistência à opressão, fica dispensado de seu cumprimento.

Notas de pé de página:

¹Sistema de Saúde do Paraguai

²Constituição Nacional do Paraguai

Explorando respostas dialógicas em tempo de crise

0

 

LIVE TOWN HALL

Explorando respostas dialógicas em um Tempo de Crise

Neste primeiro da série explorando respostas dialógicas na era de COVID, nós convidamos você a participar de um “Town Hall”, na Sexta-Feira, 17 de Abril, às 13:00 horário de Brasília, para uma conversação ao vivo em um debate com duração de 90 minutos; “Estamos vivendo no tempo mais dialógico de todos os tempos?

Debatedores:

Jaakko Seikkula

Richard Armitage

Iseult Twamley

Rai Waddingham

Andrea Zwicknagt

Para se inscrever, clique aqui→

—-

AVISO IMPORTANTE:

A TV MIB anuncia o próximo programa. Semana que vem teremos o próprio Jaakko Seikkula como nosso convidado especial, com exclusividade. Aguarde que em breve anunciaremos dia e hora, e como se inscrever para participar ativamente da conversação.

Compartilhe a informação.

Isolada pelo coronavírus? Sou bem-vinda ao meu mundo.

0

Pouco se sabe o que uma vida de pobreza e “doença mental” pode fazer a uma pessoa, com exceção daqueles que a experimentaram.  Depois de enfrentar uma dívida terrível no cartão de crédito e com uma renda insuficiente, após uma tentativa de suicídio comecei a tomar antidepressivos. Depois de oito anos em Zoloft, meu psiquiatra mudou-me para Lexapro, o que me deixou psicótica. A consequência foi haver sido internada em um hospital psiquiátrico, onde fui forçada a tomar drogas psiquiátricas contra a minha vontade e onde comecei a receber uma pensão por doença, que é paga abaixo da linha de pobreza. Tais experiências de “doença mental” e dificuldades financeiras me levaram a formas de vida de isolamento de várias maneiras.

Por causa da minha situação financeira eu não posso sair para jantar há anos com os poucos amigos que tenho. Tudo o que faço é ir ao supermercado e à clínica psiquiátrica e tentar escrever algo que valha a pena ser lido. Isso vem ocorrendo muito antes do aparecimento do coronavírus.

Acredita-se que as drogas psiquiátricas diminuam a vida útil das pessoas em 15 a 25 anos. Os antipsicóticos são considerados especialmente perigosos. Eu tomo antipsicóticos há quase uma década. Sempre me preocupei com a morte de meus pais idosos. Minha irmã mais velha morreu aos nove anos e meio e eu tinha sete anos de idade na época, então sei há muito tempo o quanto a vida é precária. Esses novos medos que as pessoas estão experimentando sobre a perda de entes queridos e sua própria mortalidade não são novos para mim.

A recente ansiedade e depressão das pessoas, que podem resultar do isolamento, são comuns entre os pobres dos Estados Unidos, especialmente aqueles que tiveram o infortúnio de cair nas garras do setor de saúde mental. O recente resgate federal de US $ 2 trilhões de dólares oferece benefícios financeiros apenas para contribuintes e trabalhadores recém-desempregados. Os muito pobres, geralmente aqueles de nós que estão envolvidos no setor de saúde mental, não recebem nada. As grandes corporações estavam se sentindo carentes e queriam ajuda financeira. Elas conseguiram. Em vez disso, por que não levar as corporações a tomar antidepressivos e a fazer terapia, como me disseram que eu fizesse, quando comecei a ter problemas financeiros significativos? Prevê-se que essa pandemia e o pacote de resgate ampliem a já acentuada divisão de riqueza nos Estados Unidos.

Quanto às crises espirituais, os cristãos recém-alienados têm uma comunidade para a qual retornar quando a epidemia acabar. As principais igrejas que experimentei atendem principalmente às classes média e alta. Elas não são uma fonte de conforto e ambiente comunitário para pessoas que não se encaixam nelas.

Uma coisa que sei de minhas experiências com o setor de saúde mental é que ele é o último lugar que as pessoas devem procurar para lidar com essa pandemia. Qualquer pessoa com dificuldades financeiras deve ser ajudada financeiramente. O fato de que isso não esteja acontecendo fala dos valores desordenados vigentes em meu país. Essa pandemia está divulgando verdades boas e feias sobre quem as pessoas realmente são.

Algumas pessoas que estão se familiarizando com a vida on-line e através de seus telefones estão tendo dificuldades para se ajustar. Para os sobreviventes psiquiátricos, esses costumam ser um dos poucos recursos que sempre tivemos às mãos. Nós, que temos acesso à Internet e telefone, somos sortudos. Muitas pessoas pobres “doentes mentais” não têm esses luxos. Os muito pobres, “doentes mentais” ou não, não têm isso.

Os ricos, a classe média e as pessoas que vivem em comunidades dinâmicas – pessoas normais – há muito têm vidas repletas de significado pessoal. Uma das piores coisas que o setor de saúde mental me fez foi roubar da minha vida o significado das coisas. Estou envolvida com a indústria da psiquiatria há quase duas décadas, e essas décadas foram amplamente desperdiçadas. Em vez de significado, a indústria oferece às pessoas drogas psiquiátricas, terapia e o papel de paciente mental. É dentro dessa estrutura que você espera simplesmente existir.

Como tenho sido tão reprimida e oprimida pelas drogas psiquiátricas, com o meu papel social de paciente mental ao longo da minha vida e com as dificuldades financeiras, há muito tempo tenho tentado encontrar significado em pequenas coisas. Um pequeno trabalho voluntário aqui ou ali para os verdadeiramente necessitados. Ajudando meus pais. Através da oração e fé. E agora, com a minha escrita.

Agora que finalmente, lentamente, estou começando a abandonar as drogas psiquiátricas com a esperança de uma vida melhor, enfrento uma tarefa assustadora. Como se começa uma vida quando se é mais velho? Tantas oportunidades perdidas. Décadas que nunca podem ser trazidas de volta à vida. As pessoas que experimentam apenas dificuldades temporárias como resultado do coronavírus são sortudas.

“Ex Usuários” Chilenos que Abandonaram as Drogas Psiquiátricas

0

No artigo da antropóloga Tatiana Castillo Parada, publicado na revista Salud Colectiva, da Universidade Nacional de Lanús, a autora trabalha com os significados e narrativas de cinco chilenos com experiência de diagnóstico psiquiátrico, que estiveram em tratamento farmacológico durante oito anos ou mais e descontinuaram o uso de psicofármacos.

O estudo é justificado pelo atual contexto mundial. O artigo aponta que em grande parte do mundo ocidental, os serviços de saúde mental priorizam o tratamento farmacológico em relação as abordagens psicossociais e comunitárias. No Chile, não é diferente, apesar da implementação do modelo comunitário de saúde mental desde a década de 1990.

Como antropóloga, a autora considera que a Antropologia pode ajudar a compreender práticas culturais como o consumo de medicamentos, fenômeno socialmente situado. Para tal, foram realizadas cinco entrevistas individuais semi estruturadas , com duração entre uma e duas horas. As pessoas selecionadas haviam passado pelos serviços de saúde mental, recebido algum diagnóstico e realizado tratamento psicofarmacológico durante oito anos ou mais e, no momento da entrevista, haviam descontinuado os remédios psiquiátricos dos quais faziam uso.

Os entrevistados relataram acontecimentos sociais e familiares como desencadeadores da origem do mal estar subjetivo e consequente inserção no atendimento psiquiátrico. Violência intrafamiliar, separação dos pais, dificuldades em cumprir papéis sociais, foram alguns dos exemplos citados. Já no serviço de saúde mental, relatam que foram diagnosticados com diferentes transtornos simultaneamente, tiveram experiências em hospitais psiquiátricos e seus tratamentos sem consentimento e descreveram a perda de memória e bloqueio mental como efeitos recorrentes do tratamento.

Quanto aos remédios psiquiátricos, é relatado que receberam diferentes tipos de psicofármacos, em quantidades diferentes e em diferentes combinações. Gerando efeitos complexos e distintos.

“O que eu sentia era que andava como “passarinho”, nem para cima nem para baixo. Comparado com a quetiapina que é muito mais forte e você anda como se estivesse atrás de um vidro. Como que se estivesse em uma cabine (…)
Não sei, imagina se te assustam aí, em um estado normal você sentiria algo, se assustaria, mas com a quetiapina não acontece nada. Você não sente nada né. Não sente nada emocionalmente, afetivamente, no sente nada sexualmente, não acontece nada. Você fica igual a um zumbi.” (Claudio)

Além desses efeitos subjetivos, os entrevistados também descrevem sintomas de abstinência ao tentar retirar os medicamentos, além do efeito físico durante o uso dos mesmos, como aumento excessivo de peso e dificuldades na realização de atividades cotidianas, como o simples ato de amarrar os sapatos. Alguns também descreveram dificuldades na interação social e nos processos de pensamento.

Os motivos descritos para dar início a descontinuação dos medicamentos psiquiátricos foram numerosos e diversos, não necessariamente influenciados externamente ou por informação científica, mas principalmente, influenciados pelas experiências adversas com os medicamentos.

Os efeitos de abstinência da descontinuação das drogas podem gerar sintomas distintos, físicos e sensoriais, como o desenvolvimento de ideias suicidas e sentimentos de desesperança, por causa da dependência do medicamento. Por isso, os entrevistados dizem que não é suficiente apenas a vontade de parar com os medicamentos, e sustentam que é conveniente realizar a descontinuação de maneira lenta, reduzindo as doses gradualmente. Além disso, chamam a atenção para a complexidade maior da descontinuação de certos medicamentos em comparação a outros.

Outra questão levantada pelos entrevistados é o fato de que a descontinuação dos medicamentos deixa a pessoa “descoberta”, sem o “apoio” de uma substância que por muito tempo ocultou a origem do mal estar. Eles assinalam que a descontinuação não é apenas deixar os medicamentos, senão que implica um processo íntimo de descobrimento pessoal, que requer um tempo de autoconhecimento e a busca de alternativas de autoajuda para a “substituição” desses medicamentos. A falta de modelos para a descontinuação dos medicamentos e a escassa ajuda da atenção psiquiátrica e dos serviços de saúde mental, também são descritos como dificuldades enfrentadas.

Por outro lado, os entrevistados descreveram estratégias associadas a descontinuação dos remédios psiquiátricos. Citaram mudanças de rotina, hábitos alimentares e atividades físicas, até formas de abordagem alternativas, como jejum e meditação, além de muita vontade e desejo de ter outra vida. Quanto ao apoio social durante o processo, foram citadas três: apoio familiar, médico e comunitário. Mas destacam que nem sempre é possível o apoio familiar ou médico. Já o apoio comunitário foi descrito como ativismo, possibilitando a transmissão da sua experiência, ensinamento e apoio às pessoas que passam pelo mesmo que eles passaram.

“Se você opta pelo ativismo, significa ter uma posição politica a respeito, um convencimento, uma capacidade crítica, desenvolver planos, é como um fortalecimento do teu valor como pessoa […] Ativar o movimento, ativar a consciência. Falando em termos mais comuns, é como uma revolução, porque estão muito enraizados os conceitos, os modelos, as formas de pensamento, são validados academicamente, socialmente. São aceitos e naturalizados os maus tratos , a discriminação e a estigmatização para a loucura que não tem a ver com a enfermidade mental. Está super naturalizado, então, basicamente é una revolução porque é uma mudança de paradigma.” (Claudio)

Por último, a partir do abandono das drogas psiquiátricas, os entrevistados descrevem o encerramento da sua participação nos serviços de saúde mental. A reflexão e ressignificação da experiência vivida gera a construção de uma nova identidade e compreensão de si mesmos. Por isso, se denominam “sobreviventes da psiquiatria” ou “ex usuários”, como uma necessidade de denúncia do difícil processo vivido. E destacam a importância de “fazer comunidade”, reconstruir os laços sociais, desenvolver espaços de participação social e cultivar relações significativas.

O artigo é muito valioso ao trazer à tona a experiência de sujeitos que passaram pela experiência da descontinuação. A partir da experiência dessas pessoas são elaborados saberes preciosos sobre a descontinuação de medicamentos, que deveriam ser levadas em conta pelo mundo científico.

***

PARADA, T.C. Subjetividade y autonomia: significados y narrativas sobre la discontinuación de fármacos psiquiátricos. Salud Coletiva, v. 14, n. 3, p. 513 – 529, 2018. (Link)

Grupo de Autogestão Libre-Mente (Link)

Estamos todos juntos nisso

0

Por várias semanas, eu tenho acordado durante a noite com sentimentos de intensa ansiedade. Monitoro-me constantemente quanto aos sintomas de uma doença que é possivelmente fatal. Não consigo me concentrar muito bem, e minhas formas habituais de lidar com as coisas não parecem estar funcionando. Eu me sinto um pouco mais segura dentro da minha casa, mas também me sinto presa. Em um minuto me sinto bem, e no outro me sinto aterrorizada. Será que de repente desenvolvi um ‘problema de saúde mental’, infelizmente coincidindo com a pandemia do COVID-19? Não, claro que não. Estou tendo uma resposta inteiramente racional a uma grande ameaça a todo o nosso modo de vida.

Parece apropriado tornar este blog mais pessoal, porque realmente estamos juntos nisso – e não quero dizer apenas enquanto comunidade ou nação, mas como espécie humana. Juntamente com os danos ambientais e as mudanças climáticas – aos quais está relacionada – a pandemia é de longe a maior ameaça que já enfrentamos. Quem pode dizer como deveríamos estar nos sentindo nesse momento? Onde traçamos a linha entre ‘normal’ e ‘anormal’, ‘doente mental’ e ‘mentalmente bem’?

E, no entanto, é exatamente isso que muitos dos chamados especialistas continuam fazendo. É horrível e fascinante ver como a narrativa de ‘doença mental’ está sendo usada para individualizar e patologizar nossas respostas, mesmo quando nossa própria sobrevivência está em risco. Isso está nos apresentando uma ilustração particularmente gritante da loucura do pensamento psiquiátrico.

No Reino Unido e no mundo, as manchetes estão por toda parte. Estamos caminhando para uma “pandemia de graves distúrbios de saúde mental“. Estamos enfrentando “uma epidemia de depressão clínica“. As instituições de caridade estão se alinhando para dar o alarme – a Mental Health Foundation descobriu que seis em cada dez pessoas estavam preocupadas com a crise e corriam o risco de terem “problemas de saúde mental persistentes e graves“. Somos exortados a aprender as lições da China e a nos preparar para “uma crise pública de saúde mental“.

Claro, isso é um absurdo. Uma resposta mais sensata seria perguntar o que há de errado com as quatro em cada dez pessoas que aparentemente não estão muito preocupadas com o que está acontecendo. Deveríamos estar muito mais preocupados com alguém que negue alegremente a extensão do problema – especialmente (sem mencionar nomes, mas existem vários deles no cenário mundial) se forem líderes nacionais encarregados de conduzir seus países durante a crise.

Apenas algumas semanas atrás, alguém que estava com muito medo de sair de casa no caso de contrair uma doença fatal e passava a maior parte do dia lavando as mãos e limpando as maçanetas, seria considerado um caso grave de ‘TOC’.  Agora é a descrição de um cidadão responsável. Nunca houve uma ilustração mais clara do fato de que julgamentos sobre quem é ‘doente mental’ são sociais, não médicos. Nunca foi tão óbvio que o sofrimento faz sentido no contexto. Situações anormais levam a respostas incomuns ou extremas. Se estamos com medo, então deveríamos estar.

***

O público que acompanha as nossas publicações em Mad in America, Mad in UK e Mad in Brasil não precisa ser convencido dos danos resultantes da rotulagem através do diagnóstico e, ao contrário do público em geral, nós já estamos familiarizadas com o grande conjunto de evidências que nos dizem que as várias formas de angústia diagnosticadas como ‘psicose’, ‘depressão clínica’, ‘transtorno bipolar’, ‘transtorno de personalidade’ e assim por diante estão fortemente relacionadas a experiências de trauma, abuso, negligência, perda, pobreza, desemprego, discriminação e desigualdade. As vozes hostis que algumas pessoas ouvem muitas vezes ecoam as palavras dos agressores da vida real. Humor e desespero fazem sentido se você está lutando com a solidão e a falta de recursos. Autoagressão e ansiedade são o resultado previsível das pressões que nossas crianças e jovens estão enfrentando. Em outras palavras, quando colocadas em contexto, essas reações são respostas compreensíveis às adversidades.

Mas, infelizmente, traduzir essas reações humanas compreensíveis para a linguagem da ‘saúde mental’ é tanto uma epidemia global quanto o coronavírus e tão difícil de combater quanto. Somos cada vez mais encorajados a reformular todas as formas de angústia em um ‘problema de saúde mental’, sob o novo imperativo de ‘falar sobre saúde mental’ mais ou menos constantemente. Esse discurso penetrou tão profundamente nas mentes dos profissionais, da mídia e do público em geral que eles simplesmente não o veem como problemático, ou nem mesmo compreendem quais podem ser as críticas. Para dar apenas um exemplo, a Public Health England promoveu, louvavelmente, uma mensagem de “É normal sentir-se ansioso em uma crise” e sugeriu uma série de estratégias de senso comum e apoio mútuo. No entanto, a campanha é encabeçada por dois de nossos membros da realeza, o duque e a duquesa de Cambridge, pedindo que “cuidemos de nossa saúde mental“.

‘Saúde mental’ é uma locução sedutora, mas assim que se torna apenas uma outra maneira de dizer ‘como todos nós sentimos’, somos sugados de volta para uma estrutura sutilmente individualizante e medicalizante. Até os escritores de opinião crítica acabam argumentando que deveríamos fazer X (onde X é estratégias comuns de enfrentamento e de apoio mútuo) em vez de Y (onde Y são diagnósticos e prescrições) a fim de preservar nossa ‘saúde mental’ – isso é misterioso, indefinível, porém um estado mental aparentemente frágil – em vez de desafiar primeiramente todo o conceito de ‘saúde mental’.

Mas a ideia de que estamos enfrentando duas pandemias simultâneas – uma de saúde física e, por uma trágica coincidência, uma de saúde mental também – não é apenas uma bobagem. É perigosa. Ao sermos vítimas desse modo de pensar, perdemos conexões com os problemas mais amplos com a mesma certeza – de fato, mais ainda, porque nem percebemos que estamos fazendo isso – como aqueles que estão promovendo abertamente em termos médicos a narrativa de que há uma “pandemia de transtornos crônicos”.

Existem duas razões principais para isso. Em primeiro lugar, quanto mais rotularmos nossas compreensíveis reações humanas como problemas ou transtornos de saúde mental, maior será a tentação de focar em “tratamentos” individuais – seja psiquiátrico ou psicológico / terapêutico. Eu já vi os dois grupos se preparando ansiosamente para receber todos os novos clientes criados pela crise, embora com quase um quarto da população do Reino Unido já com prescrição de um “antidepressivo” faríamos muito mais dando apoio prático e financeiro.

Da mesma forma, sabemos que intervenções psicológicas formais podem realmente ser prejudiciais se implementadas muito cedo. Em vez de nos unirmos em solidariedade, os rótulos de diagnóstico nos isolam e silenciam, e nos transmitem a mensagem de que não estamos lidando da forma como deveríamos. Por outro lado, tem sido demonstrado que o simples apoio humano e o contato de amigos, vizinhos e colegas protegem contra o medo e o desespero em tempos de crise e desastre.

Em segundo lugar, rótulos de diagnóstico e o discurso de “saúde mental” na verdade nos impedem de lidar com as razões mais amplas de nossa angústia, desconectando nossas respostas das ameaças. Em tempos mais “normais”, essas ameaças normalmente incluem coisas como abuso, negligência, violência, discriminação e pobreza. Esses fatores ainda se aplicam, mas, juntamente com as mudanças climáticas, agora estamos diante de um nível adicional de ameaça que vai além de tudo o que já sabemos.

A tarefa imediata é sobreviver à pandemia o melhor que pudermos. Isso por si só está demonstrando as falhas agudas de nossos sistemas públicos de saúde e redes de assistência social, além de advertências muito necessárias de que os membros mais essenciais de nossa sociedade são aqueles que são os menos bem pagos e os menos valorizados – enfermeiras, profissionais de saúde, motoristas de entregas, os empregados dos mercados e assim por diante. Há muita coisa a ser aprendida quando emergirmos em um mundo pós-pandemia.

Mas as lições precisam ir muito além. Existe o risco de “individualizar” uma crise, bem como as reações de uma pessoa a ela, embora todas as evidências sugiram que o COVID-19 não seja apenas um desastre aleatório. Está previsto há anos, com base no impacto conhecido da destruição de habitats de animais, o que aumenta a probabilidade de vírus serem transmitidos aos seres humanos. Essa destruição ambiental é, por sua vez, uma consequência da exploração do mundo natural impulsionada pelas demandas da industrialização. Verdadeiramente, o planeta está revidando. Um dia, a menos que tomemos medidas coletivas drásticas para mudar toda a base econômica e de valores do nosso modo de vida industrializado ocidental, haverá um vírus que não poderemos derrotar.

***

Esses são argumentos complicados a serem apresentados e podem ser rapidamente interpretados como negligência insensível ao sofrimento das pessoas. É muito importante não negar o sofrimento real e agudo que muitas pessoas com “doença mental” diagnosticada estão enfrentando, especialmente se de repente descobrirem que seus serviços habituais não estão disponíveis e ficarem presas dentro de suas próprias quatro paredes sem ninguém para chamar. Vi pedidos desesperados de pessoas que foram descartadas por sua equipe psiquiátrica, exatamente quando precisam mais de contato do que nunca. Isso é chocante e injustificável.

Mas igualmente, não queremos assumir que os sobreviventes enquanto grupo não conseguirão lidar com essa situação atual. Isso é falso e até paternalista, e também há relatos de pessoas lidando melhor do que o habitual, à medida que se baseiam em talentos para a sobrevivência dos quais a população oficialmente “normal” carece. Um usuário do serviço twittou: “Para aqueles que como nós já vivem com trauma ou impactos significativos de saúde mental em nossa vida cotidiana, talvez estejamos mais preparados / menos queixosos do autoisolamento, tendo que sobreviver com baixa renda, com restrições de movimento e enfrentando cortes em nossos serviços de saúde / assistência social.“ Outro disse: “Já passamos por essas emoções extremas e conseguimos atravessar para o outro lado.”

Da mesma forma, pessoas com sérios problemas de saúde física têm salientado que o isolamento é o seu modo de vida habitual e pedem para não serem esquecidas novamente quando o bloqueio for suspenso. Sobreviventes psiquiátricos criaram uma lista impressionante de redes e recursos de pares nas últimas semanas, incluindo um conjunto de estratégias de “experiências de vida”, extraídas de “conhecimentos adquiridos com muito esforço que foram aprendidos ao atravessar experiências de vida desafiadoras”.

O jornalista britânico John Crace [1] que tem histórico de sofrimento mental, está enfrentando os dois lados da moeda: “Acordo cedo e, por um breve nanossegundo, tudo está bem com o mundo. Então minha mente se volta para … a realidade da pandemia de coronavírus. A ansiedade me eletrifica. Não é apenas uma sensação de medo existencial, é uma entidade parasitária que domina todo o meu corpo. Meus ombros e braços formigam de medo, há uma bola de pavor em minhas entranhas e passo a ter cãibras em minhas pernas. Fico imobilizado por quase uma hora. Eu sei que deveria estar saindo da cama, mas tenho muito medo de fazê-lo … No momento, não consigo enfrentar estar em meu escritório em casa. Eu me sinto muito sozinho e inseguro”. E aí ele acrescenta: “Parece que a realidade finalmente alcançou meu próprio senso de neurose e ansiedade. O que pode ser profundamente preocupante para a maioria das pessoas comuns, mas de alguma forma é quase reconfortante para mim. Quase.”

Sua ansiedade é claramente muito real e avassaladora, mas quem pode dizer que não é razoável? Talvez todos devêssemos nos sentir mais parecidos com ele há muito tempo. De repente, as barreiras entre eles – usuários / sobreviventes de serviço e nós, os “normais” – estão quebrando. Todos nós podemos oferecer e receber suporte.

***

Sobreviver à pandemia, como ocorrerá com a maioria de nós, é apenas o começo. No entanto, não devemos ser tentados a voltar a uma narrativa médica, mesmo que o que vem depois seja provavelmente tão ruim, se não pior. A equipe de saúde pode ficar profundamente abalada com o sofrimento que viu, mas não precisamos chamar isso de um surto de “Transtorno Pós-Estresse”. As pessoas que perderam o emprego provavelmente se sentirão desesperadas, mas não precisamos descrever isso como “depressão clínica” e prescrever medicamentos para isso. A recessão econômica que se seguirá à pandemia pode levar a tantos suicídios quanto as medidas de austeridade, mas não precisamos dizer que “doenças mentais” causaram essas mortes.

O COVID-19 é uma crise nacional e internacional e não há dúvida de que todos ficaremos profundamente assustados. No entanto, podemos sair desta crise em um estado melhor do que antes, mantendo-se conectados com nossos sentimentos e com as ameaças urgentes que nos levaram a eles e realizando ações coletivas para lidar com as causas profundas. Talvez, finalmente, sejamos forçados a estabelecer a ligação entre níveis crescentes de miséria, medo, automutilação, suicídio e desespero e os males sociais da austeridade, emprego inseguro, discriminação e pobreza. Talvez finalmente abandonemos os dois polos da narrativa “saúde mental / doença” e, em vez disso, conversemos muito mais sobre nossas reais e válidas reações humanas à discriminação, insegurança, desigualdade e injustiça em nossas vidas e em nossas comunidades.

Esta é uma chance de desafiar, e não reforçar, a narrativa de Saúde Mental e é por isso que faço parte de um pequeno grupo tentando transmitir uma mensagem diferente na mídia. Tivemos alguns sucessos (confira The Guardian and Nursing Standard). Mais artigos, podcasts e blogs estão por vir e reunimos recursos não médicos e não patológicos que estão no Mad in UK.

“Trauma coletivo” pode ser definido como um evento ou situação que desafia o estilo de vida, os valores e a identidade de toda a sociedade. Judith Herman [2] , uma das pioneiras no trabalho de trauma, reconhece seu profundo impacto em sociedades inteiras, bem como em indivíduos. Ela diz: “A solidariedade de um grupo fornece a proteção mais forte contra o terror e o desespero, e o antídoto mais forte para a experiência traumática“. Ela também diz que a ação social e a revelação da verdade podem trazer cura e mudar as adversidades. O escritor Ben Okri expressou isso lindamente:

As questões levantadas pela pandemia devem se espalhar para todas as outras questões através das quais futuros desastres podem surgir … mudanças climáticas, assistência universal à saúde, justiça e pobreza … Os valores do mercado substituíram os valores da solidariedade humana … Estamos imersos em um novo terreno baldio … Todos os nossos mitos apontam em duas direções. Ou subimos, em direção ao verdadeiro significado da civilização, ou seguimos para um apocalipse.

Eu acredito que já existem sinais de avançar na direção certa. No Reino Unido, as feridas do Brexit estão começando a se curar, à medida que os “defensores da permanência” [na Comunidade Europeia]” se oferecem para fazer as compras de mercado “aos que “defenderam o abandono” e vice-versa, e as pessoas se juntam ao grupo de WhatsApp de suas ruas para ficar de olho nos vulneráveis e idosos. Embora fisicamente separados, estamos de certa forma mais próximos do que nunca. Para mim, há o prazer inesperado de ter meus dois filhos adultos em casa novamente, cozinhando e assistindo filmes de lixo juntos. Outros estão encontrando o lado positivo com nova liberdade frente ao deslocamento e às pressões diárias, além de um ar mais limpo e prazeres mais simples.

Precisamos de uma nova narrativa de angústia compartilhada para substituir a falida dos “transtornos” individuais. Precisamos de conexão humana e apoio mútuo. Podemos aprender a gerenciar nossos sentimentos de uma maneira que nos ajude a atravessar a crise e que nos dê energia para fazer as mudanças sociais e ambientais necessárias depois. As linhas divisórias usuais desaparecem diante dessa emergência a nível global. Nós realmente estamos nisso juntos.

Referências bibliográficas:

[1] [Crace, J. (2020, March). I’m often paralysed by fear but it’s time to appreciate the small stuff. The Guardian.

[2][Herman, J. (2015). Trauma and recovery: The aftermath of violence—from domestic abuse to political terror. Basic Books.

No meio de uma pandemia: a mídia luta para definir o que é normal

0

Desde que o vírus COVID-19 atingiu os Estados Unidos, a grande mídia tem regularmente coberto o seu impacto psicológico no público americano. De acordo com essas matérias jornalísticas e comentários, a doença potencialmente mortal está provocando não apenas medos da doença, mas também tristeza, raiva e solidão criados pela tensão do autoisolamento obrigatório. Essa ansiedade e depressão, dizem, são reações esperadas na maioria das pessoas. Mas para aqueles que já lutam com esses sentimentos, suas respostas à pandemia podem ser vistas como um surto de seus ‘sintomas de doenças mentais’. Assim, enquanto a parte ‘normal’ da nossa população está sendo confortada, aqueles com ‘transtornos’ estão sendo instruídos a tomar cuidados! E, ao mesmo tempo, a mídia fala de uma nova epidemia que pode estar a caminho: um surto de doença mental.

O reconhecimento do estresse e da ansiedade

Por exemplo, nós temos visto estórias tais como “7 Razões Porque é Difícil Controlar a sua Ansiedade com o Coronavírus” (STAT News); “Não Caia na Espiral da Ansiedade com o Coronavírus: Aqui o que Você Pode Fazer para Aliviar as Suas Preocupações, ao Mesmo Tempo Mantendo Você e a sua Família Protegidos“ (Wired); “Como se Manter Resiliente e Saudável Mentalmente Durante a Eclosão do Coronavírus” (“On Point,” WBUR, Boston’s NPR station), e “Experts em Psicologia Dão Dicas para Salvaguardar a Sua Saúde Mental Durante a Quarentena” (CNBC), entre outras.

Essas matérias jornalísticas têm fornecido ferramentas úteis para entender nossas emoções e comportamentos e nos garantir que mudanças de humor, energia e hábitos pessoais são reações normais a uma situação perigosa com muitas incertezas.

Como a repórter Nicole Ellis explicou em “5 maneiras de responder à ansiedade induzida por coronavírus”(Washington Post, 20 de março), o aumento de rotinas e notícias assustadoras que são exibidas em nossas telas de TV e feeds de notícias criam “a tempestade perfeita para se sentir impotente e ansioso”. Diz sua convidada, a especialista em saúde mental, Dra. Jennifer Yip: “Quando estamos ansiosos, nossa resposta de luta ou fuga está sendo desencadeada – o que existe para nos proteger. O problema é que alguns de nós se concentram demais nas coisas que não podemos controlar e não naquilo que realmente podemos controlar.

Reações “saudáveis” vs. Reações “não saudáveis”

Ao mesmo tempo, como constatou um estudo feito por Mad in America sobre a cobertura da imprensa entre 8 e 25 de março, estamos vendo avisos de que, para certas pessoas, essas respostas estressantes ao vírus podem não ser normais e que devemos estar em alerta para os sinais de ansiedade ‘não saudável’.  Preste atenção a este vídeo, promovido em um comunicado de imprensa do Centro de OCD, Ansiedade e Transtornos Relacionados da Universidade da Flórida:

Aqui aprendemos que, de acordo com os psiquiatras, você pode ter níveis de ansiedade ‘não saudáveis’ se você ‘for longe demais’ em relação às medidas preventivas ou passar a evitar suas paixões normais. Por exemplo, lavar as mãos constantemente por mais do que os 20 segundos recomendados pode ser um problema. Assim como, pode não querer mais jogar beisebol depois da escola, porque há várias pessoas tocando no mesmo equipamento esportivo. O que não é mencionado: os dois comportamentos fazem sentido no contexto atual.

Como todos os comunicados à imprensa, esse foi projetado para orientar a cobertura de notícias durante a crise. Ao fazer isso, esteve promovendo o tipo de cobertura que patologiza o sofrimento emocional experimentado por aqueles com ‘doença mental’. Em nossa revisão dos relatórios sobre COVID-19 e saúde mental, esse foi o tipo de cobertura que encontramos regularmente Por exemplo, esse artigo de The Hill, intitulado “Os custos de saúde mental para conter o surto de coronavírus: uma pandemia afeta significativamente as pessoas com doenças mentais”, afirma que é normal que a população em geral se sinta ansiosa: “Todo mundo irá sentir algum nível de desconforto e ansiedade exatamente agora.”

No entanto, o artigo também alerta que “para alguns, a ansiedade pode subir a um nível clínico durante um surto”, o que requer ajuda profissional. Em outras palavras, o que é normal para alguns é anormal para outros. De acordo com Krystal Lewis, psicólogo clínico do Instituto Nacional de Saúde Mental (NAMI), os sintomas que podem ser ‘clínicos’ incluem “dificuldade para dormir, mudanças nos padrões alimentares, mudanças rápidas no humor, incapacidade de realizar tarefas requeridas ou necessárias, [e] automedicação usando álcool.” O artigo pede que as pessoas com esses sintomas revisem as recomendações e os recursos fornecidos pela Aliança Nacional sobre Doenças Mentais, uma fonte primária do trecho citado.

O NAMI é conhecido por promover a ideia de que as doenças mentais são subdiagnosticadas e subtratadas, e essa matéria citada acima, em essência está dizendo a muitos leitores que suas reações à pandemia são ‘anormais’ e que podem precisar de ajuda.

A ABC News publicou um relatório que exibiu a mesma confusão. Com o título “Ansiedade e depressão provavelmente aumentarão entre os americanos à medida que a pandemia de coronavírus se espalhar”, seu subtítulo dizendo aos leitores que “estresse, ansiedade e depressão são normais e que devem ocorrer agora”. Mas o artigo cita Yalda Safai, uma residente de psiquiatria, que alerta que “[a] ameaça única e sem precedentes do COVID-19 vem exarcebando a ansiedade, a depressão e o potencial de histeria em nossos mais vulneráveis – os doentes mentais”. Em outras palavras, as reações dos ‘doentes mentais’ estão sendo retratadas como uma forma de ‘histeria’.

Enquanto isso, um programa de uma emissora afiliada da CBS intitulado “Profissionais da área de saúde alertam para o aumento dos sintomas de doenças mentais durante a crise com o COVID-19“, deu um passo além, sugerindo que o vírus poderia deixar pessoas com problemas mentais que anteriormente eram aceitáveis. O programa comparou a pandemia ao 11 de setembro e sugeriu que reações excessivamente fortes a esses eventos perturbadores poderiam ser um sinal de um transtorno mental. Embora a voz do narrador diga às pessoas para não se autodiagnosticarem, essa mensagem é contradita pelo alerta que aparece na parte inferior de nossas telas: “Proteja-se contra as doenças mentais durante uma pandemia”.

Até comportamentos apropriados às circunstâncias podem ser patológicos, como disse um terapeuta ao The Washington Post (14 de março): “Agora todos os americanos estão sendo instruídos a ver seus arredores de uma maneira que parece imitar o TOC”.

Ao todo, o público fica com uma mensagem confusa: ficar mais ansioso em resposta ao COVID 19 seria normal se você é mentalmente saudável e um sinal de doença se não for, embora aparentemente algumas pessoas normais possam sentir tanta ansiedade que elas também agora podiam ser vistos como doentes mentais. E, finalmente, todo mundo agora deve praticar comportamentos que, no passado, seriam um sinal de que tinham TOC, mas agora são considerados razoáveis … a menos que se vá “longe demais”. Talvez aqueles rotulados com TOC tivessem acertado na hora de lavar as mãos?

Desestabilizando os ‘desordenados’

Diante de circunstâncias excepcionais, todos podem sentir níveis de medo, tristeza e irritabilidade bem acima da linha do patamar usual. Isto é especialmente verdade para pessoas que, mesmo em tempos mais comuns, lutam contra a ansiedade e a depressão. Mas, devido à visão convencional da doença mental como um defeito biológico intrínseco dos indivíduos, a imprensa está tratando esses indivíduos como casos separados.

As manchetes soaram, “Alguns com TOC, outros com Transtornos de Ansiedade, estão lutando contra a Epidemia do Coronavírus: muitos tropeçam nesse fio de arame” (Chicago Tribune), “O Tratamento do TOC e dos Transtornos de Ansiedade Podem ser Complicados pelos Medos com o Coronavírus” (Washington Post, March 13), e “Coronavírus é um ‘Pesadelo Pessoal’ para muitos com TOC e Transtorno de Ansiedade” (NBC News), para nomear apenas alguns.

Nesse esquema, se os ‘normais’ entram em pânico, é por causa da pandemia; se as pessoas ‘doentes mentais’ sofrem, é porque o Transtorno de Ansiedade Generalizada, a Mania Bipolar ou o TOC estão aumentando ou recidivando. Isso é mostrado na maneira como os profissionais de saúde mental que aparecem nessas matérias jornalísticas falam sobre as preocupações cada vez maiores que estão vendo em seus clientes – por definição, ‘pacientes’ no tratamento de um transtorno / doença.

Por exemplo, na reportagem da NBC News sobre o TOC, uma ilustração de pessoas lavando as mãos freneticamente está legendada: “A onda de ansiedade que atinge os pacientes de saúde mental é diferente de tudo que os especialistas já viram”. Aqui, a rede de televisão relata que “um dos clientes de TOC do [psicólogo Reid] Wilson quase cancelou uma consulta porque estava preocupado por ter tocado demais o nariz e poder passar o coronavírus a Wilson. . . Outro, com transtorno de ansiedade generalizada, não conseguia parar de se preocupar se a filha que viajava em outro país estaria em risco”.

No entanto, dada a pandemia, ambas preocupações parecem bem fundamentadas. Quem não se preocuparia em transmitir o coronavírus a um outro ou não ficaria agonizado devido a uma filha que está viajando em outro país?

Em um artigo intitulado “O coronavírus responde a ansiedade e angústia por vulneráveis entre os habitantes de Oklahoma”, o Oklahoma Watch descreve as ansiedades vivenciadas por uma mulher de Oklahoma chamada Sarah, que “sofre de depressão causada pelo estresse”:

Seu discurso acelera e seu coração dispara quando Sarah fala sobre a disseminação do COVID-19 e como isso poderia afetar seu irmão, cujo histórico médico o torna mais vulnerável a infecções. . . Segundo seu diário, ela está ansiosa e luta contra a insônia há semanas – sinais de que sua depressão voltou.

A ideia de que a resposta de um indivíduo ‘transtornado” com a pandemia possa ser entendida como evidência de patologia também se pode ver em comentários de líderes da psiquiatria americana. Por exemplo, o diretor do NIMH, Joshua Gordon, disse ao Washington Post  (17 de março): “Todos nós suspeitamos um pouco dos outros no metrô, na rua, se eles estão tossindo ou parecendo doentes. Imagine se você tivesse esquizofrenia – essa preocupação ou suspeita poderia se transformar em franca paranoia”.

Um artigo do Psychiatric Times (“Cuidado com os psiquiatras! O impacto do COVID-19 e da pandemia na saúde mental”) alerta da mesma forma que as preocupações com o vírus podem “desestabilizar ainda mais os pacientes e aumentar o comprometimento funcional” naqueles com “obsessões por contaminação” relacionadas ao TOC e inflam as “teorias da conspiração” médicas entre aqueles com ‘transtornos psicóticos’.

Essa é a estrutura de ‘patologia’ na qual vivem as pessoas diagnosticadas com transtornos mentais: as reações que são vistas como normais em outras pessoas são vistas como patológicas naquelas que vivem com um diagnóstico. Em uma matéria de 16 de março intitulada “Isso vai complicar seus problemas: o coronavírus apresenta novos desafios para muitos com doenças mentais”, conta a CBS News Katherine Ponte, que “em 2006 estava assistindo obsessivamente os horrores da Guerra do Iraque em notícias na tv-a-cabo quando ela deu uma martelada em sua TV. Ela sofre de um grave transtorno bipolar I com psicose e também de um transtorno depressivo maior, e as imagens de um Oriente Médio devastado pela guerra desencadearam um episódio maníaco que a levou a ser hospitalizada. Se Ponte não tomar cuidado, a atual pandemia de coronavírus pode ter um efeito semelhante nela. ”

Da mesma forma, uma história no USA Today (“O isolamento é um grande gatilho”: os sentimentos de suicídio são amplificados em meio a uma pandemia”) cita “Danielle Sinay, 28. . . uma escritora que vive no Brooklyn e que tem uma história de pensamentos suicidas. Ela foi diagnosticada com transtorno do pânico, estresse pós-traumático e depressão. Enquanto ela não está totalmente isolada – ela vive com o marido e quatro animais de estimação – [ela diz] interrupções em sua rotina e a proliferação de incógnitas a deixou vulnerável. ”

Uma epidemia iminente?

Com a pandemia dita a estar causando um aumento na ansiedade e um número crescente de pessoas que procuram terapia, tem havido uma onda de histórias de terapeutas se esforçando para atender à demanda. Esse pico de sofrimento emocional está sendo agora descrito como um ‘sintoma’ de uma ‘epidemia’ crescente em que pessoas ‘normais’ mostram sinais de ‘doença mental’ e pessoas ‘doentes mentais’ recaem ou pioram. Esse é um problema, como costumava ser dito antes, porque os transtornos de ansiedade já afetam dezenas de milhões de pessoas.

Algumas dessas matéria jornalísticas foram diretas. O New York Times, em “À medida que o coronavírus causa prejuízos emocionais, os profissionais de saúde mental se preparam para o aumento das demandas“, concentra-se nos profissionais de saúde mental que lutam para cumprir compromissos com segurança por meio de sessões de telessaúde para os muitos clientes que agora se dedicam à doença. Em “Profissionais de saúde mental estão se preparando para uma epidemia de ansiedade em torno do coronavírus“, a Mother Jones compartilha a opinião anedótica de um terapeuta sobre a enxurrada de ‘sintomas extremos’ que ela está vendo entre os pacientes. A revista então relata um aumento no número de pessoas comuns que fazem o teste on-line de rastreamento de ansiedade da Mental Health America, que considera “novos dados disponíveis”.

Essas histórias foram estruturadas em torno da ideia de que é necessário muito mais tratamento de saúde mental convencional agora, como é exemplificado pela matéria do Mashable “Coronavírus revela tudo o que há de errado com nosso sistema de assistência em saúde mental“.

Outras matérias foram mais sensacionalistas, sintetizadas por um artigo de 24 de março no The Guardian: “Enfrentamos uma pandemia de distúrbios de saúde mental. Aqueles que se encontram mais afetados mais precisam do nosso apoio”.  Aqui, o colunista do The Guardian Paul Daley declara:

Sim, esta é uma pandemia viral assustadora e mortal. Mas outra praga, da qual não estamos ouvindo o suficiente sobre nossos líderes, chegará em uma onda logo atrás.

Essa é a pandemia de depressão grave e ansiedade que varrerá o mundo à medida que a taxa de desemprego se aproxima de dígitos inéditos, famílias que preferem estar socialmente distantes são empurradas para estar juntas e os jovens não têm a certeza e a estrutura da escola. . .

À medida que o desespero em massa, a ansiedade e a depressão aumentam de acordo com o alongamento . . . Nas filas, a sociedade civil dependerá quase tanto da manutenção da saúde mental individual quanto da disponibilidade de kits de teste e de máscaras.

A confusão da mídia podia ser vista em plena exibição: embora se tornar ansioso possa ser visto como uma reação normal das pessoas normais ao COVID-19, a pandemia, no entanto, estaria provocando uma epidemia de ‘doença mental’.

Separado, Não Igual

Enquanto a mídia alerta sobre um sistema de saúde mental sobrecarregado, ela também tenta fornecer conselhos sobre como lidar por conta própria. Aqui, as dicas dadas às pessoas ‘normais’ e às ‘doentes mentais’ têm sido as mesmas: manter conexões sociais, fazer exercícios, meditar, manter uma rotina e praticar técnicas de terapia cognitivo-comportamental, como reformular os pensamentos negativos. Mas tem havido uma diferença fundamental. Enquanto o público em geral vem sendo estimulado a cultivar seus recursos internos e a procurar colegas e entes queridos, os ‘doentes mentais’ (e as pessoas que notam sinais de ansiedade no nível ‘clínico’) são solicitados a procurar um profissional.

Uma das dicas mais populares para aliviar a ansiedade de pessoas ‘saudáveis’ e ‘não saudáveis’ seria adotar uma dieta de mídia – evitando aquelas assustadoras atualizações de notícias 24 horas por dia, 7 dias por semana, que as próprias mídias vão produzindo. De acordo com profissionais de saúde mental entrevistados na Wired (acima), as pessoas devem “limitar a quantidade de informações que se consome sobre o surto de coronavírus. Tentar encontrar um equilíbrio entre ser informado o suficiente para tomar decisões sobre sua vida, mas não tão sobrecarregado com informações que se tornem estressantes.” Isso não está longe de ser o conselho oferecido às pessoas com transtornos mentais. Em “Pandemia de COVID-19 pode afetar a saúde mental“, relata a afiliada da CBS, “Jessica Ryan, da Mental Health America. . . quem diz que talvez seja hora de se fazer uma pausa [de ficar obcecado com notícias on-line]. Ela diz que todas as mudanças que acontecem e notícias constantes, podem ser desencadeadoras para alguém que tenha sido diagnosticado com uma doença mental.” Mesmo conceito, diferente enquadramento.

Às vezes, o mesmo meio de comunicação criou dois segmentos separados no mesmo tópico. Por exemplo, “CBS This Morning” transmitiu um segmento de vídeo “Cuidando da crise: como conter a ansiedade durante a pandemia“, com a psiquiatra Gail Saltz, que ofereceu dicas diárias para aliviar as reações de estresse com a pandemia. Ela tranquilizou os espectadores: “Patologizar ou fazer-se sentir pior sobre ‘por que estou tão assustado’ ‘não ajuda e não é verdadeiro. É normal estar ansioso agora, pois há algumas coisas perigosas acontecendo e temos um sistema evolutivo desenvolvido para nos alertar sobre as coisas que devemos estar cientes. ” Este artigo foi incorporado ao artigo online da CBS News mencionado acima, em flagrante contraste com a cobertura dos riscos e necessidades especiais dos ‘doentes mentais’ durante a crise do coronavírus.

Distinções falsas

Ao traçar distinções exageradas entre a emoção intensificada e os comportamentos contraproducentes que as pessoas ‘normais’ experimentam e aquelas expressas por pessoas com rótulos de doenças mentais pré-existentes, a mídia aqui está carregando água para a empresa psiquiátrica. De fato, tendemos a ouvir esses avisos toda vez que há uma crise, que acaba por levar mais pessoas ao tratamento e, muito provavelmente, às drogas psiquiátricas. Esse é o objetivo não apenas da NAMI (cujas informações de contato estão incluídas em várias histórias que examinamos), mas também de duas outras fontes principais para essas matérias: Mental Health America (Saúde Mental na América) e a Anxiety and Depression Association of America (Associação de Ansiedade e Depressão da América). Esses grupos têm um grande interesse em promover essa narrativa, e a pandemia oferece uma oportunidade para isso.

A psicóloga Lucy Johnstone comenta em seu artigo: “Por que é saudável ter medo de uma crise” (The Guardian, 25 de março):

Não estamos enfrentando ‘uma pandemia de distúrbios graves de saúde mental’. Estamos todos enfrentando medo, ansiedade, desespero e confusão totalmente normais sobre uma situação verdadeiramente aterradora que desafia todo o nosso modo de vida. Nunca ficou mais claro que os chamados ‘transtornos mentais’ fazem sentido no contexto. . .

Quanto mais rotularmos nossas reações humanas compreensíveis como transtornos, maior será a tentação de desconectá-las de sua fonte e focarmos em novos ‘tratamentos’ individuais. As empresas farmacêuticas devem estar esfregando as mãos diante da perspectiva de todos esses novos clientes.

Consequências do mundo real

Embora bem-intencionado, esse tipo de cobertura é inútil, servindo para aumentar a ansiedade existente, aumentando a possibilidade de que as reações de uma pessoa a uma pandemia internacional possam significar que há algo de ‘errado’ com elas. Também é perigoso sugerir que as diretrizes de saúde pública que precisamos seguir agora, como o auto-isolamento, podem nos quebrar – isso serve apenas para fazer as pessoas reconsiderarem a sensatez do distanciamento social.

Os estereótipos daqueles com rótulos de doenças mentais e sua necessidade ou periculosidade percebida já tiveram consequências no mundo real. No Reino Unido, uma lei de saúde mental foi temporariamente alterada para diminuir o nível exigido para a internação involuntária de pessoas consideradas doentes mentais, que passam a exigir a aprovação de um médico em vez de dois. A regra também estenderá ou removerá os prazos para a internação involuntária.

Como relatou um artigo de 19 de março do Disability News Service, a “Rede Nacional de Usuários de Sobreviventes (NSUN) teme que isso possa levar a mais coerção e mais negligência, além de menos salvaguardas”. A história cita Akiko Hart, executivo-chefe da NSUN: “Embora entendamos que são tempos sem precedentes. . . manter indivíduos desnecessariamente detidos fora do seu setor devido às pressões da força de trabalho é uma violação de seus direitos humanos.” Ela acrescentou: “Igualmente, liberar indivíduos por causa de pressões sobre a força de trabalho ou o estado de saúde mental é profundamente irresponsável”.

O mito da fragilidade

Por fim, a cobertura enfatiza a fragilidade e vulnerabilidades das pessoas com ‘doenças mentais’, e não os pontos fortes que elas também possuem. Bob Nikkel, ex-comissário estadual de saúde mental e álcool e drogas do estado de Oregon * observa: “Os jornalistas têm os mesmos estereótipos de todos os outros”. Recentemente contatado por um repórter sobre o impacto do coronavírus nos serviços para ‘os doentes mentais’, ele tentou transmitir que “as pessoas com diagnóstico de doença mental têm mais recursos do que as pessoas imaginam”.

Ele disse à Mad in America: “Não precisamos ter pena, precisamos vê-los como líderes. Precisamos reconhecer que eles fazem alguma versão do suporte entre colegas, o que vem reduzindo o isolamento há décadas.” Nikkel citou o trabalho do Intencional Peer Support e do National Empowerment Center, relatando que “o diagnóstico duplo anônimo começou on-line os programas ’12-passos mais cinco ‘[recentemente] e salvou a vida de alguém que era suicida. Mesmo na era dos coronavírus, esses esforços são especialmente valiosos.”

De fato, pessoas com deficiências psicossociais podem ser mais capazes de lidar com a ansiedade ‘saudável’ ou até ‘não saudável’. Eles tem aprendido muitas lições e táticas ao lidar com esses desafios há anos. Ken Goodman, um terapeuta do conselho da ADAA, disse ao The Washington Post (11 de março) que “dos cerca de 60 pacientes que ele trata a cada mês, apenas um expressou o medo do vírus até agora”.

No final de um artigo tipicamente ameaçador sobre os riscos para a saúde mental do coronavírus publicado em Detroit Free Press, Toni Lupro, estudante de medicina com “Transtorno Obsessivo-Compulsivo”, notou que “a pandemia de coronavírus revelou até que ponto ela chegou a terapia.” A história continua: “Medos de contaminação dominaram sua vida no passado, mas a chegada do COVID-19 em Michigan não a fez ter recaída”.

Lupro ela própria é citada, dizendo: “É bom perceber que todos estão no mesmo barco. Mesmo as pessoas que são médicas há 30 anos, todos nós não sabemos necessariamente o que vai acontecer. . . Eu acho que isso me ajuda a saber [temer germes] não é necessariamente uma coisa irracional. ”

Certamente, muitas pessoas estão atualmente sofrendo imenso sofrimento, e pacientes psiquiátricos e pessoas com problemas de uso de substâncias são mais vulneráveis à contração do vírus porque tendem a ser marginalizadas. Além disso, pesquisas mostram que os ecos desse período traumático provavelmente permanecerão muito tempo depois que o vírus e as quarentenas tiverem passado. O que isso significa é que todos nós precisaremos de níveis variáveis e ampliados de suporte.

Mas esses eventos estressantes também podem ser um grande equalizador. Como Lucy Johnstone escreveu, existe uma alternativa para uma epidemia de fobia e diagnóstico de Transtorno Pós-Traumático: “Podemos sair desta crise em um estado melhor do que antes, permanecendo conectados com nossos sentimentos e com as ameaças urgentes que os motivaram, e tomando ação coletiva para lidar com as causas básicas “.

Embora a imprensa deva reconhecer que a situação é terrível e que a ansiedade é ‘apropriada’ agora, Cohen Silver disse que há uma oportunidade para os jornalistas transmitirem uma mensagem mais construtiva: “Se trabalharmos juntos, podemos salvar vidas. . . Podemos incentivar resultados positivos da comunidade, como comportamento altruísta, coesão social, voluntariado, alcançando aqueles que moram sozinhos ou que são idosos. ”

Enquanto a nossa situação coletiva de emergência continuar, seria útil ver a mídia cobrir mais abordagens de saúde pública baseadas na comunidade e na resiliência, em vez de fornecer uma plataforma para a narrativa patologizante da psiquiatria.

O papel da imprensa

Essa perspectiva mais ampla é algo que os cientistas sociais que estudam o trauma dizem que os jornalistas devem enfatizar se quiserem ser precisos e úteis durante esta crise. Entre eles está a Dra. Roxane Cohen Silver, cuja pesquisa se concentra nos efeitos psicossociais dos desastres em larga escala e no papel da mídia nas suas conseqüências. Durante um recente seminário on-line patrocinado pela SciLine, ela falou sobre “como podemos garantir melhor a resiliência da população”:

Todos nós já passamos por traumas coletivos antes. Resistimos à violência em massa, resistimos a desastres naturais e, de fato, meus colegas e eu estudamos muitos desses eventos, incluindo os ataques terroristas de 11 de setembro. . . [e] furacões Irma e Harvey. E nossa pesquisa nos diz que a maioria superar essas situações.

Embora a imprensa deva reconhecer que a situação é terrível e que a ansiedade é “apropriada” agora, Cohen Silver disse que há uma oportunidade para os jornalistas transmitirem uma mensagem mais construtiva: “Se trabalharmos juntos, podemos salvar vidas. . . Podemos incentivar resultados positivos da comunidade, como comportamento altruísta, coesão social, voluntariado, alcançando aqueles que moram sozinhos ou que são idosos. ”

Enquanto nosso estado coletivo de emergência continuar, seria útil ver a mídia cobrir mais abordagens de saúde pública baseadas na comunidade e na resiliência, em vez de fornecer uma plataforma para a narrativa patologizante da psiquiatria.

##

*Nikkel é também Diretor Executivo da Educação Continuada do MIA. 

Noticias

Blogues