Nota do Editor: Nos próximos meses, Mad in Brasil publicará uma versão serializada do livro de Sami Timimi, Medicina Insana. Neste capítulo 3, parte 1, são apresentados as supostas bases biológicas para o TDAH e como elas são cientificamente falas. A cada quinze dias, uma nova seção do livro será publicada, e todos os capítulos serão arquivados aqui.
Deixem-me então olhar para as provas que apoiam que o TDAH é uma “coisa” que surge através de problemas genéticos e cerebrais.
Genética do TDAH: A hipótese nula foi refutada?
A alegação de que o TDAH é genético foi extrapolada principalmente a partir de estudos com gêmeos, porque os gêmeos idênticos são mais frequentemente ambos diagnosticados com TDAH do que os gêmeos não idênticos. No método dos gêmeos, presume-se que quando uma percentagem mais elevada de gêmeos idênticos do que não idênticos é diagnosticada com a mesma doença, isto se deve a fatores genéticos e não a fatores ambientais. Isto porque os pares de gêmeos idênticos partilharão 100% dos genes, enquanto os gêmeos não idênticos partilharão, em média, 50% dos seus genes.
O investigador Jay Joseph examinou a questão da hereditariedade das perturbações psiquiátricas (incluindo TDAH) com grande detalhe nos seus livros e artigos, e as suas críticas ilustram os problemas com as provas que apoiam o TDAH como sendo um transtorno com altos níveis de hereditariedade genética.
Para que gêmeos idênticos tenham maior probabilidade de ter um transtorno devido à partilha dos mesmos genes, é preciso assumir que o ambiente psicológico e social é o mesmo para gêmeos idênticos e não idênticos. Isto é conhecido como a Assunção de Ambiente Igual ou AAI, para abreviar. Foi há muito estabelecido que o AAI não se mantém quando se compara gêmeos idênticos e gêmeos não idênticos. Os gêmeos idênticos são frequentemente tratados de forma bastante mais semelhante (por exemplo, vestidos com a mesma roupa) e experimentam um ambiente psicológico único (por exemplo, troca de papéis para confundir os outros).
Ser um dos gêmeos idênticos é uma experiência diferente de ser um dos gêmeos não idênticos, pelo fato que os fatores psicológicos e sociais poderiam por si só ser responsáveis por uma maior semelhança comportamental ou emocional em relação aos gêmeos não idênticos. Isto significa que o método de estudo de gêmeos não pode separar fatores genéticos de fatores ambientais para condições psiquiátricas, e por isso não se pode chegar a estimativas da contribuição genética para o TDAH a partir deste método.
Não tem havido verdadeiros estudos de adoção em crianças com TDAH. De qualquer modo, os problemas metodológicos têm sido numerosos nos estudos de adoção, desde o fato de que a maioria dos adotados já passou um tempo considerável em famílias biológicas de origem ou em abrigos antes da adoção, até as diferenças que os pais dos adotados, como grupo, podem ter em relação aos pais originários.
Os estudos de adoção, como os estudos de família, não são portanto capazes de distinguir as contribuições ambientais das genéticas, e por isso nenhum destes métodos utilizados para estimar a hereditariedade pode por si só ou em conjunto refutar a “hipótese nula” de que não existe nenhuma anormalidade genética característica ou diferença associada àqueles que obtêm um rótulo de TDAH.
A única forma de comprovar de modo seguro uma contribuição genética específica para TDAH é através de estudos genéticos moleculares. Desde que os exames genéticos inteiros mais rápidos e baratos se tornaram disponíveis, as provas genéticas moleculares têm vindo a acumular-se. Este volume cada vez maior de investigação genética com TDAH não está mostrando quaisquer descobertas particulares, quer em relação a genes anormais, quer em relação a associações genéticas consistentes. Isto não tem impedido que investigadores inescrupulosos façam alegações em contrário.
Em 2010 foi publicado um estudo na revista médica The Lancet afirmando haver sido encontrado provas genéticas moleculares concretas de que o TDAH é uma doença genética. Este estudo tem sido, e continua a ser referido como o estudo prevalecente a demonstrar a certeza que se pode chamar TDAH de um transtorno com origem genética. No comunicado de imprensa da época no qual a líder da equipe de investigação, a Professora Anita Thapar, deixou pouco espaço para dúvidas, dizendo “Agora podemos dizer com confiança que o TDAH é uma doença genética e que os cérebros de crianças com esta condição se desenvolvem de forma diferente dos de outras crianças”. Foi isto que realmente encontraram:
O estudo envolveu a comparação de escaneamentos de genoma completo de 366 crianças “com TDAH” com os feitos em 1047 crianças de controle “não TDAH”, à procura de algo chamado copy number variants (CNVs). Os CNVs são pedaços anormais de código genético que são repetidos onde não devem ser ou apagados onde devem estar.
Os investigadores descobriram que 15,6% (57) das crianças com TDAH tinham CNV em comparação com 7,5% (78) dos controles sem TDAH. Isto dá um excesso de 8% no grupo com TDAH, o que não é um número significativo. Se quisermos aceitar a prevalência padrão citada para o TDAH, significa também que se nos depararmos com um jovem que tenha CNV é mais provável que ele não tenha um diagnóstico de TDAH do que o tenha.
O engano, porém, não acaba aí. O QI médio registrado (uma medida psicológica do nível de inteligência utilizada para avaliar o nível de aprendizagem, incluindo o nível de dificuldades de aprendizagem) das crianças com TDAH foi de 86, quer dizer, 14 pontos abaixo da média geral da população de 100. Além disso, quando 33 crianças com TDAH (QI inferior a 70) foram excluídas do grupo com TDAH, apenas 11,4% das restantes 333 crianças tinham CNV (agora apenas 4% acima do grupo de controle sem TDAH). 39% (13) das 33 crianças com TDAH e com uma deficiência intelectual que tinham CNVs.
Esta evidência é mais sugestiva de uma relação entre a presença de CNV e deficiência intelectual (39%) do que CNV e TDAH (11,4%). Os autores deste estudo deveriam, portanto, ter controlado para o QI dado o seu impacto desproporcional na probabilidade de ter CNVs, mas optaram por não o fazer.
Tal como mencionado, o QI médio no grupo TDAH era significativamente inferior ao do grupo de controle (que podemos assumir que teria um QI médio de 100). Os autores deveriam ter escolhido um subgrupo dos seus pacientes com TDAH que tivesse um QI médio de 100. Isto teria então proporcionado um grupo de comparação mais legítimo com o seu grupo de controle. Não posso deixar de pensar se o fizeram, porque suspeito que possam ter ficado sem ou com uma pequena diferença e por isso optaram por não divulgar isto. Este tipo de publicação de grande visibilidade e de atenção mediática é pior do que a ciência fraudulenta [junk Science], pois os autores enganaram a comunidade médica e o público em geral nas suas conclusões.
Desde então, tem havido uma explosão na investigação genética sobre TDAH muito bem financiada. Milhares das pessoas diagnosticadas com TDAH tiveram o seu genoma inteiro digitalizado para ser detectado o que é conhecido como “variantes de DNA” – pedaços de DNA que são diferentes em pessoas com uma condição em comparação com as que não a têm. Estes estudos são denominados estudos de associação de todo o genoma [genome-wide association studies] (GWAS).
Em GWAS, cada pessoa dá uma amostra de DNA, a partir da qual são lidos os milhões de códigos genéticos que cada pessoa carrega, procurando um gene que ocorre mais frequentemente em pessoas com uma condição do que naquelas que não têm. Se um gene é encontrado com mais frequência em pessoas com a condição, diz-se que está associado a essa condição. Os estudos da GWA investigam todo o genoma, o que os torna fundamentalmente diferentes dos métodos que começam com a hipótese de que um determinado gene poderia estar associado ao (neste caso) TDAH.
Uma abordagem baseada em hipóteses apresenta uma teoria de que um determinado gene ou conjunto de genes que codificam, por exemplo, o neurotransmissor dopamina ou os seus receptores em células nervosas, é anormal, e depois compara estes genes em pessoas com um diagnóstico e em controles não-TDAH. Este último tipo de estudo seria a forma prevalecente de investigação de anomalias genéticas moleculares ou diferenças no TDAH, mas isso não foi feito.
Os estudos de GWA não são orientados por hipóteses e são mais exercícios de pesca de dados. Podem levar a hipóteses que podem ser melhor investigadas se revelarem regiões que possam ser de interesse e parecer relevantes para a condição que está a ser estudada. Mas, por si só, dizem mais sobre o que não é relevante do que o que é, particularmente se os genes que ocorrem com mais frequência do que o acaso estiverem espalhados por muitas partes diferentes do genoma.
Os números aqui estudados são particularmente importantes para se compreender. Os estudos iniciais de GWA sobre TDAH não descobriram quaisquer variantes de DNA que alcançassem significado em todo o genoma, mesmo quando a maioria destas amostras foram combinadas numa meta-análise que incluiu mais de três mil doentes com diagnóstico de TDAH e/ou os seus pais.
Mais tarde, utilizando amostras ainda maiores, que chegaram a dezenas de milhares, estudos da GWA mostraram que o TDAH está associado a um grande número de variantes comuns, cada uma com efeitos minúsculos, que estão espalhados pelo genoma, cruzam-se com outros diagnósticos chamados psiquiátricos (como o autismo, esquizofrenia, transtorno bipolar) e muitas vezes sem qualquer controle sobre os efeitos de dificuldades de aprendizagem.
O que isto significa é que para captar genes que ocorrem muito, muito ligeiramente mais do que o acaso naqueles com TDAH em comparação com os controles saudáveis, é necessário ter uma amostra de tamanho muito grande (de pelo menos dez mil). A maioria das pessoas com diagnóstico de TDAH não tem nenhuma das diferenças genéticas individuais detectadas nas amostras maciças de GWAS, nem temos nenhuma teoria biológica razoável para testar o que está a ser detectado a partir destas pequenas e pouco relevantes descobertas.
Os entusiastas da etiologia genética têm-se referido à incapacidade de encontrar anomalias ou diferenças genéticas moleculares confiáveis como um enigma ao qual se referem como “a hereditariedade em falta”. Porque presumem que o TDAH deve ser genético, eles imaginam que os problemas genéticos devem estar aí em algum lugar; é que ainda não o encontramos. A razão mais provável para a “hereditariedade em falta” é, evidentemente, que nunca esteve lá, em primeira instância.
Cientificamente falando, temos de assumir então que no que diz respeito à genética, o armário está vazio e a “hipótese nula” mantém-se: Não há nenhuma anomalia genética característica identificável/perfil associado ao TDAH.
Estudos de imagiologia cerebral TDAH: A hipótese nula foi refutada?
Tal como com a genética, os estudos de imagens cerebrais TDAH não revelaram qualquer anomalia ou característica específicas. A imagem que emerge é de descobertas consistentemente inconsistentes, que são desvios estatísticos (os cérebros não seriam reconhecidos pelos radiologistas como sendo clinicamente anormais), provêm de pequenos estudos de tamanho de amostra, que nem sempre correspondem exatamente à idade (e você verá porque é que isto é importante, quando comentarei a investigação da data de nascimento a seguir) e tipicamente não controlam o nível de QI, ou os possíveis efeitos da medicação. Uma equipe de investigação encontra um pedaço do cérebro menor do que os controles “saudáveis” e a equipe seguinte não, ou até se encontra que esse pedaço é um pouco maior.
Mas, como tenho vindo explicando, esse tipo de ciência não se deve intrometer no caminho do cientificista dedicado! Em 2017, The Lancet Psychiatry publicou um estudo que os autores alegavam ter oferecido provas definitivas de que jovens com TDAH têm cérebros diferentes e de dimensões mais reduzidas em comparação com os seus pares saudáveis.
Tal como com a ciência genética da sucata, o investigador principal, Dr Hoogman, fez afirmações ousadas afirmando, num comunicado de imprensa com uma grande cobertura pela grande imprensa, “Os resultados do nosso estudo confirmam que as pessoas com TDAH têm diferenças na sua estrutura cerebral e, portanto, sugerem que a TDAH é uma desordem do cérebro”. Uma análise cuidadosa das suas descobertas mostra como a sua investigação revela mais o desespero dos autores em encontrar algo do que a sua capacidade de realizar um exame científico adequado das suas descobertas.
Os autores chamam ao seu estudo uma “mega-análise”, uma vez que retiraram dados de um número grande de projetos anteriores de investigação e “comprimindo” todos os resultados dos diferentes sites, como se fossem todos apenas um grande estudo. Este processo é por vezes esclarecedor, mas pode também fazer com que as descobertas incidentais pareçam mais significativas do que o são na realidade.
No total, tiveram dados dos escaneamentos do cérebro de 1713 pacientes diagnosticados com TDAH e 1529 indivíduos que não tiveram este diagnóstico, recolhidos de 23 equipes de investigação em todo o mundo. Alegam ter encontrado o que corresponde a pequenas diferenças em algumas (não todas) estruturas cerebrais específicas, mas que se tornam estatisticamente significativas quando adicionam todos os volumes disponíveis registrados para uma determinada estrutura no TDAH, quando comparados com grupos não diagnosticados com TDAH.
A utilização de certas medidas de variação estatística permitiu-lhes fazer esta afirmação sobre diferenças tão pequenas que não têm qualquer relevância clínica. Este método permitiu-lhes esconder os resultados consistentemente inconsistentes.
Por exemplo, a maior diferença foi encontrada para uma estrutura cerebral minúscula chamada núcleo accumbens (NA). Esta mega-análise faz assim a afirmação de que as crianças com TDAH têm uma NA menor do que as crianças sem TDAH. No entanto, se olharmos para os dados por site investigado, encontramos 10 sites que encontraram uma média menor de NA no grupo TDAH, 4 sites que encontraram uma média maior de NA no grupo TDAH, e 6 sites que não encontraram qualquer diferença.
Este é o quadro para a estrutura com a maior diferença no estudo. Permanecendo com a NA, também se pode ver que existem grandes problemas técnicos com a interpretação dos escaneamentos, decorrentes das diferentes máquinas e/ou algoritmos analíticos dos diferentes grupos de investigação utilizados. Por exemplo, os indivíduos em Bergen, Noruega, têm um volume médio de NA de 758 mm3 versus 805 mm3 (TDAH versus controle), enquanto em Wuzberg, Alemanha, têm um volume médio de NA de 462 mm3 v 449 mm3 ( TDAH versus controle).
Talvez as crianças norueguesas tenham NAs surpreendentes em comparação com as crianças alemãs, que por esta norma devem ter todas que se defrontar com o TDAH. No entanto, dado que o grupo norueguês é um dos grupos onde os controles têm volumes maiores, enquanto que o grupo TDAH tem volumes maiores no centro alemão, esta enorme variação – que é maior entre centros do que no interior – distorce os resultados se (como é o caso) aqueles com volumes totais maiores se situarem mais no grupo que tinha diferenças a favor de controles com maiores NAs.
Finalmente, aqui está mais um estudo que não controla as diferenças de QI. As associações entre o volume cerebral e o QI têm sido demonstradas através de uma série de estudos com adultos e crianças. Quando os autores deste estudo publicaram a tabela de QI correta (embaraçosamente tinham originalmente publicado uma versão incorreta), um grupo separado reanalisou os seus dados, tendo em conta os efeitos potenciais do QI, e concluiu que não havia diferença significativa entre indivíduos com TDAH e os do grupo de controle em qualquer uma das áreas investigadas do cérebro, uma vez que a diferença de QI é controlada.
Também aqui, no que diz respeito à ciência, o armário está igualmente vazio. Ninguém tem se aproximado de encontrar uma anomalia característica e, como resultado, não há nenhum marcador biológico ou exame cerebral utilizado para diagnosticar o TDAH. A hipótese nula mantém-se – não existe nenhuma anomalia característica do cérebro associada ao TDAH.
TDAH causado por um desequilíbrio químico: A “hipótese nula” foi refutada?
Não há escassez de “especialistas” afoitos para afirmar que o TDAH está relacionado com uma falta ou desequilíbrio químico do neurotransmissor “dopamina”. Esta ideia baseia-se unicamente na constatação de que as drogas (como a Ritalina) que agem para estimular a liberação de dopamina, e, portanto, aumentam os seus níveis nas sinapses cerebrais, parecem melhorar os “sintomas” do TDAH (mais sobre isso vejam em seguida).
Décadas atrás, estudos descobriram que ao se tomar estimulantes, independentemente do diagnóstico, melhora-se a capacidade, pelo menos a curto prazo, de se manter a concentração em uma tarefa. No entanto, ainda que ninguém tenha demonstrado haver falta de dopamina ou não em indivíduos diagnosticados com TDAH, a teoria do desequilíbrio químico foi capaz de se espalhar juntamente com a comercialização agressiva de fabricantes de medicamentos que aumentam os níveis destes agentes químicos no cérebro.
De vez em quando, surge um estudo que desafia a sabedoria aceita e, por isso mesmo, recebe pouca publicidade. Um desses estudos foi publicado em 2013. Os seus resultados questionaram “sugestões anteriores de que a perturbação do déficit de atenção e hiperatividade (TDAH) é o resultado de anomalias fundamentais na transmissão de dopamina“. Os investigadores descobriram que a administração de metilfenidato (mais comumente conhecido pela marca Ritalin) a voluntários adultos saudáveis, bem como àqueles que apresentam sintomas de TDAH, levava a aumentos semelhantes da dopamina química no cérebro. Ambos os grupos também tinham níveis equivalentes de melhorias como resultado da droga, quando testados em sua capacidade de concentração.
Não deveríamos ficar surpreendidos com esta descoberta. Estimulantes como a Ritalina agem sobre o sistema nervoso de formas quase que idênticas à cocaína. A maioria dos medicamentos estimulantes são análogos às anfetaminas e, de fato, alguns são derivados de anfetaminas. As anfetaminas são amplamente utilizadas ilegalmente porque lhe dão uma espécie de visão focalizada, fazendo o seu usuário ficar altamente absorvido no que está a fazer; assim, além de se as utilizar pelos seus efeitos recreativos, também são utilizadas como auxiliares de estudo para os exames escolares, uma vez que aumentam a concentração e mantêm o usuário acordado. Como todas as outras drogas que usamos na psiquiatria, elas têm efeitos gerais em toda as pessoas. Elas não corrigem quaisquer “desequilíbrios químicos” baseados em doenças.
Também aqui, portanto, o armário está também vazio. A “hipótese nula” mantém-se – não há desequilíbrio químico característico associado ao TDAH.
As crianças pequenas para a sua classe escolar são mais propensas a “apanhar” o TDAH
Vários estudos realizados em diferentes países descobriram que as crianças mais novas em uma classe têm um risco significativamente maior (em comparação com as crianças mais velhas num ano escolar) de serem diagnosticadas com TDAH e/ou receberem medicação para TDAH. Estes estudos descobriram que, quer se esteja em um país com altas taxas de diagnóstico ou prescrição (como os EUA) ou com baixas taxas (como a Finlândia), este padrão ainda é evidente.
Tal padrão de identificação do TDAH é fortemente sugestivo da noção de que a imaturidade relativa em comparação com os seus pares é um importante fator de risco para se receber este rótulo (ou seja, para os adultos notarem e problematizarem a capacidade de concentração de uma criança e os seus níveis de atividade – o seu ” barulho). Quer seja mais de 6% das crianças (no estudo islandês) que recebem estimulantes prescritos ou menos de 1% (no estudo finlandês), o padrão ainda se mantém. Seja como for, as normas culturais para a problematização destes comportamentos são que a relativa imaturidade na classe continua a emergir como um fator de risco.
É claro que as crianças amadurecem em ritmos diferentes, levantando uma importante questão de saber se um diagnóstico de TDAH, mesmo para crianças mais velhas da turma, pode também refletir a sua trajetória de desenvolvimento relativamente mais lento. Lembremo-nos de que este é um diagnóstico dado principalmente aos meninos, e os meninos em média desenvolvem-se mais lentamente do que as meninas.
Há já algum tempo que penso que o crescimento de pseudo-diagnósticos, como o TDAH, é um reflexo da intolerância neoliberal ocidental à diversidade entre as crianças, onde desde cedo são dadas mensagens às crianças de que são valorizadas pelo que fazem (pelo seu “desempenho”) e não apenas pelo que são. Estas descobertas dão mais apoio à minha preocupação de que a prevalência de diagnósticos como o TDAH funciona como um barômetro da intolerância das crianças e da “infantilidade” na cultura moderna.
Tratamento de TDAH: Convencer os pais que os seus filhos precisam de tomar substâncias semelhantes à cocaína
Nos anos 70, 80, e 90, o TDAH como conceito havia sido arrancado, ajudado em grande parte pelo crescimento na utilização de derivados de anfetaminas. Este grupo de substâncias é referido como “estimulantes”, pois aumentam a liberação de certos neurotransmissores (ou seja, estimulam o sistema nervoso), muito especialmente a dopamina. A Ritalina era a marca mais reconhecida destes medicamentos e tornou-se um best-seller, obtendo enormes lucros para a Novartis Pharmaceuticals. Outras empresas cedo se aperceberam do enorme potencial que advém da medicalização dos comportamentos das crianças, em particular as que estressam os pais e os professores, e por isso uma variedade de substâncias químicas de longa e curta duração estão agora disponíveis.
Rotular os comportamentos irritantes, preocupantes ou angustiantes das crianças com um rótulo pseudo-médico abre enormes mercados potenciais; por isso, embora a prescrição de estimulantes perigosos e viciantes para crianças tenha começado e permanecido durante algumas décadas como sendo um fenômeno quase que exclusivo dos EUA, desde então o fenômeno espalhou-se globalmente e os números do que estão recebendo medicamentos continuam a aumentar.
Esta tendência não tem sido isenta de controvérsias. Afinal, sabe-se que as anfetaminas, tal como a cocaína, são altamente viciantes, com um acentuado potencial de dependência física e psicológica e com muitos riscos graves para a saúde. Como estimulantes do sistema nervoso central, elas elevam as funções vitais, como a pressão arterial, a temperatura corporal e o ritmo cardíaco. Aqueles que usam anfetaminas geralmente precisam de menos sono, têm menos apetite e têm maior concentração. Como poderíamos justificar dar às crianças uma substância que advertimos os adultos sobre a sua ingestão, devido aos terríveis efeitos a longo prazo que sabemos que pode ter no corpo, cérebro e em tantos aspectos da vida quotidiana de uma pessoa?
É aqui que seria necessária uma teoria de desequilíbrio químico. Os entusiastas da medicação de TDAH criaram um mito, baseado não em provas ou evidências científicas, mas como uma forma de justificar o que eles defendiam. O argumento era que aqueles com TDAH reagem de forma diferente aos estimulantes do que aqueles sem TDAH, porque no TDAH há uma deficiência de dopamina – portanto, os estimulantes estão apenas a substituir o que não estava lá em primeiro lugar. Isto significa que seria uma correção e não algo que conduzirá a todos os efeitos terríveis conhecidos. Por conseguinte, os estimulantes são perigosos se não houver TDAH, mas seguros e talvez vitais para o funcionamento “normal” no caso de se ter TDAH.
Como discutido anteriormente, a “hipótese nula” de um desequilíbrio químico no TDAH tem ainda de ser refutada e, consequentemente, essa teoria é infundada.
A exemplo da maioria dos medicamentos utilizados na psiquiatria, a utilização das drogas para TDAH baseou-se em estórias e que já havia começado antes de ter sido feito um estudo para demonstrar que elas eram seguras e eficazes. O pressuposto era que, uma vez que os estimulantes pareciam acalmar estas crianças, devia estar a funcionar de uma forma diferente daqueles que as utilizavam de forma recreativa, que pareciam mais energizados. No entanto, quando foi estudado nos anos 80, verificou-se que, na realidade, tem efeitos semelhantes, independentemente do diagnóstico.
O seu principal efeito nas doses prescritas é de se criar uma espécie de visão psicológica focada, de modo tal que se fica absorvido no que se está a fazer. O aparente efeito calmante está relacionado com este efeito de maior concentração. Quando se vê o seu filho sentado, aparentemente concentrado no trabalho escolar, e seguindo instruções de uma forma que não estava a fazer antes, pode parecer que este é um tratamento transformador.
Mas este não passa de um efeito geral a curto prazo dum estimulante. Fá-lo-á para a maioria das crianças que tomam o estimulante, independentemente do rótulo que ele tenha. Os estudos que apoiaram a utilização de estimulantes como tratamento foram quase todos realizados por empresas farmacêuticas, duraram apenas algumas semanas ou meses, e concentraram-se na classificação de “sintomas” de TDAH em vez de outras medidas de qualidade de vida. No entanto, uma vez prescrito um estimulante às crianças, a prescrição não é para algumas semanas ou meses, mas normalmente para muitos anos. É aqui que precisamos das provas. O que acontece após vários anos?
Dado que as anfetaminas são altamente viciantes, a tolerância física é susceptível de ocorrer. Como muitos sistemas no corpo, as sinapses nervosas (as ligações entre células nervosas) têm propriedades homeostáticas. Isto significa que gostam de manter os seus mensageiros químicos num intervalo estreito para um funcionamento ótimo. Se houver mais do que a quantidade habitual de dopamina (por exemplo) a ser liberada como resultado da ingestão regular de uma anfetamina, a sinapse começará a desligar os receptores de dopamina para, com efeito, reduzir a quantidade total de dopamina de volta ao seu intervalo estreito habitual. É por isso que os viciados em cocaína que tomam uma certa quantidade regularmente descobrem que, para obterem a mesma dose, têm de tomar mais cocaína – na medida em que a quantidade que costumava dar-lhes essa quantidade já não o faz.
Devido a este mecanismo homeostático, após algum tempo, os comportamentos problemáticos começam a surgir novamente na criança, à medida que o efeito de concentração crescente do estimulante começou a desvanecer-se. Isto é o que chamamos “tolerância” à dose de anfetamina. Isto significa que as sinapses desligaram alguns dos receptores de dopamina, por isso é que já não se obtém o mesmo efeito.
No entanto, se pararmos agora a anfetamina, teremos efeitos de abstinência, uma vez que as células nervosas terão agora muito pouca dopamina, devido ao número reduzido de receptores para o trabalho. O estado de agitação que a retirada súbita ou demasiado rápida do estimulante pode fazer parecer que o “TDAH” estar a voltar com uma vingança, convencendo a todos, incluindo os médicos – poucos dos quais parecem compreender o processo acima referido – de que a criança precisa realmente da anfetamina para um funcionamento mais “normal”.
Agora, portanto, a dose será aumentada e ao ser colocada em funcionamento será um processo de aumento da dependência física (na criança) e psicológica (nos pais e no professor), o que leva a aumentos graduais da dose ao longo do tempo com períodos temporários de melhoria, que acabam por se esgotar – conduzindo a outro aumento de dose – juntamente com uma solidificação da ideia de que a criança tem uma condição cerebral chamada TDAH e que necessita de anfetaminas para a manter sob controle.
A interferência com o sono significa muitas vezes que uma ajuda para dormir será adicionada (como a melatonina); e dificuldades contínuas de comportamento resultam muitas vezes, à dada altura, em utilização também de medicamentos “antipsicóticos” muito pesados. Não é, portanto, raro, após vários anos, encontrar jovens rotulados com TDAH que estão a tomar vários medicamentos, muitas vezes em doses elevadas, e os problemas continuam a voltar ou nunca desaparecem completamente.
Mas o que dizem as evidências da investigação sobre os resultados a longo prazo?
Em 1999, foi publicado um famoso estudo americano sobre “tratamento” para o TDAH. Nessa época a prescrição de medicamentos estimulantes nos EUA já estava generalizada. Quando este estudo foi publicado, recebeu uma extensa cobertura pública e profissional. Lembro-me de assistir à nossa conferência anual da Faculdade de Psiquiatria Infantil e Adolescente (no Royal College of Psychiatrists do Reino Unido) no ano 2000, de ouvir o então presidente da faculdade explicar à audiência de psiquiatras infantis do Reino Unido que as implicações deste estudo eram que teríamos de prescrever estimulantes para qualquer pessoa diagnosticada com TDAH, e que provavelmente (dadas as limitações de recursos) os estimulantes prescritos por si só seriam insuficientes para a maioria.
Então, o que descobriu este famoso estudo? Este estudo, referido como o estudo “MTA” (Multimodal Treatment of Children with ADHD), foi um ensaio multicêntrico de 14 meses em que pacientes jovens foram randomizados para 4 grupos de tratamento: Medicação (estimulantes) apenas, terapia comportamental apenas, medicação combinada e terapia comportamental, e cuidados comunitários de rotina.
Os autores concluíram que, após 14 meses de tratamento, houve mais redução dos sintomas de TDAH apenas na medicação e nos grupos combinados de medicação e terapia comportamental do que no grupo de terapia comportamental apenas, que por sua vez tiveram melhores resultados do que o grupo de cuidados comunitários de rotina.
Como se poderia prever, houve problemas consideráveis associados ao estudo e que tornaram tal conclusão questionável. Por exemplo, dois terços do grupo de cuidados comunitários de rotina estavam também a tomar a mesma medicação que o segmento de medicação do estudo, mas tiveram os resultados mais pobres. Além disso, o segmento de tratamento comportamental consistiu em um tratamento intensivo de 6 semanas que foi concluído em qualquer momento durante os 14 meses, de modo que na altura da avaliação de 14 meses, algumas das famílias que receberam a intervenção da terapia comportamental tinham-no concluído até 9 meses antes das avaliações de 14 meses, enquanto o segmento de medicação incluía consultas regulares até 14 meses.
Isto levanta a possibilidade distinta de uma resposta placebo ser a principal razão para os melhores resultados na medicação e nas formas de tratamento combinado. Nessa época, as declarações de conflito de interesses não eram obrigatórias na maioria dos periódicos. Previsivelmente, quando estas foram divulgadas, muitos dos autores principais tinham longas listas de ligações com as empresas farmacêuticas.
O estudo MTA de 14 meses tornou-se rapidamente o estudo mais citado para tratamentos de TDAH, regularmente referido nas diretrizes de tratamento de muitos países. Com base no que ainda é citado como a melhor prova disponível, ter-se-ia pensado que o estudo MTA terminou aí e não havia mais nada a dizer. Mas mesmo que se aceite os resultados ao valor declarado, 14 meses não equivale aos muitos anos que a maioria dos medicamentos acabam por ser prescritos. Portanto, o estudo MTA ainda não conseguiu abordar a questão do que acontece aos estimulantes prescritos a longo prazo. Ou poderia?
De fato, a história do estudo da MTA não termina aí. Numa conferência em Phoenix a que assisti em 2002, acabei por acaso sentado ao lado de alguém que descobri ser um psicólogo envolvido nas avaliações do ensaio da MTA e um dos centros. Ele disse-me que a sua equipe lá tinha acabado de concluir a análise dos dados para o triênio seguinte.
Lembro-me de ele me dizer “Uma vez publicadas estas descobertas, ninguém mais vai querer que o seu filho tome medicamentos“. Fiquei surpreendido com a clareza e certeza da sua conclusão. Explicou que no seu centro, as crianças que ficaram medicadas tinham piorado constantemente e tinham muitos efeitos adversos, enquanto as que tinham ficado sem medicação estavam agora muito melhor. Disse-me que os seus resultados eram semelhantes aos dos outros centros e que não demoraria muito até que fossem publicados.
Tive de esperar mais 5 anos antes que o follow-up de 3 anos do MTA fosse publicado em 2007. Ao contrário do estudo original de 1999, esta publicação, publicada 8 anos mais tarde (dando tempo suficiente para que a prescrição de estimulantes defendida pelo jornal de 1999 se tornasse a norma), teve pouca cobertura de imprensa ou profissional. Após 14 meses, os participantes no estudo tinham sido livres para escolher os seus tratamentos em curso. Com efeito, o estudo converteu-se num estudo naturalista, semelhante ao que acontece em ambientes de ambulatório em geral.
Os resultados de 3 anos não conseguiram encontrar apoio para uma superioridade contínua dos medicamentos, independentemente da gravidade inicial dos sintomas de TDAH. Além disso, aqueles que utilizaram mais medicação durante os 3 anos tinham maior probabilidade de sofrer uma deterioração dos sintomas de TDAH, tinham taxas de delinquência mais elevadas, e eram significativamente mais curtos (em média 4 cm) e mais leves (em 3 kg) do que aqueles que não tinham tomado medicação.
Por 3 anos, aqueles que continuaram a tomar estimulantes estavam a fazer pior e a experimentar mais efeitos negativos do que aqueles que não o fizeram. Confirmou o meu palpite anterior de que o placebo tinha desempenhado um papel importante nos resultados dos 14 meses. O que o psicólogo me disse 5 anos antes estava certo. Quem, no seu juízo perfeito, iria querer continuar a dar quaisquer estimulantes infantis?
Mas isto (o fim da prescrição de estimulantes às crianças) não foi o que aconteceu. A ciência não pode vencer o marketing numa economia orientada para o mercado livre. As prescrições de estimulantes quase não piscaram após a publicação deste estudo de follow-up. O MTA de 14 meses continuou a ser referido e o follow-up de 3 anos foi ignorado. O estudo de follow-up de 3 anos do MTA tem conclusões semelhantes a outros estudos de follow-up a longo prazo.
Outros estudos também não mostram que o uso a longo prazo de estimulantes está associado a quaisquer resultados melhorados em comparação com os diagnosticados com TDAH que não os tomam, e onde há diferenças é frequentemente com crianças que tomam estimulantes com resultados piores do que as que não os tomam: com problemas físicos (como a hipertensão arterial), psiquiátricos (como “perturbações” do humor), e problemas acadêmicos mais comuns nos que tomam medicamentos a longo prazo.
Se estes medicamentos tivessem poucas provas de danos associados à sua utilização, talvez pudéssemos tolerar a pequena melhoria inicial que por vezes está associada à sua prescrição, mesmo que não haja provas de resultados melhorados a longo prazo. No entanto, os estimulantes que estão a ser receitados são anfetaminas ou substâncias semelhantes a anfetaminas com propriedades farmacológicas quase idênticas às drogas de rua, tais como “speed” e cocaína, que avisamos regularmente os outros dos perigos associados à sua utilização.
Se estes medicamentos só fossem prescritos a doentes durante um ano ou menos, poderia ser possível reunir argumentos baseados em provas para a sua utilização desta forma limitada e controlada. Infelizmente, uma vez iniciada, é provável que uma prescrição continue a ser prescrita durante anos. Como existem danos consideráveis associados ao uso de substâncias tão poderosas e viciantes, é realmente necessária água azul clara nos resultados entre aqueles que recebem tais medicamentos e aqueles que não os recebem. Não consigo pensar num argumento ético racional (provavelmente porque não existe nenhum) para justificar a prescrição a longo prazo de estimulantes.
Se você procurar informação sobre os problemas associados aos estimulantes quando estes estão a sendo categorizados como drogas de abuso, você obterá algo como isto:
“Todos os estimulantes têm em comum um conjunto de efeitos secundários que podem causar estragos no sistema de um utilizador. Os efeitos incluem aumento do ritmo cardíaco, aumento da pressão arterial, aumento da temperatura corporal, tremores ou espasmos musculares, agitação. Todos estes efeitos são comuns. Não importa como se reduz, o abuso estimulante, mesmo a curto prazo, pode ter consequências desastrosas para o usuário, resultando em hipertermia, anomalias cardiovasculares e morte súbita.
Contudo, quando uma pessoa abusa dos estimulantes durante um longo período de tempo, estes agravam os seus riscos de sofrer uma série de outros problemas devastadores de saúde física e mental, tais como alucinações, delírios, ansiedade persistente, paranóia, depressão, perda de peso, redução da função sexual, problemas gastrointestinais, deterioração muscular, danos cardiovasculares, problemas respiratórios, dores de cabeça, derrames e convulsões.
Um usuário de estimulantes crônicos está também em alto risco de desenvolver tolerância à dependência e, eventualmente, dependência química. Além disso, os indivíduos dependentes podem experimentar uma síndrome de abstinência de estimulantes quando o uso da droga para ou abranda. A abstinência do abuso de estimulantes não é um processo que ponha em risco a vida, mas pode ser desconfortável. Há aspectos físicos e psicológicos da abstinência de estimulantes que podem ser difíceis de enfrentar. Os sintomas comuns da abstinência dos estimulantes incluem exaustão mental e física, insônia, anedonia (incapacidade de sentir prazer), irritabilidade, ansiedade e agitação, sono excessivo, fome intensa. Um dos maiores riscos com a abstinência de estimulantes é a depressão com pensamentos suicidas, e a gravidade pode variar de acordo com a substância. Por vezes, esta depressão pode durar para além da fase aguda de abstinência”.
Não há razão para acreditar que as advertências acima não sejam tão relevantes para a prescrição legal de estimulantes como o são para o abuso ilegal das mesmas.
Os perigos dos estimulantes prescritos vão além dos acima descritos, uma vez que os pacientes podem continuar a tomá-los durante décadas com todas as consequências potenciais que isso tem para a confusão das substâncias químicas no cérebro. Por exemplo, num estudo que se seguiu, durante várias décadas, a pacientes a quem foram prescritos estimulantes, os investigadores descobriram um aumento de mais de 8 vezes na probabilidade de tais pacientes desenvolverem condições neurológicas, tais como a doença de Parkinson.
Parkinson é uma doença que resulta do fato de os pacientes não terem o neurotransmissor dopamina suficiente no sistema nervoso. É altamente provável que esta descoberta esteja relacionada com a ingestão de estimulantes a longo prazo, dado que os estimulantes funcionam principalmente estimulando as células a libertarem mais do que a quantidade habitual de dopamina.
O TDAH não é um diagnóstico e não pode ser apoiado como uma construção baseada em evidências
Independentemente do que se possa pensar serem os méritos percebidos da construção do TDAH como um “diagnóstico” que tem origem biológica e pode ser “tratado” com medicação, a verdade científica é que não pode ser pensada como uma entidade científica válida e a recomendação vigente para o seu tratamento que normalmente dá prioridade à medicação sem limites de tempo não é baseada em evidências.
O TDAH é um exemplo da forma como a psiquiatria acadêmica se infectou com o cientificismo, o que provavelmente levou a danos incalculáveis. Imaginar que o TDAH é um diagnóstico cega as crianças, pais, professores, médicos e outros profissionais para uma grande variedade de fatores relacionados com o contexto, incluindo imaturidade, dificuldades de aprendizagem, problemas escolares, bullying, exposição à violência, dieta, estilo de vida, falta de apoio familiar, falta de confiança nos pais, etc., que podem ser relevantes.
Também os cega à normalidade da infância e à capacidade das crianças de irritar os adultos. O TDAH é mais um comentário sobre a intolerância cultural que temos para com as diversidades das formas de crescimento das crianças, e a pressão que exercemos sobre elas e sobre os seus pais para que desempenhem os padrões de idade estreitos que estabelecemos.
Como psiquiatra infantil em exercício, vivi os anos de TDAH, emergindo de uma condição rara de interesse limitado e geralmente construída em termos sistêmicos, para que proliferasse para a condição infantil mais comum e construída em termos em grande parte biológicos. Atingiu a saturação há cerca de 5 anos quando a nova criança do bloco estava a ganhar uma dinâmica incessante-autismo, o tema do meu próximo capítulo.
[trad. e edição Fernando Freitas]