“Você já esteve deprimido como médico?”, Perguntei a 220 médicos. Noventa por cento afirmou que sim. No entanto, poucos procuram ajuda profissional. Veja o que os médicos deprimidos fazem (quando ninguém está olhando). Alguns bebem álcool, fazem exercícios obsessivamente, até roubam remédios psiquiátricos. Ainda mais chocante – descobri que 75% dos estudantes de medicina (e novos médicos) estão agora tomando medicamentos psiquiátricos.”
A Arte como Atividade Terapêutica na Colônia Juliano Moreira
O artigo A experiência com arte na Colônia Juliano Moreira na década de 1950, de João Henrique Queiroz de Araújo e Ana Maria Jacó-Vilela, publicado recentemente na revista História, Ciência e Saúde – Manguinhos, nos traz uma visão histórica sobre a relação entre arte e os saberes e práticas psi no Brasil. Os autores visam ampliar o debate, buscando compreender como as atividades de expressão artística tornaram-se um instrumento terapêutico.
Os autores fizeram um levantamento de documentos junto ao Centro de Estudos da Colônia Juliano Moreira, bem como na Biblioteca Nacional no Rio de Janeiro. Para dar suporte à leitura dos documentos, realizou-se uma revisão bibliográfica. Ademais, os autores compararam as produções da Colônia Juliano Moreira com aquelas que estavam sendo produzidas paralelamente em outros centros psiquiátricos, como é o caso de Nise da Silveira no Centro Psiquiátrico Nacional – atual Instituto Municipal de Assistência à Saúde Nise da Silveira, e de Osório César no Hospital Psiquiátrico do Juquery. Ambos, como bem sabido, são referências no campo.
A Colônia Juliano Moreira foi fundada em 1924, tendo como principal atividade terapêutica o trabalho rural, em um contexto em que a psiquiatria brasileira estava fortemente orientada pelo tratamento moral de inspiração francesa. Ou seja, a psiquiatria pretendia devolver à sociedade sujeitos aptos para o trabalho. Nesse contexto, acontece algo muito relevante, trabalhos artísticos são produzidos espontaneamente por pacientes. A arte no ambiente psiquiátrico não foi introduzida pelos saberes psi, mas surgiu dos próprios pacientes, o que acabou despertando o interesse de alguns médicos, posteriormente. Porém, foi somente na segunda metade da década de 1940 que as atividades artísticas começaram a ser incorporadas como recurso terapêutico na área da saúde mental, apesar do descrédito da psiquiatria hegemônica de cunho organicista.
Como sabido, na mesma época, a psiquiatra Nise da Silveira adquiria notoriedade a partir do ateliê de pintura e modelagem (1946) e do Museu Imagem do Inconsciente (1952). Na mesma época, em 1949, será criada a Seção de Artes Plásticas do Hospício de Juquery sob a coordenação de Osório César. É preciso ressaltar que cada instituição incentivou as atividades artísticas com objetivos, metodologias e recursos distintos.
No Hospital do Engenho de Dentro, onde Nise atuava, a livre expressão foi fortemente estimulada, o tratamento tinha como base as relações afetivas e simbólicas que se estabeleciam e o fazer artístico não possuía fins diagnósticos. Já para Osório, a compreensão da arte dos internos incluía uma ideia de liberdade. Ele acreditava que impedir o modo de expressão livre poderia afetar a estrutura psíquica dos pacientes. Diferentemente de Nise e Osório, a Colônia Juliano Moreira ressalta outro papel para as atividades artísticas dos internos, que seria o de penetrar na intimidade psíquica do paciente. Buscava-se com isso identificar traços de loucura por meio da produção artística. A metodologia utilizada nas oficinas artísticas apresentava uma tendência ao trabalho dirigido e padronizado, pois acreditava-se que a produção espontânea acentuaria a dissociação e desajuste psíquico.
O artigo é valioso para refletirmos na emergência da arte como terapêutica no interior dos hospitais psiquiátricos, antes da reforma psiquiátrica, além de identificar os diferentes objetivos pretendidos ao se utilizar dessa ferramenta. Por último, outra diferença no contexto da Colonia Juliano Moreira é que apenas 5 pacientes frequentavam o setor de produção artística, porém esse setor foi altamente valorizado pela Colônia, saindo em seus boletins e produzindo exposições artísticas nas quais participaram pessoas importantes da época. Os autores do artigo propõem uma possível resposta a isso como sendo uma tentativa de criar uma boa imagem da instituição.
“A produção artística, certamente deveria chamar mais atenção do que o trabalho braçal e bruto, simplesmente auxiliar ou administrativo, nesse sentido, pode ter sido utilizada também como meio para construir no imaginário social uma sensação de bom funcionamento da instituição. (…) Os espectadores poderiam ser levados a ignorar a doença e os problemas do sistema público de saúde (…)”
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ARAUJO, João Henrique Queiroz de; JACO-VILELA, Ana Maria. A experiência com arte na Colônia Juliano Moreira na década de 1950. Hist. cienc. saude-Manguinhos, Rio de Janeiro , v. 25, n. 2, p. 321-334, June 2018
A expulsão de Gotzsche do COCHRANE
Alvoroço sobre a expulsão de Gotzsche do COCHRANE
A decisão do Conselho Administrativo do Cochrane de expulsar Peter Gøtzsche está provocando uma forte ‘crise’ para o grupo Cochrane, já que os críticos argumentam que isso vai contra a ‘liberdade de expressão’ e a mente aberta que são tão fundamentais para a ciência.
Explorando a tensão entre psicologia educacional e psiquiatria infantil
Em um artigo publicado no International Journal of Inclusive Education, os pesquisadores dinamarqueses Bjørn Hamre, Lotte Hedegaard-Sørensen e Søren Langagerb examinam a natureza das relações de colaboração entre psicólogos educacionais (trabalhando em escolas) e psiquiatras infantis (trabalhando fora das escolas de forma independente ou através de agências externas).
Por meio de entrevistas abrangentes e semi-estruturadas com psicólogos educacionais dinamarqueses, os pesquisadores concluíram que existe uma abertura e interesse geral entre os psicólogos escolares para unir forças com profissionais de várias disciplinas para maximizar a qualidade de vida e o desempenho educacional entre os estudantes. No entanto, a equipe também conseguiu estabelecer um quadro com alguns dos obstáculos que desafiam as relações interpessoais e os esforços conjuntos de apoio estudantil entre psicólogos educacionais e psicólogos / psiquiatras que trabalham fora da escola com quem eles colaboram.
Alguns dos temas que emergiram nas entrevistas incluíram 1) um interesse em uma melhor integração para evitar uma cultura reativa, na qual os fatores de risco do estudante são discutidos e abordados com antecedência, 2) o desejo de eliminar as percepções de papéis hierárquicos entre os colaboradores e 3 ) o potencial para psicólogos educacionais para assumirem o papel de facilitadores de apoio aos alunos em ambientes escolares. Algumas características da escolaridade inclusiva, um movimento na Dinamarca motivado por mudanças de políticas estatutárias em 2014, estão em desacordo com a medicalização dos elementos sociais e emocionais da infância. No entanto, entrevistas apontaram para um interesse entre os psicólogos educacionais dinamarqueses em abordar as necessidades dos alunos com base nas funções e habilidades sociais, em vez de um rótulo de diagnóstico.
A publicação começa com a seguinte citação de uma das muitas entrevistas qualitativas que Hamre e colegas conduziram com os participantes:
“Parece-me que tudo diz respeito a definição de poder, o que tem a ver com o imperialismo funcional.” (Um psicólogo, comentando acerca da colaboração entre psicólogos e psiquiatras.”

Historicamente, as escolas nos contextos ocidentais têm confiado pesadamente em práticas disciplinares e educacionais que excluem os alunos com pronunciados desafios sociais, emocionais e comportamentais no relacionamento com seus colegas. Alunos com “necessidades especiais” às vezes são separados de seus colegas com comportamentos em sala de aula mais propícios ao ambiente de aprendizagem. A pressão atual por ambientes de aprendizagem inclusivos, embora por vezes motivada política e monetariamente, capacita os alunos com diversos contextos psicossociais e contextuais que compartilhem das mesmas salas de aula.
Na Dinamarca, assim como na Austrália, no Reino Unido e nos EUA, esse movimento coincide com uma tendência crescente nos diagnósticos psiquiátricos infantis. Houve uma redução em crianças com classificações de “necessidades educacionais especiais” em dois terços desde a reforma do país em 2014, e a meta nacional é de reduzir pela metade o número de alunos encaminhados para serem educados em ambientes segregados. No entanto, de acordo com os autores, os esforços da Dinamarca em relação à inclusão “… parecem estar em rota de colisão com o crescente interesse em diagnósticos psiquiátricos e o rápido aumento no número de crianças abrangidas pela avaliação psiquiátrica infantil e juvenil”, havendo hoje em dia alunos em típicas salas de aula com rótulos psiquiátricos mais do que nunca.
“A psicologia educacional mudou de uma cultura de testes e focada em problemas para mais atenção ao ambiente da criança e a fatores socio-emocionais, principalmente devido à agenda política nacional de inclusão”, escrevem os pesquisadores.
“Pesquisas internacionais e debates dentro da “psicologia educacional crítica ” parecem ter tido muito pouco impacto. Isso pode ser parcialmente uma explicação subjacente para algumas das descobertas do estudo empírico que sublinham por que o desenvolvimento profissional da psicologia educacional é desafiado pelo crescente domínio da psiquiatria infantil”.
Mudanças na política educacional e na psiquiatria exigem colaboração interdisciplinar entre psicólogos educacionais e psicólogos infantis. Psicólogos educacionais, ou psicólogos escolares, são tipicamente responsáveis por melhorar os suportes escolares disponíveis para estudantes com perfis sociais, emocionais e comportamentais únicos, enquanto psicólogos infantis e psiquiatras infantis tendem a adotar uma compreensão mais biomédica do comportamento.
A maioria dos psicólogos infantis e psiquiatras infantis desenvolvem sua prática fora de um ambiente educacional. Quando as determinações de colocação e intervenção são feitas por agências externas, elas geralmente são feitas por indivíduos alheios ao ambiente escolar.
“As críticas sociológicas da educação voltada para as necessidades especiais têm enfatizado os aspectos problemáticos da educação segregadora: injustiça, marginalização, estigmatização e exclusão. O debate atual sobre educação para necessidades especiais e educação inclusiva está alinhado com essa crítica e se concentra no ensino para a diversidade”, acrescentam os pesquisadores.
“A ênfase está na capacidade dos professores de dar sentido às diferenças dos indivíduos em seu ensino, sem depender de categorias de deficiências específicas para estratégias de ensino. A questão sobre as diferenças entre os alunos na escola é como essas diferenças são compreendidas e que diferença elas fazem para o ensino”.
O exame qualitativo e empírico das percepções dos psicólogos educacionais sobre colaboração interdisciplinar ocorreu entre 2013 e 2015, durante um projeto mais amplo do Departamento de Serviços para Crianças e Jovens da Prefeitura de Copenhague, destinado a melhorar a qualidade dos esforços de colaboração entre psicólogos que trabalham para apoiar estudantes em diferentes ambientes. As entrevistas pertenceram à dinâmica associada à prestação de serviços interdisciplinares e limitavam-se às perspectivas dos profissionais empregados em uma determinada disciplina. Todas as discussões foram de aproximadamente 45 minutos de duração.
Consistente com a filosofia foucaultiana, Hamre e sua equipe abordaram sua investigação com a noção norteadora de que “nem a psicologia nem a psiquiatria refletem uma posição científica neutra”. Eles procuraram explorar as perspectivas dos psicólogos educacionais sobre o clima sociopolítico que guia a ciência psicológica neste momento em um contexto cultural particular.
“O diagnóstico psiquiátrico tem sido parte integrante do sistema educacional. A agenda inclusiva implica o desejo de professores, educadores e políticos de repensar como os diagnósticos são produzidos e transferidos na escola. O presente estudo questionou como a transferência de conhecimentos diagnósticos de psicólogos educacionais para professores problematiza o papel do sistema escolar na (re) produção da psicopatologia. Alcançar a educação inclusiva requer uma consciência das estruturas de exclusão. Este artigo abordou a necessidade de focar em como a linguagem e a prática diagnóstica são construídas em contextos interprofissionais e de risco interrompendo agenda inclusiva.”
Há características do estudo de Hamre e colegas que podem não se traduzir diretamente em estruturas existentes nos EUA, mas suas descobertas têm implicações relevantes a nível internacional. Esforços para promover a colaboração interdisciplinar, ampliar os canais de comunicação e desenvolver linguagem comum acessível ao pessoal de apoio associado à escola poderiam, juntos, servir para melhorar as experiências dentro da escola para alunos de todos os tipos em salas de aula compostas por crianças com diversas origens, estilos de aprendizagem, necessidades e objetivos.
História e lutas do Movimento Internacional de Usuários e Sobreviventes da Psiquiatria
No dia 25 de setembro de 2018, na Escola Politécnica Joaquim Venâncio (EPSJV) /FIOCRUZ, das 8:30 às 12:00, Tina Minkowitz estará conosco participando da Aula Pública do Curso de Qualificação Profissional em Saúde Mental, cujo tema será “O Protagonismo dos Usuários na luta por uma Sociedade sem Manicômios”. Haverá uma cerimônia de abertura com as presenças de Anakeila de Barros Stauffer (diretora da EPSJV), Hugo Fagundes (coord. de saúde mental do Município do Rio de Janeiro), Paulo Amarante (ABRASME), Walter Farias (autor do livro: “O capa branca: de funcionário a paciente de um dos maiores hospitais psiquiátricos no Brasil”), com a coordenação de Nina Soalheiro (EPSJV).
A Conferência da Tina terá como tema: “História e lutas do movimento internacional de usuários e sobreviventes da Psiquiatria”. Será transmitida ao vivo no link www.epsjv.fiocruz.br
Em 10 de março de 2018, na Rádio Mad in America (MIA), Tina Minkowitz foi a entrevistada pelos nossos colegas. Tina é uma advogada e sobrevivente da psiquiatria que representou a Rede Mundial de Usuários e Sobreviventes da Psiquiatria na elaboração e negociação da Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência. Tina é uma forte proponente da abolição de todas as intervenções psiquiátricas forçadas e desempenhou um papel importante na obtenção de uma mudança na lei internacional em favor de tal proibição.
Nesta entrevista dada à rádio MIA, Tina fala como as Nações Unidas apoiaram a abolição do tratamento psiquiátrico forçado e por que ela acredita que a abolição do tratamento forçado, e não da reforma do tratamento, é necessária. Com essa entrevista você pode se preparar para assistir a Conferência da Tina no Rio de Janeiro.
Neste episódio nós discutimos:
Como Tina ficou interessada na interseção do direito internacional dos direitos humanos, da lei dos direitos das pessoas com deficiência e da questão do tratamento psiquiátrico forçado.
Por que Tina acredita na abolição, não na reforma, do tratamento psiquiátrico forçado.
Que a ameaça de tratamento forçado contra alguns sobreviventes psiquiátricos pode ser traumática para toda a comunidade de sobreviventes.
As barreiras à abolição do tratamento forçado, incluindo a percepção pública de pessoas rotuladas mentalmente doentes e a falta de consciência de alternativas não coercitivas.
Essa defesa é necessária para eliminar a permanência de 72 horas de hospitalização forçada, seja com ECT, tratamento psicofarmacológico forçado ou compromisso de tratamento ambulatorial.
Por que o tratamento forçado constitui violência física?
Precisamos criar práticas alternativas ao atual sistema de saúde mental para exigir uma parada imediata no tratamento forçado.
Como a política de saúde mental deve centrar o que hoje consideramos práticas alternativas, como são serviços gerenciados por pares, grupos de vozes ouvintes e apoio domiciliar.
Como a questão do tratamento forçado se enquadra no quadro dos direitos das pessoas com deficiência.
As atividades atuais de Tina com o Centro para os Direitos Humanos dos Usuários e Sobreviventes da Psiquiatria.
Links relevantes:
The Center for the Human Rights of Users and Survivors of Psychiatry
Campaign to Support CRPD Absolute Prohibition of Commitment and Forced Treatment
Committee on the Rights of Persons with Disabilities
Convention on the Rights of Persons with Disabilities
Para entrar em contato conosco e-mail: [email protected]
Por que a medicina é uma grande ameaça para a saúde pública?
Do The Guardian: “Em vez de abordar a causa básica dessas condições através de mudanças no estilo de vida, priorizamos drogas que dão- na melhor das hipóteses – apenas uma chance marginal de benefícios a longo prazo para os indivíduos, a maioria dos quais não obterá melhora nos resultados de saúde.
A realidade é que as mudanças no estilo de vida não apenas reduzem o risco de doenças futuras, mas seus efeitos positivos na qualidade de vida acontecem em dias ou semanas. No entanto, aqueles pacientes com o azar de sofrer os efeitos colaterais dos medicamentos prescritos podem achar que sua qualidade de vida se deteriorará, a fim de desfrutar de pequenos benefícios de longo prazo da medicação.
É claro que os pacientes podem precisar usar ambos, mas o importante é que as informações sejam apresentadas de forma transparente para encorajar a tomada de decisões compartilhadas. A campanha “Escolhendo com sabedoria” da Academia de médicos do Royal College incentiva os pacientes a perguntar ao médico se eles realmente precisam de um medicamento, um teste ou um procedimento.
Prof Luis Correia, diretor do Centro de Medicina Baseada em Evidências no Brasil, diz que se uma decisão clínica não está de acordo com as preferências e valores individuais do paciente, “não irá funcionar”.
Pesquisador desafia a eficácia clínica dos antidepressivos
Em um novo artigo, Michael P. Hengartner, psicólogo clínico da Universidade de Ciências Aplicadas de Zurique, escreve que os antidepressivos são “amplamente ineficazes em todo o espectro de gravidade”. O artigo, publicado on-line antes da publicação no BMJ Evidence-Based Medicine, aborda as más interpretações comuns da pesquisa de eficácia sobre medicamentos antidepressivos.
Hengartner observa que um grande estudo recente reivindicou ter encontrado que os antidepressivos são medicamentos eficazes para a depressão, com efeitos similares, independentemente da gravidade dos sintomas de depressão. Estas conclusões foram amplamente relatadas nos meios de comunicação de massa como evidência de que os antidepressivos “funcionam”. No entanto, outros pesquisadores criticaram as conclusões deste estudo.
“Obviamente, comentaristas e autores querem disseminar a mensagem de que os antidepressivos são um tratamento eficaz para a depressão leve a moderada e que as diretrizes práticas devem incorporar essas descobertas”, escreve Hengartner. “No entanto, nem o artigo original nem o editorial fornecem, de fato, evidências de que as drogas são clinicamente eficazes para qualquer forma de depressão.”
Nestes estudos recentes, os efeitos dos antidepressivos são de fato similares, seja no tratamento de depressão leve, moderada ou grave; no entanto, o efeito em si é incrivelmente pequeno e não é clinicamente significativo. De fato, os pesquisadores relatam uma diferença entre placebo droga de 1,6 pontos no HRSD de 52 pontos (escala para medir a gravidade da depressão). Ou seja, em média, as pessoas que tomam o remédio não melhoraram 2 pontos a mais do que as que tomam uma pílula falsa.
“De fato”, escreve Hengartner, “o que as descobertas deles e as relacionadas revelam é que os antidepressivos são amplamente ineficazes em todo o espectro de gravidade, porque uma diferença de 1,6 ponto entre o placebo e o medicamento é um efeito insignificante”.
A “resposta clínica tem sido definida na literature de pesquisa como uma melhora entre 10 e 12 pontos, e estudos prévios têm focalizado que os clínicos são incapazes de até mesmo detectar uma melhora de 7 pontos no HRSD.
Outro estudo publicado este ano por Hengartner, com Jules Angst e Wulf Rossler, descobriu que, após 30 anos, as pessoas que tomaram antidepressivos tiveram piora dos sintomas ao longo do tempo. O achado permaneceu o mesmo após o controle de múltiplas variáveis de confusão, incluindo a gravidade da depressão. Ou seja, as pessoas com o mesmo nível de diagnóstico de depressão se saíram melhor se não estivessem tomando antidepressivos.
Um recente artigo publicado no Mad in Brasil abordou esse estudo no contexto da pesquisa, mostrando resultados piores, pesquisas tendenciosas e a carga de efeitos colaterais que acompanha o uso de antidepressivos. Mad in Brasil também publicou uma entrevista com Hengartner, na qual ele explicou com mais detalhes seu estudo sobre os efeitos a longo prazo dos antidepressivos.
“Em vez de pedir mais prescrições de medicamentos, sugiro que os pesquisadores examinem se os antidepressivos funcionam para qualquer forma de depressão de maneira clinicamente significativa, equilibrando riscos e benefícios”.
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Hengartner, M. P. (2018). What is the threshold for a clinical minimally important drug effect? BMJ Evidence-Based Medicine, Epub ahead of print: [7 Sept, 2018]. doi:10.1136/ bmjebm-2018-111056 (Link)
Memórias de um Psiquiatra Dissidente
Quando comecei a me especializar em psiquiatria na Finlândia no início dos anos 80, a cena psicológica parecia bem diferente da de hoje. A retórica dominante era a psicanálise, e todos nós, incluindo psicólogo(a)s, assistentes sociais e enfermeiro(a)s psiquiátricas, esperávamos aprender a falar ‘psicanalise’ e ver os pacientes individualmente uma vez por semana – às vezes duas vezes por semana – durante anos. Aqueles eram os dias.
Eu logo me tornei descrente. A terapia psicodinâmica levava anos e apenas uma minoria de pessoas parecia se beneficiar com isso. Muitos pacientes reclamavam que seus terapeutas permaneciam sentados silenciosamente em suas cadeiras durante as sessões. Muitos ficavam tão dependentes de seus terapeutas que precisavam de hospitalização quando seu terapeuta estava em férias de verão. Outros cortavam sua relação com os pais porque aprendiam com seus terapeutas que todos os seus problemas eram causados por seus pais. A maioria das pessoas que entrava em terapia individual por causa da insatisfação conjugal acabava se divorciando de seus cônjuges. Alguns podiam dar palestras longas e chatas sobre por que eles tiveram seus problemas, mas não tinham a menor ideia sobre como tornar sua vida melhor. Além disso, as crianças eram forçadas a ir à terapia de longo prazo e quando seus pais se queixavam da falta de progresso, ou até da piora da situação, os pais eram criticados por sabotar a terapia de seus filhos e orientados a obter terapia individual para resolver seus próprios problemas.
Para mim, a psicanálise parecia um culto pseudocientífico que, de algum modo, conseguira infiltrar-se no establishment médico. Eu me sentia intrigado como eles haviam conseguido fazer isso. Representantes do movimento haviam conquistado uma posição na sociedade em que não apenas doutrinavam os profissionais de saúde mental nas crenças freudianas, mas também outros médicos, educadores e até professores de educação infantil. Eles eram inflexíveis em conseguir que o mundo todo engolisse suas crenças infundadas sobre as origens dos problemas de saúde mental.
Eu não gostava de psicanálise. Sugeri ao meu professor – que queria que eu fizesse um doutorado – que eu viesse a estudar os efeitos adversos da psicoterapia. Ele era um psicanalista – não muito diferente de todos os outros professores de psiquiatria e psiquiatria infantil da época – e, é claro, ele imediatamente rejeitou a ideia. Naquela época, era tabu sugerir que a psicoterapia poderia causar efeitos adversos. Todos deveriam acreditar que a terapia psicodinâmica era superior a qualquer outra forma de terapia. Se os sintomas de um paciente piorassem, durante o curso da terapia, não era porque havia algo errado com a terapia, mas porque a terapia revelara que o paciente estava, de fato, mais seriamente perturbado do que era evidente no início. Eu detestava a lógica distorcida e egoísta de meus colegas psicodinâmicos.
Eu era um dissidente. Passei a me interessar por terapia familiar em geral, e em particular pela terapia breve focada em soluções. Essas eram abordagens promissoras para ajudar os pacientes e suas famílias, onde o foco não estava no passado, mas no futuro. O terapeuta não era um ouvinte passivo, mas um participante ativo, cuja tarefa não era ajudar os pacientes a descobrir as raízes subjacentes presumidas de seu sofrimento, mas apoiá-los na busca de soluções, na descoberta do que poderiam fazer para melhorar suas vidas. Terapia breve fazia muito mais sentido para mim do que terapia psicodinâmica e em vez de manter o paciente em terapia por anos, nesse tipo de terapia, o número de sessões era reduzido ao mínimo e os pacientes não eram levados a acreditar que todos os seus problemas na infância eram ruins.
Eu tentei questionar o sistema de crença psicanalítico, mas não era possível argumentar com os crentes. A argumentação deles não seguia qualquer lógica conhecida por mim. Um colega disse que a psicanálise deve ser um sistema válido porque já está aí faz muitos anos. Um outro disse que a minha crítica à psicanálise deve ser provocada por algum problema mental meu. Ele disse que eu provavelmente tinha alguns problemas com apego, o que tornava difícil para mim me comprometer com o tipo de relações em longo prazo que são exigidas em uma terapia de longo prazo. Um terceiro disse que eu não estava em nenhuma posição para criticar a psicanálise, porque eu não havia sido o suficientemente analisado. Dois colegas, ambos psiquiatras psicanalistas de crianças, apresentaram uma queixa a meu respeito ao comitê ético da Associação Médica Finlandesa, acusando-me de um comportamento contra o sistema escolar, na medida em que eu havia publicamente criticado os métodos de tratamento psiquiátrico infantil sem ser eu mesmo um psiquiatra infantil. De acordo com a queixa – que foi derrubada pelo comitê de ética – psiquiatras de adultos como eu não estavam qualificados para apresentar críticas à psiquiatria infantil. A crítica dirigida ao campo da psiquiatria infantil, de acordo com eles, apenas poderia ser apresentada por psiquiatras infantis, não por psiquiatras de adultos.
Foi uma batalha frustrante. Eu não penso que tenha sido bem-sucedido em trazer qualquer mudança. Só consegui irritar meus colegas ocupados com a psicanálise. Acho que até me tornei por vários anos uma persona non grata dentro da minha profissão. Mas, felizmente, eu não me importei muito. Eu já havia colocado meu pé em um caminho diferente. Fiquei emocionado com a terapia breve e naqueles dias muitas outras pessoas no campo da saúde mental passaram a compartilhar do meu entusiasmo com esses métodos inovadores.
Eu focalizei em difundir informação acerca da terapia breve a profissionais que pensavam como eu, assim como ao público através de um talk show relacionado à saúde mental na tv nacional e que ocorreu em mais de 200 episódios. Hoje, a terapia focalizada em soluções (também conhecida como terapia colaborativa ou orientada aos recursos) é em meu país um método terapêutico oficialmente reconhecido, e os pacientes podem ser reembolsados pelo seguro nacional de saúde.
Enquanto eu estava ocupado espalhando a boa notícia sobre a terapia focalizada na solução e evitando criticar as convenções psiquiátricas, a psiquiatria estava passando por grandes mudanças. O sistema de crenças psicanalíticas foi descartado e substituído pelo DSM e pela doutrina biomédica: todos deveriam ter um diagnóstico, e todos deveriam ter medicação. Todas as condições anteriormente tratadas com terapia passaram a ser tratadas com medicação, que se tornou o tratamento de escolha para quase todas as condições de saúde mental, independentemente de o paciente ser adulto, adolescente ou criança. Um paciente sem medicação tornou-se uma raridade. O sistema de dados dos serviços de saúde mental passou a exigir que os médicos diagnosticassem quem procurava ajuda. Durante anos, esperei que a psiquiatria se libertasse da doutrina psicanalítica e, quando meu desejo finalmente se concretizou, minha profissão saiu da frigideira para a fogueira.
Mas eu estou lutando. Eu sou um membro da rede internacional de psiquiatria crítica. Ao longo dos anos, escrevi várias cartas ao editor que foram publicadas em nosso jornal principal, sou ativo no site fechado do Facebook da Associação Psiquiátrica Finlandesa e às vezes falo diretamente com os formuladores de políticas, como o chefe do nosso Instituto de Seguro Nacional de Saúde.
Meu principal objetivo, atualmente, é convencer os profissionais e o público de que a maioria dos problemas psiquiátricos infantis pode ser tratada de forma eficaz sem medicação. Juntamente com meus colegas, desenvolvemos nos anos 90 um método que chamamos de habilidades para crianças. É um método simples que qualquer um pode aprender, baseado na ideia de que os problemas das crianças não precisam ser considerados como distúrbios psiquiátricos, mas como a falta de algumas habilidades psicossociais que as crianças ainda não aprenderam.
O Kids Skills fornece um protocolo para descobrir que habilidade a criança precisa aprender e um meio de engajar os pais e amigos da criança para ajudar a criança a desenvolver a habilidade que está faltando, de uma maneira divertida e recompensadora. Livros e outros materiais sobre esse método já apareceram em mais de 20 idiomas e há treinadores de habilidades para crianças sendo treinados em vários países do mundo. Eu até criei um aplicativo sobre o método que foi traduzido por um tradutor voluntário para vários idiomas, incluindo russo, espanhol e chinês. Eu gosto de pensar que as pessoas vão perceber que chegamos ao fim da corda. Não faz sentido medicalizar toda a população. Vamos começar a tornar o mundo um lugar melhor, ajudando nossos filhos a superar seus problemas, não com drogas, mas com o apoio e a ajuda de seus colegas e pais.
Advertências sobre o uso de benzodiazepínicos em idosos são ignoradas
No Medscape: “Apesar dos anos de alertas sobre os perigos da prescrição de benzodiazepínicos para os idosos, esses medicamentos continuam a ser usados em uma taxa mais alta do que o que é considerado adequado em americanos mais velhos – particularmente mulheres mais velhas, mostram novos dados.
…
Desde 2012, a American Geriatrics Society (AGS) instou os médicos a evitar o uso de benzodiazepínicos em adultos mais velhos. Essa recomendação está sendo reiterada nas diretrizes de prescrição da AGS 2018 (chamadas de Beers Criteria), que estão sob revisão final.
…
“Precisamos ser um pouco mais criteriosos com isso”, disse à Medscape Medical News, Nicole Brandt, PharmD, MBA, BCGP, BCPP, FASCP, diretora executiva do Centro Peter Lamy de Terapia Química e Envelhecimento da Universidade de Maryland, em Baltimore. Brandt disse que continua preocupada com a persistência do uso de benzodiazepínicos diante de tantas advertências e diretrizes. ”
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Mad no Reino Unido
Hoje, quinta-feira, 6 de setembro, vem o culminar de muitos meses de esforços ‘nos bastidores’ com o lançamento de Mad in the UK. O MITUK é um de um número crescente de sites afiliados ao MIA, incluindo Mad in America Hispano-Hablante, Mad in Asia, Mad in Brasil e Mad in Finland.
Agindo em conjunto com o MIA (Mad in America), Mad no Reino Unido disponibilizará conteúdo específico do Reino Unido e dará voz aos profissionais, sobreviventes, militantes, cuidadores, pesquisadores, professores, treinadores, advogados, jornalistas, voluntários e outros que trabalham para a mudança no campo do que é geralmente referido como ‘saúde mental’.
O MITUK acredita que o atual paradigma de cuidados em saúde mental baseado em diagnósticos fracassou de forma abrangente, como indicado pela falta de evidências para seus princípios centrais, o número crescente daqueles diagnosticados como ‘doentes mentais’ e a crescente preocupação com o fracasso de muitos ‘tratamentos’ para ajudar as pessoas a se recuperarem. MITUK, juntamente com muitos outros, acredita que o futuro está em alternativas não médicas que explicitamente reconheçam o papel causal de conflitos sociais e relacionais, abusos, adversidades e as injustiças. Fazemos campanha por uma mudança no discurso profissional e público sobre o sofrimento emocional e experiências incomuns; para apoio, dentro e fora dos serviços, que atenda às reais necessidades das pessoas; e para a política social que trata das causas do sofrimento psíquico em suas raízes. O MITUK será um espaço voltado para discussões críticas, campanhas e ações. Além disso, o MITUK fornecerá links para muitos outros recursos, projetos e organizações que também estão desenvolvendo caminhos positivos.
O coletivo MITUK
MITUK é publicado por um coletivo, com James Moore como elo técnico para MIA. O coletivo é atualmente composto por 10 pessoas com origens e interesses variados e sobrepostos. 7 de nós têm experiência de sobrevivência e 5 de nós têm antecedentes profissionais em saúde mental (e alguns têm os dois). No entanto, esperamos que nossas discussões vão além de um conjunto de dicotomias que raramente refletem a realidade complexa, como sobreviventes X profissionais, quem toma X quem não está tomando drogas psiquiátricas, os que trabalham dentro X os que estão fora dos serviços, psicólogos X psiquiatras, e assim por diante. A comunidade do MITUK provavelmente variará de acordo com o tempo, energia e outros compromissos.
Nossa posição básica com relação ao ‘modelo biomédico’ e à prática baseada em diagnósticos é clara e orientará nosso conteúdo e blogs. A grande maioria das fontes de informação apóia o paradigma existente, sendo o comum que as pessoas tenham ‘carreiras psiquiátricas’ ao longo de suas trajetórias de vida – enquanto usuários e profissionais de saúde -, sem receber críticas ou alternativas. Se a escolha informada significa qualquer coisa, o que se apresenta como ‘fatalidade’ precisa mudar. Uma vez que esperamos facilitar discussões construtivas em todas as áreas, ocasionalmente publicaremos mais perspectivas gerais para debate. Estamos conscientes de que estas são questões muito emotivas e as discussões resultantes podem ser perturbadoras para todas as partes. Nós nos esforçaremos para promover um debate respeitoso, livre de discriminação, abuso ou ataque pessoal, moderando os comentários do blog e outros espaços de discussão proativamente. (Veja nossas orientações para comentários.) Também promoveremos as artes criativas, incluindo teatro, poesia, desenhos animados e obras de arte.
A longa experiência ensinou a muitos de nós que o mero ato de questionar as ortodoxias atuais, oferecer alternativas ou discordar de figuras importantes, pode resultar em reações adversas. Prevemos que este site estará sujeito às mesmas reações – na verdade, algumas deles foram perceptíveis mesmo antes do lançamento. Acreditamos que todos têm o direito de opinar sobre essas questões controversas. Acreditamos igualmente que pouquíssimas pessoas recebem informações suficientes para uma avaliação completa dos argumentos. Além disso, deploramos a tendência preocupante de sugerir, ou às vezes dizer abertamente, que as visões que desafiam o status quo não devem ser expressas de maneira alguma. Este silenciamento pode assumir várias formas, distorcendo os argumentos ou implacável trollagem ou atribuindo-lhes à ambição pessoal / profissional e malícia, a alegar que essas visões são intrinsecamente prejudiciais, envergonhando, atacando ou sendo abusivas. Isso pode resultar em alguns paradoxos curiosos. Por exemplo, se você passar muito tempo em mídias sociais, poderá acabar com a impressão de que as pessoas em todo o país estão sendo privadas de seus diagnósticos, independentemente de suas preferências e necessidade de acesso aos serviços. A verdade é que virtualmente a ninguém é oferecido uma alternativa para a prática diagnóstica vigente, e quem protesta com a imposição dessas categorias está em risco de punição por sua ‘falta de discernimento’. Enquanto isso, os danos geralmente causados pela prática psiquiátrica de rotina continuam e até aumentam. A figura muito citada de “1 e 4” experimentando ‘doença mental’ está caminhando em direção a 4 em 4, e, em uma tendência similar, as prescrições das drogas psiquiátricas estão aumentando sem diminuição da ‘epidemia’ das várias formas de sofrimento. Algo está muito errado!
Nesta turbulência às avessas, à medida que um paradigma entra em colapso e novos surgem, a MITUK está empenhado em dizer a verdade tal como a vemos, independentemente da controvérsia. Estamos em um momento histórico na história da psiquiatria, com uma oportunidade única de ajudar a moldar um futuro melhor. Congratulamo-nos com o seu interesse, comentários e contribuições.
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[É com grande satisfação que vemos que a nossa comunidade do Mad cresce, que ganha cada vez mais dimensões globalizadas. Agora com o Mad in UK. E reiteramos a importância que nós da comunidade brasileira contribuamos para fortalecer a perspectiva de busca de alternativas ao ‘modelo biomédico’ hoje dominante na assistência em saúde mental, no Brasil e no mundo em geral. Envie suas contribuições para [email protected]
Quinzenalmente, postagens originais serão veiculadas no site do Mad in America e no Mad in the UK.
Editores do Mad in Brasil]