DIÁLOGO ABERTO: REDUÇÃO DA MEDICAÇÃO E SUPORTE CIENTÍFICO

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Jaakko Seikkula, apresenta com detalhes a abordagem finlandesa da esquizofrenia e das psicoses em geral com os melhores resultados em todas as sociedades do mundo ocidental. Trata-se do Open Dialogue (Diálogo-Aberto).

O Mad in Brasil, dá sequência às postagens com o resumo das palestras apresentadas no Simpósio Científico: Drogas Psiquiátricas – riscos e alternativas -, que ocorreu na cidade de Gotemburgo, na Suécia, em 15 de outubro de 2016, .

Jaakko inicia a sua apresentação chamando a nossa atenção para o fato que ele está naquele momento se apresentando enquanto um cientista. Ele nos lembra que sem rigor científico seria impossível o que foi desenvolvido até hoje com a abordagem do Diálogo-Aberto (Open Dialogue).  Daí a importância de se fazer Ciência.

Sabemos que a maioria da pesquisa que hoje em dia é feita no campo da psiquiatria está baseada em falhas que comprometem significativamente seus resultados. Isso porque uma parte considerável dos princípios básicos da ciência utilizados pela Psiquiatria estão baseados em uma lógica de laboratório, portanto separada da vida real das pessoas. São os critérios considerados como ‘padrão ouro’: que a pesquisa seja ‘randomizada’ (os sujeitos selecionados de forma aleatória) e em ‘duplo cego’ (onde nem o examinado e nem o examinador sabem qual é a variável que está sendo utilizada em um dado momento).  É esse o modelo que é defendido, patrocinado financeiramente, e propagandeado pela Indústria Farmacêutica.

A proposta de Jaakko é que se desenvolva uma metodologia que dê conta da experiência da clínica no cotidiano das pessoas, como é o caso do Diálogo-Aberto. Trata-se do que ele chama de ‘pesquisa naturalística’. E propõe que essa metodologia seja comparada com o modelo de pesquisa hoje dominante e que costuma ser generalizável para todas as realidades investigadas.

É muito frequente se ouvir que a pesquisa que é feita de orientação ‘naturalística’ não é Ciência, na medida em que não segue os padrões científicos dominantes. E em que consiste a metodologia naturalística?  Em termos gerais:

Desenho Naturalístico:

  • Volta o olhar para o que ocorre no mundo real.
  • Não é um desenho de pesquisa de laboratório.
  • A ênfase é na validade externa.
  • O desenho é de acordo com o contexto específico e o método específico
  • O emprego de ‘métodos mistos’ – dados tanto quantitativos quanto qualitativos no mesmo projeto.

Aspectos:

  • Uso de terapias interacionais.
  • Passo 1: Fazer um acompanhamento sistemático dos resultados.
  • Passo 2: Escolha de casos para comparações.
  • Fase 3: Estudos de caso com resultados pobres e bons.
  • Passo 4: Integrar os resultados dos casos para dados estatísticos.

Em seguida, Jaakko apresenta a evolução da abordagem do Diálogo-Aberto. A abordagem tem sido desenvolvida e construída a partir da experiência no mundo real das pessoas e das suas interações interpessoais. E graças à sistemática avaliação dos resultados é que a clínica passa a ser inseparável do processo de pesquisa.  Nas próprias palavras de Jaakko:

“Não haveria o Diálogo-Aberto sem a pesquisa, porque sem pesquisa não se pode sobreviver! “.

Vejamos esses quadros que sintetizam o processo desenvolvido nessa região da Finlândia há umas três décadas.

Estudos do Diálogo Aberto em Western Lapland:

  • 1988-1991: As fronteiras entre o Hospital e a família.
  • Diferença entre pacientes que estão na primeira hospitalização, quando é recorrente a hospitalização, e os pacientes em tratamento a longo-prazo.
  • A equipe abre-se para um interesse social mais amplo.
  • Primeiras ideias sobre a importância do ‘diálogo’.

Estudos sobre Psicose:

  • 1992-1993 (Projeto Tratamento Integrado da Psicose Aguda)

(1) estudar o papel da droga psiquiátrica, no começo do tratamento e não no final.

(2) começa-se a constatar que de fato muito poucas pessoas necessitam da medicação.

  • 1994-1997 (Pesquisar o papel do Diálogo Aberto na fase aguda)

(1) Mudanças do sistema do hospital para intervenções móveis, de preferência na residência.

(2) O diálogo como foco, explorando seus recursos.

  • 2003-2005: Quais são os principais aspectos?

(1) Diferenciar o Diálogo Aberto das abordagens convencionais.

(2) Não há necessidade de hospitalização, quando se reúne com as famílias e o diálogo é de fato aberto, as soluções são construídas em conjunto, sem hierarquia.

Estudos de follow-up são realizados sistematicamente. O primeiro, de dois anos; em seguida, de 5 anos, e depois um outro de 10 anos.  Os resultados são abordados quantitativa e qualitativamente.

Princípios fundamentais para a organização do Diálogo Aberto nas Redes Sociais:

  • Ajuda imediata
  • Perspectiva de rede social
  • Flexibilidade e Mobilidade
  • Responsabilidade
  • Continuidade Psicológica
  • Tolerância da incerteza
  • Dialogismo

Os resultados dos estudos de follow-up estão disponíveis ao final do texto.

A observar que o estudo naturalístico não é ‘randomizado’ e nem com o ‘duplo-cego’. O estudo é feito na vida real. As entrevistas de follow-up são fóruns de aprendizado mútuo: pacientes-família-redes sociais/equipe de saúde mental.

Metas:

  • Meta 1: Garantir o tratamento fora do hospital, no lar das pessoas de preferência.
  • Meta 2: Aumentar o conhecimento do lugar da medicação. Não começar com medicação neuroléptica no começo do tratamento, mas focalizar em um tratamento psicossocial ativo.
  • Explorar as forças terapêuticas inerentes ao diálogo

Os resultados com o Diálogo-Aberto são surpreendentes, de longe os melhores resultados obtidos em todo o mundo ocidental.

Conclusões:

  • O Diálogo Aberto se desenvolveu em um processo inseparável da pesquisa.
  • A pesquisa naturalística fornece informação avaliável a respeito da prática – levando em conta os problemas, os dilemas.
  • A validade externa (o acompanhamento dos casos) é mais elevada do que os ensaios clínicos empíricos.
  • O grupo não medicado desde o começo tem resultados muito superiores, em médio e longo prazos.
  • Há o uso seletivo da medicação (o uso de ansiolíticos, no começo do tratamento, quando é considerado necessário por todos envolvidos, quando indispensável após as duas primeiras semanas antipsicóticos), e isso é acompanhado avaliado sistematicamente.
  • Há a replicação de todo o processo, dez anos depois.
  • A ênfase é nas descrições, e não em explicações
  • É um processo continuado.

Atualmente está sendo realizado um estudo de follow-up de 25 anos.

Bibliografia dos estudos de follow-up.

  • Seikkula, J., Aaltonen, J., Alakare, B., Haarakangas, K., Keranen, J., & Lehtinen, K. (2006). Five year experience of first episode nonaffective psychosis in open-dialogue approach: Treatment principles, follow-up outcomes, and two case studies. Psychotherapy Research, 16(02), 214–228.CrossRefGoogle Scholar
  • Seikkula, J., Aaltonen, J., Rasinkangas, A., Alakare, B., Holma, J., & Lehtinen, K. (2003a). Open dialogue approach: Treatment principles and preliminary results of a Two-year follow-up on first episode schizophrenia. Ethical and Human Sciences and Services, 5, 163–182.Google Scholar
  • Seikkula, J., Alakare, B., & Aaltonen, J. (2001a). Open dialogue in psychosis I: An introduction and case illustration. Journal of Constructivisit Psychology, 14, 247–265.CrossRefGoogle Scholar
  • Seikkula, J., Alakare, B., & Aaltonen, J. (2001b). Open dialogue in psychosis II: A comparison of good and poor outcome cases. Journal of Constructivisit Psychology, 14, 267–284.CrossRefGoogle Scholar
  • Seikkula, J., Alakare, B., Aaltonen, J., Holma, J., Rasinkangas, A., & Lehtinen, V. (2003b). Open dialogue approach: Treatment priciples and preliminary results of a two-year follow-up on first episode psychosis. Ethical and Human Sciences and Services, 5(3), 163–182.Google Scholar

A experiência clínica da abordagem do Diálogo-Aberto (Open Dialogue)

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Dra. Birgitta Alakare, diretora médica do Programa Diálogo-Aberto (Open Dialogue), em Western Lapland, na Finlândia, apresenta como é possível tratar da esquizofrenia e das psicoses em geral, sem antipsicóticos, particularmente nos primeiros episódios agudos. A experiência finlandesa é a que de longe obtém os melhores resultados em todo o mundo ocidental.

O Mad in Brasil, dando sequência às postagens com o resumo das palestras apresentadas no Simpósio Científico: Drogas Psiquiátricas – riscos e alternativas -, que ocorreu na cidade de Gotemburgo, na Suécia, em 15 de outubro de 2016, apresenta agora a intervenção de Birgitta Alakare.

Há 30 anos Birgitta é a coordenadora médica do Programa do Diálogo-Aberto (Open-Dialogue).

No começo, no Hospital de Laplande, ela lembra, a sua população era de esquizofrênicos crônicos, a maioria de pacientes fortemente medicados. Os antipsicóticos eram muito usados, que era o protocolo para os psiquiatras fazerem; no mínimo, dois diferentes a cada vez. Evidentemente que eram muitos os efeitos colaterais, e para que fossem atenuados os sintomas, cada vez mais medicamentos se faziam necessários.

A questão do diagnóstico? Ela reconhece que após 30 anos de experiência enquanto médica ainda não sabe o que é um diagnóstico ‘correto’ – quando ela se encontra com um paciente. E mesmo quando sabe qual é o diagnóstico, como estar segura de que tratamento e qual é a medicação mais adequada?

E quando se encontra com os pacientes, ela diz não poder deixar de admitir que os diagnósticos mudam todo o tempo. Isto porque os diagnósticos mudam quando se está em relações com os pacientes.  O que significa que são as relações que constroem o chamado ‘diagnóstico psiquiátrico’.

Como ocorre na psiquiatria tradicional?

Nela, o psiquiatra é um tipo de autoridade, ele é uma autoridade médica. Por conseguinte, ninguém questiona as suas recomendações ou as suas prescrições.

A medicação e a sua necessidade não são objeto de discussão com os outros. Tal quadro ilustra bem isso:

Medicação Psiquiátrica:

O paciente, a família e os outros profissionais:

  • Espera-se por um milagre
  • Há os medos
  • O tratamento pode se tornar apenas ajustar a medicação.

A família, o paciente e outras pessoas próximas ao paciente, incluindo os outros membros da equipe e profissionais, todos confiam no médico. Mas eles também têm muitos tipos de medos, e também uma certa esperança por um milagre que a medicação possa ajudar: a medicação a fazer milagres.

Os psiquiatras prescrevem a medicação de acordo com o seu próprio treinamento, essa é a regra geral.

Consequentemente, os medicamentos não são integrados ao processo de tratamento como um todo.

Mas na prática, os medicamentos são apenas uma parte – diferente e separada do tratamento.

E quando se prescreve medicamento no início, o que ocorre é que a medicação passa a se tornar o aspecto mais importante durante todo o processo de tratamento.

O foco passa a ser:

Como a medicação afeta? A dosagem é suficiente? Deve-se aumentar ou diminuir a dosagem?

Todas as pessoas ficam a olhar para ver se os sintomas desapareceram.

Assim sendo, a medicação pode ser a única discussão.

Isso é inevitável: quando a medicação é prescrita no começo do tratamento

E o que está ocorrendo na vida real? Muito pouco se sabe, não é mesmo? – ela nos indaga.

Na experiência na Finlândia, eles começaram a reforma do seu sistema de assistência com as assim chamadas ‘reuniões de tratamento’; isso foi em 1984.  E um detalhe que irá fazer a diferença: a medicação fazia parte do discutido nessas reuniões.

Com o que aprenderam com o processo: há um avanço, ao se evitar o uso de medicação com antipsicóticos durante as duas primeiras semanas do processo agudo psicótico.  Resumindo o que passa a ser experimentado entre 1992-1993:

No Projeto de 1992-1993:

  • Evitar a hospitalização
  • Evitar o uso de medicação neuroléptica no início (durante as 2 semanas)

O surpreendente para todos os membros da equipe é que a demanda por neurolépticos não foi tão grande quanto era o esperado, graças à maneira como começaram a trabalhar.

O projeto foi um estudo de nível nacional (Finlândia), mas eles continuaram a fazê-lo em Western Lapland até 1997.

Birgitte apresenta vários estudos de follow-up. Esses estudos serão apresentados por Mad in Brasil em uma postagem onde iremos apresentar com mais detalhes em que consiste a abordagem do Diálogo Aberto.

Birgitte reconhece que durante muito tempo prescreveu antipsicóticos e a hospitalização.  Mas essa experiência era muito frustrante para ela enquanto médica assim como para a equipe.

Ela fala das recaídas.

O que é dito pela indústria farmacêutica? Que o indivíduo não pode interromper o tratamento medicamentoso, senão terá recaídas.

E o que é uma recaída?  É uma nova crise, ela sublinha. Evidentemente que todo mundo pode ter uma nova crise em suas vidas. Se alguém foi deprimido num momento do passado e depois tem uma nova depressão, então ele/ela está em crise.

Birgitte apresenta os principais elementos da abordagem do Diálogo Aberto. A saber:

Princípios do Diálogo Aberto:

  • Ajuda imediata (há algo decisivo nas vidas das pessoas a espera de ajuda)
  • Rede Social (explorando os recursos disponíveis, os seus saberes dos atores)
  • Flexibilidade e mobilidade (ver os pacientes em suas residências e em seu meio social)
  • Responsabilidade (o mesmo médico acompanha todo o processo de tratamento, quando há vários há muitas medicações prescritas inevitavelmente)
  • Continuidade psicológica (a equipe acompanha todo o processo)
  • Tolerância à incerteza (as dúvidas, o reconhecimento que há uma construção coletiva, que não se tem de antemão as soluções)
  • Diálogo (tudo é discutido juntos, inclusive a própria medicação).

Com esses princípios, na prática clínica a necessidade por medicamentos diminui muito significativamente. Quando a medicação é prescrita, é importante discuti-la, e ainda avaliá-la e garantir meios para interrompe-la. E todos discutem a medicação.

Quando necessária, em geral a medicação é um ansiolítico, e no começo do tratamento. E sempre que qualquer medicação psiquiátrica é usada, sempre em baixas doses – e por um período curto. Nenhum psiquiatra está autorizado a se encontrar sozinho com o paciente. O psiquiatra faz parte, é membro da equipe específica para o caso, o que torna mais fácil enfrentar o problema da medicação.

Como abandonar a medicação?

Abandonar a medicação:

  • As medicações psiquiátricas afetam muitos receptores no cérebro.
  • O cérebro é sábio e flexível: adaptação.
  • Um grande aumento nos receptores com relação ao que havia antes da medicação.
  • Interrupção de antipsicóticos = ‘tempestade no cérebro’. Alucinações, entre outras, como uma das consequências da interrupção. Mas isso não é recaída.
  • Diminuir lentamente a medicação para que assim o cérebro possa se adaptar.
  • Esse processo pode chegar mesmo de dois a quatro anos.

Birgitta Alakare tem publicados vários artigos em periódicos científicos. Mas recomendamos o que ela escreve nesse livro:

alternatives-beyond-psychiatry

 

O DIAGNÓSTICO PSIQUIÁTRICO E A MEDICAÇÃO PSIQUIÁTRICA: O QUE NÃO COMBINA

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No dia 15 de outubro em Gotemburgo, Suécia, ocorreu um Simpósio internacional que abordou a pesquisa e as evidências baseadas na prática com relação às alternativas ao tratamento com drogas psiquiátricas.  Um grupo de cientistas internacionalmente conhecidos, clínicos, e também pessoas com as suas próprias experiências de vida, estiveram juntos para discutir essa questão fundamental da saúde mental e apresentar alternativas.

Mad in Brasil inicia a publicação de algumas das apresentações. Um resumo em português de cada palestra estará sendo disponibilizado para o público em geral. E você poderá ver na íntegra o vídeo da apresentação.

A primeira palestra aqui apresentada é a do Dr. Sami Tamimi. Ao final você pode encontar um resumo da biografia e bibliografia do Dr. Sami.

O Dr. Sami abre a sua apresentação enumerando alguns dos dilemas que ele enquanto clínico e educador enfrenta no cotidiano. Embora não tenha soluções, ele mostrou como ele vem enfrentando esses dilemas. São dilemas que provavelmente a maioria de nós enfrenta. Pois como ele diz, lidar com a vida real é confuso, muito difícil, pois implica entre outras coisas saber negociar com as pessoas.

São três os dilemas que ele sublinhou:

  • O primeiro é como lidar com as pessoas a quem foram prescritas drogas psiquiátricas.
  • O segundo dilema é que as pessoas recebem uma enorme propaganda a respeito das medicações psiquiátricas. As pessoas já chegam esperando que o diagnóstico psiquiátrico será útil e que há medicamentos que ajudarão a aliviar seus sofrimentos.
  • Por conseguinte, como trabalhar em equipe? Quando o diagnóstico e a prescrição de medicamentos psiquiátricos são a regra.

O que se transformou em senso-comum:

Que há ‘anti-psicóticos’. Ou que há ‘anti-depressivos’.  Mas não existe isso a que se chama de ‘antipsicóticos’ ou de ‘antidepressivos’.  Isso é algo que o marketing utiliza, a fim de vender a ideia de que existe um tratamento específico para uma específica condição.

Na verdade, essas drogas ‘psicoativas’ são químicas usadas em qualquer pessoa, ‘normal’ ou com um diagnóstico de ‘transtorno mental’.

Um paciente chega com uma queixa: depressão:

Dr. Sami ilustra a problemática com uma situação muito comum na clínica. Uma paciente chega se queixando de um persistente baixo humor. Ela já esteve em terapia cognitivo comportamental (TCC) mas se queixa que essa terapia não lhe tem ajudado. Ela diz que uma amiga sua pensa que ela necessita de um ‘antidepressivo’, na medida em que nada lhe ajudou até agora. Assumamos que se concorde com a prescrição, diz o Dr. Sami, como isso será explicado à paciente?

Pelo modelo médico:

A razão para tal sofrimento (um persistente baixo humor) é que há um desequilíbrio químico.

É dito à paciente: “Você irá tomar esse medicamento prescrito por mim, por um período; irei suspendê-lo e iremos ver se você tem uma recaída”.

Portanto, o que está sendo dito é que está ocorrendo um desequilíbrio na química no cérebro e que a medicação irá corrigir tal desequilíbrio, quer dizer, o tratamento prescrito irá ajudar o paciente.

Na prática o que está ocorrendo?

  • Se a meta do terapeuta é mudar um estado mental (psiquico), logo isso é terapia psíquica (psicoterapia).
  • O quadro de referência empregado (a mensagem e a relação interpessoal criada), usado quando se diagnostica e prescreve, é com frequência muito mais importante do que o suposto efeito químico. Não há nenhuma evidência de ‘desequilíbrio químico’ ali.
  • Ora o modelo biomédico é provavelmente o pior quadro de referência a ser usado quando se prescreve medicamentos. Porque está se empregando um agente externo ao que é ‘psicoterápico’.

Consequentemente, são construídas ideias de que se trata de ‘doenças crônicas’, porque é isso o que de fato ocorre com tais ideias construídas em torno da abordagem biomédica da psiquiatria. E o modelo psicofarmacológico é um desses meios.

Dr. Sami apresenta um quadro com evidências científicas que sinalizam o que ele chama de ‘más notícias’.

O hiato entre o laboratório/clínica

  • Entre 50 -70% das pessoas se recuperam sem serem tratadas, sem intervenções.
  • 75% das pessoas que entram em tratamento não apresentam melhorias (USA).
  • Apenas 15% no UK alcançam recuperação com esse paradigma.
  • Pesquisas na Austrália. Apesar de haver dobrado os recursos em saúde mental, o que resultou foi o aumento de pessoas em tratamento e resultados muito abaixo do esperado. O que ocorreu? Foi o aumento de pessoas tomando medicamentos. E não se recuperando.
  • As pessoas que se recusaram a aceitar a ideia de doença mental têm muito mais chances de se recuperarem do sofrimento.

Embora há sempre o problema de falta de recursos destinados à assistência em saúde mental, Dr. Sami chama a nossa atenção que não esse o problema mais importante que está em jogo, quando o foco se volta para a falta de recuperação dos que são tratados por esse paradigma biomédico da psiquiatria.

O principal problema não é a falta de recursos para a multiplicação desse modelo de assistência.

Dr. Sami apresenta um quadro dramático sobre o que ocorre no mundo com os pacientes em tratamento por longo-prazo.

Pacientes em tratamento por longo-prazo:

  • USA: pessoas que dependem de pensão por ‘doença mental’ – via o Supplemental Security Income (SSI) ou Social Security Disability Insurance (SSDI) – mais do que dobrou: de 1 em 184 americanos em 1987 para 1 em 76 em 2007.
  • UK: A doença mental se tornou a principal razão para a dependência por ‘incapacitação’ em 2011. Cerca de 50% é por diagnóstico de ‘depressão’. Enquanto que outras condições médicas têm melhorado ao longo do tempo.
  • Esse padrão é replicado em todos os países ocidentais que têm aumentado o seu financiamento para os serviços de saúde mental.

Como bem pode ser observado, o aumento do financiamento para o tratamento de problemas ‘psiquiátricos’ não é acompanhado pela melhoria das condições (‘transtornos mentais’), como ocorre com as enfermidades em geral.

O que se observa é que quanto mais pessoas entram no sistema de assistência psiquiátrica mais pessoas ficam doentes; sendo que uma parcela significativa para o resto de suas vidas.

Dr. Sami faz uma análise da visão dominante que está sustentando essa epidemia: a proliferação de serviços psiquiátricos sendo acompanhada pela epidemia de doenças mentais.  Trata-se do que ele chama de ‘tecnologia psiquiátrica’.

A visão de uma tecnologia psiquiátrica:

– Um sistema de classificação válido.

– Trilhas causais biológicas e psicológicas.

– Tratamento tecnológicos que possam ser aplicados independentemente do contexto.

O que está implicado nesse modelo tecnológico:

O modelo tecnológico:

– Privilegia a técnica, em detrimento da relação.

– Privilegia o diagnóstico, em detrimento das expectativas.

– Privilegia o processo, em detrimento dos resultados.

– Privilegia os manuais, em detrimento do contexto social.

Dr. Sami desconstrói os componentes dessa visão ‘tecnológica’.  Primeiramente, sublinhando que na verdade não há ‘diagnóstico psiquiátrico’. Na teoria médica, diagnóstico é explicação para certos sintomas; é o que se aprende desde os primeiros dias da formação acadêmica em medicina.  E o que ocorre com a medicina mental (quer dizer, com a psiquiatria) é que não há ‘diagnósticos’ propriamente ditos.

Em Psiquiatria não há diagnósticos:

  • Os diagnósticos em psiquiatria não podem ser explicados (exceto demências).
  • Considere-se a questão ‘O que é TDAH’ e compare-se com a questão ‘O que é diabetes’?
  • Considere o que ocorre quando nós argumentamos que ‘TDAH causa hiperatividade e falta de atenção’!
  • Em psiquiatria nós temos classificação e não diagnóstico.
  • Ecossistemas usam múltiplas classificações – o que é o mais apropriado para sistemas com contexto rico e dinamicamente abertos.

Dr. Sami apresenta resultados de pesquisa da qual ele é um dos colaboradores. Trata-se do Projeto Colaborativo de Pesquisa sobre Depressão.

Foram comparadas quatro abordagens de tratamento (Terapia Cognitivo-Comportamental, Terapia Interpessoal, Antidepressivos, Placebo) aplicadas em diversos locais de assistência. As expectativas de tratamento e a aliança criadas entre paciente e profissional de saúde mental, nas duas primeiras sessões, são os melhores preditores dos resultados ao longo de cada um dos tratamentos. As psicoterapias (Terapia Cognitivo-Comportamental e Terapia Interpessoal), sem as condições criadas pelos antidepressivos, em longo prazo foram as práticas que garantiram menor probabilidade de recaída, e mais semanas de mínimos sintomas ou de nenhum sintoma.

Dr. Sami chama a atenção para algo que é muito comum escapar da clínica. Ele diz: “Se você encaixa a sua abordagem em um modelo específico tem menos chances de ter bons resultados”.  A própria importância do efeito placebo ainda é pouca conhecida e desenvolvida.

Achados centrais da pesquisa sobre resultados: Contexto e relações

Contexto e Relações:

  • A pesquisa mostra que a psicoterapia é efetiva para problemas de saúde mental, principalmente como um ‘catalisador’.
  • Modelo ou técnica tem um mínimo impacto nos resultados.
  • Fatores extra-terapêuticos tais como circunstâncias sociais e motivação têm o maior impacto nos resultados.
  • E a qualidade da aliança terapêutica é de suma importância.
  • Outras ideias, tais como um sistemático monitoramento de resultados, a abertura dialógica, o pensamento sistêmico, a ‘aativação dos recursos’, todas são ideias promissoras.

Daí a ênfase a ser dada deve ser na ‘relação’ em ‘contexto’, e não na técnica.  Trabalhando-se com as ‘motivações’ e as ‘expectativas’, e criando janelas de oportunidades.

Voltando à problemática da medicação.  Quando necessária, as prescrições devem ser apenas por um tempo limitado.

Alguns dos livros escritos pelo Dr. Sami Timimi, entre outros:

Re-thinking Autism: Diagnosis, Identity and Equality

A straight talking introduction to children’s mental health problems

Livros em co-autoria, entre outros:

Dimimi, S., Cohen, C. Liberatory Psychiatry: philosophy, politics and mental health.

Dimimi, S., Maitra, B. Critical voices in child and adolescent mental health

 

 

 

DESPATOLOGIZA

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As sociedades ocidentais vivem processo de patologização de todas as esferas da vida, associado à busca de padronização e homogeneização dos diferentes modos de viver. A diversidade e as diferenças que caracterizam e enriquecem a humanidade são tornadas problemas. Ocultam-se as desigualdades, reapresentadas como doenças. Problemas de diferentes ordens são transformados em doenças, transtornos, distúrbios que escamoteiam as grandes questões políticas, sociais, culturais, afetivas que afligem a vida das pessoas. Questões coletivas são tomadas como individuais; problemas sociais e políticos são tornados biológicos.

Reduzida a vida a seu substrato biológico, está preparado o terreno para a medicalização, ideário em que questões sociais são apresentadas como decorrentes de problemas de origem e solução no campo médico.

Deve ser ressaltado que quando se fala em reducionismo e medicalização, está-se referindo à concepção de medicina enraizada no paradigma positivista.

Ao ser a primeira ciência ligada aos seres humanos a se constituir como ciência moderna, a medicina se constitui, por sua vez, em modelo epistemológico para as ciências do homem. Daí decorre que os processos de medicalização da vida são concretizados por profissionais da medicina, da psicologia, da educação, da fonoaudiologia, de todas as áreas quando pensam e atuam em conformidade com o positivismo… Por este motivo, as expressões medicalização e patologização têm sido amplamente utilizadas como sinônimos.

Por sua vez, os discursos de inclusão, tão comuns nos processos patologizantes, ocultam uma segunda exclusão realizada pelo estigma da doença (ou do transtorno) daqueles já excluídos, social, educacional ou afetivamente. Hoje, esse processo vem, de modo crescente, se articulando à judicialização das relações, dos conflitos e dificuldades que permeiam o viver em sociedade; o passo seguinte, que vem sendo atingido com grande facilidade, consiste na criminalização das diferenças, das utopias e dos questionamentos à ordem estabelecida.

Especificamente em relação à medicalização da vida de crianças e adolescentes, ocorre a articulação com a medicalização da educação na invenção das doenças do não-aprender e das doenças do não-se-comportar. Os campos da saúde afirmam há mais de um século que os graves – e crônicos – problemas do sistema educacional e da vida em sociedade seriam decorrentes de doenças que eles seriam capazes de resolver; criam, assim, a demanda por seus serviços, ampliando a patologização.

O Brasil é um dos países em que a patologização da vida tem sido mais intensa e extensa, despontando em todas as estatísticas como um dos maiores consumidores de substâncias psicoativas legais. Também é um dos países em que a crítica à medicalização tem se fortalecido nos últimos anos, em diferentes campos do conhecimento.

O DESPATOLOGIZA – Movimento pela Despatologização da Vida – filia-se à utopia de outros futuros possíveis, de vidas despatologizadas, reunindo profissionais de diferentes áreas para refletir sobre processos de patologização e medicalização da vida, e propor e realizar enfrentamentos a esses processos.

O DESPATOLOGIZA é composto por vários grupos, em diferentes regiões, que se articulam pelas mesmas concepções de sujeito, de mundo e de ciência, embasados em referenciais epistemológicos e políticos semelhantes; cada grupo se organiza com reuniões periódicas, sempre abertas a todos os interessados.

Uma das ações mais visíveis do DESPATOLOGIZA tem sido a realização de encontros profissionais e acadêmicos, com o propósito de divulgar e aprofundar as discussões sobre o tema, sempre com a participação de profissionais e pesquisadores renomados e reconhecidos, das áreas de Educação, Fonoaudiologia, Medicina, Psicologia, Direito, entre outras. Entre esses eventos, destacamos aqui os “Encontro Despatologiza”.

Além disto, os membros do DESPATOLOGIZA têm participado de inúmeros eventos, organizados por outras entidades e movimentos; sempre que o tema da patologização está em pauta, estamos dispostos a colaborar com as reflexões e avanços nos modos de organização e propostas de ações no campo das políticas públicas.

Toda elaboração teórica e prática resultante do trabalho do grupo deve servir como suporte de qualidade para ações despatologizantes em diversas áreas de conhecimento e regiões do país.

Ao longo desses anos, o DESPATOLOGIZA já promoveu inúmeros debates, sempre buscando construí-los frutíferos, contando com contribuições riquíssimas de pesquisadores e profissionais reconhecidos em suas áreas de atuação. Os eventos  buscam sensibilizar profissionais e usuários e a sociedade em geral para temas polêmicos, geralmente naturalizados pela forma de vida que se adota hoje. Assim, temos discutido o conceito de patologização/medicalização e formas de enfrentamento; distúrbios de aprendizagem X fracasso escolar X supostos transtornos; os impactos da medicalização na educação e na saúde; a possibilidade de atuar de forma despatologizada e despatologizante em serviços públicos de diferentes campos; a judicialização da vida; relações do poder legislativo com os processos de patologização da sociedade; processos de subjetivação e a construção de vidas despatologizadas; medicina do marketing e marketing da medicina; medicalização e racismo;  disputas capitalistas e biomedicalização da infância; a  produção de sofrimento psíquico; pseudociência e o terrorismo nutricional; sociedade de desigualdades e seus produtos; preconceitos de todas as formas – as relações raciais, étnicas, de gênero, … Os temas elencados  para cada encontro têm sido selecionados em consonância com as discussões mais pertinentes daquele momento. Um tema recorrente tem sido as crianças e adolescentes encaminhadas aos equipamentos de saúde com a queixa de dificuldades de aprendizagem, transtornos e distúrbios, que nós, do DESPATOLOGIZA preferimos chamar de “crianças que não aprendem na escola”.

Um princípio fundante do DESPATOLOGIZA é a compreensão de que não se deve – nem se pode – criar amarras burocratizantes que dificultem ainda mais o trabalho em um terreno já tão minado e cheio de armadilhas, posto que situado contra hegemonias e interesses financeiros. Assim, entendemos que o grupo que constitui o DESPATOLOGIZA em cada região é quem pode saber das possibilidades e limites de suas ações a cada momento, pela avaliação de condições concretas, internas e externas ao grupo. Cada grupo constrói seu próprio caminho caminhando, não há metas pré fixadas, não há obrigatoriedade outra que o compromisso contra os processos que, pela naturalização, patologização, judicialização, retiram a vida de cena.

Venha também colaborar com a construção de vidas despatologizadas!

Próximo fórum: Políticas Públicas Socialmente Compromissadas, Vidas Despatologizadas. 29 e 30 de novembro. Auditório do Instituto de Economia – IE – UNICAMP.

 

maria-aparecida

Maria Aparecida Affonso Moysés. Médica, Pediatra. Com doutorado em Medicina pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (1979) e Livre-Docência em Pediatria Social na Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp (1998). É professora Titular em Pediatria da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP). É autora do livro A institucionalização invisível: crianças que não aprendem na escola.

AS MUDANÇAS NO CÉREBRO ATRAVÉS DOS ANTIPSICÓTICOS E CONSEQUÊNCIAS TERAPÊUTICAS

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Recentemente, em 15 de outubro de 2016, em Gotemburgo, na Suécia, foi realizado o Simpósio Científico: Drogas Psiquiátricas – riscos e alternativas. Mais de 220 pessoas, de 13 diferentes países, responderam ao convite de Carina Hakansson para ouvir e discutir as descobertas da pesquisa científica, novos conhecimentos e perspectivas com relação aos riscos dos psicofármacos e alternativas ao modelo biológico da psiquiatria. O resultado foi a criação do Instituto Internacional para Interrupção da Droga Psiquiátrica (International Institute for Psychiatric Drug Withdrawal).  Entre seus membros a destacar: Olga Runciman, Sami Timimi, Birgitta Alakare, Robert Whitaker, Will Hall, Carina Håkansson, Jaakko Seikkula, Volkmar Aderhold, John Read, Peter Gøtzsche and Magnus Hald.

O Mad in Brasil irá postar várias das apresentações feitas, destacando partes importantes traduzidas para o português. Iremos disponibilizar o vídeo de cada palestra. Será uma oportunidade para que os nossos leitores tenham acesso ao que certamente há hoje de mais avançado sobre a problemática. Na medida do possível, iremos disponibilizar links para que você leitor interessado possa aprofundar o que cada um dos palestrantes tem produzido.

A primeira palestra que iremos aqui resumir foi dada pelo Dr. Volkmar Aderhold. Ele é do Instituto de Psiquiatria Social, Departamento de Psiquiatria e Psicoterapia, em Ernst-Moritz-Arnd-University, Greifswald, Alemanha.

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A palestra do Dr. Volkmar Aderhold foi ilustrada por uma série de slides. É impossível para nós aqui do Mad in Brasil ter esses slides com as legendas em português. Mas você, caro leitor, ao ver o vídeo da sua apresentação terá acesso a cada slide e a todo o conteúdo da palestra.

Aderhold inicia a sua palestra dizendo haver se dedicado a ler a literatura sobre as drogas psiquiátrica; não se limitando à leitura dos Resumos (Abstracts), mas cada artigo em sua íntegra. E ficou chocado com o que leu. E decidiu confrontar esse sistema de evidências.

Ele diz textualmente:

“É uma história de crimes!”

  1. Os primeiros slides, como você pode acompanhar vendo o vídeo, mostram o cérebro, as sinapses da dopamina, o cérebro ‘normal’, o cérebro ‘psicótico’, os fenômenos no cérebro sob a ação dos antipsicóticos. Sabe-se que há aumento da liberação da dopamina no pré-sináptico, quando há estados psicóticos. Essa é a trilha final patofisiológica, não a causa, ele faz questão de sublinhar. E isso é chamado de ‘sensibilização fásica’, quando as pessoas estão em estados psicóticos. Nós não sabemos o por quê. Em esquizofrenia isso é episódico, em 60 a 70% dos casos.
  2. São apresentados vários slides a respeito dos fatores de risco para a ‘esquizofrenia’ – pesquisados e confirmados amplamente na literatura científica:
  • Complicações biológicas e psicológicas durante a gravidez.
  • O estresse durante a gravidez.
  • Uma gravidez indesejada.
  • Complicações perinatais.
  • Perda precoce de figuras parentais, por morte ou abandono.
  • Ambiente instável no começo da vida.
  • Separação dos pais.
  • Testemunhar violência entre os pais.
  • Uma educação familiar disfuncional (com frequência entre gerações).
  • Trauma sexual e físico.
  • Traumas emocionais e negligência.
  • Privações sociais.
  • Rejeição social e fracasso.
  • Discriminação racial e outras formas de discriminação.
  • Migração.
  • E a pobreza.
  1. Falando de medicamentos. Sabe-se que para que seja antipsicótico, o bloqueio do receptor dopamínico pós-sináptico é necessário e suficiente.
  2. Assim sendo, neurolépticos não são para cura, apenas filtram os problemas.
  1. Efeito dos antipsicóticos:

                                                 Eles apenas silenciam os problemas!

  1. Bloqueamos um sistema e as consequências?
  1. Há um bloqueio de cerca de 60% do D2, é isso o que os antipsicóticos fazem.
  2. E o que se tem como resultado?
  • Distúrbios extrapiramidais.
  • Acatisia acima de 78%.
  • Prejuízos cognitivos acima de 70%.
  • Disforia acima de 70%.
  • Aumento da depressão e mais sintomas negativos acima de 70%.
  • Elevação da prolactina acima de 72%.
  • (E não importa que tipo de antipsicótico, os chamados de primeira ou segunda geração. Efeitos metabólicos colaterais são similares.)
  • Maior mortalidade cerebrovascular.
  • Maior mortalidade cardiovascular.
  • Súbita morte cardíaca.
  • Infarto do miocárdio.
  • Efeitos sexuais colaterais.

9. Os efeitos? O bloqueio dos receptores: um “lindo termo” – como ele diz. Na realidade, a droga atinge o cérebro como um todo. Isto porque o cérebro é neuroplástico, se adapta na medida que ele pode.

10. As mudanças na regulação do cérebro são muito impactantes

11. O que se tem a médio e longo prazo, buscando bloqueadores de dopamina? Uma regulação intensa no estriado. Que cresce acentuadamente a cada ano. E há a supersensibilidade dos receptores de dopamina.

12. É mostrado um quadro onde se vê o aumento na proporção de receptores de dopamina com cada tipo de droga psiquiátrica. Basta ver o que cada droga faz.

13. E aí é criada uma dependência à dose. Se for usada em menores doses, a dependência é menor. Se for usada em maiores doses, maior será a dependência. Porque há uma hiper-regulação e uma sensibilização.

14. Que resultados são alcançados?

  • O aumento da dose necessária.
  • A diminuição da efetividade.
  • Os fenômenos conhecidos como ‘rebote’, com a redução da dose e com a sua interrupção.
  • Com a interrupção abrupta: acima de três vezes mais de taxas de recaída.
  • Há o aumento de sintomas positivos e negativos nas recaídas. Em intervalos cada vez menores entre os episódios. E psicoses super-sensitivas. E tudo isso, mesmo tomando as pílulas!

15. O que fazer?

É aumentar a dosagem?

É algo absurdo.

Então, o que fazer?

16. Alguns estudos de como retirar a dosagem até eliminar definitivamente as drogas antipsicóticas foram por ele apresentados.

Três estudos piloto ao longo de seis meses, como uma referência. Trata-se de pacientes com o diagnóstico de esquizofrenia estabilizado. E como?

  • Ingesta da droga a cada dois dias, durante três meses.
  • Após os três meses, a cada três dias a ingesta da droga;
  • O resultado é que houve menor taxa de hospitalização.
  • Outros estudos: prolongando os intervalos.
  •       Risperidona: entre 2 a 4 semanas.
  •        Flufenazina: entre 2 a 6 semanas.
  • Nas psicoses o que há é uma enorme heterogeneidade. Elas são muito diferentes entre si. E não se sabe o por quê. Antes da introdução dos neurolépticos como era o processo natural de evolução de diferentes tipos de psicose? A situação era bem melhor. Os antipsicóticos apenas pioram a situação.
  • Estudos sobre pacientes em primeiro episódio tratados com neurolépticos: Apenas 14,5% têm uma queda em seus sintomas.
  •  Após 4 semanas, nada de melhoria ocorre.
  • Pessoas que foram tratadas durante 17 anos com  Risperidona: 80% bem abaixo, sem resposta esperada.
  • Trajetórias de resposta ao tratamento e medicamentos antipsicóticos: 18 meses de tratamento na investigação sobre a esquizofrenia de CATIE. Mais uma vez, resultados chocantes. Vejam os resultados na tela. Quem toma as drogas fica pior!
  • A deterioração dos usuários de antipsicóticos ao longo do tempo é visível. Acompanhe a demonstração no vídeo.

Mas vejamos as suas recomendações:

Consequências possíveis:

  • As doses mais baixas possíveis para o controle dos sintomas
  • Extensão da dose por 2 ou 3 dias
  • Redução/ descontinuação guiada
  • Adiamento inicial no primeiro e no segundo episódios, uso seletivo após a terceira e a quarta semanas, porque 40% não necessitará de uso de antipsicóticos em momento algum.

O exemplo da experiência do Diálogo Aberto (Finlândia) é mais uma vez exemplar. Essa experiência será detalhada nas próximas postagens que faremos aqui no Mad in Brasil.

 

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(A seguir, no mesmo vídeo que você está acompanhando, em 10 minutos o Dr. Peter Gotzsche faz uma breve intervenção. Relembrando que Gotzsche é co-fundador do Cochrane (http://nordic.cochrane.org) , um dos mais renomados órgãos internacionais para pesquisar os resultados das evidências em Medicina.)

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As drogas psiquiátricas estão baseadas em uma má Ciência, de imediato é o que Peter afirma.

“Eu duvido que os antipsicóticos tenham um efeito de fato nas psicoses. Essas drogas deveriam ser chamadas de ‘psicóticas’ e não de ‘antipsicóticos’ “.

As pesquisas são feitas com muitos equívocos. A principal é que elas não são adequadamente ‘cegas’ (blinded). As drogas têm visivelmente efeitos colaterais, logo os médicos e os pacientes sabem bem disso, reconhecem isso, sabem se estão em antipsicóticos ou placebo. Se exagera os resultados subjetivos, por conseguinte.

Praticamente todas as pesquisas feitas com antipsicóticos têm vícios flagrantes, ele denuncia. Porque são pesquisas feitas com pessoas que estão usando drogas, e que são comparadas com um grupo ‘placebo’, p. ex. E se diz que tal droga é melhor do que o placebo. Isso não é uma boa Ciência, afirma Peter.

E ele continua: uma parcela significativa dos que fazem parte de grupos placebo morrem.  Morrem, porque estavam dependentes de algum antipsicótico. São pesquisas que nunca são relatadas quando se lança algum novo produto.  A maioria das mortes deve ser por suicídio, porque os sintomas de abstinência dessas drogas são terríveis, sabemos disso.

Além desses vieses, quando o que é enviado para aprovação pela FDA de algum novo antipsicótico, como a Risperidona e assim por diante, o que ocorre é que apenas 5% a 6% é superior ao placebo, e a menor diferença que pode ser notada é 15%. Então a média dos efeitos positivos é menor do que se pode perceber. Então a FDA aprova drogas que não funcionam.

Portanto, os efeitos dos antipsicóticos são menores do que é o relevante. E se sabe que a indústria farmacêutica manipula as suas pesquisas, seus resultados. O que foi feito com a aprovação do Prozac é um escândalo para a boa Ciência. Na verdade, segundo Peter, essas drogas não poderiam nunca chegar ao mercado. E são drogas campeãs de venda.

Peter diz que a pesquisa mostrada por Jaakko (Diálogo Aberto) é muito mais Ciência do que aquilo que costuma ser feita com o método randomizado. Em breve o Mad in Brasil irá mostrar os detalhes do método científico reivindicado por Jaakko.

Peter diz que as drogas mais tóxicas que ele já viu como médico e cientista são aquelas usadas para a terapia do câncer, que é a quimioterapia. Porém, tais drogas não destroem o cérebro humano. E o cérebro humano é o que há de mais sagrado!

E ele conclui:

“Não se deveria usar antipsicóticos em absoluto! “                                   

Quando ele, Peter, pergunta a pacientes, quando tiverem um novo episódio psicótico, vocês preferem um benzodizipínico ou um antidepressivo. Todos dizem, prefiro um benzo.

E as pesquisas do Cochrane mostram que os benzodiazepínicos são mais sedativos do que os antipsicóticos.

Na sua opinião, o tratamento forçado, quer dizer, o uso forçado de drogas psiquiátricas, deveria ser abolido por todas as nações. E se o paciente necessita de algo para se acalmar, que se tome um benzodiazipínico por alguns dias. E os efeitos desaparecem em alguns dias, na grande maioria dos casos.

    

“Indústria farmacêutica age como o crime organizado”, afirma Peter Gotzsche na Folha de São Paulo

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Em uma matéria publicada na edição de hoje de Folha de São Paulo, é reafirmado por Peter Gotzsche o que temos postado aqui em Mad in Brasil:

  “Não sei de outra especialidade médica onde haja tanto excesso de diagnóstico e de    tratamento ou onde os danos dos medicamentos sejam tão debilitantes e persistentes em relação aos benefícios.” (Peter Gotzsche).

Leia a matéria na íntegra

ANTIDEPRESSIVOS AUMENTAM O RISCO DE SUICÍDIO E VIOLÊNCIA EM TODAS AS IDADES

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Young man at the end of the road

ANTIDEPRESSIVOS AUMENTAM O RISCO DE SUICÍDIO E VIOLÊNCIA EM TODAS AS IDADES

Peter Gotzsche, MD.

As agências de medicamentos advertem contra o uso de antidepressivos em crianças e adolescentes, porque eles aumentam o risco de suicídio. É bem mais difícil saber qual é o risco em adultos, já que tem havido um sub-resgistro massivo e inclusive fraude nos informes dos suicídios, tentativas de suicídio e pensamentos suicidas nas pesquisas controladas com placebo (1, 2).   A Administração de Alimentos e Medicamentos dos Estados Unidos (FDA) tem contribuído para a obscuridade, por negligenciar os problemas, escolhendo confiar nas empresas farmacêuticas, mediante a supressão de informações importantes, assim como por outros meios (2).

Em uma meta-análise das pesquisas controladas com placebo de 2006, a FDA informou apenas cinco suicídios em 52.960 pacientes tratados com antidepressivos (um por cada 10.000 pacientes) (3), quando haviam muito mais suicídios nestas pesquisas. Cinco anos antes, em 2001, Thomas Laughren, que era o responsável pela meta-análise da FDA, publicou um documento a partir dos dados da FDA, no qual ele informou 22 suicídios em 22.062 pacientes escolhidos ao azar de pacientes em antidepressivos, o que é 10 por 10.000, ou seja 10 vezes mais do que havia sido informado em 2006.  No artigo de Laughren de 2001, havia quatro vezes mais o número de suicídios em pacientes com antidepressivos do que em placebo, o que foi estatisticamente significativo (P=0.03, meu cálculo).  Não obstante, Laughren não disse isso a seus leitores, embora tenha escrito: “Obviamente que não há sugestão que haja um excesso de risco de suicídio em pacientes tratados com placebo. “ Não, porém há sem dúvida entre os pacientes tratados com a droga!

Em sua meta-análise, a FDA encontrou que a paroxetina aumenta significativamente as tentativas de suicídio em adultos com transtornos psiquiátricos, probabilidade de 2.76 (intervalo de confiança de 95% 1.16 a 6.60) (3). A GlaxoSmithKline (GSK) também encontrou um aumento das tentativas de suicídio em adultos, e em 2006 a GSK EUA enviou uma carta ‘Estimado Doutor’ que sublinhou que o risco de comportamento suicida aumentou também para cima dos 24 anos de idade (2).

A FDA foi inconsistente. A agência afirmou em 2009 que é apenas nos menores de 24 anos de idade que essas drogas são perigosas (5).  Porém, em 2007, a agência admitiu, pelo menos indiretamente, que os ISRSs (Inibidores Seletivos de Recaptação de Serotonina) podem causar suicídio em todas as idades (6):  “Todos os pacientes  que estão sendo tratados com antidepressivos, para qualquer indicação, devem ser monitorados de forma adequada e observados de perto por piora clínica, tendências suicidas e mudanças repentinas de comportamento, especialmente durante os primeiros meses de um processo de terapia com medicamentos, ou em momentos de mudanças de doses, para mais ou para menos. Os seguintes sintomas têm sido relatados em pacientes adultos e pediátricos que fazem uso de antidepressivos: ansiedade, agitação, ataques de pânico, insônia, irritabilidade, hostilidade, agressividade, impulsividade, acatisia (inquietação psicomotora), hipomania e mania”.  A FDA também observou que, “as famílias e os cuidadores dos pacientes devem ser advertidos para o aparecimento desses sintomas no dia-a-dia, visto que as mudanças podem ser abruptas. “ Parece que a FDA finalmente admitiu que os ISRSs podem causar a loucura em todas as idades e que as drogas são muito perigosas; de outro modo por que seria necessário um acompanhamento diário? Esse acompanhamento diário é, sem dúvida, uma solução falsa. As pessoas não podem ser controladas a cada minuto, e muitos se suicidaram por indução dos ISRSs em poucas horas depois que todo o mundo pensava que eles estavam perfeitamente bem.

Visto que há má conduta científica onipresente na literatura das pesquisas publicadas com relação às tendências suicidas e à agressão de quem está em tratamento com antidepressivos, decidimos buscar em outro lugar. Obtivemos 64.381 páginas de relatos de estudos clínicos da Agência Europeia de Medicamentos, o que resultou ser muito revelador (7).  Em janeiro de 2016, foi mostrado pela primeira vez que os ISRSs em comparação com o placebo aumentam a agressão em crianças e adolescentes, em média 2.79 (IC de 95%: 1,62 a 4,81). Este é um achado importante, levando em conta os numerosos tiroteios nas escolas, onde os assassinos estavam tomando os ISRSs.

Em outubro passado, eu coloquei uma revisão sistemática de pesquisas controladas com placebo em adultos voluntários sadios mostrando que os antidepressivos dobram a ocorrência de eventos que podem conduzir ao suicídio e à violência, probabilidade de 1,85 (IC de 95% 1.11. a 3.8) (8) .  O número necessário para causar danos a uma pessoa adulta sadia é apenas 1,6 (IC do 95%: 8 a 100).

Em 14 de novembro, demonstramos que os efeitos adversos que aumentam o risco de suicídio e violência eram 4 a 5 vezes mais comuns com duloxetina (cymbalta) que com placebo, em pesquisas clínicas em mulheres com incontinência urinária sob estresse (9). Os resultados foram similares para os eventos de ativação definidos pela FDA, e também houve mais mulheres em duloxetina que experimentaram um núcleo ou potencial evento psicótico, risco relativo: 2,25 (IC do 95%: 1,06 a 4,81). Muitas mulheres se viram afetadas pelos danos da duloxetina. Haviam 187 que tinham pelo menos um núcleo ou evento potencial de ativação com a duloxetina de 958, enquanto que apenas 42 de 955 mulheres com placebo experimentaram esse tipo de eventos; quer dizer, 15% mais de mulheres foram prejudicadas quando com o medicamento em comparação com o placebo, ou seja: uma de cada sete mulheres tratadas com essa droga.

A duloxetina nunca foi aprovada nos EUA ou no Canada, para uso na incontinência por estresse, enquanto que está aprovada na Europa. Foi realizada uma meta-análise das 4 pesquisas aleatórias controladas com placebo de duloxetina (com um total de 1913 pacientes), que foram apresentadas à Agência Europeia de Medicamentos para a aprovação de sua comercialização.  Nós utilizamos os dados dos informes dos estudos clínicos (para um total de 6870 páginas e que incluem dados de pacientes individuais). Teria sido impossível demonstrar como a duloxetina é perigosa, se apenas se tivesse tido acesso à investigação publicada.

Nossa revisão sistemática sublinha que os antidepressivos não apenas aumentam o risco de suicídio e violência em crianças e adolescentes, senão também nas pessoas com muito mais idade: as mulheres nas pesquisas tinham uma idade média de 52 anos. De acordo com isso, a própria FDA havia anunciado previamente que as mulheres que foram tratadas com duloxetina para a incontinência na fase de extensão aberta dos estudos clínicos tinham 2.6 vezes mais tentativas de suicídio que as outras mulheres com a mesma idade (2).

Eu não tenho nenhuma dúvida que os fabricantes de antidepressivos e seus aliados pagos entre os psiquiatras argumentam que não há nada para se preocupar, porque não temos encontrado um aumento nos suicídios ou tentativas de suicídios, em voluntários adultos sadios ou em mulheres com incontinência urinária, apenas há o aumento dos precursores desse tipo evento. Contudo, essa argumentação é falaciosa. Com relação a eventos precursores de suicídio é como se olhar os fatores de prognóstico para a enfermidade cardíaca. Dizemos que o aumento de colesterol, o tabagismo, e a inatividade física, aumentam o risco de ataques cardíacos e mortes cardíacas, e, por conseguinte recomenda-se às pessoas que façam algo a respeito. Os líderes psiquiátricos costumam fazer tiradas insustentáveis. Muitos dizem, por exemplo, que os antidepressivos podem ser administrados com segurança em crianças, argumentando que não havia mais suicídio nas pesquisas, apenas mais tentativas de suicídio, como se não houvesse nenhuma relação entre os dois; ainda que todos saibamos que um suicídio começa com tendências suicidas, pensamentos, seguido de preparações em uma ou mais tentativas.

Conclusões

Apesar de que a indústria farmacêutica, nossos reguladores de medicamentos, bem como os líderes psiquiatras, tenham feito tudo o que é possível para ocultar os fatos (2), não se pode de maneira alguma por em dúvida que os antidepressivos são perigosos e podem causar suicídio e homicídio em qualquer idade (2,10,11). Os antidepressivos têm muitos outros danos importantes e seus benefícios clínicos são duvidosos (2). Por conseguinte, a minha conclusão é que em absoluto eles não podem ser utilizados. É particularmente absurdo utilizar medicamentos para a depressão que aumentam o risco de suicídio, quando sabemos que a psicoterapia diminui o risco de suicídio. As pesquisas de psicoterapia têm sido criticadas pela falta da ‘ocultação’ (blinding) (12), porém é difícil ‘cegar’ (blind) nesse tipo de pesquisa. Por outra parte, a tendência suicida é um resultado bastante difícil.

                    Devemos fazer todo o possível para evitar colocar as pessoas em           drogas antidepressivas; e ajudar a aqueles que já estão nelas, para deter o seu uso, reduzindo lentamente o consumo da droga  – com uma rigorosa supervisão.

                                                  As pessoas com depressão devem receber psicoterapia, apoio psicossocial, e não drogas.

Referências:

  1. Healy D. Did regulators fail over selective serotonin reuptake inhibitors? BMJ 2006;333:92–5.
  2. Gøtzsche PC. Deadly psychiatry and organised denial. Copenhagen: People’s Press; 2015.
  3. Laughren TP. Overview for December 13 Meeting of Psychopharmacologic Drugs Advisory Committee (PDAC). 2006 Nov 16. www.fda.gov/ohrms/dockets/ac/06/briefing/2006-4272b1-01-FDA.pdf.
  4. Laughren TP. The scientific and ethical basis for placebo-controlled trials in de¬pression and schizophrenia: an FDA perspective. Eur Psychiatry 2001;16:418-23.
  5. Stone M, Laughren T, Jones ML, et al. Risk of suicidality in clinical trials of antidepressants in adults: analysis of proprietary data submitted to US Food and Drug Administration. BMJ 2009;339:b2880.
  6. FDA. Antidepressant use in children, adolescents, and adults. http://www.fda.gov/drugs/drugsafety/informationbydrugclass/ucm096273.htm.
  7. Sharma T, Guski LS, Freund N, Gøtzsche PC. Suicidality and aggression during antidepressant treatment: systematic review and meta-analyses based on clinical study reports. BMJ 2016;352:i65.
  8. Bielefeldt AØ, Danborg PB, Gøtzsche PC. Precursors to suicidality and violence on antidepressants: systematic review of trials in adult healthy volunteers. J R Soc Med 2016;109:381-392.
  9. Maund E, Guski LS, Freund N, Gøtzsche PC. Considering benefits and harms of duloxetine for treatment of stress urinary incontinence: a meta-analysis of clinical study reports. CMAJ 2016;14 November. http://www.cmaj.ca/lookup/doi/10.1503/cmaj.151104.
  10. Healy D. Let them eat Prozac. New York: New York University Press; 2004.
  11. Breggin P. Medication madness. New York: St. Martin’s Griffin; 2008.
  12. Hawton K, Witt KG, Taylor Salisbury TL, Arensman E, Gunnell D, Hazell P, Townsend E, van Heeringen K. Psychosocial interventions for self-harm in adults. Cochrane Database Syst Rev 2016; 5: CD012189.

 

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Deadly Psychiatry and Organised Denial: Professor Peter C. Gøtzsche, MD, co-founded the Cochrane Collaboration. He has published more than 70 papers in the top 5 general medical journals and 5 books, most recently, Deadly Psychiatry and Organised Denial.

 

Sociedade Britânica de Psicologia: contra o modelo biomédico da Psiquiatria

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Em um movimento audaz e sem precedente para qualquer corporação profissional, a divisão de Psicologia Clínica (DCP) do Reino Unido, que é uma sub-divisão da Sociedade Britânica de Psicologia, emitiu uma tomada de posição que é muito pouco conhecida entre nós brasileiros.  Merece que o maior número de pessoas tenha essa informação.

Nessa declaração o que é reivindicado é o fim do modelo biomédico, por falta de evidências científicas, modelo esse que está implicado no diagnóstico psiquiátrico. Veja o documento.

O DCP é da opinião ser oportuno e apropriado afirmar publicamente que o atual sistema de classificação presente no DSM e CID, com relação aos diagnósticos psiquiátricos funcionais, tem limitações conceituais e empíricos significativos. Em consequência, existe uma necessidade de mudança de paradigma em relação com às experiências referidas nesses Manuais, em vistas de se ter um sistema conceitual que não esteja baseado em um modelo de ‘enfermidade’. ”

Resumindo, o argumento é que os diagnósticos dos chamados ‘transtornos mentais’ funcionais – esquizofrenia, depressão, transtorno bipolar, transtorno da personalidade, o TDAH, e assim sucessivamente – não são categorias cientificamente válidas, e que com frequência são prejudiciais na prática clínica, e, sobretudo, na vida dos diagnosticados.

A declaração afirma que já contamos com alternativas reais e eficazes, como é a formulação psicológica para abordar tais ‘transtornos’, e que existe uma necessidade de se trabalhar em colaboração com os usuários do serviço e os grupos profissionais, incluindo os psiquiatras, com a finalidade de se desenvolver ainda mais as alternativas a esse modelo ‘iatrogênico’.

Essa tomada de posição da Sociedade Britânica de Psicologia ultrapassou em muito a comunidade dos profissionais de saúde, ao aparecer na primeira página de jornais de grande circulação no Reino Unido, como foi no The Guardian, que dedicou duas páginas internas para discutir o assunto, com os títulos ‘Um novo grande campo de batalha de medicamentos? Existe realmente uma enfermidade mental’ , e ‘Os psiquiatras sob fogo na batalha da saúde mental’.

Em questão de horas, milhares de comentários começaram a ser feitos na página na internet do The Guardian, e os artigos estavam sendo re-twiteados ao redor do mundo.

Não faz falta dizer, que a postura assumida pela Sociedade Britânica de Psicologia teve reações de aprovação como de reprovação.

Talvez a mais previsível tenha sido a reação de Allen Frances, quem recentemente esteve no Brasil para o lançamento em português do seu último livro.  Frances passou a ser conhecido recentemente como um opositor declarado do DSM-5. Porém, como seria o esperado de quem foi o coordenado-chefe da força tarefa que elaborou o DSM-IV, Frances reagiu a essa declaração como sendo uma  “postura extremista da Sociedade Britânica de Psicologia, igual ao que foi feito pelo DSM-5 e o NIMH“.

Sendo ele um dos nomes de ponta do modelo biomédico da psiquiatria, muitos foram aqueles que tomaram o posicionamento de Frances, , como seu suporte ideológico (quer dizer, supostamente científico) para o debate entre os profissionais; uns a dizer que tudo isso não passa de “guerras territoriais”, enquanto que outros acusaram o DCP de ignorar o papel da biologia.

Quem lê a declaração do DCP pode constatar o quanto as reações em contrário mal escapam do ideológico, portanto, em nada científicas. O DCP estabelece especificamente que “Esta posição não deve ser interpretada como uma negação do papel da biologia na mediação em todas as formas da experiência, do comportamento e da angústia, humanas.” A declaração também diz explicitamente que o argumento diz respeito às formas de pensar, e não sobre determinadas profissões.

A acusação ‘guerras pelo território’ é particularmente algo muito longe da realidade, visto que a declaração do DCP é simplesmente uma reiteração, aliás bem equilibrada, dos comentários recentes de alguns dos psiquiatras mais eminentes no mundo.  O próprio Allen Frances descreve o DSM-5 como “profundamente defeituoso e que carece de rigor científico”. Enquanto que o Dr. Thomas Insel, diretor do NIMH (National Institute of Mental Health), disse “… os pacientes merecem algo melhor”.  E o ex-diretor do mesmo NIMH, o doutor Steven Hyman, foi ainda bem mais contundente: chamou o DSM-5 de “totalmente equivocado, um pesadelo científico absoluto”. Em resposta, o Presidente do Comitê do DSM-5, o Dr. David Kupfer admitiu: “Temos estado a dizer aos pacientes há várias décadas que estamos buscando pelos bio-marcadores.  E ainda estamos esperando.”

A principal diferença – e, por suposto, muito importante – entre a posição desses eminentes psiquiatras e o DCP é que a primeira se caracteriza pela perseguição do modelo biomédico a todo o custo. De fato, o NIMH anunciou a intenção de colocar como prioridade um programa de 10 anos para definir, de uma vez por todas, os bio-marcadores que até agora têm se esquivado aos investigadores. O projeto parte da posição muito pouco científica de assumir o que necessita ser demonstrado: em suas palavras que “os transtornos mentais são transtornos biológicos”.  Um projeto viciado por natureza, porque ele permite que os conservadores do ‘biologicismo’ continuem afirmando que “estamos nos aproximando – honestamente”. Enquanto tal, a avassaladora quantidade de evidências de fatores causais de natureza psicossocial é relegada, sistematicamente, a um segundo plano.

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Se pensarmos na situação nossa aqui no Brasil. O que as entidades representativas das diversas profissões que trabalham no campo da saúde mental têm a dizer?  O que as organizações sociais de defesa dos interesses dos usuários do sistema de saúde têm a dizer?

A informação precisa chegar ao público dos profissionais de saúde, e em particular aos próprios usuários do sistema de saúde, público e privado.

Ajude a qualificar o debate!

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Transgênero, Assexualidade e os Antidepressivos

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Recentemente, o renomado psiquiatra David Healy postou em sua página um blog onde ele coloca para o debate público a questão dos possíveis impactos que o uso de antidepressivos pode estar tendo em nossa própria sexualidade e questões de gênero.

Resolvi escrever algo a partir da leitura desse blog.

A imagem acima é de Ben, que acredita que ele na verdade possa ser a Amy.  É por isso/ou para isso, que ele está tomando hormônios para prevenir a puberdade. Esse tema faz parte de um programa da rede de televisão pública britânica BBC, dirigido a crianças a partir dos seis anos de idade.

Just  Girl, o nome do seriado, é a respeito de uma criança que no começo da sua puberdade é um ‘transgênero’ que tenta dar sentido a seu mundo, lidando com bullying e se esforçando para manter suas amigas.

Trata-se de uma problemática muito contemporânea. Sexualidade e gênero: o que é que é da ordem do biológico por natureza?  Por outro lado, o que é socialmente construído? Quais as relações entre esses termos? Quais são os limites para a intervenção no biológico? Que mundo se quer construir socialmente?

Um debate aberto, cujos ‘topos’ são ocasião para acaloradas defesas de posições.

Por exemplo, há muitos que consideram que dar hormônios a crianças antes da puberdade para prevenir o desenvolvimento natural é uma forma de ‘abuso infantil’. Há outras pessoas que dizem que quanto mais se promove a ideia que um garoto possa ter nascido em um corpo de menina, e que uma menina possa ter nascido em um corpo de garoto, e que drogas e cirurgia podem colocar as coisas em seu lugar, isso pode levar as crianças a se sentirem profundamente confusas.

Pois bem, nesse debate David Healy coloca algo a tornar mais complexa a discussão sobre essa problemática.  A pergunta que Healy formula é:

                    Que relações podem haver de fato entre problemas de transgênero ou   disforia sexual e os antidepressivos? 

De imediato, é verdade que cada vez mais há mais pessoas tomando antidepressivos. Afinal de contas, é uma das modas dos tempos atuais buscar nos antidepressivos a solução para as diversas manifestações de infelicidade.  E entre os inúmeros efeitos colaterais, os antidepressivos estão associados a um grande número de efeitos na função sexual, incluindo desejo sexual alterado, dificuldades de excitação (ereção nos homens, falta de lubrificação, nas mulheres), problemas de orgasmo, etc. [1]

Esses são efeitos colaterais dos antidepressivos já bem conhecidos e relatados. O que já é por si algo bastante alarmante!  Pouco a pouco se vem conhecendo o impacto dos antidepressivos na destruição das relações amorosas, estando fortemente associados ao crescimento das possibilidades de divórcio quando um ou os dois parceiros faz uso dessas drogas.

E quantos efeitos adversos ainda são desconhecidos?

Por exemplo, o que ocorre com filhos de pais que na sua gestação estavam fazendo uso de antidepressivos? Senão, quantas crianças, adolescentes e jovens adultos são pacientes de drogas antidepressivas?  Como a explosão do consumo dos antidepressivos se deu a partir dos anos 1990, ainda há muito o que desconhecemos.

A questão da relação entre os antidepressivos e a ‘disforia sexual’ tratada pela psiquiatria tem antecedentes na própria ciência que está na base dos atuais psicotrópicos prescritos.  Healy lembra que o primeiro artigo de língua inglesa sobre a imipramina, que foi o primeiro inibidor relativamente potente da reabsorção de serotonina, em 1958, já era mencionado que algumas pessoas com uma orientação homossexual transitariam ou se converteriam à heterossexualidade. Isso foi motivo de celebração na época. O que quer dizer, que já se sabe há muito que os antidepressivos têm impactos na sexualidade.

O tempo passa, mudanças socioculturais ocorrem. Mas, como mais uma vez Healy nos lembra,  em 1993, portanto muito mais recentemente, Peter Kramer, o autor do famoso livro Ouvir o Prozac  dizia algo muito parecido. O que foi comemorado, como um meio para se construir o mundo de relações, conforme o desejo.

A orientação sexual, como é mudada?

São questões que ainda temos respostas quase que absolutamente provisórias.

Quem pode ajudar na construção desse conhecimento, são as próprias pessoas que estão passando por tais experiências. Como é bem observado por Healy, as pessoas mais bem colocadas para descobrir o que pode estar acontecendo é a própria comunidade dos que vivem essa ‘fluidez’ de gênero.

Healy organizou uma plataforma na internet muito importante, que é uma comunidade virtual dos que comungam a problemática dos efeitos colaterais das drogas psiquiátricas prescritas por médicos. Como você pode se dar conta, ao se conectar a essa página, lá você tem disponibilizadas várias maneiras para se manter em comunicação com pessoas que sofrem os efeitos adversos das drogas psiquiátricas, e que querem compartilhar ideias e experiências com os demais.

Nesse sentido, precisamos de relatos de pessoas cuja orientação e auto-visão mudaram dramaticamente com exposição a essas drogas ou retirada de alguma dessas drogas. Mas por trás da mudança no exterior, precisamos saber mais sobre quaisquer mudanças no interior. Como foi a mudança? O que mudou para provocar a mudança? Essas coisas poderiam estar ligadas a efeitos ‘primitivos’, como efeitos sobre nosso cheiro ou olfato. E assim por diante.

Esse programa da BBC é eloquente sobre a atualidade dessa ‘problemática’, não é mesmo?

Quanto mais bem informados somos, as nossas decisões podem ser tomadas com mais consciência.  E o debate público passa a ser mais bem qualificado.

 

 

 

 

 

A ‘medicalização’ da miséria humana e o crescimento do consumo de antidepressivos

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Médicos em toda a Europa estão advertindo que o vertiginoso aumento da prescrição de antidepressivos ocorre devido à pressão de ‘medicalizar’ a infelicidade.  Eles se queixam que por falta de tempo na consulta e pela pouca disponibilidade de terapias alternativas, recorrem com demasiada frequência ao seu bloquinho de prescrição de medicamentos.

Esse é o resultado de um questionário enviado pelo jornal britânico The Guardian e cinco outros grandes jornais europeus. Foram entrevistados 100 médicos e psiquiatras europeus, cuja maioria disse que há uma ‘cultura de prescrição’ em seus países, na medida em que as pessoas com depressão não encontram uma ajuda adequada.

Muitos dos médicos – da Inglaterra, França, Itália, Alemanha, Espanha, Luxemburgo, Bélgica e Holanda – disseram que eles acreditam que os antidepressivos sejam o tratamento efetivo para casos de depressão grave. Não obstante, dezenas dos médicos expressaram frustração que por falta de tempo e de outras alternativas o que fazem é prescrever antidepressivos para todas as demandas que lhes chegam, independentemente de uma avaliação clínica realmente cuidadosa.

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Entre as várias declarações feitas pelos médicos, há por exemplo essa de Gladys Mujica Lescano, médica de um hospital de Barcelona:

                “Nós estamos medicalizando situações comuns: conflito, separação e          vicissitudes da vida”.

Confira a reportagem completa do The Guardian.

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